segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

O adeus ao deputado dos sem-terra

“Um homem não vale pela quantidade de discursos que fez ou pelos anos que viveu. Vale pela sua luta. E é isso que o Adão representa. Ele é um símbolo da dignidade humana”. Presidente Lula no enterro do deputado federal Adão Preto, um dos fundadores do MST.


Conheci Adão Preto nas marchas dos sem-terra e nas atividades de formação do MST. Deputado em seis legislaturas pelo PT gaúcho, ele mantinha sua simplicidade e seu jeitão de camponês. Os mandatos não lhe subiram à cabeça. Era um homem totalmente comprometido com as lutas pela reforma agrária. Vítima de pancreatite, sua morte representa sensível perda para os trabalhadores brasileiros. O discurso do presidente Lula, com lagrimas nos olhos, durante seu sepultamento em Porto Alegre, na sexta-feira, expressa bem os valores de Adão Preto, o deputado dos sem-terra.

Ele iniciou sua militância no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Miraguaí, influenciado pelas idéias da “teologia da libertação” da Comissão Pastoral da Terra (CPT). No final dos anos 80, ele ajudou a construir o Movimento dos Sem Terra (MST), atuando na ocupação da Fazenda Anoni, em Sarandi (RS). João Pedro Stedile, membro da coordenação nacional do MST, lembra que seu primeiro contato com Adão Preto se deu há mais de 30 anos, quando ele era líder da comunidade e ministro da eucaristia na Diocese de Frederico. Vale registrar as sentidas lembranças de Stedile:

Garra e coerência na militância

“Frei Sergio Gorgen o apresentou fazendo boas referências, de que se tratava de um pequeno agricultor, lutador, honesto, trabalhador, pai de nove filhos. Naqueles tempos de ditadura militar era difícil encontrar pessoas corajosas que se dispusessem a defender o interesse da comunidade. Desde o início o admirei por sua sensibilidade social, sua coerência e franqueza. Nos encontros, ele costumava colocar em versos singelos as idéias que matutava e as avaliações que fazia da política... O tempo foi passando e, em 1986, organizamos a maior ocupação de terras no Rio Grande do Sul, na Fazenda Anoni, com mais de 2,5 mil famílias. E lá estava Adão Preto”.

“Naquele mesmo ano, elegeu-se deputado estadual. Seria o primeiro deputado camponês a tomar posse na Assembléia Legislativa. Uma grande vitória do movimento camponês do Rio Grande do Sul. No início, colunistas da imprensa burguesa riram de seu pouco estudo, afinal tinha apenas a terceira série do primário. A resposta veio na ação exemplar em defesa dos pequenos agricultores e dos sem-terra que impactou a sociedade e que lhe deu o Prêmio Springer de melhor deputado. Depois se elegeu deputado federal, defendendo com a mesma coerência e garra os interesses da classe trabalhadora. Adão Preto não era um parlamentar padrão. Não gostava da tribuna. Mas estava presente em todas as lutas sociais e as fazia repercutir no parlamento, na forma de leis ou de denúncias. Sempre o mesmo. Simples. Com uma coerência impressionante. Nunca titubeou”.

“Hábitos simples e idéias refinadas”

A morte de Adão Preto entristece todos os lutadores sociais. Deixa uma grande lacuna. De todas as partes, líderes políticos e populares manifestaram pesar. Em discurso no plenário da Câmara Federal, o deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) lamentou a morte de seu colega de parlamento. “A Câmara perdeu um combatente e o Brasil, um patriota. Homem de hábitos simples, mas de idéias refinadas, ele pautou sua ação pela defesa intransigente da ampliação da democracia em todos os níveis”, afirmou. Para o comunista, Adão Preto se notabilizou pela luta contra “uma das chagas mais renitentes da formação social brasileira, a concentração da posse da terra”.