sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Mídia distorce a vitória de Chávez

A mídia brasileira, que mais parece uma sucursal dos neocons dos EUA, não engole o presidente Hugo Chávez. Nos editoriais dos jornalões e na “cobertura” das televisões – com exceção para a reportagem imparcial de Rodrigo Viana na TV Record –, o que se viu foi a tentativa de distorcer o resultado do referendo de domingo último, na qual o líder bolivariano obteve a sua 14º vitória eleitoral em dez anos de governo. Para iludir os ingênuos, ela alardeou que o pleito foi fraudado, que a oposição oligárquica “quase” venceu e que Chávez garantiu “a sua reeleição ilimitada”.

O editorial da Folha foi um dos mais deprimentes: “O rolo compressor do bonapartismo chavista destruiu mais um pilar do sistema de pesos e contrapesos que caracteriza a democracia”, afirmou – logo ela que clamou pelo golpe de 64 contra o “perigo comunista”, transportou presos políticos para a tortura e agora chama a ditadura militar de “ditabranda”. A vitória de Chávez, segundo sua análise enviesada, decorreu do uso do “dinheiro que fluiu copiosamente para as ações sociais do presidente” – ela quer que o recurso público seja usado no subsídio ao papel para suas gráficas. Animada com “a oposição revigorada e ativa”, a Folha aposta no fim do “conforto de Chávez”.

O falso rótulo de “ditador”

Outros editoriais revelaram o desconforto da mídia com a vitória de Chávez, num tom bem mais realista do que o rei. Até o “império do mal”, agora sob a direção de Barack Obama, procurou suavizar a sua ingerência agressiva, elogiando o processo de consulta democrática. A oposição direitista, que liderou um golpe em abril de 2002, um locaute patronal e várias iniciativas de desestabilização da Venezuela, também reconheceu a derrota. Mas a mídia burguesa, principal “partido do capital”, conforme a definição clássica de Antonio Gramsci, ainda esperneia e faz de tudo para manipular a opinião pública. Derrotada nas suas pretensões, ela não perde a pose.

A distorção mais descarada, estampada nas manchetes dos jornais e nas chamadas da TV, é que Chávez bancou “a sua reeleição ilimitada”. A manipulação visa carimbar no líder bolivariano o rótulo de “ditador”. O referendo, porém, não foi sobre a possibilidade de reeleição do presidente, mas de todos os mandatos. Pela constituição atual, os parlamentares têm direito a duas reeleições – no Brasil não há esta limitação; já os governadores e prefeitos só podem se reeleger uma única vez. A vitória do “si” no referendo garante a possibilidade de reeleição para todos os integrantes do executivo e do legislativo, inclusive os da oposição – e não apenas para Chávez.

Além disso, a emenda constitucional aprovada no referendo não garante a “reeleição ilimitada”, mas sim a possibilidade de disputar novamente o cargo. Caso o governante ou deputado frustre as expectativas da sociedade ele poderá ser rejeitado nas urnas. O povo é soberano. O cargo não é vitalício, como insinuam alguns “colunistas” da mídia. Quanto ao uso da máquina pública e do poder econômico, não dá para criticar apenas um dos lados. Os cinco governadores da oposição, filhotes do antigo bipartidarismo oligárquico do país, são mestres no uso da máquina pública. Já a maior parte dos ricos empresários e a mídia golpista nunca desistiram de derrotar Chávez.

A manipulação dos meios privados

No próprio referendo, o poder manipulador da mídia privada venezuelana ficou patente. Segundo pesquisas do Observatório Mundial de Mídia, encomendadas pelo Conselho Nacional Eleitoral, a campanha contra a emenda obteve 71% da cobertura nos veículos de comunicação. Já o “si” teve 29% dos noticiários. “O desequilíbrio informativo, apontado por órgãos que monitoram a mídia, colocou em desvantagem a campanha do bloco revolucionário, o que desmascara o papel de vítima da oposição”, criticou Jesse Chacón, chefe de comunicação do Comando Simon Bolívar.

Outra pesquisa, feita pela Entorno Inteligente, constatou que “de cada 100 artigos publicados na mídia impressa, 77 foram a favor do ‘no’ e 23 a favor do ‘si’. Quanto às principais cadeias de televisão, o estudo detectou que 73% das matérias foram a favor do ‘no’ e 27% a favor do ‘si’; as emissoras mais equilibradas durante a campanha eleitoral foram a Televen e a Venevisión”. Para Jesse Chacón, estes dados demonstram que “se houve algum setor privilegiado na campanha, foi o favorável ao no”. Ele também criticou a manipulação dos institutos de pesquisa, que apontaram empate técnico no referendo, sendo que a vitória do ‘si’ ficou bem acima da margem de erro.

“Péssima notícia para o império”

Diante destes fatos, por que a mídia burguesa faz tanto escarcéu com o resultado do referendo na Venezuela? Pascoal Serrano, num excelente artigo no sitio Rebelion, mostra que esse alvoroço é despropositado. “Vale lembrar que a reeleição sem limitações é reconhecida por 17 dos 27 países que integram a União Européia, sem que haja gerado polêmicas nem que estes sejam acusados de ditadura ou deterioro democrático. Basta lembrar-se de Tage Fritiof, primeiro ministro da Suécia durante 23 anos contínuos; de Helmut Kohl, chanceler da Alemanha por 16 anos seguidos; ou de Felipe Gonzáles, presidente do governo espanhol durante 14 anos sem interrupção”.

Para o renomado sociólogo argentino Atílio Boron, o motivo deste alarde é que a nova vitória de Chávez é uma “péssima notícia para o império” e a oligarquia local. “A emenda constitucional que o povo venezuelano aprovou evidencia o desespero dos adversários, de dentro e de fora, da revolução bolivariana. Eles estão conscientes de que a consolidação da liderança de Chávez e a continuidade de seu projeto reforçam os espaços da esquerda na balança política regional... Os publicistas do império e da plutocracia venezuelana afirmaram que a aprovação da emenda significaria que Chávez iria governar indefinidamente. Fiéis a sua tradição, tergiversaram sobre o que estava em discussão, procurando enganar a opinião publica”.

Boron lembra ainda que esta mesma imprensa burguesa nada fala sobre o escandaloso processo que garantiu a reeleição de Álvaro Uribe na Colômbia, “mediante ao suborno de deputados que, com o passar do tempo, confessaram o delito... Quanto à nova proposta de re-reeleição de Uribe, os falsos defensores da democracia, que tanto atacam Chávez, não divulgam que ele aprovou seu projeto numa sessão extraordinária, convocada com extrema urgência, à meia noite, diante da quase total ausência da desprevenida oposição. Mas isto é a democracia [para a mídia burguesa]. A de Chávez, que segue todos os passos que manda a legalidade vigente, é ditadura”.

6 comentários:

Anônimo disse...

Bela avaliação! Eles tentam nos cegar mesmo. Mas, como destacou uma recente capa da revista Caros Amigos: "A América Latina está Viva!"

Anônimo disse...

Muito bem Altamiro! Essa midia golpista tenta mascarar a realidade!

AF Sturt Silva disse...

É BORGES ,ASSIM MESMO A MIDIA BURQUESA SEJA EM QUALQUER PAIS ESTA SEMPRE MANIPULANDO TUDO,QUE BOM QUE ALGUNS CASOS ELES NÃO CONSEGUEM.
SOBRE CHAVES,É O POVO VENEZUELANO QUE TEM QUE DECIDIR SE ELE É O CARA IDEAL PARA GOVERNAR OU NÃO.É ASSIM MESMO ,ACHO QUE NÃO É UM BOM SOCIALISMO O DELE,MAS PIOR SEM ELE E AGORA SO BASTA APOIAR E ESPERAR PARA QUE ELE FAÇA ALGUMA COISA PELO SEU POVO A QUAL PROMOTEU.TAMBÉM DEVE COBRAR MAIS JAMAIS SER OPOSIÇÃO SO POR CAUSA DE POLITICAGEM.
SAUDAÇÕES SOCIALISTAS...

RLocatelli Digital disse...

Surpreendentemente, o Depto. de Estado dos EUA lançou nota em que reconhece que a vitória de Chávez foi democrática.
Por mais que saibamos que os EUA continuem sendo o império de sempre - talvez agora mais carcomido - mas não deixa de ser interessante que Obama esteja deixando órfãs as "zelites" latinoamericanas.
Nos tempos do Bushinho uma nota como essa seria impensável.

Renan Barreto disse...

“Os reality shows são a forma mais eficiente de ilusão que a cultura de massas já produziu: eles vendem aos espectadores o espelho fiel de sua vida amesquinhada sob a égide severa das ‘leis do mercado’. Eles vendem a imagem da selva em que a concorrência transforma as relações humanas. Só que elevados ao estatuto de espetáculo” Amei isso. Bela referência. O Big Brother é o circo moderno, uma jaula cheios de animais. O interessante para a população é que os animais falam e copulam embaixo do edredon. Como já dizia Guy Debord: Essa é a sociedade do espetáculo.

Valeu! Excelente blog. Sendo que o texto está parecendo texto de impresso, cheio de intertítulos.

Anônimo disse...

Ah que bom seria se o presidente Lula conseguisse aprovar um referendo igual no Brasil, antes das próximas eleições presidenciais!! Ótimo blog!!