O presidente russo, Vladimir Putin, com a presidenta do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), Dilma Rousseff. Foto: |
A 16ª Cúpula do Brics, que se realizará em Kazan, Rússia, entre 22 e 24 de outubro, apresenta-se como um fato geopolítico de grande importância. A Rússia, em plena guerra maquinada pela Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), o braço armado do imperialismo comandado pelos Estados Unidos, anuncia a previsão de participação de mais trinta países.
Dos dez membros do bloco, oito serão representados presencialmente por chefes de Estado. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva cancelou de última hora a ida ao evento, devido aos danos de um acidente doméstico que sofreu, mas participará da reunião por videoconferência . De início já se tem o primeiro significado da Cúpula: retratar o fracasso da tentativa estadunidense de isolar Moscou.
Será a primeira reunião com a participação de Egito, Irã, Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita e Etiópia, que se tornaram membros de pleno direito em 1º de janeiro de 2024, juntando-se à formação que se iniciou em 2006 com Brasil, Rússia, Índia e China, depois ampliada com a entrada da África do Sul, em 2011. A Argentina também faria parte em 2024, mas o presidente Javier Milei, de extrema-direita, oficializou a desistência de o país participar.
As economias dessas nações, com 45% da população mundial, superam as do G7, o grupo dos países mais industrializados, que apresentam tendências de queda do Produto Interno Bruto (PIB) – sobretudo alguns da União Europeia –, e já atinge 36,7% da economia global, com previsão de crescimento de 4,4% em média em 2024-2025.
De acordo com o vice-ministro da Administração Geral das Alfândegas da China, Wang Lingjun, citado pela agência de notícias russa Tass, o volume de negócios comerciais dos chineses com os países do Brics aumentou 5,1% em relação ao ano anterior entre janeiro e setembro e chegou a cerca de US$ 653 bilhões. Wang Lingjun disse que a cooperação no Brics é uma plataforma importante para países emergentes e em desenvolvimento.
Segundo o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, quase quarenta países demonstraram interesse em se juntar ao Brics, uma demonstração, entre outras, de que está surgindo uma ordem mundial multipolar. Na pauta da Cúpula de Kazan será examinado um novo tipo de vínculo com os Brics, os países parceiros, a partir de alguns critérios: defesa da reforma da ONU (inclusive do Conselho de Segurança); relações de amizade com os países membros; e não impor e nem apoiar sanções sem apoio do Conselho de Segurança.
A expansão dos Brics fortalece a possibilidade de projetos autônomos de desenvolvimento para os países que estão fora do chamado centro capitalista. Tem o potencial, ainda, de responder aos anseios dos povos pela paz e dos países pela cooperação em alternativa à militarização imperialista da Otan e suas consequências, a exemplo do conflito na Ucrânia e das brutais ações bélicas no Oriente Médio contra palestinos e libaneses. Além de ofensivas econômicas como a guerra tecnológica contra a China.
De acordo o secretário de Relações Exteriores do Brasil para Ásia e Pacífico, Eduardo Paes Saboia, a redução da dependência do dólar norte-americano tende a ser um dos pontos principais da pauta, assunto há tempo debatido entre representantes pelas finanças em países do Brics. O Brasil defende aumento de moedas nacionais no comércio entre seus membros.
A proposta cria um sistema alternativo à Sociedade de Telecomunicações Financeiras Mundial (Swift), utilizado pelos bancos para a troca de transferências internacionais, e assim reduzir a dependência do dólar no comércio entre os países do bloco. A proposta inclui o fortalecimento de instituições financeiras alternativas ao Fundo Monetário Internacional (FMI) e ao Banco Mundial, sob forte controle das potências capitalistas.
Dilma Roussef, presidenta do Novo Banco de Desenvolvimento do Brics, tem anunciado financiamento em moedas nacionais para as economias dos estados-membros. O presidente Lula disse, na última Cúpula dos Brics, na África do Sul, em 2023, que a criação de uma moeda para as transações comerciais e investimentos aumenta as “condições de pagamento e reduz nossas vulnerabilidades”.
Esse tema ecoou na sucessão presidencial dos Estados Unidos. O candidato republicano, Donald Trump, ameaça, caso vitorioso, taxar em 100% os produtos de países que adotem essa política de redução do uso do dólar. Mais uma evidência de que os Estados Unidos tentam, com guerra convencional ou comercial, além de outros componentes, conter ou reverter o declínio de sua hegemonia no sistema de poder mundial.
Outro aspecto de grande relevância é o crescimento da inovação, de acordo com Luis Fernandes, secretário executivo do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. Segundo ele, o Brasil precisa olhar para novas formas de parceria em ciência e tecnologia com países em desenvolvimento e estimular cooperações que expressem a realidade do mundo de hoje.
O Brasil, único país da América Latina nos Brics, presidirá o grupo em 2025. Fato relevante, posto que, objetivamente, confronta a política externa estadunidense de controle absoluto dos países das Américas. O peso do Brasil nessa configuração dos Brics foi retomado com o governo do presidente Lula. O governo da extrema-direita havia posto a autoridade externa do país ao rés do chão.
Num momento em que os campos políticos começam a se articularem para as eleições presidenciais de 2026, os êxitos na política externa são de grande importância. A constituição de um bloco de forças que sustente a ideia de um projeto de desenvolvimento nacional inserido nessa realidade multipolar que vai se impondo se apresenta como tarefa imediata.
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