quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

Maus sinais para Temer na Câmara

Por Tereza Cruvinel, em seu blog:

Foi em fevereiro de 2005, com o racha na base governista e a eleição do obscuro Severino Cavalcanti, do PP, para a presidência da Câmara, que o PT foi “estraçalhado” pelo baixo clero, como se disse na época, e começou a perder o comando político do Congresso, num progressivo descarrilhamento que veio a dar no golpe de 2016. A sucessão de agora na presidência da Casa está ficando cada vez mais parecida com aquela de 12 anos atrás, que marcou também o início da derrocada ética, moral e funcional do Congresso. Lula, entretanto, tinha “gordura” para queimar. Com a popularidade alta e saldos econômicos e sociais positivos, conseguiu reeleger-se em 2006. Já Temer, se perder o controle sobre a Câmara, estará privado do único trunfo sobre o qual se sustenta seu governo impopular, desastroso na economia, vacilante no enfrentamento dos problemas nacionais e disposto a destruir os avanços sociais das últimas décadas.

A semelhança começa pela multiplicação de candidaturas do campo governista. Em 2005 o PT, sendo majoritário e tendo direito ao cargo, deu-se ao luxo de rachar. Contra a candidatura oficial de Luiz Eduardo Greenhalgh, houve o lançamento do dissidente Virgílio Guimarães. O baixo clero ressentido, hoje organizado no Centrão, insuflou a candidatura de Severino. E ainda havia a de Chico Alencar pelo PSOL e a de José Carlos Aleluia, do PFL, hoje Democratas. Foi longa a noite de rasteiras e traições. Foi a primeira grande derrota parlamentar do PT.

Agora, na base de Temer, surgiram três candidaturas. A do atual presidente Rodrigo Maia, do DEM, que o Planalto de fato prefere mas finge não apoiar, e duas do Centrão, a de Jovair Arantes, do PTB, e a de Rogerio Rosso, do PSD. Assim como Severino em 2005, estes dois têm pregado a independência da Câmara em relação ao Planalto e ao Judiciário, a valorização dos deputados do baixo clero, sempre preteridos em relatorias e presidências de comissões, em favor da elite colegiada, e uma agenda legislativa própria destinada a tirar do brejo a imagem da Casa. 

Não nos esqueçamos de que os dois tiveram papeis relevantes no golpe que premiou Temer com a cadeira de Dilma. Jovair foi relator e Rosso presidente da comissão do impeachment na Câmara. Esperavam mais benemerência do atual governo. Vão se juntar lá na frente, num provável segundo turno, como deixaram claro ontem no lançamento da candidatura de Jovair, que contou com a presença de Rosso. Ambos não escondem a bronca com a postura dissimulada de Temer, que promete equidistância mas deixa que auxiliares ajudem Maia.

A situação de agora, como a de 2005, realça a anormalidade regimental e a tibieza dos partidos, que não fazem prevalecer as regras da proporcionalidade. Nunca o PT poderia ter permitido que um azarão folclórico lhe tomasse o cargo de presidente da Câmara, que o regimento garante ao maior partido, o que recebeu o maior número de votos, logo, o que representa a maioria do eleitorado. Severino caiu em poucos meses, quando se descobriu que ganhava um “mensalinho” de um concessionário de restaurante da Câmara. 

Se este governo quisesse mesmo restaurar os cânones do bom funcionamento parlamentar, faria valer a regra da proporcionalidade, e ela garantiria a presidência ao PMDB, que tem a maior bancada. Mas não. O partido de Temer foi convencido a abdicar em favor dos aliados pois, afinal, a base é o pilar único do governo. Na eleição do substituto de Eduardo Cunha o governo favoreceu Rodrigo Maia, do Democratas, e até prometeu que agora seria a vez dos tucanos, mas isso também foi revisto em nome da base. O partido de Maia é o nono no ranking das bancadas. Em tempo de normalidade parlamentar e um mínimo de hierarquia partidária, jamais teria a presidência, mesmo para um mandato tampão. O PTB de Jovair tem apenas 17 deputados e contorna seu nanismo formando bloco com o PP e o PSC. Jamais também poderia pretender o cargo não fosse a anarquia partidária atual. O PSD de Rosso, idem. Tem a sexta maior bancada.

A propósito da hoje ultrajada regra da proporcionalidade na composição das Mesas do Congresso, cabe aqui um comentário sobre a posição atual do PT. Ciro Gomes diz que será uma traição o partido participar de composições com siglas governistas para a eleição de fevereiro. Como segunda maior bancada, o PT teria direito, teoricamente, à primeira vice-presidência da Casa, um cargo importante, que lhe daria protagonismo e condições de influir na agenda legislativa. Para estar na Mesa, de todo modo, terá que estar no jogo, terá que apoiar algum dos candidatos governistas. A alternativa é ficar fora da Mesa, como ficou no passado, quando era oposição, e como ficou quando Severino se elegeu. Não creio que um político vivido como Ciro considere esta alternativa inteligente, para um partido que acaba de sofrer sua maior derrota, precisa juntar seus cacos e não pode se dar ao luxo de uma postura contemplativa.

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