sexta-feira, 6 de maio de 2011

PSDB/DEM: modelo para repetir derrotas

Ilustração: Kalvellido
Reproduzo artigo de Maria Inês Nassif, publicado no blog de Luis Nassif:

A oposição aos governos petistas caiu no conto de seu próprio discurso. Daí a grande dificuldade de sobreviver a três derrotas sucessivas em eleições para a Presidência da República. A desintegração do PSDB e do DEM, os dois partidos mais fortes da aliança antipetista nos dois governos de Luiz Inácio Lula da Silva, e o amiudamento do PPS, que pegou carona em um projeto que pouco tinha a ver com a sua história, resultam também numa aposta em conceitos liberais como o fim da luta de classes e uma política sem divergências ideológicas.


Num quadro onde supostamente a política está homogeneizada, a polarização com o projeto de poder hoje hegemônico foi tentada com base exclusivamente no discurso moral, que tentava opor o "bem", representado não pelo partido, mas por seu candidato, e o "mal", transformado em gente com a cara de Lula. Sem vida e organicidade internas, o PSDB, legenda mais forte da aliança oposicionista, foi levado a personificar a disputa política de forma muito mais acentuada que o próprio PT, que tinha Lula e seu carisma pessoal na linha de frente. Quando um partido abre mão de sua dinâmica interna para assumir o rosto de um único integrante, mesmo que seja o seu candidato a presidente da República, corre o risco de ir para o ralo quando o candidato é derrotado.

Apenas por isso, o PSDB já teria sua situação seriamente comprometida. Sem tradição de organicidade – e negando a utilidade de um liame ideológico ao longo de várias eleições, desde Fernando Henrique Cardoso –, dificilmente passaria incólume aos abalos de uma derrota presidencial. Mas, mais do que isso, o partido de Serra e Fernando Henrique Cardoso não dispõe de instrumentos internos para construir uma unidade que nunca teve. Uma certa uniformidade remonta a criação do partido, mas ela foi desfeita tão logo chegou ao poder, sob a pressão de uma onda ideológica liberal que tomava todo o mundo e ganhava inclusive governos relutantes, com a pressão dos organismos internacionais de crédito.

O partido não teve tempo de estabelecer ligações sólidas com a sociedade, exceto as relações de conveniência com mediadores junto à opinião pública e uma representação, que se tornou concreta, das elites econômicas, envaidecidas por levarem ao poder líderes formados nas academias. Na sua tenra idade, deu como suficientes uma base parlamentar grande, a cooptação de lideranças regionais tradicionais, com autonomia local, e uma forte centralização das decisões nacionais nas mãos de poucos líderes, conforme analisa o cientista político Celso Roma. Assim, o PSDB se consolidou sob o mandonismo regional, dos líderes locais, e o mandonismo nacional, levado a termo pelos cardeais do partido.

O PSDB vive os rachas da seção paulista, a mais importante para a equação de poder nacional do partido, como uma extensão dessa fragilidade de origem. E o comando do bloco governista pelo PSDB, no governo FHC, e oposicionista, nos anos Lula, acabaram contaminando também os dois partidos que foram mais fiéis a ele nos últimos dezesseis anos. O PFL, depois DEM, e o PPS, antes PCB, tinham uma organicidade maior que a do partido líder, mas acabaram se diluindo na mesma massa, dirigidos pelo comando pessoal dos candidatos tucanos – o vitorioso, FHC, ou os derrotados José Serra (duas vezes) e Geraldo Alckmin (uma vez).

Após a terceira derrota, o DEM se divide em dois e o PSDB racha em disputas internas. O mais curioso, todavia, é que o racha tucano acabará resultado numa continuidade de um modelo partidário que tem dificuldades de sobreviver na derrota. Internamente, está ocorrendo uma transferência de poder do núcleo paulista (representado por José Serra e Fernando Henrique Cardoso) para o pré-pré-candidato a presidente, senador Aécio Neves (apoiado pelo paulista Geraldo Alckmin), que muda o chefe, mas não o partido.

Serra está totalmente esvaziado; Fernando Henrique não conseguiu manter uma liderança de fato – presente e atuante – no partido, depois que deixou o poder, nem teve grande interesse nisso, exceto nos momentos em que o pragmatismo eleitoral do candidato do momento tentou esquecer os governos dele. O espaço passa a ser ocupado de forma quase absoluta pelo senador Aécio Neves, que pode assumir o comando do partido nas mesmas condições que os paulistas antes dele: capitalizando um apoio incondicional das elites por sua candidatura, contra o PT, na sociedade; e com comando pleno sobre o partido, internamente, a bem de um projeto político personalista. No final das contas, o PSDB caminha para repetir uma receita de organização que o levou ao quase nocaute nessas eleições. E que pode nocauteá-lo de vez se enfrentar mais uma derrota.

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