segunda-feira, 8 de junho de 2015

Estadão e a ‘crise de identidade’ tucana

Por Altamiro Borges

O artigo “Ninguém se entende no PSDB” gerou polêmica nas redes sociais. Tucaninhos amestrados alegaram que a Dilma é quem está em crise e que a oposição vive seu melhor momento. Alguns mais aloprados voltaram a defender a maluquice de que o cambaleante Aécio Neves foi roubado na eleição do ano passado, o que justificaria a tese golpista do impeachment da presidenta. Agora, porém, é o Estadão, que nunca escondeu seu apoio ao PSDB, que reforça a leitura de que a sigla vive uma “crise de identidade”. Em três matérias publicadas neste sábado (6), o jornal confirma que, de fato, ninguém se entende no ninho tucano e que as bicadas são mais sangrentas a cada dia que passa.

O primeiro texto, assinado por Erich Decat, explica o imbróglio. “Com dificuldades para impor a sua agenda mesmo diante de um governo federal enfraquecido, o PSDB vai renovar a sua Executiva Nacional no próximo mês buscando superar uma espécie de crise de identidade pela qual passa e estruturar um discurso para as eleições municipais de 2016. Embora comemorem a deterioração da imagem do governo Dilma e do PT, setores do PSDB admitem que ainda falta à legenda mecanismos para poder capitalizar a insatisfação dos eleitores. Internamente há também cobranças para se ‘decodificar’ o discurso dos tucanos e críticas à falta de uma postura mais clara em temas que envolvem o dia a dia da sociedade”.

Dissidências internas e críticas externas

Conforme aponta a reportagem, posições recentes da bancada federal foram alvo de críticas de tucanos históricos por contrariarem as antigas decisões do partido – principalmente o apoio ao fim da reeleição e à flexibilização do fator previdenciário, instituídos no governo de FHC. “Neste semestre, o PSDB também viveu momentos de dissidências interna e críticas externas ao decidir descartar a possibilidade de pedir o impeachment da presidente Dilma Rousseff. Após queda de braço entre integrantes da bancada na Câmara e a cúpula do partido, optou-se, a contragosto de parte dos deputados, por um pedido de ação penal contra Dilma por causa das chamadas pedaladas fiscais”.

O jornalista ouviu deputados federais e integrantes da executiva nacional da legenda. O chororô é intenso. Alguns criticam o “eleitoralismo” da sigla; outros apontam a ausência de formulação política; há também ataques à falta de democracia interna. Em síntese: o PSDB está sem rumo e sem projeto. Mas o Estadão evita explicitar uma das principais razões desta “crise de identidade”: a briga entre os caciques tucanos com vistas às eleições municipais de 2016 e, principalmente, ao pleito presidencial de 2018. Num dos trechos, o jornalista afirma apenas que “o atual presidente da sigla, senador Aécio Neves (MG), será reconduzido ao cargo em uma cúpula que será reforçada pela ala paulista”. As bicadas são sangrentas!

As farpas do grão-tucano FHC 

O jornal também abriu generoso espaço, novamente, para FHC – que até parece o presidente de honra da mídia privada. Na longa entrevista, o grão-tucano solta umas farpas contra a bancada federal, que o apunhalou pelas costas. Ele criticou os votos pelo fim da reeleição e contra o fator previdenciário, duas criações do seu reinado. “Eu continuo favorável à reeleição e não creio que o tempo de experiência tenha sido suficiente para invalidá-la... Acabar com o fator agrava a situação fiscal e, a médio prazo, o custo disso cairá no bolso do povo. O PSDB votar como votou abala seu prestígio, embora em camadas de menor peso eleitoral”.

O “príncipe da Sorbonne” ainda teoriza sobre os dilemas da sua criatura. “A imagem de um PSDB desunido aparece toda vez que estamos próximos a uma disputa eleitoral ou quando há ansiedade diante de grandes impasses... Como a maioria dos partidos, o PSDB, embora tenha uma postura reconhecida – que os adversários acusam de ser elitista, quando na verdade é, como se diz agora, ‘republicana’ –, não possui unidade, digamos, ideológica... É compreensível que haja hesitação: votar contra tudo que vem do governo ‘do PT’, como este fez quando éramos governo, ou manter a coerência? Para mim não há dúvidas: é manter a coerência, denunciando, ao mesmo tempo, o oportunismo do PT”.

"Brasilianista" dá conselhos de Washington

Por último, o Estadão ainda abre suas páginas para um “brasilianista”, o pesquisador estadunidense Peter Hakim, presidente emérito do instituto “Inter-American Dialogue”, sediado em Washington, definir quais seriam as tarefas do PSDB – algo bem característico de um jornal colonizado. Na entrevista, ele adverte o tucanato par evitar aventuras imediatistas. “O impeachment irá danificar o PT, mas provavelmente não vai beneficiar muito o PSDB. Sob praticamente qualquer cenário que imagino, o PMDB será o principal beneficiário de um impeachment”, alerta. Para ele, o PSDB deve manter a coerência com os seus princípios “e evitar perseguir ganhos táticos imediatos”.

“Não há nenhuma boa razão para o PSDB mudar a sua agenda básica. O melhor caminho para Aécio é ficar com o programa que lhe trouxe 48% dos votos. O PSDB perdeu quatro eleições consecutivas, mas os princípios básicos e a moderação do PSDB estão ganhando mais força, como resultado do progresso que o Brasil fez em direção a uma sociedade de classe média pagadora de impostos e das falhas claras do PT. Seria um erro para Aécio mudar de rumo radicalmente. O PT danificou a própria imagem, os manifestantes de 2013 e deste ano foram para as ruas por causa de erros do PT e seu fraco desempenho, não por causa de campanhas anti-PT feitas pelo PSDB”, conclui o “brasilianista” descaradamente tucano. Os conselhos do estadunidense confirmam a crise de identidade do PSDB.

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