sábado, 10 de março de 2012

Alemanha, o passado e o presente

Por Rui Paz, no sítio português O Diário:

Há mais de vinte anos que o grande capital alemão anda a rever a História, a criminalizar as vítimas da opressão nazi e as forças que mais lhe resistiram, como a URSS, os comunistas e o movimento operário. Durante 45 anos, a Alemanha Federal esteve sob controlo dos seus aliados militares. Os laços, que sempre ligaram o capital monopolista ao regime hitleriano, derrotado em 1945, estão bem visíveis não só nas dinastias de industriais e banqueiros que transitaram do nazismo para a República Federal mas também no elevado número de altos dirigentes do Estado que fizeram carreira em ambos os regimes. Recordar algumas dessas figuras mais significativas é importante para se compreender a nova vaga de ataques aos direitos do trabalhadores e de desrespeito pela soberania dos povos desencadeada por Berlim desde a chamada «unificação».

O primeiro presidente da República da Alemanha, Theodor Heuss, foi um dos deputados que a 23 de Março de 1933 votou no Reichstag a lei que deu a Hitler plenos poderes (Ermächtigunsgesetz). O seu sucessor será Heinrich Lübke, construtor de campos de concentração e de centros de trabalho escravo no III Reich. Após um curto interregno, seguir-se-ão Walter Schell e Karl Carstens, ambos antigos membros do partido de Hitler, o NSDAP. Kurt Georg Kiesinger, membro do partido nazi desde Fevereiro de 1933 será chanceler da Alemanha entre 1966 e 1969.

A subida de Hans Globke ao cargo de secretário de Estado da chancelaria de 1953 a 1963 veio demonstrar não haver limites para a recuperação de nazis pelo regime de Adenauer. Globke foi o comentador oficial das leis racistas de Nuremberga, cuja finalidade era a defesa da pureza do sangue e da superioridade da raça ariana. Enquanto nazis ocupavam cada vez mais importantes funções políticas, o governo de Bona ilegalizava em 1956 o Partido Comunista Alemão (KPD) e desencadeava uma nova vaga de perseguições contra os comunistas.

Um Estado como a Alemanha Federal, fundado sob a protecção militar da NATO por «democratas» que serviram um regime de terror, reflectirá forçosamente na sua doutrina e comportamento princípios avessos à igualdade de direitos e ao respeito pela soberania dos povos.

Se lançarmos um olhar muito breve sobre a Alemanha de hoje o que verificamos? Tribunais que proíbem greves, como aconteceu nestes dias com os controladores aéreos no aeroporto de Frankfurt. Serviços secretos que espionam ideologicamente milhares de cidadãos e registam em ficheiros as suas convicções políticas. Anticomunismo de Estado visando criminalizar as forças que procuram alternativas para o capitalismo e novos caminhos para uma sociedade mais justa e mais democrática. Promiscuidade entre os serviços secretos e organizações terroristas de extrema-direita, permitindo, durante mais de dez anos, o assassínio impune de estrangeiros e a prática de atentados racistas. Dois presidentes da República demitidos, no espaço de ano e meio, o primeiro por ter confirmado que as tropas alemãs no Afeganistão defendem os interesses económicos da Alemanha e o segundo, possuidor de uma infinidade de «amigos» empresários prestadores de tais favores que o Ministério Público se viu obrigado a intervir. Mas a surpresa não será menor face à decisão do «partido único europeu da Alemanha», constituído pela CDU, SPD, Liberais e Verdes, de escolher como candidato conjunto a presidente da República um pastor protestante, visceralmente anticomunista.

É nos momentos de crise do sistema capitalista que a verdadeira natureza reaccionária, obscurantista e de classe dos estados imperialistas se revela.

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