segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Banda larga e direito à comunicação

Nas últimas semanas, o governo Lula agendou várias reuniões para discutir o Plano Nacional de Banda Larga (PNBL). No geral, as avaliações dos participantes da sociedade civil são positivas. O amigo Marcos Dantas, professor da Escola de Comunicação da UFRJ, participou de um dos encontros com o presidente Lula e saiu animado. Entre outros avanços sinalizados pelo governo, ele destacou três pontos:

Avanços e pressão das operadoras

“1- O governo pretende fazer a banda larga chegar, até 2014, a 4.300 municípios, através dos troncos (backbone) da Eletronet e outros estatais, em parceria com operadoras de comunicações, provedores de internet, pequenas e médias empresas. 2- Pretende levar a banda larga às classes C, D e E, beneficiando cerca de 20 milhões de domicílios a mais do que aqueles que, conforme as projeções disponíveis, já seriam ‘naturalmente’ incorporadas à banda larga pela expansão do mercado. 3- pretende que o PNBL não seja ‘apenas’ de inclusão digital, mas seja parte de um programa de desenvolvimento econômico e social, incluindo também o fomento à produção de conteúdos nacionais para a internet e apoio ao desenvolvimento industrial-tecnológico”.

Já prevendo a chiadeira das empresas de telefonia, a maioria multinacionais, Dantas alertou em sua mensagem: “É possível que os lobbies de sempre e a grande mídia reduzam o plano a uma tentativa de ressucitar a Telebrás. Como pode ser observado, sequer citei esse nome na descrição acima. Não é o mais importante. Se a Telebras vier a ser ressucitada, será outra empresa, com reduzido número de funcionários, encarregada apenas de gerenciar a infra-estrutura já existente do estado, muito distante daquela Telebrás que um dia ofereceu satélites, troncos de comunicações, pesquisas tecnológicas e mais de 12 milhões de telefones à sociedade brasileira”.

Propostas do Coletivo Intervozes

O debate sobre o Plano Nacional de Banda Larga é estratégico na luta pela democratização dos meios de comunicação no país. Diante da violenta reação das poderosas empresas do setor e das manipulações da mídia corporativa, ele exigirá forte pressão e muita capacidade de elaboração dos movimentos sociais. Com o objetivo de contribuir com este debate, reproduzo abaixo as “propostas para o PNBL” elaboradas pelo Coletivo Intervozes, que encara “a banda larga como instrumento de avanço na efetivação da comunicação como um direito humano no Brasil”.

Objetivos do PNBL

a) Universalizar o acesso à banda larga no Brasil, na perspectiva de garantir o direito à comunicação dos cidadãos e cidadãs, no contexto das novas tecnologias e da sociedade da informação;

b) Ampliar o papel do Estado na área, posicionando-o tanto como provedor direto do serviço quanto como indutor da competitividade neste mercado, por meio da oferta de infra-estrutura a pequenos e médios operadores privados;

c) Promover o acesso não discriminatório e competitivo à infra-estrutura das operadoras;

d) Implementar medidas que promovam a apropriação da tecnologia pelos cidadãos e cidadãs.


Diretrizes do modelo

1) Criação do serviço de acesso à Internet em alta velocidade (banda larga) a ser prestado em regime público (conforme o Art. 18 da LGT), com participação de empresas privadas e públicas em todas as etapas do tráfego e provimento (backbones, backhauls e última milha)

O modelo de acesso à Internet em alta velocidade (banda larga) orientado exclusivamente pela dinâmica de mercado (prestado em regime privado) evidenciou sua incapacidade de atender às demandas da população brasileira. O caso da implantação da TV a cabo no país é uma amostra que, ao mercado, não interessa investir em regiões menos rentáveis.

No modelo brasileiro de telecomunicações, todo serviço de “interesse coletivo, cuja existência, universalização e continuidade a própria União comprometa-se a assegurar”, deve ser prestado em regime público.

A universalização, independentemente de localização e condição sócio-econômica, é essencial para a garantia da cidadania. Enquanto houver brasileiros sem acesso à banda larga, estaremos aumentando a desigualdade social e privando-os do seu direito humano à comunicação.

No regime público há condições de instituir obrigações às operadoras relativas ao alcance, à continuidade, à qualidade (incluída aí a velocidade) e ao controle tarifário do serviço. Essa proposta foi aprovada por unanimidade na 1a Conferência Nacional de Comunicação.

Para definir a banda larga como serviço a ser prestado em regime público, basta um decreto da Presidência da República (conforme o Artigo 18 da Lei Geral de Telecomunicações).

2) Estabelecimento das obrigações e metas a serem respeitadas pelos prestadores privados no que tange à universalização, aos preços, à continuidade, à velocidade e à qualidade do serviço

A orientação do mercado produziu um modelo marcado pela baixa penetração, altos preços e baixas velocidades do acesso à Internet em alta velocidade. Segundo dados da UIT, o Brasil está em 77º lugar na escala de preços, abaixo dos demais membros do Bric, o grupo dos grandes emergentes: Rússia (37º), Índia (73º) e China (75º).

Segundo dados divulgados em documento do Ministério das Comunicações, há uma grande discrepância entre os níveis de penetração da banda larga no Brasil e nos países da OCDE e também Argentina, México, Turquia, Chile e China [G6]. O Brasil apresenta penetração menor que a média da OCDE e do G6, do qual faz parte, ao longo dos anos. O mesmo documento afirma que “a comparação internacional das velocidades contratadas de download revela que a velocidade média do Brasil, em 2008, era menor que a da Argentina e do Chile”.

Número da UIT também mostram que o custo mensal da banda larga equivale a 9,6% da renda média per capita brasileira. Mesmo os brasileiros que pagam para ter acesso à banda larga estão fazendo um enorme esforço em seu orçamento. As leis do mercado fizeram, por exemplo, com que o número de paulistas ligados à rede veloz (2,4 milhões) seja maior que o de todos os clientes das regiões Nordeste, Norte e Centro-Oeste (2 milhões).

Fica explícita, portanto, a necessidade do estabelecimento de obrigações e metas aos prestadores de serviços privados, de forma a garantir a universalização, a continuidade, a qualidade no acesso, velocidade e modicidade nos preços de oferta da banda larga.

3) Implantar uma empresa pública (preferencialmente a Telebrás) que, diretamente ou em parceria com outros órgãos estatais (como governos estaduais e prefeituras), disponibilize tanto infra-estrutura para prestadores privados (comerciais ou não-comerciais) quanto o serviço na casa do cidadão.

Aproximadamente 55,7% dos domicílios “estão em condições geográficas e/ ou de renda incapazes de atrair a oferta de Internet em banda larga”. As operadoras comerciais não têm condições de oferecer uma solução para atender a esse enorme contingente.

A entrada da Telebrás representaria uma alternativa de provimento do serviço para todo o conjunto de cidadãos, que dificilmente serão atendidos pelo mercado. É preciso haver um operador que tenha metas sociais, e não apenas econômicas, de forma que o Estado garanta o direito à comunicação dos cidadãos. No horizonte, deve estar a gratuidade na oferta do serviço à população, visto que hoje o preço é a maior barreira para o acesso à banda larga nas regiões onde o serviço já é ofertado.

A atuação da Telebrás não pode se limitar aos municípios em que não há acesso ou nos quais o preço é exorbitante, sob pena de não atender à demanda de cidadãos sem condições de obter acesso nas áreas em que oferta privada existe (hoje, mais de 90% dos municípios) ou que possuam serviços a preços não-exorbitantes.

A verticalização do mercado e o comando da infra-estrutura pelas grandes operadoras é um obstáculo ao funcionamento de pequenos e médios provedores. Atualmente, várias iniciativas de cidades digitais são frustradas por conta dos gargalos criados pelos escorchantes preços cobrados pelas operadoras privadas. Um operador estatal pode viabilizar a concorrência na última milha.


Parceria com prefeituras

Segundo entendimento da Anatel consolidado no Ato nº 66.198, de 27 de julho de 2007, de seu Conselho Diretor, as prefeituras municipais não podem prestar o serviço de internet diretamente à população em caráter oneroso, oferecendo o serviço apenas por meio de uma empresa pública ou abrindo sua rede gratuitamente aos usuários. Em associação com a Telebrás, as prefeituras e associações sem fins lucrativos podem ter papel essencial na prestação de serviços à população, sem passar pelos caríssimos gargalos criados pelas operadores privadas, em geral operadoras de telefone fixo que operam um monopólio na área, oferecendo a última milha ao cidadão.

4) Promover a regulação da gestão das redes a partir da desagregação entre detentores e prestadores de serviço, bem como do acesso não discriminatório e competitivo à infra-estrutura de tráfego de dados

A organização vertical do mercado, com um mesmo operador controlando a infra-estrutura e prestando os serviços, gera altos preços e baixíssima concorrência. Uma empresa que opera do controle da infra-estrutura ao serviço que chega na casa do cidadão buscará sempre maximizar a integração de seus bens e serviços e dificultar a ação dos seus concorrentes, especialmente quando eles dependem de suas redes.

A separação estrutural promove a concorrência, pois a operação exclusiva do tráfego de dados no atacado motiva os operadores a oferecer condições favoráveis para diversos prestadores de serviço, e o fato de não ter que contratar a infra-estrutura de seus concorrentes os protege de práticas anti-competitivas.

Na gestão das redes, deve ser garantida a neutralidade do detentor de infra-estrutura no tratamento das informações, sem nenhum tipo de interferência discriminatória na velocidade de transmissão ou no conteúdo transmitido.

5) A gestão do PNBL deve ser realizada por um conselho ou órgão com a participação do governo federal e de todas as esferas estatais envolvidas na sua implantação, bem como por representações da sociedade civil.

O volume e a complexidade de políticas na implantação do Plano Nacional de Banda Larga demanda uma nova estrutura administrativa para além daquelas já existentes no governo federal, que integre os órgãos envolvidos no extenso conjunto de ações. A participação das diversas esferas estatais envolvidas na implantação do Plano reforça seu caráter federativo e legitima a importância dos estados e municípios na definição dos rumos da iniciativa.

A participação de representações da sociedade civil é proclamada como uma importante bandeira nesta gestão, além de ser mecanismo para aproximar as políticas públicas dos cidadãos e de seus reais interesses. No caso das empresas, uma presença significativa do setor neste órgão constitui um perigo, pois daria a estes atores a prerrogativa de definir o ambiente de mercado em que atuam.


Além do acesso

O PNBL deve ir além das políticas de acesso e prever ações de formação e capacitação, estímulo à produção e difusão de conteúdo na rede, bem como modelos democráticos para a regulação dos protocolos e conteúdos, garantindo a plena inserção dos cidadãos e cidadãs no mundo IP. Neste sentido, é necessário:

- Estabelecer uma agenda regulatória para a normatização dos protocolos, em especial a modelagem da neutralidade de rede, de modo a promover padrões livres ou fortemente acessíveis e democráticos;

- Estabelecer uma agenda regulatória para os conteúdos nos serviços baseados em protocolos IP, de modo a garantir a circulação democrática, plural e diversa de opiniões e expressões culturais;

- Instituir uma política de governo eletrônico, crianço uma cesta de serviços e de mecanismos de participação popular através do acesso à rede.


Mecanismos participativos

Pela sua relevância, o PNBL deve ser alvo de intenso debate, envolvendo os diversos setores e cidadãos em geral que ainda não tiveram a oportunidade de apresentar sua visão ao governo federal. Neste sentido, o Intervozes propõe a publicação da proposta do Plano para consulta pública por no mínimo um mês; a realização de audiências públicas em pelo menos 8 capitais, contemplando todas as regiões; e a promoção do debate sobre o Plano nas estruturas de comunicação do governo federal.

“Estadão” apóia FHC; “Folha” é do Serra

Reproduzo artigo do jornalista Rodrigo Vianna, intitulado “Estadão fala por FHC; Folha é a voz de José Serra”, publicado no seu blog “Escrevinhador”:


Sob comando da família Mesquita, o "Estadão" sempre foi um jornal mais "ideológico" do que a "Folha". O diário dos Frias muda de posição conforme muda o vento.

Os dois jornais estiveram a favor do golpe de 64. O "Estadão" – como boa parte da elite brasileira – queria uma intervenção rápida dos militares, "limpando" o país dos "comuno-petebistas". Depois, o poder cairia no colo da UDN. Era o sonho da família Mesquita.

Quando a ditadura mostrou que viria para ficar, o "Estadão" teve a coragem de rever suas posições, e foi pra oposição. Viveu sob censura, teve que publicar receitas e poemas no lugar de textos censurados. A "Folha", não.

A "Folha" (há várias testemunhas disso) chegou a emprestar seus carros para transporte de presos, e para uso do DOI-Codi em São Paulo.

Quando o vento mudou, nos anos 80, aí a "Folha" virou "democrata", botou faixa amarela na capa, e fez campanha pelas Diretas-Já. Teve um papel importante naquela época. Isso não se nega. E conquistou muitos jovens leitores com essa posição de "vanguarda".

Por que relembro isso tudo?

Porque, nos últimos dias, ficou claro que apito "Folha" e "Estadão" tocam em relação à candidatura tucana.

O "Estadão" publicou o artigo de FHC, no domingo - chamando o PT para a briga (o que Lula e Dilma adoraram).

A "Folha", nesta terça, deixa claro que a tática de FHC desagradou a Serra. O jornal dos Frias não ouviu o Serra em "on". E não precisa. O recado foi dado na capa: "Críticas de FHC ao presidente contrariam a tática de Serra".

O "Estadão" fala por FHC. De forma aberta – como manda a boa tradição do jornal (lembro que, hoje, o diário nem está mais sob comando dos Mesquita, mas de um comitê de credores que – segundo alguns – incluiria também gente muito próxima a FHC).

A "Folha" fala por Serra. De forma velada.

É um pouco mais que isso.

Os dois jornais, claro, querem a vitória de Serra. Mas, para o "Estadão, não basta uma vitória qualquer. Precisa ser uma vitória que reafirme o ideário (neo) liberal: a candidatura tucana deveria levantar as bandeiras, defendendo o legado de FHC. Para o "Estadão", não vale uma vitória envergonhada, que esconda FHC e legitime o "Estado forte" do segundo mandato lulista. FHC foi o sujeito que prometeu "enterrar a era Vargas". É o velho sonho do "Estadão", que até hoje não digere a derrota para Vargas em 32.

A "Folha", como sempre, parece mais pragmática. Se for preciso esconder FHC para que Serra vença, ótimo.

Não é por outro motivo que o jornal dos Frias escalou o (bom) repórter Gustavo Patu para mostrar como FHC omitiu os erros do governo dele no artigo escrito para o "Estadão". É um recado da "Folha" (e de Serra) para FHC: se falar demais, até nós vamos desconstruir o seu governo!

FHC já percebeu que – se não brigar para defender sua biografia – ela será jogada no lixo, inclusive pelos correligionários tucanos.

Lula quer que a eleição vire um "choque de programas" (governo Lula x governo FHC).

Serra quer "choque de biografias" (o ex-ministro e governador "experiente" x a ministra "inexperiente").

O problema é o choque de egos entre os tucanos.

Quem vai guardar o ego de FHC no apartamento dele, em Higienópolis? Só Dona Ruth conseguiria...

Pensando bem, não é justo exigir tal esforço de FHC, a essa altura da vida.

Deixa o FHC falar à vontade! Faz bem pra ele. E, certamente, fará um bem enorme ao país...