domingo, 9 de julho de 2017

A já esperada queda nas receitas da União

Por Paulo Kliass, no site Carta Maior:

O noticiário está completamente tomado pelos sucessivos escândalos de natureza política, envolvendo os personagens mais próximos da Presidência da República. Denúncias e delações trazem para o centro do noticiário “politicial” a evidência da corrupção como prática “naturalizada” na Esplanada. São malas de dinheiro e depósitos em contas ilegais no exterior de membros do grupo portador da redenção. Os denunciados são queles que passaram a ocupar os postos da Esplanada, com a incumbência de tirar o Brasil do mar de lama em que estaria envolto até poucos minutos antes da definição do golpeachment.

Apesar disso, os meios de comunicação ainda oferecem alguma ou outra notícia a respeito das tentativas desesperadas da equipe econômica. Os representantes autênticos do financismo insistem em dizer que também estão “animadíssimos” com a perspectiva da superação da crise. A exemplo do chefe Temer, os ministros tentam exibir um otimismo que não se sustenta em nenhum relatório estatístico oficial e muito menos em avaliações prospectivas de curto ou médio prazos a respeito do ritmo da atividade econômica. Mas a força dos fatos faz com que os jornais agora comecem a estampar as ameaças do núcleo do governo em aumentar os impostos.

Até pouco tempo atrás, a boia de salvação daqueles que promoveram a retirada ilegal de uma Presidenta eleita pela maioria da população resumia-se à nota promissória da aprovação das reformas trabalhista e da previdência. Constatada a incapacidade em oferecer o paraíso prometido ao empresariado e à classe média, os protagonistas do estupro constitucional tiveram de se resignar à evidência do engodo. Afinal, estava mais do que claro que não “bastava tirar a Dilma” para resolver os inúmeros problemas existentes no âmbito da economia. A promessa da suposta eficiência e competência do “dream team” do financismo não resistiu a alguns meses de banho de realidade.

Recessão e diminuição de receitas públicas
A verdadeira obstinação com que os representantes dos interesses do sistema financeiro brandiam as receitas do austericídio impedia a elaboração de um diagnóstico que fosse minimamente aderente à realidade dos fatos e à experiência internacional. Não que se esperasse deles uma retomada do projeto de distribuição de renda ou de inclusão social. Mas apenas e tão somente que sobrasse alguma pitada de racionalidade e realismo, caso a intenção fosse mesmo aquela tão alardeada pelos jornais - superar a recessão e buscar o caminho do crescimento.

O elemento mais dramático de todo esse processo talvez tenha sido o sentimento de enganação. Afinal, o discurso do establishment financeiro tupiniquim logrou unificar o conjunto dos setores das próprias classes dominantes em apoio a Temer e sua pinguela para o passado. Todos juntos em torno do projeto do parasitismo rentista. Um autêntico tiro no pé. O Brasil afunda a cada dia no fundo do poço e os custos sociais e econômicos para a retomada serão certamente ainda maiores do que o sofrimento vivenciado até o momento.

Ora, qualquer manual básico de macroeconomia nos ensina que o caminho para o equilíbrio fiscal passa pelo crescimento da economia como um todo. A política de aprofundar a recessão por meio do arrocho monetário e da contenção das despesas apenas nos afasta de uma desejada melhora nas contas públicas. Isso pelo simples fato de que o nível de arrecadação de tributos obtidos pelo Estado depende, essencialmente, da manutenção ou ampliação da atividade econômica. Se o Produto Interno Bruto (PIB) não cresce, não há meio de se obter aumento das receitas do governo. Como boa parte de suas despesas são obrigatórias, parece evidente que surgirão problemas para fechar a conta do orçamento público.

Capacidade de arrecadação em queda

E assim a realidade começa a incomodar os defensores dos cálculos de planilha. Os “modelitos” de arrocho conservador já não mais respondem aos anseios e desejos de seus proponentes. E mesmo os arautos da responsabilidade fiscal ensaiam algumas medidas que até pouco tempo atrás xingavam como sendo “pedaladas fiscais”. Apenas para ficar na meta oficial de resultado fiscal para 2017: Meirelles reluta em admitir que nem mesmo o déficit declarado de R$ 140 bilhões será atingido. Parece óbvio que tal resultado resultará em grave mancha na reputação de quem se intitulava guardião da competência e do equilíbrio.

O próprio Relatório Mensal da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) exibe as informações do desastre. Os dados obtidos para o mês de maio de 2017 mencionam o pior resultado para esse mês desde que a série foi iniciada em 1997. O governo central apresentou um déficit superior a R$ 29 bilhões no mês. Para fugir a um eventual casuísmo de análise de um período isolado de 30 dias, a mesma performance pode ser identificada na avaliação do acumulado dos 5 primeiros meses do ano. Assim, no somatório janeiro-maio o déficit foi de R$ 35 bi, também o maior já visto para igual período ao longo dos 21 anos da série.

E, ao contrário daquilo que vinha sendo repetido “ad nauseam” pelos papagaios do financismo dentro e fora do governo, o principal responsável por tal desempenho não é a tal propalada explosão das despesas. O elemento que tem causado tal desastre é a brutal queda na arrecadação. Fato esse, aliás, já identificado há muito tempo por aqueles que alertávamos a respeito das consequências trágicas advindas da opção pelo austericídio.

Meirelles ameaça elevar impostos

A divulgação do resultado de maio elevou o total arrecadado ao longo dos 5 primeiros meses de 2017 para R$ 563 bi. Esse total representou uma queda real de R$ 10 bi em relação ao obtido em igual período de 2016, quando as receitas foram de R$ 573 bi. Ou ainda uma queda maior face ao resultado de 2015, quando a União arrecadou R$ 610 entre janeiro e maio. Caso consideremos o último período antes do início da opção pela austeridade nua e crua, veremos que esse acumulado de receita arrecadada estava em R$ 632 em 2014. Ou seja, houve uma queda de 11% no volume de recursos que ingressaram nos cofres do governo federal.

Caso o enfoque se concentre na avaliação do desempenho de arrecadação ao longo de período equivalente a um ano a tendência é a mesma. Antes do início do austericídio, o resultado de maio de 2014 exibia um acumulado de 12 meses equivalente a R$ 1,55 trilhão de receita federal. Ao longo dos anos seguintes, a opção pela recessão provocou queda nesse volume a cada novo ano, até atingir o valor de R$ 1,35 tri no maio mais recente. Isso representa uma queda de 13% na capacidade arrecadatória ao longo de 3 anos.

Com a popularidade de Temer no rodapé da sala e o envolvimento de seus principais colaboradores com a polícia e o Ministério Público, a performance econômica não autoriza nenhum tipo de otimismo. No entanto, a debacle fiscal já era esperada de há muito tempo. O austericídio havia cortado a fonte de receitas lá atrás, pré anunciando a quem quisesse ouvir a chegada da etapa 2.0 da crise. Não por acaso a própria equipe que lá foi colocada com o apoio entusiasmado da turma do impostômetro, agora joga a toalha e fala em elevar tributos. Oh, santa heresia!

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