domingo, 12 de setembro de 2010

"Dez razões" de Luis Fernando Verissimo

Para encerrar em alto astral a noite de domingo, reproduzo a deliciosa crônica de Luis Fernando Verissimo, publicada no jornal O Globo:

Dez razões pelas quais o Eike Batista deveria me dar um milhão de dólares.

1 — Eu sou um cara legal.

2 — Ele não sentiria falta.

3 — Não aguento mais esses fraudulentos substitutos de caviar no mercado. Chegaram ao cúmulo de pintar sagu de preto e vender em potes como se viesse de esturjões do lado errado do Mar Cáspio, o que explicaria o preço baixo. Você só descobre o engodo quando vê que, no rótulo, "Cáspio" está com acento circunflexo. A doação do Eike me livraria desses métodos inescrupulosos e me permitiria, finalmente, ser fiel ao lema "Caviar: ou Beluga ou nada" que me acompanha desde a infância.

4 — Eu pararia de trabalhar, o que causaria enorme regozijo público, e me dedicaria à leitura de todos os livros que fui para ler depois, começando por "O elefantinho Dudu" e chegando, se desse tempo, à "Crítica da razão pura".

5 — Nós estaríamos colaborando, mesmo que modestamente, para a redistribuição de renda no país.

6 — Eu teria mais, digamos assim, estofo moral para convidar a Luana Piovani para um cruzeiro no Caribe num daqueles navios que têm até metrô para o transporte interno, as piscinas têm cascatas e o show principal é do Cirque du Soleil com participação especial do Frank Sinatra, trazido de volta, com grande custo, para mais uma despedida. Nossos camarotes seriam separados, mas sempre haveria a esperança de que, em caso de furacão, ela batesse freneticamente na minha porta.

7 — Eu abandonaria, definitivamente, todos os meus outros planos para depressa, como o de me transformar em médium de animais domésticos. A ideia era oferecer meus serviços a quem quisesse entrar em contato com cachorros ou gatos falecidos e transmitir suas mensagens do Além, cuidando apenas para latir e miar de forma convincente.

8 — Eu estaria sempre à disposição do Eike para escrever uma biografia elogiosa, melhorando passagens da sua vida e, inclusive, lhe dando outro primeiro nome.

9 — Nós poderíamos estar inaugurando uma prática regular, a de o Eike dar um milhão dos seus dólares todos os meses. Pra mim.

10 — Eu... Mas o que estou dizendo? É claro que isso nunca vai acontecer. E, mesmo (consolo), um milhão de dólares não é mais o que era. Não quero.

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