segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Ideologia das trevas virou moda

Por Bepe Damasco, em seu blog:

Tomando por base o que lemos na internet e ouvimos na filas do banco, nos supermercados, ônibus, metrôs, trens, nos restaurantes e nos botecos, cada vez mais brasileiros perderam o pudor de defender as teses mais obscurantistas, xenófobas, racistas e preconceituosas, na direção oposta de várias conquistas humanistas e civilizatórias. Por isso, o apoio maciço à bárbara execução do brasileiro Marco Archer pela Indonésia, nas redes sociais, não surpreende. É apenas mais uma entre as incontáveis manifestações insanas que inundam os comentários dos sites noticiosos do PIG, o facebook e o twitter. Ser reacionário e fascista está virando moda no Brasil, essa é a verdade. Aos cientistas políticos, antropólogos, psicólogos e quadros políticos deixo uma sugestão para análise e estudo: por que será que o ódio e a intolerância como instrumentos de luta política cresceram de forma tão exponencial depois das jornadas de junho de 2013 ?

Já virou rotina ler descerebrados pregando na internet barbaridades como o assassinato de Lula, Dilma e de todos os petistas. O ódio a nordestinos, elevado à enésima potência depois que o Nordeste passou a votar em peso nos candidatos a presidente do PT, também faz sucesso entre muitos moradores dos bairros chiques dos grandes capitais do Sudeste e do Sul.

Chegam a propor a céu aberto a cassação do direito a voto dos beneficiários do bolsa família e, óbvio, são contra a política de cotas raciais e sociais para ingresso nas universidades e no serviço público, torcem o nariz para a valorização do salário mínimo e esbravejam quando o assunto é a lei que estende direitos trabalhistas para as empregadas domésticas. Nada demais, aliás, para quem zela pela herança escravocrata da nossa elite.

Um traço marcante entre os adeptos desta ideologia das trevas é a extrema superficialidade e a pobreza de argumentos de suas opiniões, fruto de um analfabetismo político crônico e incurável. Para eles, foi o PT que inventou a corrupção no Brasil e as notícias de Veja e do Jornal Nacional são verdades absolutas. No cipoal de bobagens que vivem a trombetear e multiplicar, destacam-se a compra da Friboi pelo filho de Lula e o enriquecimento da filha da presidenta Dilma. Dispensa comentários a influência do monopólio midiático na formação do conjunto de valores desses brasileiros imbecilizados.

"Especialistas" em política externa, condenam o alinhamento do Brasil a "ditaduras" como Venezuela, Bolívia e Equador. Nem de longe lhes ocorre que em todos esses países os governantes são eleitos em pleitos livres e democráticos. Mas o que importa é alardear que o PT quer implantar um regime "bolivariano" no Brasil. Aposto que uma pesquisa feita no universo reaça brasileiro mostraria que mais de 90% dos consultados desconhecem quem foi Simon Bolívar, o grande libertador da América espanhola.

Por tudo isso, seria lhes pedir demais que levassem em consideração algumas informações, dados e constatações importantes sobre a questão da pena de morte e do tráfico de drogas no mundo. Mais de dois terços dos países não têm a pena de morte nas suas legislações penais. Noutros, embora suas leis prevejam essa punição, ela foi abolida na prática. Mesmo nos EUA, país conhecido por adotar a pena capital, a grande maioria dos estados já não a pratica. O Texas é responsável por mais da metade das execuções ocorridas nos EUA.

Sobre a repressão ao tráfico de drogas, é sabido que o mundo só tem acumulado derrotas nesta guerra. A política mundial de repressão, comandada pelos EUA, se revelou através dos anos um retumbante fracasso, seja em relação ao objetivo de desmantelar as quadrilhas de narcotraficantes ou à tentativa de desestimular as pessoas ao consumo. Centenas de milhares de vidas foram perdidas e uma soma incalculável de recursos públicos foram consumidas nessa guerra.

Hoje, há o reconhecimento crescente de que algum nível de liberalização e descriminalização terá de ser adotado em escala mundial, a exemplo do que já fazem vários países europeus e, mais recentemente, o Uruguai, do bravo estadista Mujica. Também é uma questão de tempo a mudança na abordagem central da questão das drogas, substituindo o foco exclusivo na repressão pela ênfase na saúde pública.

Para os "justiceiros" das redes sociais, a Indonésia fez muito bem em fuzilar um traficante. Simples assim. Não importa a grande desproporcionalidade entre o crime cometido e os castigo imposto. Não importa que Marco Archer tenha cumprido 11 anos de cadeia na Indonésia. Não importa que ele tenha reconhecido seu erro e pedido clemência. Infelizmente, se alastra como rastilho de pólvora em nosso país uma ideologia que despe o ser humano de noções básicas de solidariedade, justiça e compaixão. Uma tristeza.

2 comentários:

  1. Donde se conclui que o Pullitzer foi profético, no caso da mídia nativa.
    Precisamos, cada vez mais, contrapor a esse cartel.

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