A realização da Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) continua encalacrada. Num visível jogo de chantagem, os barões da mídia ameaçam deixar este fórum democrático de debate – o que só confirma que eles não têm qualquer compromisso com a tal “liberdade de expressão” – para impor suas propostas de temário e delegados. Na semana passada, eles se reuniram com os ministros Hélio Costa (Comunicação), Franklin Martins (Secretaria de Comunicação Social) e Luis Dulci (Secretaria Geral da Presidência). Mas a reunião novamente não deu em nada e o regimento da Confecom continua engavetado, o que prejudica o próprio calendário do evento.
Segundo a jornalista Mariana Mazza, a agência Tela Viva, “a falta de um desfecho conclusivo na reunião se deu ponta de um apelo feito pelo governo. A maior parte das associações empresariais estava disposta a deixar a comissão organizadora da conferência, mas os ministros pediram mais uma semana para que elas repensassem a sua decisão. A contraproposta do governo para tentar manter as empresas é a possibilidade da criação de um ‘quórum qualificado’ para a deliberação dos assuntos mais polêmicos”. Outra exigência, a da garantia de 40% dos delegados do evento para os barões da mídia, também parece ter sido acolhida nestas negociações de bastidores.
Risco de atentado à democracia
Esta cedência do governo, se confirmada, seria um atentado à democracia na Confecom. Afinal, os empresários não representam 40% da sociedade brasileira. Se assim fosse, não haveria motivo para lutar contra a concentração monopolista do setor, na qual meia-dúzia de famílias controla a quase totalidade dos meios de comunicação no país. Já o “quórum qualificado”, com a exigência de 60% dos votos, dificultaria a aprovação de qualquer proposta mais avançada de mudanças no setor e inviabilizaria a adoção de políticas públicas para a democratização da mídia. Na prática, ao impor estas “exigências mínimas”, os barões da mídia querem sabotar e implodir a Confecom.
Ainda segundo Mariana Mazza, tamanha cedência ainda não garantiria a participação dos barões da mídia. “O aceno do governo não atende exatamente as demandas empresariais, que queriam ter algum tipo de veto sobre os temas que lhe são mais sensíveis”. Das oito entidades patronais representadas na comissão nacional organizadora da Confecom, seis estariam decididas a deixar o evento para não abonar suas resoluções. O interessante no seu relato é que cresce a divisão no meio empresarial e também no próprio governo, o que indica que o jogo ainda não está decidido.
Contradições entre os empresários
A contradição entre os empresários não é nova. Algumas redes de televisão há muito questionam o descomunal poder da Rede Globo, que comanda com mão-de-ferro Associação Brasileira das Rádios e Televisões (Abert). Encabeçadas pela Rede Bandeirantes, estes “dissidentes” criaram a ABRA (Associação Brasileira de Radiodifusores) e não têm se comportado como apêndices da TV Globo nas discussões da Confecom. Junto com a Associação Brasileira de Telecomunicações (Telebrasil), ela inclusive apresentou uma “pauta mínima” para participar do evento. “ABRA e Telebrasil estariam unidas para continuar negociando as demandas encaminhas ao governo por meio de uma carta entregue ao ministro Hélio Costa”, informa Mariana Mazza.
No interior do governo, o ministro Hélio Costa é o mais afoito em ceder às pressões da Abert – o que não é surpresa. Já o ministro Luis Dulci, numa entrevista à revista Caros Amigos, garantiu que a Confecom ocorrerá com ou sem a presença dos barões da mídia. “Se o setor empresarial se afastar, ela será feita com quem quiser, mas acho que isso não é bom para a conferência, nem para o próprio setor empresarial”. Para ele, a Confecom não perderá legitimidade com a possível sabotagem das empresas. Já o ministro Franklin Martins tenta fazer o meio de campo. Ele afirma que aceita mudanças no regimento “desde que não implique em direito de veto para ninguém”.