quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

A liberdade na web em risco

Por José Dirceu, em seu blog:

O Senado dos Estados Unidos programa votar a Lei de Paralisação da Pirataria Online (SOPA - Stop Online Piracy Act) no próximo dia 24. Caso aprovada, ela permitirá a criminalização de conteúdos da web. Para isso, basta que sejam considerados ilegais ou perigosos pelo governo norte-americano. As implicações do novo marco legal norte-americano têm o poder de afetar o ciberespaço como um todo.

Segundo o especialista na área, Sérgio Amadeu, se a lei for aprovada, o mundo verá a primeira grande derrota da cultura da liberdade na web.



Qual é o conteúdo desse projeto de lei? Por que é tão polêmico?

Sérgio Amadeu: O SOPA, apresentado em outubro de 2011 na Câmara dos Deputados dos EUA, é praticamente um complemento do Protect IP Act (PIPA), apresentado quatro meses antes no Senado norte-americano. As duas propostas legislativas visam bloquear o acesso a sites e aplicações na Internet que sejam consideradas violadoras da propriedade intelectual norte-americana. A indústria do copyright percebeu que os principais buscadores, provedores de conteúdo e redes sociais online estão sediadas nos EUA. Por isso, acreditam conseguir no ciberespaço algo semelhante ao bem sucedido bloqueio econômico à Cuba.

Na prática, o que acontecerá se ela for aprovada?

Nenhuma empresa sediada nos EUA poderá permitir o acesso a um número de IP (ou seja, do protocolo de internet) ou a um domínio de um site acusado de "roubar" imagem, vídeo, música, texto ou software de cidadãos ou corporações norte-americanas, sob pena de ser considerado um verdadeiro cúmplice. Mais do que aplicar a técnica chinesa do bloqueio aos endereços dos sites, a lei exige que, em cinco dias, todas as referências a estes sites sejam apagadas. Isto quer dizer que se meu blog for acusado de violar o copyright de algum americano, o Google e o Yahoo serão obrigados a deletar todas as referências a ele. Também a Wikipedia deverá suprimir todos os links que teriam para o meu blog, mesmo que os enlaces tratassem de outro tema.

Além disso, são completamente impeditivos os custos para se recorrer na Justiça norte-americana dessa ação de bloqueio administrativo. O pior é que os dois projetos de lei visam controlar a criatividade e a inovação também na área de aplicações na rede. Imagine se a Microsoft acusar o Wordpress de violar determinadas patentes de software (que são aceitas nos EUA). Como ficarão os blogs que usam a plataforma wordpress em todo o planeta? Certamente terão seus IPs bloqueados em solo americano e os mecanismos de busca deverão suprimir qualquer link que os indique.

Qual o impacto disso para a rede como um todo?

Se o SOPA e o PIPA forem aprovados, será a primeira grande derrota da cultura da liberdade diante da cultura da permissão e do vigilantismo. Será um grande retrocesso para a criatividade e para a inovação da comunicação em rede. A Internet poderá ser afetada nos seu sistema de DNS (sistema de nomes de domínio) e isto poderá alterar profundamente a sua dinâmica. Por isso, enquanto lutamos contra os traficantes do copyright, temos que utilizar a estratégia das comunidades de software livre. É preciso pensar e construir também novas tecnologias de rede que possam anular a truculência do Estado norte-americano. Resistir, mobilizar, denunciar, sem esquecermos que, talvez, o decisivo seja hackear. E vale lembrar que hackear é hipertrofiar. Borrar as fronteiras dos inimigos da liberdade. Elevar ao extremo seus absurdos. Não têm nada a ver com crackear, roubar e invadir. Um exemplo é o plano para lançar o primeiro satélite hacker (leia mais).

Quais são os interesses por trás da lei?

Esta medida é defendida por membros do Partido Republicano e do Partido Democratas que querem subordinar todos os direitos sociais e culturais ao enrijecimento e extensão da propriedade intelectual. São lobistas de associações como a MPAA (indústria cinematográfica), RIAA (indústria fonográfica), BSA (Business Software Aliance) que articulam deputados e senadores para apoiar tais medidas que são consideradas anti-constitucionais por diversos analistas. Todavia, os deputados defensores do SOPA e do PIPA defendem que tais medidas não se aplicam em território americano, são para bloquear sites fora de sua jurisdição, portanto, não fere a Constituição. Por trás dessas propostas está a certeza de que não adianta atuar contra o usuário da Internet, pois esse não acredita que compartilhar música, textos e vídeos seja uma atividade criminosa. Por isso, querem atuar na própria infraestrutura de conexão e de provimento de acesso da rede.

Há reação dos movimentos sociais?

Há uma grande reação nos EUA contra o SOPA e o Protect IP Act. O principal articulador da luta contra o bloqueio da Internet é a Electronic Frontier Foundation. Ativistas do mundo inteiro se mobilizam contra essas medidas. Organizações sem fins lucrativos, tais como a Wikipedia e a Mozilla Foundation se mobilizam igualmente junto com corporações como o Google e o Yahoo. No Brasil, os ativistas da liberdade na Internet que lutam contra o AI-5 Digital se mobilizam desde o ano passado para denunciar o SOPA. Diversos blogueiros também têm denunciado essas investidas que visam censurar e bloquear a rede. Existe até um aplicativo para celulares Android (veja) que permite o usuário identificar as empresas que apóiam o SOPA, conforme tenho relatado no Twitter ( http://twitter.com/samadeu).

3 comentários:

Paulo César disse...

A liberdade da Internet

Todos sabem que a Internet é um instrumento de comunicação que se traduz em uso multilinguístico do mundo globalizado, e que as relações culturais entre países e povos não voltarão a serem as mesmas de antes dessa invenção. O conteúdo veiculado pela rede dos meios digitais no mundo não é propriedade exclusiva de nenhum país e de nenhum governo. Nenhuma lei truculenta de um único país pode quebrar o espírito de liberdade alcançada pelo mundo de hoje, principalmente porque países já se libertaram de ditaduras através do uso desse novo canal da comunicação internacional. A internetização do planeta transformou tão rápida e radicalmente a estrutura dos sistemas de produção comercial no planeta, que a conjuntura econômica que sustenta todos os povos e governos é pautada na interrelação da informação configurada numa linguagem técnica digitalizada, que por sua vez traduz a comunicação virtual de domínio público movimentada nas relações comerciais de ordens internacionais e nacionais, que coadunam serviços indispensáveis para a dinâmica da vida cotidiana de cada país. Portanto, esse projeto de lei americano, SOPA – Stop Online Piracy Act, não passa de uma tentativa de apossar da maior parte da infraestrutura e provedores do mercado digital consolidado pelos usuários em escala internacional. É mais o caso da velha ambição americana de querer manter a hegemonia do mercado do mundo globalizado em suas raízes, coisa que já faz parte do domínio público planetário.

Pode-se dizer, seguramente, que a dinâmica de funcionamento das cidades contemporâneas é ritmada pela mímesis do mundo digitalizado na realidade virtual com a realidade concreta, fazendo com que as relações humanas concretizadas se expressem significativamente através da abstração das informações disponíveis virtualmente. Assim vemos uma metamorfose relativa da realidade em vários setores da vida em sociedade, e que um retrocesso em alguns desses mecanismos que estão significativamente integrados à vida cotidiana pode ocasionar danos profundos no meio urbano, por onde a estruturação do comportamento produtivo e orientador é assegurada pela fluidez da informação disponibilizada na Internet ao público em geral. Portanto, o bloqueio de sites de busca, redes sociais e portais, nacional ou estrangeiro, conforme pretende essa lei SOPA, interrompem também a disponibilização de conteúdos digitais que são cruciais para a gestão pública de diversos serviços sociais que já estão integrados ao sistema sobrevivente da população, não importando a origem da informação.

A informação digital tornou-se tão vital para as empresas que produzem a tecnologia da Internet, que a grande indústria de produção de bens de consumo e os bancos cedem campo para a estruturação de controle digital da informação via Internet para estas empresas, utilizando programas de hackers de proteção, a fim de garantir a segurança do sistema digital interno das empresas de produção industrial contra a invasão de vírus digitais e programas piratas de “crackers”. Há um monopólio do sistema de informática pelas empresas de produção de hardwares e softwares em todo o mundo que influência além do domínio comercial, favorecendo o controle e a formação de corporações que procuram estabelecer um império econômico-financeiro instrumentalizado pela informática e suas ramificações digitais, com especialização no ramo empresarial. Embora a Internet seja um meio que oferece um considerável grau de liberdade de expressão pública da população, em contraposição, também proporciona uma dependência funcional de controle da vontade popular, quando influência o processo de tomada de decisão dos usuários relativo ao consumismo, pela propaganda apelativa fortemente elaborada e a indução desenfreada do uso de cartão de crédito.

Paulo César disse...

É lógico que a informação digital “informal” passou a fazer de um mercado paralelo que também produz hardwares e softwares piratas, falsificados por um sistema de produção barata, e assim possibilita um ganho de capital que concorre ilegalmente com a produção especializada patenteada e protegida com os direitos autorais. Qualquer usuário da internet sabe acessar nos sites os inúmeros conteúdos de downloads disponíveis gratuitamente. Porém, nem todos os links encontrados no Google, Yahoo, Uol e outros sites referem-se a conteúdo legal, mas sua grande maioria é composta de downloads ilegais. No Brasil, disponibilizar conteúdo ilegal é crime previsto na lei nº 109/91 que versa sobre a Criminalidade Informática, e que deixa claro que a distribuição de conteúdo protegido por direito autoral sem a autorização de seus respectivos proprietários acarreta em crime, punido com multa variável e até pena de três anos de reclusão. Porém, mesmo sendo crime, pessoas físicas disponibilizam conteúdo ilegal na internet sem almejar qualquer lucro financeiro, mas agem pela simples vontade de disponibilizar, sem qualquer restrição de ordem física ou jurídica.

São muitos os sistemas de fornecimento de download que funcionam com compartilhamentos de software, permitindo que arquivos sejam disponibilizados para download sem que o arquivo esteja necessariamente de algum servidor na internet. Basta apenas que o arquivo esteja na pasta criada pelo software no computador do usuário na hora da instalação. Deste modo, downloads de todos os tipos, sejam ilegais ou não, ficaram muito mais fáceis de serem disponibilizados. Além dessa tecnologia, há também as pessoas que hospedam os downloads ilegais em servidores que disponibilizam a possibilidade de baixar os arquivos por HTML, que exige menos conhecimento do usuário que vai baixar os arquivos, facilitando ainda mais a disponibilização de tais arquivos. Todos esses servidores não foram criados pelos seus idealizadores para esse propósito, mas são usados para esse meio por muitos usuários sem nenhuma restrição de suas respectivas empresas.

Mas nem todo download de software na internet é ilegal. Existem também os softwares que são disponibilizados gratuitamente na internet pelos proprietários criadores do software. Esses softwares são denominados Freeware e Shareware. Os Freewares como o próprio nome sugere, são softwares gratuitos sem qualquer tipo de restrição legal de distribuição e uso. Esses softwares são em sua maioria criados por usuários mais avançados ou por pequenas empresas que desejam divulgar seu trabalho. Geralmente esses softwares não têm a mesma qualidade de softwares pagos, pois seu processo de criação exige baixo capital.

Os sharewares também são gratuitos, porém com um diferencial, apenas uma parte do software é disponibilizado gratuitamente, para que o usuário possa analisá-lo e decidir comprar futuramente até o prazo de indisposição automática do programa. Geralmente esses softwares são disponibilizados com boa parte do conteúdo inacessível e com um prazo de validade de uso limitado.

Porém, existem alguns tipos de software arcaicos que são arquivos que foram abandonados pelos seus respectivos distribuidores. Seus criadores não desejam mais usá-lo comercialmente, por isso ninguém reclama seus direitos autorais e seu download é permitido. Geralmente esses softwares são muito antigos, tão antigos que não são mais produzidos na indústria de informática competitiva.

Paulo César disse...

O controle legal brasileiro ainda é muito falho, por isso segundo a lei nacional, baixar arquivos não é crime. A lei nº 109/91, citada acima, não pune o usuário que baixa os arquivos, apenas o que distribui, desse modo, pelo posicionamento da justiça, baixar arquivos protegidos por direito autoral não é crime. Cabe à consciência do usuário decidir se é honesto ou não.

Vale considerar que da mesma forma que os downloads piratas, os servidores privados também são uma forma de pirataria. Os softwares não têm direitos autorais apenas para impedir que o usuário os baixe, mas para fazer com que a empresa que os criaram continue a fornecer suas respectivas atualizações, arcar com os gastos na criação, produção e distribuição aos fornecedores de mercado, pois sem capital essa tarefa se torna inviável. Por isso, o usuário deve pensar bem antes de baixar softwares protegidos por direitos autorais, pois a lei não condena quem baixa, mas a consciência de cada um pode muito bem fazer isso.