Reproduzo artigo de Marcelo Salles, publicado no blog "Escrevinhador":
Não há dúvidas de que o fato político mais importante na América Latina neste segundo semestre são as eleições gerais de outubro no Brasil. Ali será decidida a nova composição do Poderes Legislativo e Executivo em âmbito federal, além dos chefes dos governos estaduais e dos parlamentares para as assembléias legislativas.
O Brasil, por sua dimensão continental, seus quase 200 milhões de habitantes, além de possuir o maior PIB da região, seguramente é o maior responsável pela determinação dos rumos da região. Como disse o presidente venezuelano Hugo Chávez, quando recebeu a medalha Tiradentes, em 2007, na Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro: “Para onde for o Brasil vai a América Latina”.
No plano federal, são nove candidatos à presidência da República, sendo quatro com maior inserção social: Dilma, Serra, Marina e Plínio. A primeira tem o apoio do presidente Lula, cujo governo registra a maior aprovação popular de todos os tempos – entre 70% e 80%. Não à toa. Dezenas de milhões de pessoas saíram da miséria ou migraram para a chamada classe C, que alguns dizem ser a nova classe média. Dilma se apresenta como legítima sucessora do atual governo, que avançou em quase todas – senão em todas – as áreas na comparação com o governo anterior.
José Serra, candidato da direita brasileira (PSDB-DEM), representa a parcela mais conservadora da população. Esse grupo é o mais refratário às transformações sociais e não se conforma, por exemplo, com o maior acesso do povo aos aeroportos. No plano externo, Serra representa o alinhamento servil às grandes potências, em oposição à integração Sul-Sul e à política externa multipolar implementada ao longo do governo Lula. Por isso Serra ataca países vizinhos como Bolívia e Venezuela, que geograficamente são fundamentais para o desenvolvimento da região.
Marina Silva (PV) se apresenta envolta na bandeira verde, uma pauta que vem sendo crescendo no cenário internacional. Apesar de seu histórico de vida – mulher negra, lutadora, criada na floresta – ainda não conseguiu convencer a maior parte do povo brasileiro, para quem as áreas mais emergenciais continuam sendo saúde, educação e segurança pública, conforme mostram diversas pesquisas.
Plínio de Arruda Sampaio, 80 anos, luta pelo Brasil desde o governo João Goulart. Especialista em reforma agrária, o socialista foi fundador do PT e agora concorre pelo PSOL. O partido, em tese, é o que mais reúne condições de apresentar uma proposta de governo mais à esquerda, o que forçaria o deslocamento do debate para esse lado.
As pesquisas de intenção de voto mostram Dilma com dez pontos à frente de Serra; Marina estagnada entre 7% e 10% e Plínio abaixo disso.
A centralidade da comunicação
Apesar das diferenças ideológicas entre os candidatos e os partidos políticos que representam, até agora nenhum deles apresentou um programa consistente para a comunicação.
A mídia, como sabemos, é a instituição com maior poder de produzir e reproduzir subjetividades. Ou seja, é ela a maior responsável pela determinação de formas de sentir, pensar e viver. Há outras instituições, como Família, Igreja, Forças Armadas e Universidade, mas só a mídia atravessa todas elas.
Além disso, basta olharmos para a América Latina e vamos ver que entre os países que mais avançaram socialmente estão também os que avançaram na democratização dos meios de comunicação. Venezuela, cuja política pode ser medida pelos investimentos na Telesur, que revolucionou a televisão latino-americana; a Bolívia, que impulsionou as rádios comunitárias e deu nova cara à emissora estatal; e a Argentina, que enfrentou o monopólio do grupo Clarin e aprovou uma legislação muito mais democrática para o setor.
Na área da comunicação, o governo Lula vive um paradoxo. Ao mesmo tempo em que pela primeira vez o Brasil ganhou uma TV Pública em escala nacional – a TV Brasil – e o Ministério da Cultura passou a premiar iniciativas de mídia livre, fato também inédito na nossa história – o país perdeu a chance proporcionada pela digitalização dos meios, o que poderia democratizar significativamente o setor com a entrada de sindicatos, universidades e movimentos sociais na transmissão do sinal aberto.
Essa é a pauta que falta ser discutida nessa campanha. Jornalões fecham ou perdem tiragem, sites e blogs crescem a cada ano, as mídias sociais pipocam e a Federação Nacional de Jornalistas acusa cerca de 20 mil profissionais desempregados. Não há lógica nisso. O que pretendem fazer os candidatos para incluir milhares de comunicadores formados num país que vive transformações profundas, inclusive na forma de se comunicar? Essa resposta nos dará uma boa indicação de como o Brasil vai se ver e como ele será nos próximos anos.
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