quarta-feira, 2 de março de 2016

A mansão de Paraty e o genro dos Marinho


Por Luiz Carlos Azenha, no blog Viomundo:

Na página 15 do registro de número 1030822 da Junta Comercial do Estado de Minas Gerais, de 25.10.2010, o empresário Alexandre Chiappetta de Azevedo se declara testemunha da formação de um consórcio.

Alexandre era genro de João Roberto Marinho, vice-presidente do Grupo Globo, casado com uma das netas de Roberto Marinho, Paula.

O consórcio formado em Minas Gerais uniu duas empresas.

De um lado, a Agropecuária Veine Patrimonial. Está em nome dela a Paraty House, a mansão de concreto construída de forma irregular na praia pública de Santa Rita, no litoral do Rio de Janeiro.

Foi a engenheira florestal Graziela Moraes Barros, do Instituto Chico Mendes, que ligou o triplex de Paraty à família Marinho, em entrevista que deu à Bloomberg, publicada em 8 de março de 2012: Ricos brasileiros não têm vergonha de construir em área de preservação ambiental.

Em notificação a blogs através de sua advogada, João Roberto Marinho informou que “a notícia é inverídica”, pois a casa e as empresas ligadas a ela “não pertencem, direta ou indiretamente, ao notificante ou a qualquer um dos demais integrantes da família Marinho”.

Voltando ao consórcio: do outro lado do contrato registrado na JUCEMG estava a Santa Amália Administração e Participações Ltda.

Ela tem como endereço a rua Margarida Assis Fonseca, 171, na capital mineira. O Viomundo esteve lá. É a sede da Brasif, que já operou free shops em aeroportos brasileiros e hoje aluga máquinas pesadas. Pertence ao pecuarista e empresário Jonas Barcellos.

A Brasif, de Jonas, admitiu recentemente ter contratado a jornalista Mirian Dutra, ex-amante de Fernando Henrique Cardoso, para prestar serviços no Exterior. Mirian, repórter da TV Globo, exilou-se quando, grávida, ouviu do então senador FHC que poderia ter o filho de qualquer um, menos dele, que era casado com a antropóloga Ruth Cardoso e pretendia chegar ao Planalto, como chegou.

O caso será investigado pela Polícia Federal, já que FHC ainda ocupava o Palácio do Planalto quando o contrato foi assinado e a Brasif era à época concessionária do governo federal.

O objetivo do consórcio Brasif-Santa Amália-Veine, estabelecido em 2010, foi trazer para o Brasil um helicóptero.

“As partes pretendem conjugar esforços para realizar uma operação de arrendamento operacional de um helicóptero Agusta A109E Power, com número de série 11764, com importação da Aeronave para o Brasil pelo regime de admissão temporária para utilização da mesma pelas Consorciadas e seus executivos”.

A mansão de Paraty tem heliporto. Um vôo entre a Lagoa Rodrigo de Freitas - de onde decolam, inclusive, os helicópteros da Globo - ou o aeroporto de Jacarepaguá e a Paraty House dura menos de duas horas.

O contrato que formou o consórcio teria duração de 5 anos.

A participação da Veine era de 70%. Por isso, a empresa tinha prioridade no uso do helicóptero, que ficou baseado no Rio de Janeiro.

“Todas as notificações e comunicações feitas de acordo com este Contrato de Consórcio devem ser feitas por escrito”, diz o contrato na página 14.

O endereço de entrega da correspondência da Agropecuária Veine, a dona da mansão de Paraty, aparece como: Avenida Borges de Medeiros, 1424, na Lagoa Rodrigo de Freitas.

No documento, Lúcia Cortes Pinto aparece como a sócia da Veine que nomeia uma procuradora.

Lúcia é uma das sócias originais da empresa. Ela teria entrado com 10% das ações. Os outros 90% eram da Blainville, empresa panamenha que tinha como procurador o contador Jorge Lamenza.

Lúcia mora no Grajaú, um bairro de classe média do Rio. Ela desligou o telefone quando consultada se foi mesmo sócia da Veine.

O endereço de correspondência


O endereço de correspondência da Agropecuária Veine no Rio que aparece no documento de formação do consórcio - avenida Borges de Medeiros, 1424 - é onde funciona a empresa do genro de João Roberto Marinho, que os cariocas conhecem como Lagoon.

É um controverso empreendimento que montou cinemas, restaurantes e estacionamento no estádio de remo da Lagoa Rodrigo de Freitas.

A Lagoa é um dos endereços mais valorizados do Rio.

No dia 22 de setembro de 1997, o governador e o prefeito do Rio, Marcello Alencar e Luiz Paulo Conde, concederam ao genro de João Roberto Marinho, sem licitação, o uso do estádio de remo para fins comerciais.

Era para ter sido a “título precário”, conforme está escrito no contrato inicial (leia abaixo). Em 2017, o acordo “precário” completará duas décadas.



O contrato foi renovado por outros governantes, sempre sem concorrência pública. Em 15 de junho de 1998 foi celebrado o primeiro aditivo.

Pelo governo do Estado assinou Anthony Garotinho. Pela empresa permissionária, Alexandre.

Como fiadora, assinou Paula Marinho de Azevedo, a filha de João Roberto Marinho.

Naquele primeiro aditivo foi mantida a mesma cláusula de compensação financeira: pagamento mensal de 10% do valor faturado ou, no mínimo, 25 mil reais.

Porém, segundo ação movida pelo Ministério Público Estadual, entre 1997 e 2003 a empresa nunca recolheu o aluguel, tendo dívida calculada então em mais de R$ 3 milhões!



Como era e como ficou: arquitetos protestaram contra o fim dos pilotis

O remo é um esporte muito tradicional no Rio. Tombado pelo patrimônio histórico, o estádio é um ícone para os praticantes.

Muitos deles passaram a reclamar que a empresa permissionária se voltou para atividades comerciais desligadas do objetivo de incentivar o esporte.

Em dezembro de 2006, em preparação para os Jogos Panamericanos de 2007, a arquibancada do estádio de remo foi demolida.

Um oficial de Justiça levou uma ordem judicial que deveria ter paralisado a implosão, por conta de tratar-se de prédio tombado. Mas os engenheiros foram orientados a prosseguir.

O Estado alegou que a ordem deveria ter dado entrada na Procuradoria.

Novas arquibancadas foram erguidas com dinheiro público. Com um detalhe: foram feitas já com a capacidade de abrigar as salas de cinema que hoje funcionam no empreendimento do genro de João Roberto Marinho.

Praticantes do remo ficaram inconformados com as mudanças feitas. Um dos mais ativos é Zezé Barros, neto do arquiteto que projetou o estádio de remo, Benedicto de Barros. Ambos foram remadores. Em um dos desabafos, ele escreveu:

“Hoje, o remo usa quase de favor uma área, sendo cada vez mais espremido. É inacreditável que isto está acontecendo nas nossas caras e não conseguimos impedir esta apropriação indébita. Isto é real e palpável. Não está sendo publicado em nenhum jornal, como se a comunidade do remo não se importasse, como se nem existisse mais. O que fazer?”.



A ação movida pelo MPE para extinguir o contrato foi julgada procedente em 9 de novembro de 2005 pelo juiz Eduardo Gusmão Alves de Brito Neto.

Mas a empresa do genro do dono da Globo recorreu.

Ao longo do tempo, o jornal O Globo, da família Marinho, ao tratar de temas relativos ao estádio, nunca mencionou que a empresa concessionária era de Alexandre, o marido de Paula, filha de João Roberto e neta de Roberto Marinho. Nunca denunciou a falta de licitação.

Pelo contrário.


No dia 24 de abril de 2006, um notinha escondida na página 14 tratou de uma manifestação contra as obras da Lagoon.

Terminou com a declaração de uma porta-voz da concessionária, que acusou os manifestantes de serem “ligados a uma outra empresa que não conseguiu emplacar seu projeto no estádio de remo”.

Os organizadores do protesto denunciaram a reprodução de uma declaração que disseram ser completamente mentirosa.

O Globo não mencionou que a porta-voz falava em nome da empresa de Alexandre, o genro de João Roberto Marinho, dono do jornal.

Em outubro de 2015, o empresário e a filha de João Roberto se divorciaram. Ela voltou a usar o nome de solteira: Paula Marinho.

Nossas tentativas de encontrar os responsáveis pela Vaine na sede da Lagoon até agora foram infrutíferas.

Abaixo, o helicóptero no aeroporto Roberto Marinho, em Jacarepaguá, no Rio e a assinatura da neta do magnata como fiadora de concessão obtida sem concorrência pública:

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