Por Rodrigo Vianna, no blog Escrevinhador:
Os títulos da dívida pública de Portugal foram rebaixados para a categoria “junk”. Em bom português (de aquém ou além-mar), não resta dúvida: a dívida portuguesa virou lixo!
O anúncio – feito pela Moody´s (uma daquelas agências de “classificação de risco” que se desmoralizaram ao deixar de prever os riscos no mercado de hipotecas dos EUA antes de 2008) – acrescenta mais um toque de dramaticidade à crise européia.
Portugal é um mercado pequeno. Assim como a Grécia e a Irlanda - que também passam por dificuldades gigantescas. Mas se a dívida desses países virar pó, a crise pode se expandir para Alemanha e França – já que bancos franceses e alemães detêm boa parte da dívida grega e portuguesa.
O desespero leva muita gente a pregar que Portugal e Grécia saiam agora do euro, e voltem a ter moeda própria. Moeda própria permitiria a esses países defenderem suas economias, favorecendo exportações e reativando a produção. Mas a dívida antiga, em euro, cresceria exponencialmente. A não que se pronuncie uma palavra que economistas bem comportados costumam evitar: calote!
O euro, ressalte-se, é moeda “sui generis”, é moeda sem Estado. É moeda “única” de estados múltiplos. Por isso, a crise nos pequenos Portugal e Grécia é uma crise européia. Sem falar na Espanha – economia bem maior, onde o desemprego avança para impressionantes 20%.
O tremor financeiro faz ressurgir o discurso nacionalista na Alemanha – país que segue a crescer em meio à turbulência. Na terra de Angela Merkel, conservadores já falam em criar uma nova zona do euro, mais enxuta, reunindo Alemanha, Áustria e países nórdicos. Um novo euro, o “euro forte”, ficaria restrito a esse pequeno grupo de países – que assim não se deixariam “contaminar” pela instabilidade que vem do sul. Nacionalismo e Alemanha são termos que costumam provocar arrepios quando aparecem juntos.
A crise do euro é, por isso, também uma crise política.
Qual a saída?
Gregos, portugueses e espanhóis já estão nas ruas a mostrar que a velha receita do FMI sofrerá oposição gigantesca. A própria decisão da Moody´s sinaliza que os pacotes sucessivos não surtirão efeito: FMI e União Européia oferecem recursos em troca de cortes no setor público. Cada pacote faz com que o “mercado” enxergue essas economias com mais desconfiança, cobrando um preço cada vez mais alto para refinanciar a dívida pública.
Portugal prometeu vender ativos, reduzir aposentadorias, cortar empregos públicos. Qual o resultado? A dívida virou lixo!
O caminho desses países pode ser o da Argentina. Calote!
A saída pode ser, pura e simplesmente, dizer aos credores: essa dívida é impagável, a economia sofrerá as consequências de qualquer jeito, então, antes de arrasar o que resta do Estado, vamos interromper a brincadeira agora”.
Se o calote não vier de forma mais ou menos “organizada”, ele virá cedo ou tarde – como onda a arrastar também os orgulhosos alemães e franceses.
A receita liberal ainda tenta se impor. Quem se contrapõe a ela? Forças ainda disformes, incertas, pouco articuladas.
As velhas legendas social-democratas se desmoralizaram ao virar sócias da receita liberal. A resistência ao desmonte, portanto, terá que vir de novas forças políticas.
É um momento novo, de alguma dramaticidade. Que faz ressurgir na Europa o fantasma do nacionalismo e da xenofobia. Mas que pode, por outro lado, ser a semente também de uma nova esquerda, forjada nas ruas.
Quem foi mesmo que falou no “fim da história”? Queria ver Fukuyama defender essa tese nas praças de Atenas, Lisboa ou Barcelona.
E como isso pode refletir no Brasil? Respostas, em parte, podem ser encontradas aqui, no ótimo artigo de Antônio Luiz M. C. Costa, na “CartaCapital”:
Se grandes bancos europeus ou norte-americanos quebrarem de repente e o crédito sumir, o governo brasileiro tem como evitar a propagação da desconfiança para os bancos e empresas nacionais? Se os grupos financeiros internacionais tiverem, de repente, de sacar aplicações nos países periféricos para fazer frente à crise de confiança interna, o Brasil terá instrumentos para evitar o caos cambial? As repostas a essas questões, mais que a exata dimensão dos gastos públicos ou os preparativos para a Copa do Mundo, é que vão definir o fracasso ou sucesso do governo e do próprio País até 2014.
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