sexta-feira, 27 de outubro de 2017

A (r)evolução cultural do imperialismo

Por Anderson Bahia, no site da UJS:

Em algumas das conversas frutíferas que tive nos últimos meses, alguém falou que o desenvolvimento do capitalismo, tanto na elaboração política-ideológica-filosófica quanto no salto das forças produtivas, avança tão rápido que ele não sabe o que é projetado primeiro. Se as ideias ou o desenvolvimento. A base filosófica do marxismo indica que as ideias apreendem a posteriori os fenômenos que derivam da atividade econômica, indicando uma resposta à inquietação do amigo. Mas daí não podemos concluir que os processos socioculturais precisam ser secundarizados.

Como um sistema que passa por uma profunda crise vai se perpetuando? Como pode o capitalismo aprofundar cada vez mais as desigualdades e ainda assim se fortalecer e abrir novos ciclos históricos? Ou não é esse o sistema do 1% da população no mundial com renda equivalente aos demais? Que no Brasil faz apenas seis pessoas (dá para contar nos dedos) possuírem riqueza igual a de 100 milhões dos mais pobres, conforme apresenta relatório recente da Oxfam.

Se os processos econômicos sob o capitalismo criam desesperanças para a maioria das pessoas, não dá para atribuir apenas a economia a resposta para um conjunto de outros fatores, como pretendem alguns que reduzem tudo a essa esfera. Diariamente a classe trabalhadora é bombardeada com um conjunto de informações, conceitos e juízos de valores fabricados sob os princípios do liberalismo devidamente empacotados sob o rótulo de “natural”, “normal”, “a vida sempre foi assim” e outros termos para diminuir a capacidade crítica de quem “consome” tais ideias.

Paralelamente aos processos produtivos, há uma indústria montada para disputar consciências. Ela por si só movimenta um mercado gigantesco, com ramos diversos e muito bem consolidado.

Interessante notar que a chamada indústria cultural acompanha os métodos da indústria “pesada”. No ambiente de convergência tecnológica, por exemplo, as empresas que dominam seus ramos de atuação passaram da formação de monopólios para a de oligopólios. Nas TV´s, cada vez mais se acompanha programas cujos formatos são exportados. “The Voice”, “Master Chef” e “Big Brother” surgiram em países diferentes e hoje são transmitidos em vários outros. Na alimentação, nem se fala. O MacDonald´s dispensa apresentações. Na música e no cinema, idem. Num cenário da livre circulação de capitais, os bens culturais passaram a circular livremente também, devidamente assegurada pela onda de desregulamentações na égide neoliberal.

Mais do que produtos, são vendidas ideias, emoções e conceitos que criam uma subjetividade neoliberal e vendem ao mundo os modos de vida sobretudo do Tio Sam . O marketing cumpre papel destacado nisso à ponto de alguns afirmarem que o capitalismo anda “desconstruidão”, pelo fato de terem passado a valorizar a diversidade étnica e de gênero na venda dos seus produtos, giro mais recente do liberalismo. Tal enfoque, contudo, limita-se a representatividade e ignora a noção de direitos. Num país que passa por uma onda de reformas que solapam as garantias constitucionais, a questão democrática vai ficando alojada nas representações diversas promovidas pelo mercado ao invés da geração de serviços e direitos geradas pelo Estado.

Essa avalanche é tamanha que liberdade e amor viraram pauta política até mais forte que trabalho, educação, saúde, etc., em alguns espaços onde se dá o debate político. E a noção de democracia aparece muito fluída no meio disso. A necessidade de disputar o enorme contingente que se forma em torno dessas pautas já intimida alguns a problematizarem centralmente as perspectivas de superação do capitalismo.

No primeiro semestre desse ano, a Fundação Perseu Abramo revelou outro ramo da ofensiva cultural de cunho conservador. Com a pesquisa “Percepções e Valores Políticos nas Periferias de São Paulo”, demonstraram que tem predominado nessas regiões populares concepções individualistas e, mesmo sendo em áreas onde os serviços públicos são mais precários, noções contrárias à presença do Estado. A menos quando se trata de segurança/violência, que aumenta a demanda por repressão policial. Um dos principais fatores para isso, segundo a pesquisa, é a forte atuação de igrejas evangélicas neopentecostais forjando esse tipo de consciências. Nas últimas eleições, Dilma e Haddad perderam em vários bairros da periferia da capital paulista. Ao contrário de Doria e Bolsonaro, que contam com boa aceitação em grande parte dos bairros ali situados.

Se debruçar sobre esses elementos é de extrema importância para identificar os enormes desafios na construção de um projeto nacional e autônomo de desenvolvimento. Além de entender melhor o ambiente que temos atuado politicamente.

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