segunda-feira, 26 de maio de 2008

O cerco midiático ao sindicalismo



A mídia burguesa resolveu declarar guerra aberta ao sindicalismo brasileiro. Todos os dias algum sindicato ou central ocupa as manchetes de jornais e revistas e fartos espaços nas telinhas da TV. Há poucos meses a vítima foi a CUT, com denúncias de desvio de verbas públicas da Federação da Agricultura Familiar de Santa Catarina – alvo de investigação na CPI da ONGs. Agora, a bola da vez é a Força Sindical, bombardeada com acusações de corrupção no uso de recurso do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A revista Veja, que não é flor que se cheire, deu até uma capa tenebrosa contra o presidente desta central, o deputado Paulo Pereira.
O cerco midiático ao sindicalismo, abanado por alguns setores de esquerda, não é algo ingênuo. Ele não visa contribuir para o justo debate sobre o fortalecimento das organizações de classe dos trabalhadores, inclusive com a depuração do que há de podre neste meio. Muito pelo contrário. O objetivo da mídia hegemônica, que só os ingênuos e os sectários não enxergam, é estigmatizar as entidades sindicais. Os ataques são duros, mas as provas são escassas. O que fica para o receptor da mensagem, porém, é que todo o sindicalismo é corrupto, vendido e fisiológico. Bem ao estilo dos recorrentes ataques “éticos” ao MST, esta ofensiva visa criminalizar o movimento sindical.

Motivos da recente histeria

Os ataques também não ocorrem por acaso. Surgem numa hora em que há sinais de retomada da capacidade de pressão do sindicalismo. Em decorrência do tímido crescimento da economia e do clima de maior democracia no país, nos últimos anos houve uma interrupção na queda da taxa de sindicalização. Ela cresceu de 16,73%, em 2001, para 18,35%, no final de 2005. A maior geração de emprego também aumentou o poder de barganha dos trabalhadores. Segundo o Dieese, no ano passado quase 90% das categorias conquistaram aumento salarial acima da inflação e derrotaram várias regressões trabalhistas, como o banco de horas – um fato inédito nas últimas décadas.
Fruto desta nova realidade, mais favorável à luta dos trabalhadores, o sindicalismo tem arrancado importantes conquistas institucionais – como o veto presidencial à Emenda-3 da precarização do trabalho, a legalização das centrais, o envio para a ratificação das convenções 151 (que garante o direito de negociação coletiva aos servidores públicos) e 158 (que proíbe a demissão imotivada) da OIT. Percebendo os novos ventos e revelando maior maturidade, as centrais sindicais se unem e preparam nova ofensiva para conquistar a estratégica redução da jornada. Os protestos unitários de 28 de maio inclusive podem ser o estopim de uma greve geral nacional pelas 40 horas.

Fraqueza reveladora do Estadão

Estas razões políticas – e não os motivos éticos de um udenismo rastaqüera – é que explicam este novo cerco midiático ao sindicalismo. Preventivamente, a nata da burguesia que controla a mídia tenta abortar a possibilidade da retomada da capacidade de pressão sindical dos trabalhadores. As emissoras privadas de TV no seu linguajar mais rebaixado abordam apenas as emotivas questões éticas para satanizar os sindicatos – são os imorais falando de moral. Já os jornais e revistas, nos seus editorais e reportagens de fundo, apresentam os verdadeiros motivos da atual campanha de fustigamento do sindicalismo. Não é preciso muito esforço para entender a sua hábil manobra.
O jornal O Estado de S.Paulo, que tem a virtude de não esconder o que pensa, recentemente fez longa reportagem sobre o tema. “Era Lula consagra a república sindical”, estampou a manchete, retomando o velho bordão dos golpistas de 1964. No texto, ele explicita as razões dos temores da famíglia Mesquita. “Com a regulamentação das centrais, o presidente Lula acaba de consagrar o seu governo como o que mais benefícios concedeu aos sindicalistas. Cinco anos após sua eleição, mais de uma dezena de conquistas podem ser listadas, como reflexo direto de suas origens, mas também da massiva ocupação de cargos no comando da máquina federal por ex-sindicalistas”.

A lista das conquistas sindicais

No box sugestivamente intitulado de “sindicalistas no poder”, o jornalão questiona o fato de que hoje 45% dos cargos de alto comando no governo Lula serem ocupados por sindicalizados, como se a sindicalização fosse um crime no reino do individualismo capitalista. O artigo também tenta desqualificar os dirigentes sindicais que ocupam posições de destaque nesta gestão – numa prova cabal de preconceito de classe, de nojo do trabalhador, como se somente a elite burguesa tivesse competência para exercer o poder. Mas o que causa maior irritação no jornalão conservador são as conquistas dos trabalhadores no atual governo. A lista apresentada é emblemática:
“Acordo com o governo de reajuste [salário mínimo] até 2023 indexado ao aumento da inflação, mais a variação do PIB; acordo para correção da tabela do Imposto de Renda, estagnada desde o governo FHC; criação das centrais oficialmente, que passam a receber parte do dinheiro arrecado com o imposto sindical; edição da medida provisória 388, que modifica as regras para o trabalho aos domingos no comércio; oficialização da participação do movimento sindical nos conselhos do Sesi, Senai, Sesc e Senac [Sistema S]; envio ao Congresso das convenções 151 e 158 da OIT; retirada do projeto de lei que estava no Congresso alterando a CLT; impedimento do andamento das propostas de reforma sindical e da Previdência, por falta de entendimento com os patrões”.

O falso ecletismo da Folha

Se o Estadão prima pela fraqueza, já a Folha de S.Paulo ainda tenta enganar os incautos com seu patético ecletismo. Em menos de um mês, publicou dois editorias marotos contra o sindicalismo. No mais recente, intitulado “acabou em farsa”, o jornal da famíglia Frias, que apregoou o golpe militar e apoiou a ditadura – inclusive doando as suas peruas para transportar presos políticos à tortura –, aparece travestido de defensor da liberdade sindical. No seu cinismo, ele critica a Lei 11.648, de 31 de março, que garantiu a legalização das centrais. Para o jornal, esta lei “atrelou as finanças das centrais ao Estado, a pretexto do seu ‘reconhecimento’ legal. As agremiações ganharam o direito a um quinhão do imposto sindical – tributo que é o pilar da tutela varguista”.
Para a mídia burguesa, que se locupleta com fartas verbas da publicidade estatal e com sinistros subsídios públicos, o sindicalismo dos trabalhadores deveria viver à mingua, sem recursos para desenvolver suas lutas. Para ela, os sindicatos deveriam subsistir somente com as contribuições voluntárias dos sócios – de preferência, sem desconto na folha de pagamento – num mundo em que impera a ditadura das fábricas, a perversa rotatividade no emprego e o elevado desemprego. Falsa, ela divulga que apenas no Brasil os sindicatos contam com tributos, escondendo que na maioria dos países há leis de apoio à ação sindical – como os fundos de solidariedade na Europa.
No segundo editorial, “teoria e prática sindical”, a Folha prega a imediata adoção da Convenção 87 da Organização Internacional do Trabalho, que abre brechas para a implantação do pluralismo sindical no Brasil. “O caminho para promover a verdadeira reforma sindical, que de fato elimine a indevida tutela estatal, é a [ratificação] da Convenção 87. O documento, que era defendido pela CUT até a chegada de Lula ao poder, preconiza a eliminação das contribuições compulsórias e da unidade sindical”. Tal contrabando seria “a base de todo o sindicalismo independente”. Como se observa, a mídia burguesa sabe o que quer – diferentemente de algumas correntes de esquerda.