Diante da forte retração da economia e após intensa pressão da sociedade, inclusive de setores do chamado capital produtivo – o que revela as contradições nas classes dominantes –, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central decidiu baixar a taxa básica de juros em 1,5 ponto percentual – numa decisão inusitada para esta instituição infestada de rentistas. A Selic, agora, é de 11,25% ao ano. A medida, porém, é insuficiente e não garante que o país enfrentará a grave crise mundial do capitalismo. A brusca redução do PIB no quarto trimestre de 2008 atesta que a política macroeconômica ortodoxa do BC é criminosa, responsável por falências e desemprego.
Como afirma André Modenesi, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a decisão do BC foi positiva, mas é insuficiente. “O que explica esse corte é a deterioração muito rápida das expectativas empresariais. Os últimos dados econômicos mostram que a situação piorou muito. Por um lado é uma boa notícia, mas por outro lado preocupa um pouco, porque o BC fazer essa guinada mostra que a situação pode ser mais grave do que eu pensava... Não sei até que ponto isso pode reverter a desaceleração”, alertou numa entrevista ao jornal Valor.
Papel pró-ativo do governo
Para ele, o impacto do corte não será imediato na retomada do crescimento. “Até porque a taxa real continua razoavelmente alta... A política monetária está deixando de ser entrave, mas não quer dizer que ela vai estimular a economia”. Na sua avaliação, o efeito mais positivo será sobre a redução dos gastos públicos decorrentes do endividamento interno. “O corte de 1,5 ponto gera uma economia em torno de R$ 9 bilhões nos gastos com os serviços da dívida. Isso viabiliza a manutenção dos investimentos do governo em face da previsível queda da arrecadação, que deve ficar ao redor de R$ 20 bilhões. Isso contribui para manter um nível mínimo da atividade”.
Modenesi opina que o governo federal deve ser ainda mais pró-ativo no enfrentamento da crise. “Ele tem um papel muito forte no sentido de coordenar a retomada das expectativas. Acho que o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) é importante. Está tendo uma queda da demanda agregada e, nessa situação, o governo pode tentar compensar a queda por meio da manutenção dos gastos, principalmente com os programas de investimentos do PAC. A idéia é que são necessários instrumentos complementares à política da taxa de juros”.
Polêmica com os neoliberais
Poucos dias antes da reunião do Copom, um documento do Ipea, intitulado “A gravidade da crise e a despesa com juros do governo”, cumpriu importante papel de fustigar os tecnocratas do BC. Ele propôs uma redução drástica da taxa Selic, de 5,75 pontos percentuais até outubro, e criticou qualquer medida no sentido de corte de gastos públicos. Ao apresentar o documento, João Sicsú, coordenador da Diretoria de Estudos Macroeconômicos (Dimac) do Ipea e um dos mais incisivos críticos da atual política ortodoxa do BC, foi enfático: “É possível enfrentar a crise de uma forma contundente, fazendo algo que o mundo inteiro está fazendo: reduzindo a taxa de juros”.
Enfrentando o debate de idéias com os neoliberais, de dentro e de fora do governo, ele alertou: “Cortar gastos sociais, correntes ou de investimentos significa reduzir a demanda da economia e as possibilidades de crescimento. Com menor crescimento, haverá menor arrecadação. Portanto, cortar gasto público, cujos multiplicadores de renda e emprego são relevantes, significa ampliar as dificuldades de arrecadação, criar um problema fiscal e aprofundar a crise de demanda que se instalou no setor privado”. Para ele, a grave crise mundial exige uma ação combinada, com corte drástico da taxa de juros e elevação dos investimentos e dos gastos sociais.
Ampliar os gastos públicos
Conforme aponta o Ipea, “a reação a partir da demanda governamental é o único instrumento de combate à crise que pode ser utilizado... O gasto público deve ser ampliado com o objetivo de mudar o quadro expectacional e, por conseguinte, estimular o gasto privado”. Segundo o texto, o governo tem condições orçamentárias para enfrentar a crise. A situação fiscal do país encontra-se saudável. Em 2008, o déficit nominal do orçamento federal foi de apenas 1,53% do PIB (Produto Interno Bruto). A relação dívida líquida/PIB é decrescente e atingiu 36,6% em janeiro último.
Com base nestes dados, o Ipea sugere reorganizar os gastos públicos, reduzindo a parcela para o juro, “que não gera renda e emprego”, e elevando gastos com investimentos e gastos sociais. A nota técnica prova que a ampliação de programas, como o Bolsa Família e o Bolsa Atleta, “tem velocidade máxima de impacto na capacidade gerar emprego e renda. Afinal, quem recebe esse recurso transforma-o quase que imediatamente em consumo. Além disso, o consumo dessas famílias quase não contém itens importados, que ficaram mais caros com a crise externa”. São argumentos bem diferentes dos alardeados na TV pelos demos e pela mídia hegemônica!