Reproduzo artigo de Venício Lima, publicado no Observatório da Imprensa:
O processo eleitoral e a indisfarçável partidarização revelada na cobertura jornalística dos principais veículos da grande mídia provocaram, nas últimas semanas, reações cada vez mais explícitas e contundentes por parte do próprio presidente da República. Por outro lado, o atual governo chegará ao seu término enfrentando uma hostilidade crescente por parte desses veículos. A virulência dos ataques de editoriais e colunistas contra o governo e o próprio presidente Lula encontram poucos e raros paralelos na história política brasileira.
A hostilidade entre alguns veículos e o governo é agora, mais do que antes, inegavelmente recíproca e pública.
Razões intrigantes
Nesse contexto, diante da proximidade das eleições e da provável vitória da candidata apoiada pelo atual governo – aos quais esses veículos fazem oposição explícita – é inevitável que surjam questões que não só busquem compreender o que vem acontecendo no processo eleitoral, mas, sobretudo, questões prospectivas de como poderão ser as relações da grande mídia com o próximo governo.
Uma questão, em particular, desafia o senso comum: afinal, quais razões teriam levado os principais grupos da grande mídia a fazer oposição sistemática a um governo que continua a contar com maciço apoio popular?
Um observador da mídia que não tem acesso a informações dos bastidores do poder – nem propriamente político, nem midiático – por óbvio, também não tem como responder a essa pergunta. Todavia, é intrigante a constatação do que está a ocorrer.
No Brasil, ao contrário do que acontece em alguns países da América Latina, os oito anos de governo Lula não representaram a mais remota ameaça à grande mídia. Em nossos vizinhos, apesar da oposição de grupos dominantes de mídia, foram democraticamente eleitos governos que tomaram a iniciativa de rever e/ou propor nova regulação para o setor de comunicações, desafiando interesses historicamente enraizados. Aqui nada disso ocorreu.
A grande mídia nativa não foi objeto de qualquer regulação ou saiu derrotada de qualquer disputa em relação às políticas públicas do setor de comunicações. Basta verificar que nos projetos (ou mesmo pré-projetos) e programas nos quais ela considerou estarem seus interesses ameaçados, houve recuo do governo Lula e/ou os projetos não lograram aprovação no Congresso Nacional.
Exemplos: a criação do Conselho Federal de Jornalismo (em 2004); a transformação da Ancine em Ancinav (em 2005); a criação das RTVIs (em 2005); a guinada em relação ao modelo de TV Digital (de 2003 para 2006); a nova regulação das rádios comunitárias que apesar de recomendações geradas em dois grupos de trabalho não saiu do papel (2003 e 2005); a regulação da TV paga através do PL 29 (2007) que até hoje tramita no Congresso Nacional; o recuo nas propostas relativas ao direito à comunicação constantes da terceira versão do Plano Nacional de Direitos Humanos (2009); o anunciado projeto de uma Lei Geral de Comunicação de Massa que nunca se materializou; etc. etc.
A única medida de política pública – aliás, prevista no artigo 223 da Constituição de 1988 – que logrou ser implementada pelo governo Lula foi a criação de uma empresa pública de comunicação, a EBC (Empresa Brasil de Comunicação), que, embora ridicularizada pela grande mídia, é complementar a ela e não representa qualquer ameaça.
Por outro lado, a realização da 1ª Conferência Nacional de Comunicação, em dezembro de 2009 – que tem efeitos apenas propositivos –, foi não só boicotada como satanizada nos principais veículos de comunicação do país.
O que teria provocado, então, tamanha hostilidade dos grupos dominantes de mídia?
Vivemos em plena liberdade da imprensa. O governo não deixou de aplicar vultosos recursos em publicidade oficial paga destinada exatamente à grande mídia. Apesar disso, além da oposição política publicamente admitida inclusive pela presidente da ANJ, a grande mídia insiste em anunciar que o atual governo constitui uma permanente ameaça à liberdade de expressão e que o seu partido padece de uma obsessão autoritária e stalinista de controlar a imprensa.
Outras questões
Diante de tamanho enigma, outras questões igualmente inquietantes carecem também de resposta.
Qual será o comportamento desses veículos depois das eleições? Que tipo de relação é possível se construir entre eles e o novo governo, especialmente se for eleita a candidata que enfrentou sua oposição sistemática? Que comportamento esperam esses veículos do novo governo?
E mais: o que acontecerá com a credibilidade de veículos de mídia que (1) praticam "jornalismo investigativo" seletivo, em relação apenas a uma das candidaturas e (2) transformam suspeitas e denúncias em "escândalos políticos midiáticos, mas raramente a Justiça consegue estabelecer a veracidade das acusações?
Levando-se em conta o que está acontecendo, não só na América Latina, mas, inclusive, no processo eleitoral em curso para as eleições legislativas nos Estados Unidos, é ainda de se perguntar: a quem interessa a radicalização do processo político?
As razões verdadeiras não são fáceis de ser detectadas. Talvez seja mesmo, como se diz na conhecida fábula, "da natureza do escorpião".
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Descrédito
ResponderExcluirA estabilidade das pesquisas de intenção de voto representa uma desmoralização inédita dos veículos de comunicação tradicionais. Nem mesmo seu público fiel, muito mais numeroso do que pensam os oposicionistas, se deixa enganar pela campanha difamatória contra Dilma Rousseff. Mas isso não acontece (apenas) por desinformação ou tolerância com a ilegalidade. O fato é que cidadão deixou de acreditar na imprensa.
Também pudera. Inventaram os dólares cubanos, o governo assassino, o grampo no STF, a ficha policial de Dilma, o Lula sodomita e o partido ligado ao narcotráfico, e agora querem que alguém leve a sério suas denúncias envolvendo lobbies e nepotismo em plena capital federal, surgidas milagrosamente a semanas do pleito. Não bastasse tamanha cara-de-pau, sempre que o PT e o governo apontam incoerências nos ataques, é acusado de planejar um dossiê ou uma cartilha stalinista.
Os poucos patriotas que de fato querem investigar alguma coisa exigem que “blogueiros progressistas” façam penitências públicas diante dos escândalos. Pois inverto o ônus da moralidade exemplar. Vamos realmente apurar lobbies e nepotismo no Congresso? E na Assembléia de São Paulo? Olha, para não encarecer a viagem podemos ficar na prefeitura paulistana mesmo. Agora que adquirimos uma nova noção de “fonte confiável”, que tal voltarmos aos irmãos Vedoin e ouvir o que têm a dizer sobre as ligações de José Serra com a máfia das ambulâncias?
Essa onda moralizante é hipócrita e oportunista, movida pelo único objetivo de empurrar a definição presidencial para o segundo turno. Ainda que as denúncias fossem verdadeiras, a imprensa corporativa não possui o menor resquício de credibilidade para atuar como porta-voz dos interesses republicanos. O desespero dos analistas perante a indiferença generalizada ilustra suficientemente suas verdadeiras intenções.
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