Reproduzo artigo de Wanderley Caixe, publicado no blog Escrevinhador:
Nunca é ético tripudiar sobre o vencido. Nas vitórias, recomenda-se uma certa condescendência com quem perdeu. Por isso, para aqueles de coração aberto, ofereço aqui algumas sugestões de votos de solidariedade para com os derrotados, neste momento em que estão lambendo suas feridas.
Em primeiro lugar, pode-se escolher a solidariedade com o tucano vencido, porque é fácil imaginar a dor de cabeça que o forte impacto de uma bolinha de papel lhe deve ter causado, moral e fisicamente; ou o arrependimento que deve estar sentindo por não ter deixado a outro (um mineiro, talvez) a ingrata missão de opor-se a um projeto de aprovação popular.
A solidaridade ao candidato pode e deve estender-se a muita gente próxima a ele, que deve ter passado noites insones, ao longo do período eleitoral, imaginando a candidata vencedora a executar criancinhas em praça pública, em cerimônias de aborto coletivo…
Igualmente humanitária seria a posição de solidariedade que se dirigisse para os políticos vencidos na derrota dos tucanos. Ela poderia destinar-se, por exemplo, a uma série de ex-senadores (tucanos ou agregados), a maioria deles do Norte ou Nordeste, caciques que, de repente, se descobriram sem tribos, e que, até agora, não devem estar entendendo como conseguiram perder as eleições depois de tentar destruir, sem tréguas, a figura de um presidente com 82% de aplauso do povo.
Um voto especial, nesse âmbito, pode ir, seguramente, para o Sr. César Maia, que, na voz das urnas, encontrou ressonância equivalente às vozes que vemos diuturnamente ecoar na “Cidade da Música”, elefante branco que marcou a sua gestão na Prefeitura carioca…
Outra que merece essa mão estendida é a mídia corporativa desse país, esse poderosíssimo poder de fazer cabeças, mas injustamente não levada em consideração no pleito presidencial pela maioria dos eleitores, apesar dos esforços éticos e aéticos, factuais ou ficcionais, que levou a efeito para tentar eleger o candidato que perdeu.
E, nesse caso específico, a solidariedade deve abranger os valentes profissionais que compõem essa mídia, entre eles alguns comentaristas políticos e economistas de nomeada ”especialistas”, que devem até agora estar se interrogando sobre como, onde e por quê erraram, já que fizeram certinho o dever de casa (ou melhor, o dever “da casa” onde trabalham)… Deve ser horrível fazer jornalismo em um país em que as pessoas se atrevem a ter juízo próprio…
Por falar nisso, não se deve esquecer uma possível solidariedade aos leitores que escrevem cartas nessas publicações midiáticas – em sua esmagadora maioria, legitimos representantes de uma elite que, raivosa, a julgar pela forma como se manifesta, tem imensa dificuldade em conviver bem com a melhor repartição do pão que sobra em fartas mesas, com o maior movimento de gente nos aeroportos, com a maior presença de “estranhos” nas universidades, enfim, com a felicidade melhor distribuída…Imagino como estejam tristes pelo fato de não ter sido ainda desta vez que se reinstaurou entre nós o nirvana dos privilegiados…
Também há a possibilidade de se ser solidário a algumas entidades religiosas (instituições ou seitas, não importa)que, não se pode negar, cumpriram direitinho – embora sem êxito, no final das contas (que pena!) - o seu papel de aterrorizar os eleitores com assuntos que não deveriam ter composto o cardápio eleitoral. Um destaque especial pode ser conferido ao Papa, que fez todo o esforço possível para que o obscurantismo prevalecesse, mas que não encontrou, entre os seus fiéis, tanta devoção à causa quanto julgava, apesar das recomendadas lavagens cerebrais eclesiásticas.
Há ainda a solidariedade aos verdes – cuja “onda”, afinal de contas, acabou por não gerar mais que uns gatos pingados no Congresso - e aos de outras colorações que, por não terem uma posição firmada sobre coisa alguma, encontraram grande dificuldade para se manterem em cima de muros, em posição desconfortável que, quem sabe, ainda lhes poderá trazer, no futuro, outros problemas de desvio na coluna ideológica. Aqui excluo, em nome da verdade, o Sr Fernando Gabeira, que, embora verde, jamais se omitiu e deixou claríssima sua posição de aproximação retrógrada com a turma da direita
Pode ser que, tocados por essa onda de solidariedade, alguns desses derrotados venham a experimentar uma crise de consciência ou uma correção de rumos. Não sou muito otimista quanto a isso. A julgar pelo tom da “saudação” do candidato derrotado no discurso que se seguiu à proclamação dos resultados, penso que Dilma e as forças vitoriosas não devem desprezar as potencialidades venenosamente vingativas desse pessoal. E devem, desde já, prevenir-se com o antídoto infalível – porque já testado e comprovado – da continuidade dos projetos de redenção social como tônica do governo.
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