Reproduzo artigo do professor Venício A. de Lima, publicado na Agência Carta Maior:
Qual o papel que a televisão e o cinema desempenham na formação do “gosto” cultural do brasileiro (a)? Perguntado de outra forma: quais as chances que uma criança nascida no Brasil – independente de sua origem de classe – tem de desenvolver “gosto”, por exemplo, por desenhos animados brasileiros ou por cinema brasileiro?
Para facilitar a reflexão: pense a mesma questão substituindo “criança nascida no Brasil” por “criança nascida nos Estados Unidos” ou por “criança nascida na França” e desenhos animados ou cinema, respectivamente, de produção “americana” ou francesa.
Como se formam os gostos culturais?
Como se formam, se desenvolvem e se consolidam os hábitos culturais, incluindo aqui os hábitos de assistir determinados canais e/ou programas de TV ou de ler determinadas revistas e/ou jornais?
Este é um fascinante campo da complexa sociologia do gosto e, por óbvio, não se pretende aqui, responder categoricamente a qualquer dessas questões. Elas, no entanto, são pertinentes e atuais em relação à conhecida e repetida falácia no argumento sobre a ausência da necessidade de qualquer forma de regulação da mídia tendo em vista que essa regulação já é feita cotidianamente pelo leitor/espectador/ouvinte que lê/vê/escuta aquilo que quer, podendo, a qualquer momento, simplesmente não ler/ver/escutar aquilo que não quiser ou não gostar.
Em recente debate sobre “controle social” da mídia, Sidnei Basile, vice-presidente de relações institucionais da Editora Abril e vice-presidente do Comitê de Liberdade de Imprensa da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) para o Brasil, afirmou:
“Ela (a mídia) precisa ter um controle. É o controle que o ouvinte, o telespectador, o leitor, o internauta fazem toda hora, é o melhor controle que existe. Você compra sua revista na banca, não gostou, está ruim, está mal feita, não compra mais. Esse controle social é perfeito e não precisa de outro”.
Deslocar a questão da regulação da mídia apenas para o gosto, além de reduzir toda a problemática da comunicação de massa a uma única dimensão – do “consumo” individual no mercado – ignora toda a complexa questão da formação social do gosto e do enorme papel que a própria mídia nela desempenha.
Além disso, o argumento pressupõe um mercado de mídia democratizado, onde estariam representadas a pluralidade e a diversidade da sociedade brasileira que, por óbvio, não existe. Ignora ainda o fato elementar de que não se pode gostar ou não gostar daquilo que não se conhece ou cujas chances de se conhecer são extremamente reduzidas?
A historiadora Amara Rocha (UFRJ), mostra no seu “Nas ondas da modernização: o rádio e a televisão no Brasil de 1950 a 1970” (Aeroplano/FAPESP, 2007), como a adoção do “trusteeship model”, entre nós, respondia a pressões de um programa do governo Roosevelt (1882-1945) cujo objetivo era “estabelecer as bases para as relações econômicas e culturais com a América Latina, priorizando o papel que a proximidade com o american way of life poderia significar para as mudanças consideradas necessárias à sociedade e à cultura dessa região”.
Como ignorar que o Estado brasileiro, ainda na década de 30 do século passado, priorizou a exploração dos serviços públicos de radiodifusão por empresas privadas e, a partir daí, se instalou na sociedade brasileira um modelo de exploração da mídia que trouxe com ele uma determinada visão de mundo que inclui o gosto e os hábitos culturais?
E a noção de serviço público?
Por outro lado, é preciso insistir que, se é verdade que a mídia impressa é uma iniciativa privada que está excluída de qualquer forma de licença e/ou regulação, e pode, por opção, ignorar suas responsabilidades sociais, o mesmo não se aplica ao serviço público de radiodifusão. Concessionários de rádio e televisão são prestadores de um serviço público que se obrigam a um contrato, por tempo determinado e sob prioridades e condições definidas em Lei.
Nunca é demais lembrar a célebre frase do juiz Byron White em sentença da Suprema Corte dos Estados Unidos: “É o direito dos telespectadores e ouvintes, não o direito dos radiodifusores, que é soberano”.
O “controle” do cidadão
De qualquer maneira, o vice presidente da SIP não deixa de ter sua dose de razão. A acentuada tendência de queda nas audiências e na leitura dos veículos da grande mídia tradicional, revelada nos últimos anos, não deixa dúvidas de “que o ouvinte, o telespectador, o leitor, o internauta” estão, de fato, exercendo o seu “controle”. A grande mídia vai aos poucos tendo que conviver com uma nova mídia, alternativa e interativa, e, em alguns casos, construída pelo sistema público.
Novos tempos. Nova mídia. Novos atores. Novos poderes. E muitos ainda acreditam nas falácias de seus próprios argumentos.
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Esse comentário de Basile é preocupante. Ainda mais num país onde o gosto pessoal é induzido pelos meios de comunicação. Onde as pesoas só conseguem gostar de algo que aparece na Televisão ou se conhecem alguém que gosta.
ResponderExcluirUm gosto que perde a cada ano seu refinamento, se tornando cada vez mais rasteiro e primitivo. Como se as pessoas achassem que não se deve utilizar o cérebro ou a sensibilidade na hora de se divertir.
Ter como "controle social" o simples "não consumir", é algo bastante conformista, acomodado.
A declaração de Sydney Basile é coerente com a função dele e com a de outros barões da mídia. Ele está tranquilo. Ele sabe que de qualquer maneira, muitos irão comprar os produtos que sua empresa produz. Nem que ele tenha que fazer "lavagem cerebral" para conseguir isso.
Publicação especial elaborada pelo Incra e disponibilizada nesta quinta-feira (4) traz o balanço das ações desenvolvidas pelo órgão de 2003 a 2009, período no qual mais de meio milhão de famílias de trabalhadores rurais foram assentadas em terras que equivalem a quase duas vezes o estado de São Paulo. O jornal traz dados que apontam o crescente investimento na qualificação dos assentamentos, além do aumento dos recursos orçamentários e ações de regularização fundiária realizadas pela autarquia nesses sete anos.
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