quinta-feira, 27 de junho de 2013

A hora e a vez do projeto popular

Editorial do jornal Brasil de Fato:

As mobilizações que percorrem todo o país abrem a possibilidade de avançar nas mudanças estruturais que interessam ao povo brasileiro.

Milhões de pessoas vão às ruas protestar pela primeira vez, conquistando vitórias na redução das tarifas, proporcionando elevação da autoestima e uma experiência inigualável de protagonismo popular.

A correlação de forças se altera numa rapidez impressionante, com a entrada em cena de mobilizações populares que não se colocavam desde a década de 1980. A retomada da capacidade de lutas que já vinha sendo sinalizada por um crescimento contínuo do número de greves desde 2004, agora demonstra a presença de um elemento subjetivo, da coragem de enfrentar a repressão e do ânimo de ganhar as ruas. Já não restam dúvidas de que ingressamos numa nova etapa de reascenso da luta de massas. A retomada da luta de massas, conjugando as lutas que já vinham se acumulando com atos e marchas massivos que estão ocorrendo, configuram o momento privilegiado para que o governo federal assuma compromissos com a pauta das mudanças estruturais que conformam um projeto popular.

Para as forças de direita, as mobilizações e protestos devem ser canalizados para desgastar e desestabilizar o governo federal, inviabilizando o favoritismo do PT nas eleições gerais de 2014. Eles querem recuperar a pauta neoliberal, fortalecendo os setores rentistas, financeiros, retomando a subordinação internacional aos interesses estadunidenses e rompendo as alianças com os governos progressistas da América Latina.

O enorme poder concentrado da mídia passa a atuar como verdadeiro partido político da classe dominante, interferindo nas mobilizações, premiando e fortalecendo a imagem de “líderes” que se amoldam aos seus interesses e condenando aqueles que denunciam os reais inimigos dos interesses do povo. Atuam na disputa pela interpretação das mobilizações, sendo instrumentos poderosos para construir uma leitura, influenciando nas pautas que vão para as ruas e promovendo líderes adequados aos seus interesses.

Os atos e marchas são predominantemente progressistas até o momento, mas a disputa política e ideológica com as forças de direita se acelera.

Assistimos uma acirrada disputa pelos rumos das mobilizações populares. As forças de direita não conseguem organizar uma manifestação política expressiva desde a “marcha pela família e a propriedade”, às vésperas do golpe de 1964. Desde os anos de enfrentamento com a ditadura militar as ruas são dos que defendem os interesses populares. Agora, tentam instrumentalizar as atuais lutas que surgem por reivindicações legítimas e progressistas. Buscam isolar a esquerda organizada dos atos, utilizando de pequenos grupos de extrema direita que insuflam palavras de ordem e agressões para impedir as organizações populares de promoverem essa disputa.

As crescentes manifestações irrompem num momento em que o governo Dilma sinalizava, pressionada pelos setores rentistas, pelo grande capital especulativo internacional, com um recuo nas medidas progressistas que reduziram os juros, mudaram a política de câmbio e criaram mecanismos para proteger e incentivar a indústria nacional. O recuo foi ganhando forma desde o final do ano passado, quando estes setores iniciaram uma contraofensiva, com o amplo apoio da mídia, exigindo o ajuste fiscal e a elevação de juros, sob a ameaça da inflação crescente. Isto veio de forma articulada com uma “campanha” para derrubar o ministro Guido Mantega.

As manifestações refletem a situação que se instaurou nos últimos anos, nas grandes cidades, com o avanço da especulação imobiliária, o aumento no custo de vida – muito além dos salários – e o baixo investimento em serviços públicos. Em muitas delas, eles ficaram paralisados, gerando um sucateamento destes serviços, como podemos identificar claramente na péssima qualidade dos transportes. Nos grandes centros urbanos, a população, que vai para a escola e para o trabalho em ônibus e metrôs apertados, perde de três a quatro horas por dia no trânsito, tempo que poderia utilizar para estar com a família, estudando ou participando de atividades culturais.

Mas a atual crise não se limita aos seus aspectos econômicos e sociais mais evidentes. O atual sistema político não possibilitou que nossa sociedade superasse as principais características herdadas de sua condição colonial. Seus diferentes ciclos de desenvolvimento sempre reproduziram a desigualdade social interna e a dependência externa.

As mobilizações também têm expressado forte sentimento de rejeição ao atual sistema político. Generaliza-se a percepção de que há uma “blindagem” da política aos verdadeiros interesses do povo brasileiro. Nesse contexto, os partidos políticos e os próprios políticos são vistos como parte de uma mesma engrenagem subordinada aos interesses das elites e a democracia representativa se apresenta, aos olhos da juventude, como um mecanismo que impede a democracia efetiva. Mesmo as bandeiras de partidos de esquerda passam a ser vistas como símbolos da burocracia, apesar de seu histórico de lutas.

Sem a entrada em cena dos milhares de trabalhadores e trabalhadoras, do campo e da cidade, dos jovens negros e negras das periferias, esse processo não se desenvolverá a ponto de demonstrar ao conjunto da sociedade brasileira quais são os reais inimigos do povo. Ou seja, aqueles que longe de defenderem um projeto nacional, são diretamente atrelados aos interesses do imperialismo, que nesse momento de crise econômica mundial investe sobre a América Latina, para desestabilizar governos progressistas e forjar golpes contra o povo.

Mais do que nunca é preciso fortalecer a unidade das forças populares e de esquerda. Sabemos quem é o inimigo, podemos construir uma ampla unidade e apresentar um programa que traga soluções para os problemas básicos do povo. É a possibilidade que temos de acumular forças para avançarmos na construção de um Projeto Popular para o Brasil.

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