Por João Quartim de Moraes, no sítio Vermelho:
Esgarçados pela longa crise que explodiu em 2007, chafurdando na estagnação e no desemprego, os países que compõem o cartel da Otan têm se servido criminosamente da superioridade bélica que lhes conferem seus arsenais balísticos para manter pela força uma posição dominante no cenário internacional.
Os pretextos variam entre a mentira pura e simples (as “armas de destruição maciça” que o iraquiano Saddam Hussein teria acumulado), a retórica da cruzada (contra o “terrorismo”) e a hipocrisia explícita dos“humanitarian air strikes”. Todos sabiam que a Síria seria o próximo alvo e o Irã o alvo seguinte dos “serial killers” do Pentágono e tropas auxiliares. As mentiras “humanitárias” utilizadas contra a Síria são semelhantes às que prepararam os massacres balísticos anteriores, com pequenas adaptações “ad hoc”. Como nestes, a intoxicação mediática se intensifica num incessante fogo de barragem. A grande diferença relativamente às agressões imperialistas anteriores foi o veto da China e da Rússia ao ataque iminente dos valentões do Ocidente.
Para ajudar a romper a cadeia da mentira e oferecer informação objetiva sobre a situação do povo e do país, entrei em contato com Majed Nehmé, um dos mais respeitados intelectuais sírios da oposição de esquerda ao regime hoje dirigido por Bashar Al Assad. Radicado em Paris, onde dirige Afrique Asie, a mais importante publicação anti-imperialista em língua francesa, ele me transmitiu “La bataille pour la Syrie”, uma análise concreta e documentada que iria publicar logo em seguida, no número de março da revista. Contrastando com as ladainhas satanizantes dos papagaios de pirata empoleirados nas máquinas de guerra da Otan, o artigo oferece subsídios importantes para quem verdadeiramente quer se informar e opinar com algum conhecimento de causa. Segue a tradução de algumas passagens desse artigo, escrito, vale insistir, por um opositor de longa data:
“A crise síria, a mais grave que este país conheceu desde sua independência em 1943 e a evacuação das tropas estrangeiras em 1946, entra em seu segundo ano sem que possamos ver a saída. Contrariamente à Tunísia, ao Egito, à Líbia e ao Yemen, o poder sírio continua a enfrentar a tempestade sem ser arrastado por ela. Entretanto, os desafios que ele enfrenta são tremendos. Inicialmente, como nos demais países afetados pela esquematicamente chamada «primavera árabe», o regime foi sacudido por uma revolta popular pacífica. [...] Mas, face ao autismo das autoridades, a sua impotência em compreender a natureza do movimento, sua extrema brutalidade face a manifestações não violentas, sua demora excessiva em responder às aspirações legítimas da oposição política por reformas substanciais, uma parte desta oposição, particularmente a que recebia apoio do exterior, optou pela militarização do enfrentamento”.
Essa opção, segundo ele, foi fatal para o levante, antes de mais nada porque a relação de forças se inclina nitidamente a favor do poder estabelecido. “À parte aqueles que tinham desertado ou sido excluídos do poder antes da crise (notadamente Abdel Halim Khaddam ou Rifaat al-Assad), nenhuma outra defecção importante foi constatada até agora». Nas semanas seguintes, é verdade, fontes governamentais turcas alardearam deserções de alguns generais sírios. Mas na falta de mais precisas informações, não parece que estes tenham levado consigo trunfos decisivos.
Entrementes, os “comunicadores” e outros estafetas da máquina de propaganda imperialista, mantêm sua aguerrida ofensiva verbal. Não só os jornais d’aquém-mar (que em geral apenas traduzem mal as fontes metropolitanas), mas também e principalmente órgãos que já desfrutaram de prestígio internacional por certa seriedade jornalística, por exemplo Le Monde, alinham-se ostensivamente com os serviços de propaganda da Otan. No dia 2 de março, quando os combates em Homs atingiam máxima intensidade, o diário francês consagrou as quatro primeiras páginas a relatos e comentários de um facciosismo intelectualmente desonroso. Na primeira, uma grande foto com a legenda “Homs: uma cidade morre” e um editorial que descaradamente imputa a Bashar Al Assada responsabilidade pela “militarização” e pelo “sectarismo confessional” do confronto, quando todos sabem que foram justamente os bucaneiros da Otan, aliados com as forças mais obscurantistas do Islã (a começar pelo apoio de Reagan aos talibãs), que derrubaram regimes laicos e multiconfessionais no Afeganistão, no Iraque e na Líbia. Nas pp. 2 e 3, encontramos um jornalismo de maior qualidade, notadamente a reportagem intitulada “Damasco anuncia o começo da ofensiva sobre o bairro de Baba Hamro, em Homs”; já na p. 4, a entrevista com Abdderrazak Tlas, comandante de um destacamento do pretenso “Exército sírio livre”, armado até os dentes pelo governo feudal saudita e pelos serviços especiais do “Ocidente”, dá ao jornal ocasião de destilar sua costumeira duplicidade, derramando lágrimas protocolares sobre as vítimas da repressão ao levante, mas exibindo a fotografia do comandante e de sua impressionante metralhadora.
No final de março, Bashar Jafari, representante da Síria na ONU, dirigiu uma carta ao secretario geral Ban Ki-moon, declarando que até o dia 15 daqueles mês (um ano, portanto após o início do confronto), comandos terroristas tinham assassinado 3.211 civis, entre os quais 204 mulheres e 156 crianças, além de 478 policiais e 2.088 militares. Estes números estão sujeitos a confirmação tanto quanto aqueles fornecidos pelo “Exército sírio livre” (mas de rabo preso com os feudais árabes) e seus patrocinadores. Mas mostram que como na Líbia, e pelas mesmas razões a “primavera” na Síria está sendo de sangue.
Esgarçados pela longa crise que explodiu em 2007, chafurdando na estagnação e no desemprego, os países que compõem o cartel da Otan têm se servido criminosamente da superioridade bélica que lhes conferem seus arsenais balísticos para manter pela força uma posição dominante no cenário internacional.
Os pretextos variam entre a mentira pura e simples (as “armas de destruição maciça” que o iraquiano Saddam Hussein teria acumulado), a retórica da cruzada (contra o “terrorismo”) e a hipocrisia explícita dos“humanitarian air strikes”. Todos sabiam que a Síria seria o próximo alvo e o Irã o alvo seguinte dos “serial killers” do Pentágono e tropas auxiliares. As mentiras “humanitárias” utilizadas contra a Síria são semelhantes às que prepararam os massacres balísticos anteriores, com pequenas adaptações “ad hoc”. Como nestes, a intoxicação mediática se intensifica num incessante fogo de barragem. A grande diferença relativamente às agressões imperialistas anteriores foi o veto da China e da Rússia ao ataque iminente dos valentões do Ocidente.
Para ajudar a romper a cadeia da mentira e oferecer informação objetiva sobre a situação do povo e do país, entrei em contato com Majed Nehmé, um dos mais respeitados intelectuais sírios da oposição de esquerda ao regime hoje dirigido por Bashar Al Assad. Radicado em Paris, onde dirige Afrique Asie, a mais importante publicação anti-imperialista em língua francesa, ele me transmitiu “La bataille pour la Syrie”, uma análise concreta e documentada que iria publicar logo em seguida, no número de março da revista. Contrastando com as ladainhas satanizantes dos papagaios de pirata empoleirados nas máquinas de guerra da Otan, o artigo oferece subsídios importantes para quem verdadeiramente quer se informar e opinar com algum conhecimento de causa. Segue a tradução de algumas passagens desse artigo, escrito, vale insistir, por um opositor de longa data:
“A crise síria, a mais grave que este país conheceu desde sua independência em 1943 e a evacuação das tropas estrangeiras em 1946, entra em seu segundo ano sem que possamos ver a saída. Contrariamente à Tunísia, ao Egito, à Líbia e ao Yemen, o poder sírio continua a enfrentar a tempestade sem ser arrastado por ela. Entretanto, os desafios que ele enfrenta são tremendos. Inicialmente, como nos demais países afetados pela esquematicamente chamada «primavera árabe», o regime foi sacudido por uma revolta popular pacífica. [...] Mas, face ao autismo das autoridades, a sua impotência em compreender a natureza do movimento, sua extrema brutalidade face a manifestações não violentas, sua demora excessiva em responder às aspirações legítimas da oposição política por reformas substanciais, uma parte desta oposição, particularmente a que recebia apoio do exterior, optou pela militarização do enfrentamento”.
Essa opção, segundo ele, foi fatal para o levante, antes de mais nada porque a relação de forças se inclina nitidamente a favor do poder estabelecido. “À parte aqueles que tinham desertado ou sido excluídos do poder antes da crise (notadamente Abdel Halim Khaddam ou Rifaat al-Assad), nenhuma outra defecção importante foi constatada até agora». Nas semanas seguintes, é verdade, fontes governamentais turcas alardearam deserções de alguns generais sírios. Mas na falta de mais precisas informações, não parece que estes tenham levado consigo trunfos decisivos.
Entrementes, os “comunicadores” e outros estafetas da máquina de propaganda imperialista, mantêm sua aguerrida ofensiva verbal. Não só os jornais d’aquém-mar (que em geral apenas traduzem mal as fontes metropolitanas), mas também e principalmente órgãos que já desfrutaram de prestígio internacional por certa seriedade jornalística, por exemplo Le Monde, alinham-se ostensivamente com os serviços de propaganda da Otan. No dia 2 de março, quando os combates em Homs atingiam máxima intensidade, o diário francês consagrou as quatro primeiras páginas a relatos e comentários de um facciosismo intelectualmente desonroso. Na primeira, uma grande foto com a legenda “Homs: uma cidade morre” e um editorial que descaradamente imputa a Bashar Al Assada responsabilidade pela “militarização” e pelo “sectarismo confessional” do confronto, quando todos sabem que foram justamente os bucaneiros da Otan, aliados com as forças mais obscurantistas do Islã (a começar pelo apoio de Reagan aos talibãs), que derrubaram regimes laicos e multiconfessionais no Afeganistão, no Iraque e na Líbia. Nas pp. 2 e 3, encontramos um jornalismo de maior qualidade, notadamente a reportagem intitulada “Damasco anuncia o começo da ofensiva sobre o bairro de Baba Hamro, em Homs”; já na p. 4, a entrevista com Abdderrazak Tlas, comandante de um destacamento do pretenso “Exército sírio livre”, armado até os dentes pelo governo feudal saudita e pelos serviços especiais do “Ocidente”, dá ao jornal ocasião de destilar sua costumeira duplicidade, derramando lágrimas protocolares sobre as vítimas da repressão ao levante, mas exibindo a fotografia do comandante e de sua impressionante metralhadora.
No final de março, Bashar Jafari, representante da Síria na ONU, dirigiu uma carta ao secretario geral Ban Ki-moon, declarando que até o dia 15 daqueles mês (um ano, portanto após o início do confronto), comandos terroristas tinham assassinado 3.211 civis, entre os quais 204 mulheres e 156 crianças, além de 478 policiais e 2.088 militares. Estes números estão sujeitos a confirmação tanto quanto aqueles fornecidos pelo “Exército sírio livre” (mas de rabo preso com os feudais árabes) e seus patrocinadores. Mas mostram que como na Líbia, e pelas mesmas razões a “primavera” na Síria está sendo de sangue.
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