Por Luiz Carlos Azenha, no blog Viomundo:
Os leitores foram bombardeados, no fim de semana, com informações sobre o julgamento do chamado mensalão. Tanto a Folha quanto o Estadão publicaram cadernos especiais. Li ambos. Podemos estar diante do julgamento mais importante da história do STF ou do inquérito mais volumoso, mas falar em “maior escândalo de corrupção” revela prejulgamento. Ou a expectativa é de que o STF apenas confirme o que o “tribunal da opinião pública” já decidiu, quando se considera “opinião pública” o corpo de leitores, telespectadores e ouvintes de uma mídia predisposta a condenar?
Já que tratamos de preciosismos, a manchete da Folha de S. Paulo para a entrevista de Roberto Jefferson, na qual o ex-deputado denunciou o escândalo em 2005, “PT dava mesada de R$ 30 mil a parlamentares, diz Jefferson”, se confirmou?
Este é o nó da questão. O PT admite que fez caixa dois para pagar despesas de campanha de aliados e que usou para isso empréstimos feitos junto a bancos privados. A acusação da Procuradoria é muito mais grave: a de que o partido teria usado dinheiro público para pagar pelo voto de deputados no Congresso.
A linha de defesa mais comum dos petistas é de que o partido não teria motivos para pagar pelos votos, por exemplo, de seus próprios deputados.
De outra parte, a alegação de que tudo começou com o chamado mensalão tucano, também operado pelo publicitário Marcos Valério, politicamente é uma faca de dois gumes para o PT.
Sim, é estranho que um caso anterior — de 1998 — vá ser julgado depois e que tenha merecido cobertura tímida e quase nenhuma investigação da mídia.
Porém, se os dados do valerioduto tucano são verdadeiros e o DNA do chamado mensalão veio mesmo da operação mineira, há similaridades que podem incomodar os petistas.
Em Minas, de acordo com a CartaCapital deste fim de semana, parte dos R$ 104 milhões vieram do Bemge (banco posteriormente privatizado), da empresa de mineração Comig (hoje Codemig) e da empresa de águas Copasa. O publicitário Marcos Valério é acusado de ter simulado contratos de patrocínio de eventos esportivos para receber parte do dinheiro.
Por que ele mudaria a forma de atuar no chamado mensalão petista? No valerioduto nacional, R$ 76,7 milhões — de um total de R$ 140 milhões — teriam origem, direta ou indiretamente, no Banco do Brasil. Marcos Valério teria simulado contratos de prestação de serviços de publicidade.
Deriva daí a importância da decisão do Tribunal de Contas da União (TCU), a partir do voto da relatora Ana Arraes, de considerar legal um contrato entre o BB e uma das agências de Marcos Valério.
Se cair a tese da simulação, fica reforçada a de que o PT não usou dinheiro público, mas de empréstimos bancários.
O Estadão deu mais espaço à defesa que a Folha. Trouxe um texto do governador gaúcho Tarso Genro, por exemplo, mas outro falava sobre “manobras jurídicas da defesa”. O jornal utilizou declarações ‘espíritas’ de José Dirceu, como “A CPI [do Cachoeira] foi uma burrada”, declaração atribuída a ele por terceiros.
Ou seja, se o principal acusado não fala, falam por ele.
“O plano do PT, no entanto, era muito mais ambicioso. Na tentativa de desconstruir a denúncia do Ministério Público e de desqualificar seus algozes, petistas tinham como alvos preferenciais na CPI o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, o ministro Gilmar Mendes, do STF, e setores da imprensa”, diz parágrafo do mesmo texto.
Com isso o jornal se julga livre de tratar da relação de Gurgel, Mendes e ‘setores da imprensa’ com as investigações relativas às Operações Vegas e Monte Carlo. Existem ou não? São ou não relevantes?
Mencionar a relação entre os arapongas de Carlinhos Cachoeira e os primórdios do chamado mensalão, então, nem pensar…
Em minha opinião, há exagero quando se fala do futuro impacto político do resultado do julgamento.
Por um lado, Lula se reelegeu presidente depois de uma intensa campanha midiática alimentada por três CPIs, uma das quais concluiu que o mensalão existiu conforme o denunciado. Além disso, Lula elegeu a sucessora. Ao escolher alguns candidatos a prefeito do PT, este ano, talvez o ex-presidente tenha insistido em políticos novos já se antecipando a uma possível condenação de antigos quadros do PT pelo STF.
De outra parte, não podemos desconhecer que a ascensão social e a disseminação das tecnologias de informação trouxeram milhões de novos eleitores para o consumo diário e instantâneo de notícias. O eventual desgaste de Lula poderá, sim, ter reflexo nas eleições municipais.
Há uma tendência, refletida nos jornais, de considerar o julgamento simbólico do amadurecimento da democracia brasileira. Pode ser.
Pessoalmente, acho que seria bom que houvesse uma apuração tão rigorosa do processo de privatizações — começando com uma CPI, por exemplo — quanto houve do valerioduto petista e, em menor escala, do esquema tucano.
Se andassem as investigações da Operação Castelo de Areia, por exemplo, que compromete gente de todos os partidos, melhor ainda.
De qualquer forma, não deixa de ser um bom sinal o fato de que o chamado mensalão petista será finalmente julgado.
Neste caso, não há como o STF agradar a gregos e troianos: ou existiu um esquema que usou dinheiro público para comprar votos no Congresso, ou este esquema não existiu.
“O Judiciário deve agir com base nas provas produzidas no processo. Nenhum julgamento pode ser um juízo de exceção ou uma vendetta de grupos políticos”, escreveu Marcelo Figueiredo, diretor da Faculdade de Direito da PUC-SP, na CartaCapital. Concordamos.
Os leitores foram bombardeados, no fim de semana, com informações sobre o julgamento do chamado mensalão. Tanto a Folha quanto o Estadão publicaram cadernos especiais. Li ambos. Podemos estar diante do julgamento mais importante da história do STF ou do inquérito mais volumoso, mas falar em “maior escândalo de corrupção” revela prejulgamento. Ou a expectativa é de que o STF apenas confirme o que o “tribunal da opinião pública” já decidiu, quando se considera “opinião pública” o corpo de leitores, telespectadores e ouvintes de uma mídia predisposta a condenar?
Já que tratamos de preciosismos, a manchete da Folha de S. Paulo para a entrevista de Roberto Jefferson, na qual o ex-deputado denunciou o escândalo em 2005, “PT dava mesada de R$ 30 mil a parlamentares, diz Jefferson”, se confirmou?
Este é o nó da questão. O PT admite que fez caixa dois para pagar despesas de campanha de aliados e que usou para isso empréstimos feitos junto a bancos privados. A acusação da Procuradoria é muito mais grave: a de que o partido teria usado dinheiro público para pagar pelo voto de deputados no Congresso.
A linha de defesa mais comum dos petistas é de que o partido não teria motivos para pagar pelos votos, por exemplo, de seus próprios deputados.
De outra parte, a alegação de que tudo começou com o chamado mensalão tucano, também operado pelo publicitário Marcos Valério, politicamente é uma faca de dois gumes para o PT.
Sim, é estranho que um caso anterior — de 1998 — vá ser julgado depois e que tenha merecido cobertura tímida e quase nenhuma investigação da mídia.
Porém, se os dados do valerioduto tucano são verdadeiros e o DNA do chamado mensalão veio mesmo da operação mineira, há similaridades que podem incomodar os petistas.
Em Minas, de acordo com a CartaCapital deste fim de semana, parte dos R$ 104 milhões vieram do Bemge (banco posteriormente privatizado), da empresa de mineração Comig (hoje Codemig) e da empresa de águas Copasa. O publicitário Marcos Valério é acusado de ter simulado contratos de patrocínio de eventos esportivos para receber parte do dinheiro.
Por que ele mudaria a forma de atuar no chamado mensalão petista? No valerioduto nacional, R$ 76,7 milhões — de um total de R$ 140 milhões — teriam origem, direta ou indiretamente, no Banco do Brasil. Marcos Valério teria simulado contratos de prestação de serviços de publicidade.
Deriva daí a importância da decisão do Tribunal de Contas da União (TCU), a partir do voto da relatora Ana Arraes, de considerar legal um contrato entre o BB e uma das agências de Marcos Valério.
Se cair a tese da simulação, fica reforçada a de que o PT não usou dinheiro público, mas de empréstimos bancários.
O Estadão deu mais espaço à defesa que a Folha. Trouxe um texto do governador gaúcho Tarso Genro, por exemplo, mas outro falava sobre “manobras jurídicas da defesa”. O jornal utilizou declarações ‘espíritas’ de José Dirceu, como “A CPI [do Cachoeira] foi uma burrada”, declaração atribuída a ele por terceiros.
Ou seja, se o principal acusado não fala, falam por ele.
“O plano do PT, no entanto, era muito mais ambicioso. Na tentativa de desconstruir a denúncia do Ministério Público e de desqualificar seus algozes, petistas tinham como alvos preferenciais na CPI o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, o ministro Gilmar Mendes, do STF, e setores da imprensa”, diz parágrafo do mesmo texto.
Com isso o jornal se julga livre de tratar da relação de Gurgel, Mendes e ‘setores da imprensa’ com as investigações relativas às Operações Vegas e Monte Carlo. Existem ou não? São ou não relevantes?
Mencionar a relação entre os arapongas de Carlinhos Cachoeira e os primórdios do chamado mensalão, então, nem pensar…
Em minha opinião, há exagero quando se fala do futuro impacto político do resultado do julgamento.
Por um lado, Lula se reelegeu presidente depois de uma intensa campanha midiática alimentada por três CPIs, uma das quais concluiu que o mensalão existiu conforme o denunciado. Além disso, Lula elegeu a sucessora. Ao escolher alguns candidatos a prefeito do PT, este ano, talvez o ex-presidente tenha insistido em políticos novos já se antecipando a uma possível condenação de antigos quadros do PT pelo STF.
De outra parte, não podemos desconhecer que a ascensão social e a disseminação das tecnologias de informação trouxeram milhões de novos eleitores para o consumo diário e instantâneo de notícias. O eventual desgaste de Lula poderá, sim, ter reflexo nas eleições municipais.
Há uma tendência, refletida nos jornais, de considerar o julgamento simbólico do amadurecimento da democracia brasileira. Pode ser.
Pessoalmente, acho que seria bom que houvesse uma apuração tão rigorosa do processo de privatizações — começando com uma CPI, por exemplo — quanto houve do valerioduto petista e, em menor escala, do esquema tucano.
Se andassem as investigações da Operação Castelo de Areia, por exemplo, que compromete gente de todos os partidos, melhor ainda.
De qualquer forma, não deixa de ser um bom sinal o fato de que o chamado mensalão petista será finalmente julgado.
Neste caso, não há como o STF agradar a gregos e troianos: ou existiu um esquema que usou dinheiro público para comprar votos no Congresso, ou este esquema não existiu.
“O Judiciário deve agir com base nas provas produzidas no processo. Nenhum julgamento pode ser um juízo de exceção ou uma vendetta de grupos políticos”, escreveu Marcelo Figueiredo, diretor da Faculdade de Direito da PUC-SP, na CartaCapital. Concordamos.
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