sexta-feira, 26 de junho de 2015

O PT ainda vive? Talvez sim!

Por Miguel do Rosário, no blog O Cafezinho:

A Resolução Política do Partido dos Trabalhadores, divulgada ontem, mostra que a legenda ainda possui um esqueleto resistente e uma coluna vertebral intacta.

E que, sobretudo, ainda vive!

Agora só falta o PT assumir de fato o governo e convencer a presidenta de que ela também pertence a este partido…

*****

O desgaste de governar o Brasil, as conspirações judiciais, os ataques diuturnos da mídia, os erros políticos, as inúmeras traições internas, quase desossaram o partido, quase o tornaram um bicho invertebrado, uma legenda amorfa.

O PT por pouco não se converte num modelo de covardia e esvaziamento ideológico, que é a forma que assumem os partidos quando morrem.

Felizmente, a política é movida por forças dialéticas poderosas, quase orgânicas, que fogem à compreensão e ao controle dos próprios atores sociais.

O PT, em sua fase mais difícil, em seu momento mais perigoso, quando a história lhe oferece uma encruzilhada mortal, escolheu a direção mais corajosa: enfrentar de frente, cabeça erguida, o arbítrio.

Diante de toda postura de intrepidez, eu sempre me lembro da máxima de um de meus escritores preferidos, o nova iorquino Henry Miller: “nenhuma ousadia é fatal !”.

É interessante esse momento: um partido de governo de repente se vê mergulhado numa atmosfera psicológica de quase clandestinidade.

Coisas típicas do Brasil: único país do mundo onde a polícia política opera contra o próprio governo; onde a censura se dá também contra o governo; e onde o partido no poder é tratado como agremiação clandestina.

Vivemos uma guerra política diuturna, sem tréguas, uma guerra que usa as armas mais sofisticadas da semiótica, da propaganda, da tecnologia da informação, da psicologia de massas, e que impõe ao campo sob ataque uma severíssima e dolorosa rotina de exercícios.

Diante desta conjuntura paradoxal, entre ser simultaneamente governo e resistência, se desdobra uma dessas lindíssimas ironias.

Ao contrário do que esperava a mídia, o PT e sua militância aos poucos tem desenvolvido técnicas de resistência e combate que poucos partidos no mundo tiveram oportunidade de produzir.

Então voltamos à máxima de Heraclito, um dos mais brilhantes e enigmáticos pensadores da antiguidade: a guerra tudo cria, e de uns faz escravos, de outros, homens livres.

A resolução do PT mostra que a legenda escolheu seu caminho: a guerra e a liberdade.

Quer ser um partido de homens – e mulheres – livres.

Essa escolha, a meu ver, é o caminho inexorável da vitória, porque, em se tratando de uma guerra política e psicológica, a vitória se dá antes das batalhas.

É uma vitória interna.

Uma vitória sobre si mesmo.

Uma vitória que se respira.

Uma vitória de quem ama o povo brasileiro, e que, por isso mesmo, não pretende explorar seus vícios, como faz a mídia, ao atiçar seus instintos mais baixos, seus rancores, seus ressentimentos, tentando sempre levar a política não para o campo do debate de ideias, mas para a arena dos tribunais, onde prevalece o autoritarismo.

No campo das ideias, ao contrário, os truculentos, os autoritários, soçobram diante da tríade criatividade, sensibilidade, inteligência.

Foi apenas por isso, e exclusivamente por isso, que Aécio Neves perdeu as eleições em 2014.

Durante as eleições, ficou bem claro quem representava a violência política, o autoritarismo, a truculência midiática e judicial.

A mesma coisa vale para hoje.

Quem são as forças que crescem na esteira do avanço do autoritarismo, do conservadorismo, de todos os sentimentos de violência e egoísmo social?

O PT, malgrado todos seus infinitos erros, e até mesmo por causa desses erros, é o único contraponto à judicialização da política, que é um disfarce mal ajambrado da ditadura.

A aceleração dos processos históricos, um fenômeno que ocorre desde a primeira revolução industrial, nos permite, cada vez mais, observar e compreender algumas mudanças que, em outras épocas, demandariam décadas, ou mesmo séculos, para serem devidamente observadas e compreendidas.

Hoje podemos ver a história, esta moça maliciosa, bipolar, que oscila entre o mais puro sadismo à generosidade mais comovente, dançando, rindo e chorando diante de nossos olhos.

Testemunhamos o PT, uma legenda que brotou do chão, do nada histórico, no momento mais crítico da esquerda mundial, quando os regimes socialistas europeus se esboroavam em ruínas envergonhadas, transformar-se em poucos anos no maior partido de massas da esquerda latino-americana, talvez de todo o mundo democrático.

Vimos o PT conquistar, num país com 200 milhões de pessoas, quatro grandes vitórias presidenciais consecutivas, sempre tendo contra si as mais poderosas e mais concentradas forças midiáticas do mundo.

Depois vimos o PT envelhecer rapidamente, desgastar-se junto a população, perder sua juventude, seu entusiasmo, seu tesão pela necessária luta em prol de uma sociedade mais justa.

Vimos suas lideranças serem condenadas, várias delas injustamente, em processos que se constituíram em sofisticadas conspirações midiático-judiciais, conspirações extremamente bem sucedidas no campo da guerra simbólica, com suas técnicas goebelianas de psicologia de massas.

Vimos os estragos terríveis provocados no PT, que de repente parecia uma cidade semidestruída, um amontoado de escombros e corpos mutilados.

Pior de tudo: vimos o PT enfiar-se no buraco de sua própria covardia, abandonando o povo às influências nefastas de uma mídia reacionária, maligna, antinacional.

Entretanto, num ambiente democrático, é muito difícil matar um partido de massas.

Aliás, não foi para isso que lutamos tanto pela democracia? Para imortalizarmos as ideias de independência, rebeldia, liberdade e soberania?

Essa é a razão do ódio irracional, a razão pela qual crescem as demonstrações de irritação contra a democracia e em favor de uma intervenção militar, o motivo da ascensão deste neofascismo tupiniquim: porque eles sabem que, enquanto formos uma democracia, as nossas ideias não podem morrer.

Ao contrário.

É a dialética da natureza: o que não nos mata, nos torna mais fortes.

Os ataques que tanto destróem produzem experiências, impõem posturas combativas, criam rotinas e técnicas de resistência, que não existiriam não fosse o próprio fato da guerra.

Como blogueiro, eu tenho a oportunidade e, arrisco dizer, até mesmo o privilégio, de viver intensamente todas essas experiências de luta política.

Philip Dick, o grande escritor de ficção científica, numa entrevista concedida em 1974, fez uma declaração que, a meu ver, resume o espírito com que criei este blog:

“Como fazer um livro de resistência, um livro de verdade em meio a um império de falsidades, um livro de retidão perante um império de odiosas mentiras?

Como alguém poderia fazer isso, abertamente, diante do inimigo?

Como alguém poderia fazer isso num futuro de tecnologias avançadas?

É possível para liberdade e a independência surgirem sob novas formas, sob novas condições históricas? Quer dizer, as novas tiranias conseguirão abolir esses protestos? Ou haverá novas respostas e novas reações do espírito humano que não podemos prever?”

É com esse espírito de resistência que saúdo a resolução política do PT.

Os gladiadores romanos, antes de iniciarem as batalhas das quais apenas alguns sobreviveriam, saudavam o imperador:

– Ave César, os que vão morrer te saúdam!

Diante da demonstração de coragem do PT, eu diria o contrário:

– Ave César, os que vão viver te saúdam!

***

Resolução Política do PT

Reunida em São Paulo no dia 25 de junho de 2015, a Comissão Executiva Nacional do PT analisou a conjuntura recente do País e aprovou a seguinte resolução política:

1. Prossegue a ofensiva conservadora da oposição, da mídia monopolizada e de agentes públicos, com o nítido objetivo de enfraquecer o governo Dilma, criminalizar o PT e atingir a popularidade do ex-presidente Lula.

2. Tão grave quanto as tentativas de reduzir a maioridade penal, de realizar uma contra-reforma do sistema político-eleitoral e de comprometer o sentido progressista do Plano Nacional de Educação, é a ação ilegal, antidemocrática e seletiva de setores do Judiciário, do Ministério Público e da Polícia Federal no âmbito da Operação Lava-Jato.

3. O PT, que sempre esteve na linha de frente do combate à corrupção, é favorável à apuração de qualquer crime envolvendo apropriação privada de recursos públicos e eventuais malfeitos em governos, empresas públicas ou privadas, bem como a punição de corruptos e corruptores.

4. Mas o PT não admite que isso seja realizado, como agora, fora dos marcos do Estado Democrático de Direito. Se o princípio de presunção de inocência é violado, se o espetáculo jurídico-político-midiático se sobrepõe à necessária produção de provas para inculpar previamente réus e indiciados; se as prisões preventivas sem fundamento se prolongam para constranger psicologicamente e induzir denúncias, tudo isso que se passa às vistas da cidadania, não é a corrupção que está sendo extirpada. É um estado de exceção sendo gestado em afronta à Constituição e à democracia.

5. Neste sentido, o PT repele a negativa da revogação de prisão preventiva do companheiro João Vaccari Neto, a despeito da defesa haver respondido, com farta documentação, a alegação que fundamentava o decreto da detenção desnecessária e ilegal.

6. Preocupa ao PT as consequências para a economia nacional do prejulgamento de empresas acusadas no âmbito da Operação Lava-Jato. É preciso apressar os acordos de leniência, que permitam a recuperação de recursos eventualmente desviados, e que não se paralisem obras ou se suspendam investimentos previstos, a fim de impedir a quebra de empresas e a continuidade das demissões daí resultantes.

7. O PT denuncia, cabalmente, projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional destinados a retirar da Petrobrás a condição de operadora única do pré-sal. Ao tempo em que a empresa se recupera, ostenta recordes de produção e revaloriza suas ações, interesses antinacionais planejam, em seguida, atacar a política de conteúdo nacional e o regime de partilha, abrindo campo para a privatização da Petrobras e para o ingresso em massa no Brasil das transnacionais do petróleo.

8. A Comissão Executiva Nacional reafirma sua reprovação à manobra antidemocrática perpetrada por excursionistas brasileiros na Venezuela, frustrada na tentativa de acuar o governo do Presidente Nicolas Maduro e de implicar a diplomacia brasileira, sempre obediente aos princípios da autodeterminação, não intervenção e defesa da paz e da resolução de conflitos através do diálogo e da negociação.

9. Do mesmo modo, é inadmissível a disputa política no interior do Tribunal de Contas da União para colocar sob suspeição as contas de 2014 do governo da presidenta Dilma Rousseff.

10. A Comissão Executiva Nacional saúda as iniciativas recentes do governo para retomar o crescimento da economia. O Plano de Investimento em Logística, os Planos Safra do Agronegócio e da Agricultura Familiar, o Plano Nacional de Exportação, a MP do fator previdenciário, que precisa ser ajustada no debate da Comissão quadripartite criada por decreto presidencial – todas essas ações indicam uma retomada positiva do nosso projeto nacional de desenvolvimento.

11. Para que se dê efetividade à continuação deste processo pelo governo e pelo PT, são necessárias medidas urgentes de reorientação, já apontadas inclusive na Carta de Salvador, aprovada no 5º. Congresso Nacional do PT.

12. Avultam entre estas providências, a serem debatidas com a sociedade e o Congresso Nacional, a redução da meta do superávit fiscal, a imediata reversão da elevação da taxa de juros praticada pelo Banco Central e a taxação das grandes heranças, das grandes fortunas e dos excessivos ganhos financeiros.

13. Igualmente urgente é a aceleração de negociação com as centrais sindicais para o lançamento de um Plano de Proteção ao Emprego, que inclua acordos com o setor privado acerca da manutenção de trabalhadores nas empresas.

14. Mais que nunca, é preciso deixar claro para a sociedade, sobretudo para os trabalhadores, os movimentos sociais organizados e os milhares de micros, pequenos e médios empreendedores, que nosso compromisso é priorizar a retomada do crescimento econômico de forma sustentável, com distribuição de renda, geração de empregos e com a inflação controlada.

15. A Comissão Executiva Nacional aprova a criação de 5 grupos de trabalho com o objetivo de mobilizar nacionalmente o PT, fazer a defesa do nosso partido e do nosso governo, bem como nos prepararmos, com disputa política e ideológica, para as eleições municipais de 2016.

16. Por fim, reiteramos nossa disposição de apoiar a participação em todas as iniciativas voltadas para a constituição de uma ampla frente democrática e popular em defesa da democracia, da questão nacional, das reformas estruturais e dos direitos dos trabalhadores.

São Paulo, 25 de junho de 2015
Comissão Executiva Nacional do Partido dos Trabalhadores

0 comentários: