Por Antonio Martins, no sítio Outras Palavras:
Uma reviravolta de última hora, muito benvinda, evitou que o candidato de extrema-direita, — o ex-general Otto Pérez Molina — vencesse e levasse, ontem (11), as eleições presidenciais na Guatemala. Molina obteve 37% dos votos e foi o líder do primeiro turno. Porém, não conseguiu evitar uma segunda volta, marcada para 6 de novembro. Nela, enfrentará o empresário Manuel Baldizón, que obteve 23% de apoio.
No texto abaixo, o jornalista argentino Sérgio Ferrari, que escreve no Le Courier de Genebra e colabora com Outras Palavras, analisa os motivos do avanço ultra-conservador. Ele destaca que o aumento da violência é um dos combustíveis em que se apoia a extrema-direita. Entre 15 e 20 pessoas são assassinadas por dia, vítimas de violência ligada à delinquência, num país de 13 milhões de habitantes. A espiral de insegurança é alimentada, por sua vez, pelas políticas que têm produzido constante empobrecimento da população. Neste ambiente caótico, o general dirige-se a um eleitorado amedrontado e lhe promete proteção…
“Se o eleitorado teve energia pra rechaçar nas urnas, em 2003, a eleição do ex-ditador Efraín Rios Montt (reconvertido a pastor evangélico fundamentalista), poderia agora abrir as portas do governo a uma opção não menos militarista. A frágil democracia guatemalteca, concebida em sua versão atual logo depois das negociações de paz entre o poder e a guerrilha em dezembro de 1996, arrisca dar um passo atrás em sua lenta consolidação. E transita na contramão, em uma região que — salvo pela exceção hondurenha — afastou-se neste século de golpes e opções de ultradireita.
A ex-guerrilha da Frente Farabundo Marti de Libertação Nacional (FMLN) governa El Salvador. A Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) mantém o poder na Nicarágua e as pesquisas antecipam a quase certa vitória de Daniel Ortega na próxima disputa eleitoral, em 6 de novembro. Em Honduras, uma mobilização maciça conseguiu, em maio último, a volta ao país do ex-presidente exilado Manuel Zelaya, demonstrando que sem participação da Frente Nacional de Resistência Poular (FNRP), este país torna-se politicamente inviável (…).
Na Guatemala, a ultra-direita encarrega-se de gerar sensacionalismo em torno do importante tema da violência social. “Meu governo será de mão dura. Vou combater o crime organizado e toda a violência com o exército. Vamos conceber estratégias militares para erradicar a violência pela raiz”, enfatiza Pérez Molina em seus discursos. Apela, inclusive, para o restabelecimento de “forças-tarefa”, termo que designa, na região, uma tática militar empregada pelo exército contra a guerrilha na Guatemala e em outros países da América Latina durante as décadas de 1970 a 90, quando imperou a Doutrina de Segurança Nacional (…).
Em 26 de agosto último, cinco organizações e redes mundiais de prestígio, entre as quais a Via Campesina, FIAN (Organização Internacional pelo Direito à Alimentação), CIDSE (Agências Católicas de Desenvolvimento) e Aprodev (agência ligada ao Conselho Mundial de Igrejas) fizeram ouvir sua voz na própria Guatemala.
Publicaram um informe elaborado entre 2009 e 2010, por uma Missão Internacional que as mesmas redes haviam organizado. No documento, expressam enorme preocupação pela “crise alimentar prolongada que continua causando estragos na Guatemala” e o “clima de criminalização e perseguição das e dos defensores dos direitos humanos, especialmente aqueles que defendem os direitos econômicos, sociais, culturais e das mulheres”.
Os organismos internacionais dirigem 15 recomendações ao Estado e aos futuros governantes. São desde medidas para assegurar o desenvolvimento rural e social do país até a depuração da Polícia Nacional, passando pelo fortalecimento dos direitos trabalhistas, especialmente no campo. A tragédia é que com suas riquezas naturais a Guatemala poderia alimentar toda a América Central, e hoje vive uma penúria alimentícia que ameaça inclusive converter-se em fome.
Por trás desta contradição está o modelo econômico hegemônico: grandes extensões de terra cultiváveis entregues indiscriminadamente a transnacionais de minieração ou agro-combustíveis, o que atenta contra a produção indígena-camponesa local e condena estes setores sociais à marginalização.
Irresponsabilidade internacional
“Os governos, principalmente os europeus, as instituições internacionais e as ONGs de desenvolvimento têm uma grande responsabilidade em relação à Guatemala e América Central”, afirma Karl Heuberger, responsável pela ONG evangélica suíça HEKS-EPER para a América Central.
“Devem refletir sobre a necessidade de uma aliança real com os movimentos sociais e os povos indígenas, que continuam trabalhando e mobilizados. Reforçando sua atuação, reconhecendo suas reivindicações. Devem expressar vontade política clara e se coordenar melhor. Investem-se recursos financeiros, mas muitas vezes de forma tortuosa. É importante refletir por que um país rico como a Guatemala enfrenta fome e crise alimentar”.
Segundo cinco grandes organizações internacionais que visitaram o país centro-americano, a comunidade internacional deveria expressar de forma contundente, ao novo governo guatemalteco, “o papel fundamental que a garantia à alimentação e à proteção aos defensores dos direitos humanos têm para o funcionamento da democracia e as estratégias para o desenvolvimento bem-sucedidas”
Insistiram que “o Estado guatemalteco deve respeitar a Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas da ONU e a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho”. E revisar as políticas que estimule o investimento da produção de agro-cumbustíveis, a mineração e megaprojetos energético, para prevenir violações do direito à alimentação, à terra, à água e os direitos dos povos indígenas — insistem as cinco redes internacionais, entre as quais a Via Campesina.
Uma reviravolta de última hora, muito benvinda, evitou que o candidato de extrema-direita, — o ex-general Otto Pérez Molina — vencesse e levasse, ontem (11), as eleições presidenciais na Guatemala. Molina obteve 37% dos votos e foi o líder do primeiro turno. Porém, não conseguiu evitar uma segunda volta, marcada para 6 de novembro. Nela, enfrentará o empresário Manuel Baldizón, que obteve 23% de apoio.
No texto abaixo, o jornalista argentino Sérgio Ferrari, que escreve no Le Courier de Genebra e colabora com Outras Palavras, analisa os motivos do avanço ultra-conservador. Ele destaca que o aumento da violência é um dos combustíveis em que se apoia a extrema-direita. Entre 15 e 20 pessoas são assassinadas por dia, vítimas de violência ligada à delinquência, num país de 13 milhões de habitantes. A espiral de insegurança é alimentada, por sua vez, pelas políticas que têm produzido constante empobrecimento da população. Neste ambiente caótico, o general dirige-se a um eleitorado amedrontado e lhe promete proteção…
“Se o eleitorado teve energia pra rechaçar nas urnas, em 2003, a eleição do ex-ditador Efraín Rios Montt (reconvertido a pastor evangélico fundamentalista), poderia agora abrir as portas do governo a uma opção não menos militarista. A frágil democracia guatemalteca, concebida em sua versão atual logo depois das negociações de paz entre o poder e a guerrilha em dezembro de 1996, arrisca dar um passo atrás em sua lenta consolidação. E transita na contramão, em uma região que — salvo pela exceção hondurenha — afastou-se neste século de golpes e opções de ultradireita.
A ex-guerrilha da Frente Farabundo Marti de Libertação Nacional (FMLN) governa El Salvador. A Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) mantém o poder na Nicarágua e as pesquisas antecipam a quase certa vitória de Daniel Ortega na próxima disputa eleitoral, em 6 de novembro. Em Honduras, uma mobilização maciça conseguiu, em maio último, a volta ao país do ex-presidente exilado Manuel Zelaya, demonstrando que sem participação da Frente Nacional de Resistência Poular (FNRP), este país torna-se politicamente inviável (…).
Na Guatemala, a ultra-direita encarrega-se de gerar sensacionalismo em torno do importante tema da violência social. “Meu governo será de mão dura. Vou combater o crime organizado e toda a violência com o exército. Vamos conceber estratégias militares para erradicar a violência pela raiz”, enfatiza Pérez Molina em seus discursos. Apela, inclusive, para o restabelecimento de “forças-tarefa”, termo que designa, na região, uma tática militar empregada pelo exército contra a guerrilha na Guatemala e em outros países da América Latina durante as décadas de 1970 a 90, quando imperou a Doutrina de Segurança Nacional (…).
Em 26 de agosto último, cinco organizações e redes mundiais de prestígio, entre as quais a Via Campesina, FIAN (Organização Internacional pelo Direito à Alimentação), CIDSE (Agências Católicas de Desenvolvimento) e Aprodev (agência ligada ao Conselho Mundial de Igrejas) fizeram ouvir sua voz na própria Guatemala.
Publicaram um informe elaborado entre 2009 e 2010, por uma Missão Internacional que as mesmas redes haviam organizado. No documento, expressam enorme preocupação pela “crise alimentar prolongada que continua causando estragos na Guatemala” e o “clima de criminalização e perseguição das e dos defensores dos direitos humanos, especialmente aqueles que defendem os direitos econômicos, sociais, culturais e das mulheres”.
Os organismos internacionais dirigem 15 recomendações ao Estado e aos futuros governantes. São desde medidas para assegurar o desenvolvimento rural e social do país até a depuração da Polícia Nacional, passando pelo fortalecimento dos direitos trabalhistas, especialmente no campo. A tragédia é que com suas riquezas naturais a Guatemala poderia alimentar toda a América Central, e hoje vive uma penúria alimentícia que ameaça inclusive converter-se em fome.
Por trás desta contradição está o modelo econômico hegemônico: grandes extensões de terra cultiváveis entregues indiscriminadamente a transnacionais de minieração ou agro-combustíveis, o que atenta contra a produção indígena-camponesa local e condena estes setores sociais à marginalização.
Irresponsabilidade internacional
“Os governos, principalmente os europeus, as instituições internacionais e as ONGs de desenvolvimento têm uma grande responsabilidade em relação à Guatemala e América Central”, afirma Karl Heuberger, responsável pela ONG evangélica suíça HEKS-EPER para a América Central.
“Devem refletir sobre a necessidade de uma aliança real com os movimentos sociais e os povos indígenas, que continuam trabalhando e mobilizados. Reforçando sua atuação, reconhecendo suas reivindicações. Devem expressar vontade política clara e se coordenar melhor. Investem-se recursos financeiros, mas muitas vezes de forma tortuosa. É importante refletir por que um país rico como a Guatemala enfrenta fome e crise alimentar”.
Segundo cinco grandes organizações internacionais que visitaram o país centro-americano, a comunidade internacional deveria expressar de forma contundente, ao novo governo guatemalteco, “o papel fundamental que a garantia à alimentação e à proteção aos defensores dos direitos humanos têm para o funcionamento da democracia e as estratégias para o desenvolvimento bem-sucedidas”
Insistiram que “o Estado guatemalteco deve respeitar a Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas da ONU e a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho”. E revisar as políticas que estimule o investimento da produção de agro-cumbustíveis, a mineração e megaprojetos energético, para prevenir violações do direito à alimentação, à terra, à água e os direitos dos povos indígenas — insistem as cinco redes internacionais, entre as quais a Via Campesina.
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