Reproduzo artigo de Maurício Thuswohl, publicado no sítio Carta Maior:
Com o resultado das eleições presidenciais, José Serra está morto politicamente e já pode repousar ao lado de Fernando Henrique Cardoso no jazigo político do PSDB. Assim como FHC, o ex-governador de São Paulo passa a ser uma figura irrelevante no front da política nacional. A eleição de Dilma Rousseff, mesmo tendo fortalecido o projeto da esquerda brasileira, não foi suficiente para prostrar o PSDB definitivamente e tampouco foi ampla a ponto de fazer recuar as forças conservadoras da sociedade. Serra, no entanto, está acabado.
A constatação pode ser dura e difícil para aqueles que admiram o tucano (não são poucos, a julgar pelos 43,6 milhões de votos recebidos) e para a mídia conservadora que tenta dar ares de vitória a uma derrota histórica. Mas, a verdade das urnas é clara e cristalina. Como escreveu o sempre espirituoso Flávio Aguiar em artigo publicado aqui na Carta Maior, a morte política de Serra é um fato inequívoco e teve direito até mesmo à extrema-unção consagrada pelo Papa Bento XVI em pessoa.
Não se trata mera e simplesmente de uma derrota eleitoral. Ao repetir diversas vezes nos últimos anos - e todos os dias durante a campanha - que se preparou a vida inteira para ser presidente, Serra revelou um sonho, mas também uma obsessão tão forte a ponto de alguns críticos terem inventado para ele o apelido de “presidente nato”. Após abandonar a militância na AP nos anos 60, Serra deixou de ser de esquerda, apesar das teses em contrário. Sua conversão definitiva aos encantos do capital (financeiro, não o livro de Marx) aconteceu em sua passagem pelos Estados Unidos. Quando retornou ao Brasil, já estava pronto para ser um expoente da elite política neoliberal que comandou o país no período pós-ditadura.
Em sua moderna e definitiva encarnação, Serra não precisou pedir, como fez FHC, que esquecessem o que escreveu. Ao contrário, na falta de coisa melhor, registrou um livro como programa de governo. Mas, nestas eleições o tucano associou-se às forças mais tenebrosas da direita de tal forma que transformou sua figura política em uma face disforme.
A campanha difamatória contra Dilma, feita à sombra das catedrais católicas e templos evangélicos, já revelava um Serra disposto a tudo para “cumprir seu destino” e chegar à Presidência. A sórdida e orquestrada repercussão midiática dada à discussão sobre o aborto, no entanto, jogou o Brasil à beira de uma cisão religiosa que nunca antes na história desse país havia acontecido. Para quem se diz “defensor das liberdades democráticas” foi uma irresponsabilidade chocante, mas útil para revelar aos eleitores que o candidato do agronegócio destruidor da Amazônia, o candidato da grande mídia monopolizadora, o candidato dos privatistas entreguistas da riqueza nacional era também o candidato da TFP e de outros segmentos fundamentalistas de nossa sociedade.
No discurso proferido logo após a confirmação da vitória de Dilma, Serra recorreu a bravatas consideradas ingênuas até mesmo na UNE, da qual foi presidente, e alertou aos “que nos imaginam derrotados” que estava “apenas começando uma luta de verdade”. Disse que “o momento não era de adeus”, e sim um “até logo”, mas a verdade é que a luta dos tucanos vai continuar sem ele. Aos 68 anos, a saída mais honrosa para Serra seria assumir a presidência do PSDB nas eleições internas programadas para o ano que vem e se candidatar ao Senado em 2014, quando terá 72 anos. Seu discurso após a derrota, entretanto, revela que a obsessiva procura pela Presidência da República permanece em seus planos. Mas, não será fácil encontrar espaço.
Tucanos divididos
No PSDB, as coisas caminham para a divisão em dois grandes blocos, aglutinados em torno do governador eleito de São Paulo, Geraldo Alckmin, e do senador eleito Aécio Neves (MG). Ambos almejam disputar a Presidência em 2014, e os efeitos dessa divisão já começam a se fazer sentir na troca de críticas pela imprensa feita entre tucanos mineiros e paulistas. Nessa briga, o fiel da balança pode ser a posição de outras lideranças do PSDB, representadas pelos oito governadores eleitos pelo partido. Se Aécio vencer a queda-de-braço interna e permanecer no PSDB, é o candidato natural do partido. Se não tiver espaço, vai sair, mas, nesse caso, parece impossível imaginar que Alckmin, o “querido amigo”, abrirá mão da disputa em favor de Serra.
Restaria ao “presidente nato” a opção de perseguir seu sonho de poder em outra legenda. Isso, entretanto, só é imaginável se Serra abraçar de vez o perfil mais sombrio que demonstrou durante a última campanha e tentar aglutinar fundamentalistas religiosos, ex-torturadores e barões decadentes da mídia numa espécie de “Tea Party” brasileiro.
Convenhamos que seria um fim de carreira política para lá de melancólico até mesmo para quem é capaz de se submeter a uma tomografia após ter sido atingido por uma bolinha de papel. Isso sem falar nas parcas possibilidades eleitorais que Serra teria em um quadro com candidatáveis do porte de Marina Silva e Eduardo Campos, além dos próprios Aécio e Alckmin e da presidente Dilma, entre outros.
Em conversa com o ex-marido, relatada pelo jornal O Globo, Dilma afirmou: “Eu nunca quis, nunca pensei em ser presidente do Brasil. Nunca tive de fazer arranjos constrangedores para chegar onde cheguei. E o Serra só fez isso (almejar a Presidência) a vida inteira: foi o primeiro aluno da classe, liderou o grêmio estudantil, foi parlamentar e governou sempre de olho na Presidência. Como é surpreendente o processo político brasileiro! Ao contrário do Serra, para mim ser presidente não era uma coisa de vida ou morte. Aconteceu naturalmente”. Como se vê pelas palavras da presidente eleita, não basta ter se preparado a vida inteira. Como diziam os velhos políticos, “Presidência é destino”. Ou, felizmente para o Brasil, Presidência é vontade popular.
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domingo, 7 de novembro de 2010
Carta aberta à Soninha Francine
Reproduzo artigo do jornalista Ivan Trindade, publicado no blog "Falando sozinho":
Cara Soninha,
Não nos conhecemos. Acompanhei sua carreira pela televisão, desde os tempos de MTV.
Sempre gostei de você, da sua imagem pública, do jeito como você se meteu no futebol, sem medo de entrar em um campo quase que totalmente dos homens.
Fiquei do seu lado quando você foi crucificada pela mídia retrógrada ao assumir que fumava maconha e que já tinha feito um aborto. Solidarizei-me quando você foi demitida da TV Cultura tucana por esses mesmos “crimes”.
Mesmo longe, morando em Porto Alegre e depois no Rio, fiquei sabendo do início da sua carreira política, das suas idéias progressistas quanto ao meio ambiente, e sua luta por um trânsito mais civilizado e humano em São Paulo.
Quando você saiu do PT, achei normal, afinal a luta progressista pode ser feita em ouros espaços e ninguém é obrigado a ser petista, mas não esperava o que estava por vir.
Quando me mudei para São Paulo, em janeiro de 2008, pensei que agora poderia votar em você, mas um descuido me fez perder a data para mudar o domicílio eleitoral, mas te apoiei no primeiro turno da eleição para prefeita.
O primeiro estranhamento veio logo no segundo turno, quando vi você apoiar Gilberto Kassab. Sei que recém saída do PT seria difícil apoiar Marta, mas porque não ficar neutra?
O segundo estranhamento veio quando você aceitou ser sub-prefeita da Lapa na administração do mesmo Kassab. Fiquei pensando se o apoio não tinha sido na verdade a sua parte no trato com o Demo? Será que foi?
Mesmo assim, continuei seu fã. Continuei achando que você representava um conjunto de idéias interessantes para a discussão política no país.
Mas aí, veio 2010, e não tive mais como te apoiar.
Não lembro o dia exato em que aconteceu, mas lembro muito bem da reação que tive ao ler a notícia de que você apoiaria José Serra para presidente. E não apenas isso, faria parte da campanha.
Ok, José Serra não é o demônio e apesar de não votar nele de forma alguma, reconheço que é um nome importante na política nacional. Nada demais em apoiar José Serra, claro.
Porém, você mesmo sentiu que o apoio era difícil de digerir e foi obrigada a publicar uma justificativa no seu blog.
Mas aí veio a campanha e o José Serra que conhecíamos sumiu. No seu lugar, apareceu um beato raivoso, um mentiroso patológico e uma aproveitador baixo.
Serra jogou sua biografia no lixo e você aproveitou para jogar a sua também.
Desde o início, os panfletos apócrifos, a aliança com o que há de pior na igreja católica, nas igrejas evangélicas e na grande mídia.
O que já começou mal, só piorou, com boatos diários atacando a imagem da adversária. Se negavam autoria do jogo sujo, a campanha oficial e o próprio candidato em momento algum desautorizaram a campanha subterrânea mais suja da história da democracia brasileira. E você no centro disso tudo.
Lembra do episódio do metrô, quando sem prova alguma você insinuou uma sabotagem petista?
Teve também a propaganda em que aparecia o Zé Dirceu chamando a Dilma de “Minha companheira de armas”. Que feio tentarem criminalizar os bravos brasileiros que lutaram contra a ditadura, um deles o próprio José Serra.
Mas vocês acharam que isso daria votos. No final, conseguiram dividir o país e criar um clima de ódio como nunca antes se havia visto.
Exploraram também a questão do aborto com a própria esposa do candidato Serra chamando a adversária de “matadora de criancinhas”. Então, como milagre, os apoiadores de Serra colocaram fotos de bebês como avatar no Twitter e no Facebook. A quem serve isso? É com esse debate político que vocês queriam propor uma alternativa para o país? O que dizer então da hipocrisia quando foi revelado que a própria Mônica Serra havia feito um aborto?
É claro que houve erros do lado da campanha da Dilma e dos seus apoiadores, inclusive dos “blogs sujos”, assim apelidados pelo Serra. Não serve a ninguém chamar Serra de vampiro (o que eu fiz também e peço desculpas), de fujão e de qualquer outra coisa, mas você há de convir que há uma grande diferença entre usar apelidos maldosos e distribuir milhões de panfletos chamando Dilma de terrorista assassina. Muitos desses panfletos produzidos em uma gráfica de propriedade da esposa de um tucano envolvido na campanha.
Outro bom fator de comparação entre as duas campanhas foi o programa de TV. No de Serra, ataques, disseminação de preconceitos e tentativa de desclassificação da Dilma, além de propostas vazias e eleitoreiras. No programa de Dilma, prestação de contas dos feitos do governo Lula e compromissos concretos baseados na experiência de quem governa o país com sucesso há oito anos, com 83% de aprovação. Até acho que você pode não ter tido nada a ver com os programas de TV, mas concordou com a exploração do tema do aborto, por exemplo.
Já no primeiro turno, ficou claro que o povo não aprovava tal estratégia e se não fosse o fator Marina, vocês já teriam sido derrotados. A campanha do Serra, porém, não fez essa leitura e resolveu insistir no debate político mais baixo possível.
Não só mantiveram, como aprofundaram a tentativa de enganar a população. Com a ajuda da Rede Globo, forjaram um ataque ao candidato por petistas raivosos em Campo Grande. Uma bolinha de papel virou um objeto de dois quilos, mas que milagrosamente não deixou nenhuma marca ao atingir em cheio a cabeça do candidato. Logo o ridículo foi exposto e Serra virou hit no Twitter. Nesse dia fui ver o que você estava escrevendo no microblog e descobri que o humor tinha sumido da sua vida. Você bradava que o PT sempre fazia isso. Tinha comprado a tese do ataque fajuto.
Veio a eleição e o povo deu o seu recado. Mais 4 anos para o projeto que vem transformando o Brasil desde 2003. Terceira derrota seguida para o partido que quase jogou o Brasil na bancarrota, mesmo vendendo várias partes do patrimônio nacional. E principalmente derrota para o candidato que escolheu o ódio, a divisão, a mentira, a raiva.
Na segunda-feira, dia 1o de novembro, assisti a um vídeo na internet. Era um debate entre você e o prefeito petista de Osasco (obrigado pelas correções). Tenho que te dizer que me assustei. A Soninha que eu estava acostumado a ver na ESPN BR e antes disso na MTV, sempre leve e com um cacoete de rir enquanto falava havia sumido. No lugar, vi uma mulher raivosa, exasperada, desesperada mesmo com a derrota acachapante que havia sofrido (digamos que 12 milhões de votos de diferença é uma derrota acachapante). Vi uma mulher tentando transferir para os adversários tudo aquilo que ela mesma fez durante a campanha. Todas as mentiras, as agressões e as estratégias subterrâneas que mancharam a democracia brasileira.
Hoje me pergunto se vou voltar a ver a Soninha que estava acostumado a ver na TV ou se aquela jornalista séria e progressista deu lugar definitivamente a uma agente política raivosa que usa o que há de pior no mundo da comunicação para tentar eleger seu candidato? Fica a pergunta.
Abraços, Ivan Trindade
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Cara Soninha,
Não nos conhecemos. Acompanhei sua carreira pela televisão, desde os tempos de MTV.
Sempre gostei de você, da sua imagem pública, do jeito como você se meteu no futebol, sem medo de entrar em um campo quase que totalmente dos homens.
Fiquei do seu lado quando você foi crucificada pela mídia retrógrada ao assumir que fumava maconha e que já tinha feito um aborto. Solidarizei-me quando você foi demitida da TV Cultura tucana por esses mesmos “crimes”.
Mesmo longe, morando em Porto Alegre e depois no Rio, fiquei sabendo do início da sua carreira política, das suas idéias progressistas quanto ao meio ambiente, e sua luta por um trânsito mais civilizado e humano em São Paulo.
Quando você saiu do PT, achei normal, afinal a luta progressista pode ser feita em ouros espaços e ninguém é obrigado a ser petista, mas não esperava o que estava por vir.
Quando me mudei para São Paulo, em janeiro de 2008, pensei que agora poderia votar em você, mas um descuido me fez perder a data para mudar o domicílio eleitoral, mas te apoiei no primeiro turno da eleição para prefeita.
O primeiro estranhamento veio logo no segundo turno, quando vi você apoiar Gilberto Kassab. Sei que recém saída do PT seria difícil apoiar Marta, mas porque não ficar neutra?
O segundo estranhamento veio quando você aceitou ser sub-prefeita da Lapa na administração do mesmo Kassab. Fiquei pensando se o apoio não tinha sido na verdade a sua parte no trato com o Demo? Será que foi?
Mesmo assim, continuei seu fã. Continuei achando que você representava um conjunto de idéias interessantes para a discussão política no país.
Mas aí, veio 2010, e não tive mais como te apoiar.
Não lembro o dia exato em que aconteceu, mas lembro muito bem da reação que tive ao ler a notícia de que você apoiaria José Serra para presidente. E não apenas isso, faria parte da campanha.
Ok, José Serra não é o demônio e apesar de não votar nele de forma alguma, reconheço que é um nome importante na política nacional. Nada demais em apoiar José Serra, claro.
Porém, você mesmo sentiu que o apoio era difícil de digerir e foi obrigada a publicar uma justificativa no seu blog.
Mas aí veio a campanha e o José Serra que conhecíamos sumiu. No seu lugar, apareceu um beato raivoso, um mentiroso patológico e uma aproveitador baixo.
Serra jogou sua biografia no lixo e você aproveitou para jogar a sua também.
Desde o início, os panfletos apócrifos, a aliança com o que há de pior na igreja católica, nas igrejas evangélicas e na grande mídia.
O que já começou mal, só piorou, com boatos diários atacando a imagem da adversária. Se negavam autoria do jogo sujo, a campanha oficial e o próprio candidato em momento algum desautorizaram a campanha subterrânea mais suja da história da democracia brasileira. E você no centro disso tudo.
Lembra do episódio do metrô, quando sem prova alguma você insinuou uma sabotagem petista?
Teve também a propaganda em que aparecia o Zé Dirceu chamando a Dilma de “Minha companheira de armas”. Que feio tentarem criminalizar os bravos brasileiros que lutaram contra a ditadura, um deles o próprio José Serra.
Mas vocês acharam que isso daria votos. No final, conseguiram dividir o país e criar um clima de ódio como nunca antes se havia visto.
Exploraram também a questão do aborto com a própria esposa do candidato Serra chamando a adversária de “matadora de criancinhas”. Então, como milagre, os apoiadores de Serra colocaram fotos de bebês como avatar no Twitter e no Facebook. A quem serve isso? É com esse debate político que vocês queriam propor uma alternativa para o país? O que dizer então da hipocrisia quando foi revelado que a própria Mônica Serra havia feito um aborto?
É claro que houve erros do lado da campanha da Dilma e dos seus apoiadores, inclusive dos “blogs sujos”, assim apelidados pelo Serra. Não serve a ninguém chamar Serra de vampiro (o que eu fiz também e peço desculpas), de fujão e de qualquer outra coisa, mas você há de convir que há uma grande diferença entre usar apelidos maldosos e distribuir milhões de panfletos chamando Dilma de terrorista assassina. Muitos desses panfletos produzidos em uma gráfica de propriedade da esposa de um tucano envolvido na campanha.
Outro bom fator de comparação entre as duas campanhas foi o programa de TV. No de Serra, ataques, disseminação de preconceitos e tentativa de desclassificação da Dilma, além de propostas vazias e eleitoreiras. No programa de Dilma, prestação de contas dos feitos do governo Lula e compromissos concretos baseados na experiência de quem governa o país com sucesso há oito anos, com 83% de aprovação. Até acho que você pode não ter tido nada a ver com os programas de TV, mas concordou com a exploração do tema do aborto, por exemplo.
Já no primeiro turno, ficou claro que o povo não aprovava tal estratégia e se não fosse o fator Marina, vocês já teriam sido derrotados. A campanha do Serra, porém, não fez essa leitura e resolveu insistir no debate político mais baixo possível.
Não só mantiveram, como aprofundaram a tentativa de enganar a população. Com a ajuda da Rede Globo, forjaram um ataque ao candidato por petistas raivosos em Campo Grande. Uma bolinha de papel virou um objeto de dois quilos, mas que milagrosamente não deixou nenhuma marca ao atingir em cheio a cabeça do candidato. Logo o ridículo foi exposto e Serra virou hit no Twitter. Nesse dia fui ver o que você estava escrevendo no microblog e descobri que o humor tinha sumido da sua vida. Você bradava que o PT sempre fazia isso. Tinha comprado a tese do ataque fajuto.
Veio a eleição e o povo deu o seu recado. Mais 4 anos para o projeto que vem transformando o Brasil desde 2003. Terceira derrota seguida para o partido que quase jogou o Brasil na bancarrota, mesmo vendendo várias partes do patrimônio nacional. E principalmente derrota para o candidato que escolheu o ódio, a divisão, a mentira, a raiva.
Na segunda-feira, dia 1o de novembro, assisti a um vídeo na internet. Era um debate entre você e o prefeito petista de Osasco (obrigado pelas correções). Tenho que te dizer que me assustei. A Soninha que eu estava acostumado a ver na ESPN BR e antes disso na MTV, sempre leve e com um cacoete de rir enquanto falava havia sumido. No lugar, vi uma mulher raivosa, exasperada, desesperada mesmo com a derrota acachapante que havia sofrido (digamos que 12 milhões de votos de diferença é uma derrota acachapante). Vi uma mulher tentando transferir para os adversários tudo aquilo que ela mesma fez durante a campanha. Todas as mentiras, as agressões e as estratégias subterrâneas que mancharam a democracia brasileira.
Hoje me pergunto se vou voltar a ver a Soninha que estava acostumado a ver na TV ou se aquela jornalista séria e progressista deu lugar definitivamente a uma agente política raivosa que usa o que há de pior no mundo da comunicação para tentar eleger seu candidato? Fica a pergunta.
Abraços, Ivan Trindade
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A falsa tese do “país dividido”
Reproduzo artigo de Idelber Avelar, publicado no excelente blog "O biscoito fino e a massa":
Nem bem contada estava a maior parte dos 55.752.529 votos recebidos por Dilma Rousseff e um insidioso meme começava a circular pelos meios de comunicação brasileiros, especialmente pela Rede Globo de Televisão. Parece que não entendiam, ou se recusavam a entender, o momento histórico que vivíamos. Trata-se da cantilena do “país dividido”, reforçada por um enganoso mapa em que o Brasil aparecia separado entre estados azuis e vermelhos.
Acompanhado por uma série de bizarras declarações de figuras como W. Waack (“a imprensa criou o mito de Lula e ele se voltou contra ela, ingrato”) ou do inacreditável Merval Pereira (“Dilma deve saber que a oposição teve uma votação muito alta”), o mapa cumpriu o papel de sugerir uma divisão que absolutamente não existe: Dilma venceu com larga margem (12%), que em qualquer democracia presidencialista qualificaria como um sacode-Iaiá. Basta lembrar que na categórica vitória de Obama sobre McCain a diferença foi 52,9% a 45,7%, pouco mais da metade, portanto, da diferença imposta por Dilma a Serra.
Como apontou Alexandre Nodari no seu Twitter, a divisão por estados peca por impor ao Brasil um modelo que é essencialmente estadunidense, baseado no princípio de que o candidato vencedor num determinado estado leva todos os seus votos a um Colégio Eleitoral, numa eleição que é, para todos os efeitos, indireta. No Brasil, como se sabe, o presidente é eleito por sufrágio universal, e nele a ideia de estados “vermelhos” e “azuis” não faz o menor sentido. O mapa do Estadão, colorido por municípios e com várias gradações de azul e vermelho, esse sim, serve a um estudo sério, já iniciado pelo Fabricio Vasselai.
A ideia dos estados azuis e vermelhos faz menos sentido ainda depois de estudado o mapa eleitoral do pleito de 2010. A grande maioria dos estados que aparecem em azul no “país dividido” da TV Globo são unidades da federação em que Serra venceu por mínima diferença: Goiás (50,7%), Rio Grande do Sul (50,9%), Espírito Santo (50,8%), Mato Grosso (51,1%). Não se encontra, na coluna azul, nem rastro de um estado em que a vantagem se compare com a conquistada por Dilma em lugares como Amazonas (80%), Maranhão (79%), Ceará (77%), Pernambuco (75%), Bahia (70%), Piauí (69%) e vários outros. Num país com eleição por sufrágio universal e uma diferença tão acachapante entre os estados “dilmistas” e os “serristas”, só com muita desonestidade intelectual você colore alguns estados de azul e outros de vermelho, sem variação no tom das cores, para apresentar um país “dividido”.
Se a tese do país dividido não tem fundamento, menos ainda o tem a tese do país dividido entre Sul/Sudeste, por um lado, e o Norte/Nordeste, por outro. Não custa lembrar, mas essa divisão grita em desacordo com os fatos: Dilma enfiou goleadas acachapantes em Serra no Rio de Janeiro (60,5% x 39,5%) e Minas Gerais (58,5 x 41,5), além conquistar um empate no Rio Grande do Sul. Não custa lembrar aos jornalistas da Globo: Dilma Rousseff venceu as eleições no Sudeste, caso o fato tenha passado despercebido no Jardim Botânico.
Já na segunda-feira, a mídia brasileira havia conseguido insuflar uma onda divisionista que não demorou em encontrar solo fértil no nosso bom e velho racismo latente. No Twitter, proliferava o discurso do ódio aos nordestinos, desinformado até do básico dado de que Dilma teria ganho eleição mesmo se o Brasil não incluísse o Nordeste. Aludindo de forma desonesta ao “fato” que ela mesma havia ajudado a criar, a Globo relatava que havia um “embate” entre regiões do Brasil nas redes sociais, quando na verdade o único embate se deu entre a sanidade e uma minoria racista e ressentida. Começa mal, muito mal a Vênus Platinada, talvez como consequência do que aconteceu nesta eleição histórica: Dilma venceu o pleito com o debate da Band, desmontou a última armação com um vídeo do SBT e concedeu sua primeira entrevista à Record.
Sinais dos tempos.
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Nem bem contada estava a maior parte dos 55.752.529 votos recebidos por Dilma Rousseff e um insidioso meme começava a circular pelos meios de comunicação brasileiros, especialmente pela Rede Globo de Televisão. Parece que não entendiam, ou se recusavam a entender, o momento histórico que vivíamos. Trata-se da cantilena do “país dividido”, reforçada por um enganoso mapa em que o Brasil aparecia separado entre estados azuis e vermelhos.
Acompanhado por uma série de bizarras declarações de figuras como W. Waack (“a imprensa criou o mito de Lula e ele se voltou contra ela, ingrato”) ou do inacreditável Merval Pereira (“Dilma deve saber que a oposição teve uma votação muito alta”), o mapa cumpriu o papel de sugerir uma divisão que absolutamente não existe: Dilma venceu com larga margem (12%), que em qualquer democracia presidencialista qualificaria como um sacode-Iaiá. Basta lembrar que na categórica vitória de Obama sobre McCain a diferença foi 52,9% a 45,7%, pouco mais da metade, portanto, da diferença imposta por Dilma a Serra.
Como apontou Alexandre Nodari no seu Twitter, a divisão por estados peca por impor ao Brasil um modelo que é essencialmente estadunidense, baseado no princípio de que o candidato vencedor num determinado estado leva todos os seus votos a um Colégio Eleitoral, numa eleição que é, para todos os efeitos, indireta. No Brasil, como se sabe, o presidente é eleito por sufrágio universal, e nele a ideia de estados “vermelhos” e “azuis” não faz o menor sentido. O mapa do Estadão, colorido por municípios e com várias gradações de azul e vermelho, esse sim, serve a um estudo sério, já iniciado pelo Fabricio Vasselai.
A ideia dos estados azuis e vermelhos faz menos sentido ainda depois de estudado o mapa eleitoral do pleito de 2010. A grande maioria dos estados que aparecem em azul no “país dividido” da TV Globo são unidades da federação em que Serra venceu por mínima diferença: Goiás (50,7%), Rio Grande do Sul (50,9%), Espírito Santo (50,8%), Mato Grosso (51,1%). Não se encontra, na coluna azul, nem rastro de um estado em que a vantagem se compare com a conquistada por Dilma em lugares como Amazonas (80%), Maranhão (79%), Ceará (77%), Pernambuco (75%), Bahia (70%), Piauí (69%) e vários outros. Num país com eleição por sufrágio universal e uma diferença tão acachapante entre os estados “dilmistas” e os “serristas”, só com muita desonestidade intelectual você colore alguns estados de azul e outros de vermelho, sem variação no tom das cores, para apresentar um país “dividido”.
Se a tese do país dividido não tem fundamento, menos ainda o tem a tese do país dividido entre Sul/Sudeste, por um lado, e o Norte/Nordeste, por outro. Não custa lembrar, mas essa divisão grita em desacordo com os fatos: Dilma enfiou goleadas acachapantes em Serra no Rio de Janeiro (60,5% x 39,5%) e Minas Gerais (58,5 x 41,5), além conquistar um empate no Rio Grande do Sul. Não custa lembrar aos jornalistas da Globo: Dilma Rousseff venceu as eleições no Sudeste, caso o fato tenha passado despercebido no Jardim Botânico.
Já na segunda-feira, a mídia brasileira havia conseguido insuflar uma onda divisionista que não demorou em encontrar solo fértil no nosso bom e velho racismo latente. No Twitter, proliferava o discurso do ódio aos nordestinos, desinformado até do básico dado de que Dilma teria ganho eleição mesmo se o Brasil não incluísse o Nordeste. Aludindo de forma desonesta ao “fato” que ela mesma havia ajudado a criar, a Globo relatava que havia um “embate” entre regiões do Brasil nas redes sociais, quando na verdade o único embate se deu entre a sanidade e uma minoria racista e ressentida. Começa mal, muito mal a Vênus Platinada, talvez como consequência do que aconteceu nesta eleição histórica: Dilma venceu o pleito com o debate da Band, desmontou a última armação com um vídeo do SBT e concedeu sua primeira entrevista à Record.
Sinais dos tempos.
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Serra vai à guerra
Reproduzo artigo de Mauricio Dias, publicado na revista CartaCapital:
Na noite de domingo 31 de outubro, se o rosto tenso de José Serra, emoldurado pelo ar da tristeza, era um retrato natural após o resultado oficial da vitória de Dilma Rousseff, as palavras que disparou surpreenderam e quebraram a cordialidade protocolar normalmente seguida pelo candidato derrotado.
É um caso raro, único talvez, em que o perdedor de uma eleição democrática declarou guerra ao vencedor. Oposição é oposição. Guerra é guerra.
“E para os que nos imaginam derrotados, eu quero dizer: nós apenas estamos começando uma luta de verdade (…) em defesa da pátria, da liberdade, da democracia”, disse com voz amargurada incapaz de sustentar a confiança das palavras.
Nós quem? Ele fez uma lista de agradecimentos da qual excluiu o ex-governador de Minas Aécio Neves, senador eleito, esperança de uma oposição capaz de vencer e não de derrubar o governo antes da eleição presidencial de 2014.
Embora tenha agradecido a Aloysio Nunes Ferreira, senador eleito, não fez referência a Paulo Preto, braço direito de Aloysio na Casa Civil do governo paulista. Deu um abraço comovido em Geraldo Alckmin, governador eleito por São Paulo que, posteriormente, em gesto político moderado e republicano, telefonou para a presidente eleita, Dilma Rousseff, para parabenizá-la pela vitória.
Alckmin ainda é uma incógnita nesse processo. Mas Serra invocou a eleição de governadores tucanos e, mais ainda, os 43 milhões de votos que obteve, com a certeza de que ao grito de avante ele seria seguido por todos.
Respeito e humildade, palavras usadas por Serra, se diluem diante da exegese do discurso da derrota, com duração de dez minutos, proferido por ele no QG da oposição montado no Edifício Joelma, no centro de São Paulo.
Serra deixou claro que a campanha eleitoral foi calculadamente transformada em batalha pela oposição, na qual, como se sabe, o candidato tucano foi atingido na cabeça por uma bolinha de papel. Um petardo disparado pelos adversários, as “forças terríveis” às quais se referiu, repetindo frase extraída do discurso de renúncia do ex-presidente Jânio Quadros. Uma referência de mau augúrio.
Há suspeita, porém, de que pode ter sido uma “bolinha perdida”, uma ocorrência comum, como se sabe, na violenta cidade do Rio de Janeiro. O ferimento deixou sequelas profundas que não foram percebidas pela tomografia feita após o conflito, mas que estão visíveis na mensagem de Serra a seguidores e aliados.
“Vocês alcançaram uma vitória estratégica no Brasil. Cavaram uma grande trincheira, construíram um campo político de defesa da liberdade e da democracia no Brasil”, afirmou Serra terçando armas contra moinhos de vento.
Serra fez um discurso ao mesmo tempo tão próximo e tão distante daqueles que compõem a figura imortal de Dom Quixote, nascido do talento imenso de Cervantes.
Próximo porque tresloucado. Distante porque o “cavaleiro da triste figura” era uma alma ensandecida pela esperança e Serra, ao contrário, é apenas um político ambicioso atordoado pela mágoa e pela frustração pessoal. Perdeu sem grandeza.
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Na noite de domingo 31 de outubro, se o rosto tenso de José Serra, emoldurado pelo ar da tristeza, era um retrato natural após o resultado oficial da vitória de Dilma Rousseff, as palavras que disparou surpreenderam e quebraram a cordialidade protocolar normalmente seguida pelo candidato derrotado.
É um caso raro, único talvez, em que o perdedor de uma eleição democrática declarou guerra ao vencedor. Oposição é oposição. Guerra é guerra.
“E para os que nos imaginam derrotados, eu quero dizer: nós apenas estamos começando uma luta de verdade (…) em defesa da pátria, da liberdade, da democracia”, disse com voz amargurada incapaz de sustentar a confiança das palavras.
Nós quem? Ele fez uma lista de agradecimentos da qual excluiu o ex-governador de Minas Aécio Neves, senador eleito, esperança de uma oposição capaz de vencer e não de derrubar o governo antes da eleição presidencial de 2014.
Embora tenha agradecido a Aloysio Nunes Ferreira, senador eleito, não fez referência a Paulo Preto, braço direito de Aloysio na Casa Civil do governo paulista. Deu um abraço comovido em Geraldo Alckmin, governador eleito por São Paulo que, posteriormente, em gesto político moderado e republicano, telefonou para a presidente eleita, Dilma Rousseff, para parabenizá-la pela vitória.
Alckmin ainda é uma incógnita nesse processo. Mas Serra invocou a eleição de governadores tucanos e, mais ainda, os 43 milhões de votos que obteve, com a certeza de que ao grito de avante ele seria seguido por todos.
Respeito e humildade, palavras usadas por Serra, se diluem diante da exegese do discurso da derrota, com duração de dez minutos, proferido por ele no QG da oposição montado no Edifício Joelma, no centro de São Paulo.
Serra deixou claro que a campanha eleitoral foi calculadamente transformada em batalha pela oposição, na qual, como se sabe, o candidato tucano foi atingido na cabeça por uma bolinha de papel. Um petardo disparado pelos adversários, as “forças terríveis” às quais se referiu, repetindo frase extraída do discurso de renúncia do ex-presidente Jânio Quadros. Uma referência de mau augúrio.
Há suspeita, porém, de que pode ter sido uma “bolinha perdida”, uma ocorrência comum, como se sabe, na violenta cidade do Rio de Janeiro. O ferimento deixou sequelas profundas que não foram percebidas pela tomografia feita após o conflito, mas que estão visíveis na mensagem de Serra a seguidores e aliados.
“Vocês alcançaram uma vitória estratégica no Brasil. Cavaram uma grande trincheira, construíram um campo político de defesa da liberdade e da democracia no Brasil”, afirmou Serra terçando armas contra moinhos de vento.
Serra fez um discurso ao mesmo tempo tão próximo e tão distante daqueles que compõem a figura imortal de Dom Quixote, nascido do talento imenso de Cervantes.
Próximo porque tresloucado. Distante porque o “cavaleiro da triste figura” era uma alma ensandecida pela esperança e Serra, ao contrário, é apenas um político ambicioso atordoado pela mágoa e pela frustração pessoal. Perdeu sem grandeza.
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