quinta-feira, 14 de março de 2013

Outros Chávez virão!

Editorial do jornal Brasil de Fato:

Guiorgui Plekhanov (1856-1918) nos deixou a obra clássica O Papel do Indivíduo na História, onde enfrenta um dilema fundamental. Se para a concepção materialista da história “o modo de produção da vida material condiciona o processo da vida social, política e espiritual”, se não é a consciência do homem que determina o seu ser, mas pelo contrário, o seu ser social é que determina a sua consciência, qual é, então, o papel do indivíduo na história?
Em seu esforço de responder esta questão há uma passagem em que afirma que “o grande homem é grande não porque suas particularidades individuais imprimam uma fisionomia individual aos acontecimentos históricos, mas porque é dotado de particularidades que o tornam o indivíduo mais capaz de servir às grandes necessidades sociais de sua época. É precisamente um iniciador, porque vê mais longe que os outros e deseja mais fortemente que os outros”.

A década de 1990 inaugurou um período extremamente difícil para a classe trabalhadora em todo o mundo. As consequências do fim da União Soviética e das demais experiências de transição socialista no abalo do imaginário da transformação social somente são comparáveis com os impactos que a própria Revolução Russa causou no sentido de colocar a revolução como uma possibilidade concreta para milhões em todo o mundo. Anos difíceis em que o nosso continente assiste a escalada de governos que seguem a mesma receita: privatizações, reduções de direitos, perda de soberania. É neste contexto em que emerge o papel deste indivíduo na história. Hugo Chávez Frias.

O ano de 1989 produziu o chamado “Caracazo”, uma surpreendente explosão social espontânea contra o pacote de medidas neoliberais do presidente Carlos Andrés Perez. A rebelião, sufocada pela falta de organização, funciona como um catalisador que acelera os planos do clandestino Movimento Bolivariano Revolucionário. Quando a ofensiva neoliberal mostrava toda a sua força em nosso continente no ano de 1992, o tenente coronel Hugo Chávez dirige um levante que coloca a questão da conquista do poder. Cercados e sem o respaldo popular que esperavam, Chávez propõe utilizar uma cadeia de TV e rádio para desmobilizar os que haviam aderido em regiões do interior. E nestes famosos um minuto e cinquenta e oitos segundos, assumindo a responsabilidade da ação e explicando ao povo seus motivos se converterá numa forte esperança do imaginário coletivo, transformando uma derrota militar num exemplo pedagógico.

E mais uma vez, a unidade, as massas e as armas são os ingredientes que se combinam para o avanço de um processo revolucionário. Desde a primeira vitória em 1999, ganhou 15 dos 16 embates eleitorais ocorridos na Venezuela. As sucessivas vitórias eleitorais e o enfrentamento do golpe em 2002 possibilitam o avanço de mudanças estruturais e a retomada de um horizonte socialista, confirmando, no século 21, o ensinamento de que em nosso continente não se pode atingir o socialismo senão pela via da revolução democrática anti-imperialista, mas tampouco se pode consumar a revolução democrática anti-imperialista sem atingir o socialismo.

Os resultados são impressionantes e calam até mesmo os setores mais reacionários. A taxa de mortalidade infantil passou de 19,1 a cada mil, em 1999, para 10 a cada mil em 2012, ou seja, uma redução de 49%. Enquanto a expectativa de vida passou de 72,2 anos em 1999 para 74,3 anos em 2011.

Em sua genialidade de dirigente político, sempre ligado ao povo, Chávez demonstrou compreender que a identidade é a energia estruturante fundamental de uma construção humana ao resgatar e assumir que o projeto popular que apresentou é a continuidade do libertador Simón Bolívar. Seguindo a inspiração de Bolívar, Hugo Chávez apresentou a Venezuela à América Latina. Liderou a vitoriosa luta contra a Alca, não por ser contra a integração, mas por ser contra a servidão. E com essa rebeldia, propôs uma Alternativa Bolivariana para as Américas. Não descansou enquanto nosso povo e suas lideranças progressistas oriundas da luta antineoliberal como ele se unissem, seja através da Unasul ou da Celac, fortalecendo o imenso sentimento de unidade dos povos que sua liderança irradiou a cada ponto de nosso hemisfério.

Consciente do papel pedagógico de um dirigente revolucionário, em cada oportunidade ou aparição pública sabia aproveitar o momento para identificar os problemas, pautar os desafios e propagar ideias. Sempre como um incansável organizador, investindo energias na formação política da juventude, nas organizações populares e na construção do Partido Socialista Unifi cado da Venezuela (Psuv). Sabia, claramente, a importância da construção de organizações coletivas. E dedicou-se à tarefa da organização popular.

Exatamente por tudo isso, a Revolução Bolivariana prosseguirá apesar de sua morte, para a frustração de seus inimigos.

Seu exemplo e coerência seguirão animando os lutadores populares em todo o mundo e incomodando os nossos inimigos. Porque uma coisa é certa: da mesma forma que os rios, por mais tortuosos que sejam seus caminhos, correm sempre para uma determinada direção, os povos, por mais peculiar que seja o trajeto de seu desenvolvimento histórico, não se afastam de seu curso. E para o desespero dos privilegiados que se animam com a morte de Hugo Chávez, saibam que outros Chávez virão. E serão milhões.

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