Por Venício Lima, no sítio Carta Maior:
Os 10 anos dos atentados terroristas de 11 de setembro, nos Estados Unidos, constituem mais uma oportunidade para se refletir em torno do recurso à violência na ação política e sobre a centralidade da mídia no conturbado mundo contemporâneo.
Uma vasta literatura sobre terrorismo floresceu nos últimos anos. Não se trata, evidentemente, de fazer um balanço dela. O que interessa, em particular, é recuperar as lições já aprendidas sobre o terrorismo como forma de comunicação. E essa característica vale para os diferentes tipos de terrorismo, inclusive aquele ao qual, eventualmente, grupos de mídia se aliam de forma explícita ou não.
“Sem comunicação não haveria terrorismo”
Atribui-se a Marshall McLuhan a afirmação acima. De fato, existe consenso de que a divulgação, através da grande mídia, dos atos de terror constitui uma condição básica para sua própria existência. A violência terrorista tem como um de seus principais objetivos a transmissão de uma mensagem. Trata-se, portanto, de uma violência instrumental na medida em que seus executores pretendem que ela seja construtora de significações. A principal delas: o medo generalizado.
Ao disseminar o medo, o terror – na maioria das vezes – tenta identificar o conjunto da população como inimiga e, dessa forma, passa a “legitimar” qualquer tipo de ação violenta indiscriminada. De forma circular, quanto mais severas as medidas de repressão ao terrorismo adotadas pelo Estado, mais se tende a desrespeitar garantias de direitos e liberdades fundamentais e, muitas vezes, mais se legitima a própria ação terrorista.
Mas não é só o medo que o terror comunica. Os atos de terror servem como forma de manutenção da coesão interna, da moral e das motivações dos próprios grupos terroristas. Dirigem-se, dessa forma, também ao “público interno” além de facilitar o trabalho de recrutamento de novos membros.
Por tudo isso, atos de terror se transformaram em ações grandiosas e espetaculares que atraem a cobertura da grande mídia. Há autores, inclusive, que falam na existência de uma simbiose: se o terror precisa da mídia para divulgar sua mensagem de violência e medo, os terroristas proporcionam o espetáculo do qual a mídia comercial se alimenta.
Estratégia do medo
A estratégia do medo, por óbvio, não é um recurso exclusivo da violência terrorista. Ele tem sido utilizado também em nome do jornalismo. No intrigante artigo sobre o escândalo do tablóide “News of the World” - “O medo que não ousava dizer o nome” – o professor Timothy Garton Ash afirmou:
“a débâcle de Murdoch revela uma doença que vem obstruindo lentamente o coração do Estado britânico nos últimos 30 anos. (...) A causa fundamental dessa doença britânica tem sido o poder exacerbado, implacável e fora de controle da mídia; seu principal sintoma é o medo. (...) Se a medida final de poder relativo é “quem tem mais medo de quem”, então seria o caso de dizer que Murdoch foi – no sentido estrito, básico – mais poderoso que os últimos três premiês da Grã-Bretanha. Eles tinham mais medo dele do que ele deles” (cf. http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/inews-of-the-worldi-o-poder-do-medo)
Na Terra de Santa Cruz a constatação da existência de situações semelhantes em diferentes momentos da nossa história recente não chegaria a constituir surpresa.
Conseqüências e lições
A simbiose mencionada entre mídia e terror parece ter se manifestado de forma clara quando, após o 11 de setembro de 2001, os EUA dividiram o mundo entre o “bem” e o “mal” e iniciaram “missões do bem”. A violência da invasão militar de países considerados do “mal” passa, de certa forma, a “legitimar-se” por essa dicotomia mistificadora.
Ademais, a ação de violência do Estado pode, então, tornar-se, ela própria, uma prática terrorista. O Ato Patriótico do governo Bush institucionalizou uma forma de terrorismo admitindo, por exemplo, a tortura e a prisão sem julgamento, além de definir randomicamente alvos simbólicos.
Nesse contexto, aparece a figura do “embedded journalist”. Os jornalistas da grande mídia que quisessem cobrir a ação das tropas americanas na invasão do Iraque em 2003 seriam “incorporados” (embutidos) aos próprios batalhões de combate.
O “embedded journalist”, por óbvio, abdica de qualquer autonomia. Sujeita-se às contingências da própria operação militar e a cobertura “jornalística” passa a ser conduzida de “dentro” pelo comando da tropa. Aqui a mídia se incorpora à própria ação de violência do Estado e, de certa forma, com ela se confunde.
É indispensável que a grande mídia se dê conta de seu delicado papel nas sociedades contemporâneas e abrace de forma inequívoca o compromisso com a não violência e – por extensão – recuse qualquer prática que se valha da estratégia do medo.
Em relação à conduta frente a atos de violência terrorista – seja qual for a sua origem – o fundamental é praticar a não-violência ativa, pautada por princípios civilizatórios. Não há outra forma de evitar a cumplicidade.
Os 10 anos dos atentados terroristas de 11 de setembro, nos Estados Unidos, constituem mais uma oportunidade para se refletir em torno do recurso à violência na ação política e sobre a centralidade da mídia no conturbado mundo contemporâneo.
Uma vasta literatura sobre terrorismo floresceu nos últimos anos. Não se trata, evidentemente, de fazer um balanço dela. O que interessa, em particular, é recuperar as lições já aprendidas sobre o terrorismo como forma de comunicação. E essa característica vale para os diferentes tipos de terrorismo, inclusive aquele ao qual, eventualmente, grupos de mídia se aliam de forma explícita ou não.
“Sem comunicação não haveria terrorismo”
Atribui-se a Marshall McLuhan a afirmação acima. De fato, existe consenso de que a divulgação, através da grande mídia, dos atos de terror constitui uma condição básica para sua própria existência. A violência terrorista tem como um de seus principais objetivos a transmissão de uma mensagem. Trata-se, portanto, de uma violência instrumental na medida em que seus executores pretendem que ela seja construtora de significações. A principal delas: o medo generalizado.
Ao disseminar o medo, o terror – na maioria das vezes – tenta identificar o conjunto da população como inimiga e, dessa forma, passa a “legitimar” qualquer tipo de ação violenta indiscriminada. De forma circular, quanto mais severas as medidas de repressão ao terrorismo adotadas pelo Estado, mais se tende a desrespeitar garantias de direitos e liberdades fundamentais e, muitas vezes, mais se legitima a própria ação terrorista.
Mas não é só o medo que o terror comunica. Os atos de terror servem como forma de manutenção da coesão interna, da moral e das motivações dos próprios grupos terroristas. Dirigem-se, dessa forma, também ao “público interno” além de facilitar o trabalho de recrutamento de novos membros.
Por tudo isso, atos de terror se transformaram em ações grandiosas e espetaculares que atraem a cobertura da grande mídia. Há autores, inclusive, que falam na existência de uma simbiose: se o terror precisa da mídia para divulgar sua mensagem de violência e medo, os terroristas proporcionam o espetáculo do qual a mídia comercial se alimenta.
Estratégia do medo
A estratégia do medo, por óbvio, não é um recurso exclusivo da violência terrorista. Ele tem sido utilizado também em nome do jornalismo. No intrigante artigo sobre o escândalo do tablóide “News of the World” - “O medo que não ousava dizer o nome” – o professor Timothy Garton Ash afirmou:
“a débâcle de Murdoch revela uma doença que vem obstruindo lentamente o coração do Estado britânico nos últimos 30 anos. (...) A causa fundamental dessa doença britânica tem sido o poder exacerbado, implacável e fora de controle da mídia; seu principal sintoma é o medo. (...) Se a medida final de poder relativo é “quem tem mais medo de quem”, então seria o caso de dizer que Murdoch foi – no sentido estrito, básico – mais poderoso que os últimos três premiês da Grã-Bretanha. Eles tinham mais medo dele do que ele deles” (cf. http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/inews-of-the-worldi-o-poder-do-medo)
Na Terra de Santa Cruz a constatação da existência de situações semelhantes em diferentes momentos da nossa história recente não chegaria a constituir surpresa.
Conseqüências e lições
A simbiose mencionada entre mídia e terror parece ter se manifestado de forma clara quando, após o 11 de setembro de 2001, os EUA dividiram o mundo entre o “bem” e o “mal” e iniciaram “missões do bem”. A violência da invasão militar de países considerados do “mal” passa, de certa forma, a “legitimar-se” por essa dicotomia mistificadora.
Ademais, a ação de violência do Estado pode, então, tornar-se, ela própria, uma prática terrorista. O Ato Patriótico do governo Bush institucionalizou uma forma de terrorismo admitindo, por exemplo, a tortura e a prisão sem julgamento, além de definir randomicamente alvos simbólicos.
Nesse contexto, aparece a figura do “embedded journalist”. Os jornalistas da grande mídia que quisessem cobrir a ação das tropas americanas na invasão do Iraque em 2003 seriam “incorporados” (embutidos) aos próprios batalhões de combate.
O “embedded journalist”, por óbvio, abdica de qualquer autonomia. Sujeita-se às contingências da própria operação militar e a cobertura “jornalística” passa a ser conduzida de “dentro” pelo comando da tropa. Aqui a mídia se incorpora à própria ação de violência do Estado e, de certa forma, com ela se confunde.
É indispensável que a grande mídia se dê conta de seu delicado papel nas sociedades contemporâneas e abrace de forma inequívoca o compromisso com a não violência e – por extensão – recuse qualquer prática que se valha da estratégia do medo.
Em relação à conduta frente a atos de violência terrorista – seja qual for a sua origem – o fundamental é praticar a não-violência ativa, pautada por princípios civilizatórios. Não há outra forma de evitar a cumplicidade.
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