Por Renata Mielli, no blog Janela sobre a Palavra:
Pode até não parecer, mas há um quê de filosofia embutida nesta pergunta aparentemente simples. Qual o limite da opinião, qual o futuro da humanidade na era da cibercomunicação, são questões para as quais ainda não se tem respostas – talvez nunca tenham.
Mas, para além da filosofia, há um debate político importante para ser enfrentado sobre o assunto, que foi alvo de uma audiência pública na Câmara dos Deputados, na tarde de ontem. Para debater a judicialização da censura, a Comissão de Direitos Humanos reuniu o professor Túlio Viana, o deputado federal Emiliano José (PT-BA) e esta blogueira.
O debate foi interessante mas, apenas tangenciou a discussão acerca do tema proposto, já que avançou para outras questões relativas a democratização da comunicação – o que mostra que, mais do que nunca, este é um tema que está na ordem do dia.
Então, aproveito para apresentar algumas considerações sobre a questão: Por que são processados os blogueiros? Filosofias e casos isolados à parte, os blogueiros são processados porque estão no epicentro de uma disputa pelo poder.
Quem é o mediador?
Até bem pouco tempo atrás, os meios de comunicação hegemônicos – rádio, televisão, grandes jornais e revistas – detinham o monopólio da mediação da esfera pública, o que lhes conferiu um alto grau de poder político e econômico. Alguns passaram a chamar a mídia de 4º poder, mas o apelido que pegou nos últimos tempos foi PIG – Partido da Imprensa Golpista.
O fato é que o surgimento das novas tecnologias da comunicação abalou, ainda que não se saiba medir em que grau, esse monopólio. A internet e sua arquitetura aberta, descentralizada e colaborativa permitiu o nascimento de milhares de novos atores sociais com a capacidade de produzir informação e opinião, criando o que até então não havia – o contraponto.
Blogs, microblogs, redes sociais e portais não vinculados à velha mídia deram voz aos que estavam calados e quebrou o monopólio da fala que estava concentrado numa elite política e econômica. E, isto, é disputa de poder.
Essa elite e seus veículos de comunicação não aceitam perder nem um naco do poder que lhes era exclusivo e estão utilizando de todos os expedientes para calar a “concorrência”.
Desqualificar e estrangular
A fórmula que estão usando é simples: desqualificação + estrangulamento econômico. No primeiro caso tentam marcar os blogueiros e ativistas digitais com o carimbo da falta de credibilidade e compromisso com a informação. Um emblema disso foi a campanha do site do Estadão produzindo pela agência Talent. Onde um macaco chamado de Bruno tinha um blog que servia como fonte para o trabalho de um estudante de economia. O comercial deu o que falar na época e foi tirado do ar.
Outro emblema dessa desqualificação foi o sobrenome que Serra deu aos blogueiros durante a campanha presidencial de 2010 – Sujos.
A outra via utilizada para tentar calar os blogueiros é a judicial, uma enxurrada de processos civis e criminais contra blogueiros, com a imposição de multas impagáveis tem pipocado em todo o país. São movidos, na maioria dos casos, por coronéis da política, por jornalistas, empresas de comunicação e pelo setor corporativo. Um dos casos que ganhou mais evidência foi o do blog Falha de S.Paulo, dos irmãos Mário e Lino Bochini.
Esse expediente da judicialização da censura não é exclusivo do Brasil. Nos Estados Unidos, em 2007, processos contra blogueiros movimentaram 17,4 milhões de dólares.
Dois pesos e duas medidas
Há os que dizem que, apesar da necessidade de se garantir a liberdade de expressão, não se pode vendar os olhos para o fato de que muitos blogueiros publicam conteúdos discriminatórios (racistas, homofóbicos e nazistas), inventam fatos que comprometem a honra de pessoas e empresas.
Bem, isso pode até ser verdade, mas não é o retrato da realidade da judicialização da censura. A maioria dos blogueiros não tem sido processada por veicular conteúdos criminosos, mas sim por estarem revelando informações que não eram divulgadas pela mídia hegemônica e, principalmente, por emitirem opinião e versão diversa dos pseudo-fatos publicados pela velha mídia.
Muito pelo contrário. Quem tem publicado conteúdos discriminatórios e que comprometem a honra das pessoas é a velha mídia. E o pior, o faz livremente. Emissoras de televisão, jornalões e revistas têm o direito de dizer o que quiser, sem revelar suas fontes, sem que qualquer apuração e fatos que sustentem suas notícias sejam apresentados à sociedade, infringindo a Constituição Federal que diz que o ônus da prova é de quem acusa.
Bem, mas essa velha mídia pode ser processada. Eu diria, poder até pode, mas o estrago que uma manchete de jornal ou uma notícia veiculada no jornal nacional provoca não tem processo que repare.
Um ambiente de direitos e não de proibição
A tentativa de cercear a liberdade de expressão da sociedade para que os velhos impérios midiáticos mantenham sua liberdade de empresa e o monopólio de mediação da esfera pública se dá pela judicialização da censura e pela articulação para que se aprovem leis restritivas para a internet, como no caso do AI 5 digital do senador Azeredo.
O debate sobre a internet não pode se dar a partir do que deve ser proibido e evitado na rede, mas sim dos direitos e liberdades que ela precisa garantir. Por isso é urgente a aprovação do Marco Civil da Internet e a discussão de um novo marco regulatório para as comunicações.
Compreender a fundo as transformações no ambiente da comunicação e na sociedade que a internet e as novas mídias estão produzindo é um desafio. Mas só o seu potencial mobilizador e questionador já são suficientes para incomodar os bastiões do status quo. Por isso, estão sendo processados os blogueiros.
Pode até não parecer, mas há um quê de filosofia embutida nesta pergunta aparentemente simples. Qual o limite da opinião, qual o futuro da humanidade na era da cibercomunicação, são questões para as quais ainda não se tem respostas – talvez nunca tenham.
Mas, para além da filosofia, há um debate político importante para ser enfrentado sobre o assunto, que foi alvo de uma audiência pública na Câmara dos Deputados, na tarde de ontem. Para debater a judicialização da censura, a Comissão de Direitos Humanos reuniu o professor Túlio Viana, o deputado federal Emiliano José (PT-BA) e esta blogueira.
O debate foi interessante mas, apenas tangenciou a discussão acerca do tema proposto, já que avançou para outras questões relativas a democratização da comunicação – o que mostra que, mais do que nunca, este é um tema que está na ordem do dia.
Então, aproveito para apresentar algumas considerações sobre a questão: Por que são processados os blogueiros? Filosofias e casos isolados à parte, os blogueiros são processados porque estão no epicentro de uma disputa pelo poder.
Quem é o mediador?
Até bem pouco tempo atrás, os meios de comunicação hegemônicos – rádio, televisão, grandes jornais e revistas – detinham o monopólio da mediação da esfera pública, o que lhes conferiu um alto grau de poder político e econômico. Alguns passaram a chamar a mídia de 4º poder, mas o apelido que pegou nos últimos tempos foi PIG – Partido da Imprensa Golpista.
O fato é que o surgimento das novas tecnologias da comunicação abalou, ainda que não se saiba medir em que grau, esse monopólio. A internet e sua arquitetura aberta, descentralizada e colaborativa permitiu o nascimento de milhares de novos atores sociais com a capacidade de produzir informação e opinião, criando o que até então não havia – o contraponto.
Blogs, microblogs, redes sociais e portais não vinculados à velha mídia deram voz aos que estavam calados e quebrou o monopólio da fala que estava concentrado numa elite política e econômica. E, isto, é disputa de poder.
Essa elite e seus veículos de comunicação não aceitam perder nem um naco do poder que lhes era exclusivo e estão utilizando de todos os expedientes para calar a “concorrência”.
Desqualificar e estrangular
A fórmula que estão usando é simples: desqualificação + estrangulamento econômico. No primeiro caso tentam marcar os blogueiros e ativistas digitais com o carimbo da falta de credibilidade e compromisso com a informação. Um emblema disso foi a campanha do site do Estadão produzindo pela agência Talent. Onde um macaco chamado de Bruno tinha um blog que servia como fonte para o trabalho de um estudante de economia. O comercial deu o que falar na época e foi tirado do ar.
Outro emblema dessa desqualificação foi o sobrenome que Serra deu aos blogueiros durante a campanha presidencial de 2010 – Sujos.
A outra via utilizada para tentar calar os blogueiros é a judicial, uma enxurrada de processos civis e criminais contra blogueiros, com a imposição de multas impagáveis tem pipocado em todo o país. São movidos, na maioria dos casos, por coronéis da política, por jornalistas, empresas de comunicação e pelo setor corporativo. Um dos casos que ganhou mais evidência foi o do blog Falha de S.Paulo, dos irmãos Mário e Lino Bochini.
Esse expediente da judicialização da censura não é exclusivo do Brasil. Nos Estados Unidos, em 2007, processos contra blogueiros movimentaram 17,4 milhões de dólares.
Dois pesos e duas medidas
Há os que dizem que, apesar da necessidade de se garantir a liberdade de expressão, não se pode vendar os olhos para o fato de que muitos blogueiros publicam conteúdos discriminatórios (racistas, homofóbicos e nazistas), inventam fatos que comprometem a honra de pessoas e empresas.
Bem, isso pode até ser verdade, mas não é o retrato da realidade da judicialização da censura. A maioria dos blogueiros não tem sido processada por veicular conteúdos criminosos, mas sim por estarem revelando informações que não eram divulgadas pela mídia hegemônica e, principalmente, por emitirem opinião e versão diversa dos pseudo-fatos publicados pela velha mídia.
Muito pelo contrário. Quem tem publicado conteúdos discriminatórios e que comprometem a honra das pessoas é a velha mídia. E o pior, o faz livremente. Emissoras de televisão, jornalões e revistas têm o direito de dizer o que quiser, sem revelar suas fontes, sem que qualquer apuração e fatos que sustentem suas notícias sejam apresentados à sociedade, infringindo a Constituição Federal que diz que o ônus da prova é de quem acusa.
Bem, mas essa velha mídia pode ser processada. Eu diria, poder até pode, mas o estrago que uma manchete de jornal ou uma notícia veiculada no jornal nacional provoca não tem processo que repare.
Um ambiente de direitos e não de proibição
A tentativa de cercear a liberdade de expressão da sociedade para que os velhos impérios midiáticos mantenham sua liberdade de empresa e o monopólio de mediação da esfera pública se dá pela judicialização da censura e pela articulação para que se aprovem leis restritivas para a internet, como no caso do AI 5 digital do senador Azeredo.
O debate sobre a internet não pode se dar a partir do que deve ser proibido e evitado na rede, mas sim dos direitos e liberdades que ela precisa garantir. Por isso é urgente a aprovação do Marco Civil da Internet e a discussão de um novo marco regulatório para as comunicações.
Compreender a fundo as transformações no ambiente da comunicação e na sociedade que a internet e as novas mídias estão produzindo é um desafio. Mas só o seu potencial mobilizador e questionador já são suficientes para incomodar os bastiões do status quo. Por isso, estão sendo processados os blogueiros.
Os Blogueiros Progressistas ("sujos") agora têm onde recorrer:
ResponderExcluirhttp://blogdosadvogadosprogressistas.blogspot.com/p/denuncie.html
Saudações Libertárias.
Há duas filosofias sobre a liberdade de expressão: (1) qualquer opinião é permitida, por mais preconceituosa ou ofensiva que seja, sem pena para o autor; ou (2) opiniões que certos grupos ou pessoas consideram ofensivas dão cadeia e/ou multa e/ou indenização. (Note que estamos falando de *opiniões*, mesmo crenças incorretas, mas não xingamentos, pareceres profissionais, publicidade, ou afirmações "factuais" que o autor sabe que não são verídicas).
ResponderExcluirNo Brasil, embora a constitução nominalmente garanta (1), a legislação criminal e a prática judiciária tendem a implementar (2). Além de opiniões proibidas (opiniões racistas, apologias de crime, etc.) são efetivamente proibidas opiniões que alguém pode considerar ofensivas contra sua "honra", com penas monetárias muito elevadas. E há campanhas para ampliar a lista de opiniões proibidas (como opiniões homofóbicas).
Parece que muitos blogueiros "sujos" preferem (2) na suposição que ajuda a combater racismo, homofobia, etc.. Mas essa alternativa é muito perigosa para esses mesmos blogueiros, pois é *a* arma que políticos, empresários, autoridades e grandes jornais podem usar para fechar blogs e "matar" financeiramente os autores. Basta convencer o juiz (como fez a F@lha) de que as opiniões do blogueiro são "ofensivas", e o blog é fechado por liminar mesmo sem ouvir o autor. Mesmo que a acusação seja descabida, o blogueiro raramente terá recursos e energia para questionar a liminar.
Além disso, uma vez que se admite a possibilidade de existirem opiniões "proibidas", nada impede que a lista seja ampliada ao capricho do Congresso criminalizando, por exemplo, opiniões denigratórias sobre governantes, parlamentares e juízes, sobre as forças armadas e a polícia, sobre a Petrobrás, sobre empresas, ...
Então, acho que todo blogueiro deveria, por interesse próprio, lutar para que seja adotada a interpretação (1) da liberdade de expressão. Entendo que não é fácil defender o direito de pessoas emitirem opiniões racistas, homófobas, etc.. Mas se cada um defender a liberdade apenas para si, negando-a aos outros, é muito provável que a liberdade venha a ser negada a todos.