Por Vivian Fernandes, no sítio da Radioagência NP:
A história parece familiar: grandes grupos de comunicação que possuem jornais, canais de televisão e rádio, exercem um domínio sobre toda a informação que circula no país. Esse é o cenário do Brasil, Colômbia, Peru e, até bem pouco tempo atrás, era também o da Venezuela. O país vem, nos últimos anos, deixando mais plural a sua mídia.
Até 1998, ano da eleição que tornou Hugo Chávez presidente, existiam na Venezuela 331 concessões privadas de rádio e televisão, 11 canais de radiodifusão públicos e nenhum comunitário. Ao longo de mais de uma década de governo, todos os setores tiveram aumento. No final de 2011, o país possuía 473 televisões e rádios privadas, 83 meios públicos e 244 canais comunitários. Os dados são da Comissão Nacional de Telecomunicações (Conatel).
A democratização da mídia e a pluralidade da informação foram propostas assumidas por Chávez, como observa o professor de Estudos Culturais e Mídia da Universidade Federal Fluminense (UFF), Dênis de Moraes.
“Com o processo de profundas transformações que estão acontecendo desde então na Venezuela, o Estado voltou a ter um papel protagônico. O governo Chávez tem desenvolvido uma série de ações e mudanças regulatórias para tentar progressivamente democratizar o sistema de comunicação. E se esse objetivo é muito ambicioso, pelo menos aumentar significativamente as margens de diversidade informativa e cultural.”
Mídia e golpe
Um momento de ruptura de projeto de comunicação ocorre em abril de 2002, quando a Rede Caracas de Televisão (RCTV) participa da tentativa de golpe de Estado. Nesse momento, uma relação que era estável, entre governo e grande mídia, passou para um conflito declarado, como relata o jornalista e historiador, Gilberto Maringoni, que esteve no país e acompanhou o pós-golpe.
“Os meios de comunicação não só comemoraram o golpe, mas logo depois da queda e da volta do Chávez continuaram uma campanha de desgaste, de desqualificação em toda a grade de programação. Eu vi naquela situação um clima extremamente hostil e beligerante por parte da mídia.”
O descolamento entre a realidade vivida pela população e o que a mídia exibia foi o que mais surpreendeu Maringoni.
“A vida das pessoas começou paulatinamente a melhorar, ao mesmo tempo em que a mídia acentuava os seus ataques. A pessoa vê que sua vida está mudando e percebe que tem algum problema em quem ataca tanto o presidente. Esse descolamento é que ficou evidente no golpe, porque a população três dias depois da queda do Chávez foi às ruas, embora os meios continuassem a fazer uma campanha contra o governo.”
Concessões públicas
Outro momento de ruptura ocorreu quando o governo não renovou a concessão da RCTV, em maio de 2007. O ato foi alardeado como antidemocrático pelos grandes grupos de mídia de todo o mundo. Porém, para Dênis de Moraes, a decisão foi conduzida dentro da lei.
“O governo Chávez cumpriu a legislação em vigor com o poder concedente das outorgas de rádio e televisão, o poder de renovar ou não, terminados os contratos, as devidas concessões. O governo optou, democraticamente, por respeitar o contrato de concessão e avisou seis meses antes a RCTV que o contrato não seria renovado.”
O espaço radioelétrico do ar é um bem público e seu uso para transmissões depende de uma concessão do Estado, como explica o professor.
“Concessionárias de rádio e televisão não são proprietárias das licenças e outorgas, são meramente concessionárias temporárias, cuja exploração dos canais pode ou não continuar. Isso depende do poder público, já que as licenças e outorgas pertencem a cada sociedade, e não a grupos mercantis de comunicação.”
Em 2007, a Conatel registrava mais de 600 acusações contra a RCTV por violações de direitos e exibição de conteúdos inapropriados. A RCTV deixou de transmitir em sinal aberto e passou para a TV a cabo. Em seu lugar, entrou no ar uma nova emissora pública: a Televisora Venezolana Social (Tevs). Outros canais públicos são a Venezolana de Televisión (VTV), a ViveTV, o canal da Assembleia Nacional e a rede multiestatal Telesur.
Mudanças nas leis
A Lei de Responsabilidade Social no Rádio e na Televisão (Lei Resorte), criada em 2006 e revisada em 2010, marca as mudanças no marco regulatório da comunicação no país. A lei busca zelar pelos conteúdos midiáticos dos prestadores de serviços de rádio e televisão, provedores de meios eletrônicos, anunciantes, produtores independentes e usuários.
Também neste caso houve polêmica em torno do tema da liberdade de expressão. Na opinião do professor Dênis de Moraes, a Lei Resorte contém excessos na aplicação de multas e punições, mas é respeitado o direito de defesa constitucional. Ele acrescenta que de maneira geral a lei é positiva.
“A Lei tem tido, um papel, a meu juízo, muito positivo em vários aspectos, como por exemplo, coibir a pornografia infantil, coibir a violência estimulada, combater discriminação e preconceitos sociais e comunitários, impedir que as empresas de rádio e televisão tenham uma liberdade de direcionar a opinião pública para juízos de valor que são absolutamente mercantilizados.”
Outra recente lei é a de Comunicação Popular, do fim de 2011, que prevê uma série de direitos equivalentes e incentivos às mídias populares e alternativas.
Conquista do imaginário
Apesar dessas iniciativas de pluralidade da informação, o seu reflexo nas conversas, gosto e pensamento do povo venezuelano ainda é pequeno, devido ao poder histórico de influência da grande mídia, como lembra Dênis de Moraes.
Ele explica que a grande mídia internacional também reforça uma imagem negativa do governo Chávez. O professor observa que muitos desses veículos estão articulados na Sociedade Interamericana de Prensa e no grupo Diários das Américas, como os jornais brasileiros O Globo e O Estado de São Paulo.
“A mesma matéria, os mesmos interesses percorrem como se fosse uma corrente elétrica os principais veículos de comunicação impressa, os audiovisuais, eletrônicos, instantaneamente na América Latina difundindo um volume de informações, de artigos de opinião, de manchetes, de entrevistas, etc., tendencialmente contrários a qualquer governo progressista.”
Na Venezuela, durante esses anos, os grandes meios de comunicação seguem retratando de forma pejorativa Hugo Chávez para deslegitimar seu governo, como lembra Maringoni.
“Eles tiveram que engolir o Chávez como um dado da realidade venezuelana. Agora, a campanha de desgaste continua. Eu não acho que o Chávez seja perfeito, ele tem aquele nacionalismo por vezes autoritário, mas em momento algum desrespeitou nenhum preceito Constitucional.”
A história parece familiar: grandes grupos de comunicação que possuem jornais, canais de televisão e rádio, exercem um domínio sobre toda a informação que circula no país. Esse é o cenário do Brasil, Colômbia, Peru e, até bem pouco tempo atrás, era também o da Venezuela. O país vem, nos últimos anos, deixando mais plural a sua mídia.
Até 1998, ano da eleição que tornou Hugo Chávez presidente, existiam na Venezuela 331 concessões privadas de rádio e televisão, 11 canais de radiodifusão públicos e nenhum comunitário. Ao longo de mais de uma década de governo, todos os setores tiveram aumento. No final de 2011, o país possuía 473 televisões e rádios privadas, 83 meios públicos e 244 canais comunitários. Os dados são da Comissão Nacional de Telecomunicações (Conatel).
A democratização da mídia e a pluralidade da informação foram propostas assumidas por Chávez, como observa o professor de Estudos Culturais e Mídia da Universidade Federal Fluminense (UFF), Dênis de Moraes.
“Com o processo de profundas transformações que estão acontecendo desde então na Venezuela, o Estado voltou a ter um papel protagônico. O governo Chávez tem desenvolvido uma série de ações e mudanças regulatórias para tentar progressivamente democratizar o sistema de comunicação. E se esse objetivo é muito ambicioso, pelo menos aumentar significativamente as margens de diversidade informativa e cultural.”
Mídia e golpe
Um momento de ruptura de projeto de comunicação ocorre em abril de 2002, quando a Rede Caracas de Televisão (RCTV) participa da tentativa de golpe de Estado. Nesse momento, uma relação que era estável, entre governo e grande mídia, passou para um conflito declarado, como relata o jornalista e historiador, Gilberto Maringoni, que esteve no país e acompanhou o pós-golpe.
“Os meios de comunicação não só comemoraram o golpe, mas logo depois da queda e da volta do Chávez continuaram uma campanha de desgaste, de desqualificação em toda a grade de programação. Eu vi naquela situação um clima extremamente hostil e beligerante por parte da mídia.”
O descolamento entre a realidade vivida pela população e o que a mídia exibia foi o que mais surpreendeu Maringoni.
“A vida das pessoas começou paulatinamente a melhorar, ao mesmo tempo em que a mídia acentuava os seus ataques. A pessoa vê que sua vida está mudando e percebe que tem algum problema em quem ataca tanto o presidente. Esse descolamento é que ficou evidente no golpe, porque a população três dias depois da queda do Chávez foi às ruas, embora os meios continuassem a fazer uma campanha contra o governo.”
Concessões públicas
Outro momento de ruptura ocorreu quando o governo não renovou a concessão da RCTV, em maio de 2007. O ato foi alardeado como antidemocrático pelos grandes grupos de mídia de todo o mundo. Porém, para Dênis de Moraes, a decisão foi conduzida dentro da lei.
“O governo Chávez cumpriu a legislação em vigor com o poder concedente das outorgas de rádio e televisão, o poder de renovar ou não, terminados os contratos, as devidas concessões. O governo optou, democraticamente, por respeitar o contrato de concessão e avisou seis meses antes a RCTV que o contrato não seria renovado.”
O espaço radioelétrico do ar é um bem público e seu uso para transmissões depende de uma concessão do Estado, como explica o professor.
“Concessionárias de rádio e televisão não são proprietárias das licenças e outorgas, são meramente concessionárias temporárias, cuja exploração dos canais pode ou não continuar. Isso depende do poder público, já que as licenças e outorgas pertencem a cada sociedade, e não a grupos mercantis de comunicação.”
Em 2007, a Conatel registrava mais de 600 acusações contra a RCTV por violações de direitos e exibição de conteúdos inapropriados. A RCTV deixou de transmitir em sinal aberto e passou para a TV a cabo. Em seu lugar, entrou no ar uma nova emissora pública: a Televisora Venezolana Social (Tevs). Outros canais públicos são a Venezolana de Televisión (VTV), a ViveTV, o canal da Assembleia Nacional e a rede multiestatal Telesur.
Mudanças nas leis
A Lei de Responsabilidade Social no Rádio e na Televisão (Lei Resorte), criada em 2006 e revisada em 2010, marca as mudanças no marco regulatório da comunicação no país. A lei busca zelar pelos conteúdos midiáticos dos prestadores de serviços de rádio e televisão, provedores de meios eletrônicos, anunciantes, produtores independentes e usuários.
Também neste caso houve polêmica em torno do tema da liberdade de expressão. Na opinião do professor Dênis de Moraes, a Lei Resorte contém excessos na aplicação de multas e punições, mas é respeitado o direito de defesa constitucional. Ele acrescenta que de maneira geral a lei é positiva.
“A Lei tem tido, um papel, a meu juízo, muito positivo em vários aspectos, como por exemplo, coibir a pornografia infantil, coibir a violência estimulada, combater discriminação e preconceitos sociais e comunitários, impedir que as empresas de rádio e televisão tenham uma liberdade de direcionar a opinião pública para juízos de valor que são absolutamente mercantilizados.”
Outra recente lei é a de Comunicação Popular, do fim de 2011, que prevê uma série de direitos equivalentes e incentivos às mídias populares e alternativas.
Conquista do imaginário
Apesar dessas iniciativas de pluralidade da informação, o seu reflexo nas conversas, gosto e pensamento do povo venezuelano ainda é pequeno, devido ao poder histórico de influência da grande mídia, como lembra Dênis de Moraes.
Ele explica que a grande mídia internacional também reforça uma imagem negativa do governo Chávez. O professor observa que muitos desses veículos estão articulados na Sociedade Interamericana de Prensa e no grupo Diários das Américas, como os jornais brasileiros O Globo e O Estado de São Paulo.
“A mesma matéria, os mesmos interesses percorrem como se fosse uma corrente elétrica os principais veículos de comunicação impressa, os audiovisuais, eletrônicos, instantaneamente na América Latina difundindo um volume de informações, de artigos de opinião, de manchetes, de entrevistas, etc., tendencialmente contrários a qualquer governo progressista.”
Na Venezuela, durante esses anos, os grandes meios de comunicação seguem retratando de forma pejorativa Hugo Chávez para deslegitimar seu governo, como lembra Maringoni.
“Eles tiveram que engolir o Chávez como um dado da realidade venezuelana. Agora, a campanha de desgaste continua. Eu não acho que o Chávez seja perfeito, ele tem aquele nacionalismo por vezes autoritário, mas em momento algum desrespeitou nenhum preceito Constitucional.”
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