sexta-feira, 24 de outubro de 2014

"PT Malvado" contra o "Pobre Tucano"

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Por Ricardo Kotscho, no blog Balaio do Kotscho:

Em busca de uma razão para explicar a nova onda vermelha de Dilma e o derretimento de Aécio, na antevéspera da eleição presidencial, a velha imprensa familiar criou uma narrativa comum que, de tão fantástica, lembra a literatura de cordel: "A Peleja do PT Malvado contra o Pobre Tucano".

Dava até pena de ver experimentados profissionais se contorcendo nas cadeiras dos telejornais noturnos, visivelmente contrariados, diante das novas pesquisas divulgadas no final da tarde desta quinta-feira, que apontavam a reeleição de Dilma no domingo, por uma diferença entre 6 e 8 pontos dos votos válidos.

O chororô do pensamento único vinha acontecendo já há alguns dias, desde que o Datafolha e o Vox Populi mostraram Dilma na frente de Aécio, no início da semana, pela primeira vez no segundo turno, e foi chegando próximo à histeria, diante da confirmação da inversão das curvas nas novas pesquisas, abrindo a boca do jacaré.

Tudo era culpa do "PT Malvado": baixo nível, jogo sujo, má fé, mentiras, leviandades, agressividade, terrorismo, desconstrução. Ou seja, acusa-se o adversário pelas dificuldades enfrentadas por Aécio na reta final da campanha, depois de entrar com a bola toda no segundo turno.

Se procurassem as razões da derrocada na própria campanha tucana, os "istas" e "ólogos" de plantão poderiam descobrir que as entrevistas desastradas de Fernando Henrique Cardoso sobre os eleitores do PT e de Arminio Fraga sobre bancos públicos foram mais danosas para Aécio do que todas as propagandas negativas do PT focadas no nepotismo e no patrimonialismo, tão coisas nossas.

Em política, como sabemos, o papel de vítima indefesa diante do adversário malvado não funciona. O coitadismo nunca deu certo, o povo não aceita. Lula e o PT só passaram a ganhar eleições quando perceberam isso.

Por acreditar demais na mídia amiga, Aécio parece ter levado um susto ao ver a ave de bico grande indo para o brejo, quando já posava de presidente eleito, e não se conformava de ter sido chamado de "filhinho de papai" pelo ex-presidente Lula: "Ver um ex-presidente sendo protagonista dessa campanha sórdida, e a meu ver criminosa, é lamentável", queixou-se.

Após visita a d. Orani Tempesta, arcebispo do Rio de Janeiro, Aécio ainda pediu aos seus eleitores que saiam no sábado vestidos com as cores da bandeira brasileira, sem se dar conta de que o mesmo apelo já tinha sido feito por Fernando Collor, pouco antes de ser afastado da Presidência da República, em 1992, acusado de corrupção.

"Nos aguardem. Domingo falarei com vocês como presidente eleito", anunciou o candidato tucano, após incorporar um Collor básico, que não combina com ele. Algum assessor deveria lembra-lo que naquele episódio, em vez de verde-amarelo, o povo se vestiu foi de preto para protestar contra o então presidente.

Desta vez, a cor predominante nestas últimas horas de campanha eleitoral, fora de São Paulo, claro, é o vermelho. Por aqui também já bateu o desespero nos tucanos pouco antes da divulgação das pesquisas, como relata Nilson Hernandes, de O Globo, sobre o confronto entre tucanos e petistas diante do Teatro Municipal, no centro da cidade, envolvendo 500 apoiadores de Aécio:

"Ao se depararem com cerca de 50 petistas que faziam campanha para a presidente Dilma Rousseff, com bandeiras e distribuição de material de campanha, um dos cabos eleitorais de Aécio atirou uma bandeira em direção a um correligionário de Dilma. O militante petista, então, revidou contra o ônibus no qual os apoiadores do PSDB estavam embarcados. Nesse momento, cerca de dez militantes tucanos desceram e começaram a dar socos e pontapés contra os petistas, que também desferiram agressões contra os adversários".

Era previsível e até estava demorando: todo o clima de ódio e agressões do Fla-Flu eleitoral alimentado por pitbulls nas redes sociais e também por blogueiros da grande imprensa acabou chegando às ruas, em cenas que lembraram os recentes confrontos entre torcidas organizadas do futebol.

Uma nota pitoresca em meio à batalha final entre tucanos e petistas foi registrada pela revista britânica "The Economist", que apoia abertamente Aécio Neves, em despacho do seu correspondente Jan Piotrowski, sobre a manifestação tucana da véspera, que reuniu 10 mil pessoas no largo da Batata, em São Paulo.

Encantado com o que viu, o jornalista chamou o ato pró-Aécio de "Revolução da Cashmere", uma referência à lã macia usada em roupas caras. "Foi um espetáculo talvez sem precedentes na história das eleições e não apenas do Brasil. Vestidos com camisas com iniciais bordadas e bem passadas empunhavam bandeiras de Aécio. Socialites bem vestidas protegidas por pashminas para se proteger do frio fora de época entoavam frases anti-PT. As únicas coisas que faltaram foram taças de champanhe e o próprio sr. Neves, que fazia campanha em Minas", escreveu o correspondente.

Agora, meus caros leitores, como diria o professor Heródoto Barbeiro em bom latim, "alia jacta est". A sorte já está lançada, o jogo está jogado. Só faltam dois programas de televisão, na hora do almoço e à noite, e depois o debate na TV Globo. A campanha está acabando. Faltam menos de 48 horas para a abertura das urnas.

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