Por Wladimir Pomar, no sítio Correio da Cidadania:
O governo Dilma, finalmente, deu um passo estratégico ao lançar um programa de investimentos para reimplantar a rede ferroviária, chegando a 10 mil km, ampliar a rede rodoviária em mais 7,5 mil km, e criar a EPL - Empresa de Planejamento e Logística. Esse programa, assim como os demais que serão anunciados, são sinais de que o governo se deu conta de que os atuais problemas conjunturais de nossa economia só podem ser resolvidos com mudanças estruturais, sob o comando do Estado.
A rigor, o governo está recuperando parte da experiência histórica brasileira, que teve em grupos de trabalho, grupos executivos e empresas estatais de planejamento e execução os principais instrumentos de implantação das políticas de desenvolvimento industrial, nas quais a infraestrutura foi parte essencial. Por outro lado, é preciso também considerar a experiência histórica e evitar alguns dos erros e barbaridades cometidos anteriormente, um dos quais foi acreditar que o empresariado brasileiro seria capaz de se mobilizar amplamente para realizar tal desenvolvimento.
Na época Vargas, o empresariado que existia teve que ser subsidiado o tempo todo, nem sempre obtendo o resultado esperado, principalmente quando o retorno do investimento era de longo prazo. O que obrigou o governo a constituir empresas estatais para assumir a construção e operação desses empreendimentos. Na época JK, ocorreu algo idêntico, mas numa conjuntura internacional em que já havia excedentes de capitais nos países avançados. Assim, para superar o pequeno empreendedorismo do empresariado brasileiro, JK realizou o desenvolvimento industrial principalmente tendo por base os capitais privados estrangeiros e, meio a contragosto, os capitais estatais nacionais.
Algo idêntico ocorreu no período da ditadura militar, quando esta teve que criar inúmeras estatais para dar conta dos investimentos em infraestrutura. Em todos esses períodos históricos, o grande empresariado privado brasileiro cresceu na marola dos capitais estatais e dos capitais estrangeiros, enquanto sufocava os pequenos e médios empresários, e passou, rapidamente, a imitar o sistema de monopólio das multinacionais estrangeiras. Esse mesmo grande empresariado se rebelou contra as estatais e contra o apoio dos governos ditatoriais a elas, a partir de 1974, mas não deu um pio sequer contra a destruição e o esgarçamento de grande parte do parque produtivo do Brasil, promovido pelos governos neoliberais dos anos 1990. Para ele, pouco importou a intensificação da oligopolização e da desnacionalização da economia brasileira.
Por outro lado, a maior parte dos grandes empresários brasileiros não tem vontade empresarial, nem financeira, para tocar as obras do PAC, nem para realizar os empreendimentos previstos nos programas estratégicos que a presidenta Dilma começou a anunciar, mesmo que o BNDES financie 80%. Essa parte do grande empresariado se acostumou a não se submeter aos riscos do capitalismo. Sua prática tem sido a de formação de cartéis, seja para fixar preços de monopólio, seja para pressionar o adiamento de licitações e obras, de modo que possam terminar as que estão construindo e tenham condições de obter as novas, impedindo que outras empresas, fora do cartel, participem do processo.
Não é por acaso que há atrasos e problemas em várias obras dos projetos do governo, desde as de baixa complexidade, como a da integração de bacias do São Francisco, até as de maior complexidade, como as das usinas dos rios Madeira e Xingu, das linhas de alta voltagem, e mesmo das ferrovias já em construção. Tais atrasos e problemas se devem, em grande medida, àquela falta de vontade de grandes empresas oligopolistas, falta de vontade que não é técnica, mas sim da natureza do sistema de monopólio.
Nessas condições, não basta ter programas e projetos, nem organizar as licitações com rapidez. É imprescindível que o governo também assuma a tarefa de reordenar as distorções do passado, como a submissão de nossa infraestrutura ao oligopólio automobilístico, que criou uma malha de transporte frankeinstein de altíssimo custo, com predominância das rodovias, desmontagem das ferrovias e portos, e destruição da marinha mercante brasileira. Além disso, é indispensável realizar uma verdadeira engenharia empresarial na formação de empresas de propósito específico, nas quais sejam integradas não só empresas estatais e grandes empresas brasileiras e estrangeiras, mas também médias e pequenas empresas nacionais. Em outras palavras, o governo precisa aproveitar sua capacidade de investimento e de planejamento e execução para reforçar a participação estatal e democratizar o capital, abrindo brechas no sistema oligopólico que domina a economia brasileira.
Além disso, as forças sociais e políticas democráticas e populares deveriam ser informadas sobre os diversos problemas técnicos que envolvem os programas e projetos anunciados e em processo de apresentação. Por exemplo, as novas ferrovias devem contemplar uma parcela de linhas eletrificadas e pisos de velocidade mais elevados do que os atuais. Se continuarmos com tetos de velocidade de 60 km/h, isso pouco vai agregar para baixar os custos logísticos e elevar a competitividade brasileira. O mesmo será verdade se a maior parte das linhas for de via única, ao invés de dupla via, e se não forem instalados centros modais de interligação com sistemas rodoviários, fluviais e aéreos.
Afora isso, a construção da infraestrutura é estratégica, mas não resolve por si só o problema da reindustrialização. Ela precisa ser complementada, no exemplo ferroviário, não só pela obrigação das siderúrgicas implantadas no Brasil fabricarem trilhos tecnicamente adequados às densidades de carga e às novas velocidades dos trens, mas também pela instalação de fábricas de locomotivas, carros de passageiros, vagões de cargas de diferentes modalidades, trucks, rodeiros e outros componentes, de modo a fortalecer estruturalmente a capacidade produtiva do país e, tão importante quanto, criar grande número de empregos permanentes.
Finalmente, mesmo reafirmando o caráter estratégico do passo dado pelo governo, não custa relembrar que os investimentos anunciados representam um pequeno percentual dos investimentos totais que o Brasil precisa para alavancar sua economia. Por isso, talvez seja de suma importância que as discussões em torno dos diversos programas pretendidos pelo governo devam se estender além do âmbito das equipes executivas, ministérios, governadores e grande empresariado, e incluam as diversas forças que apoiam o governo, em especial as forças democráticas populares. Mesmo porque, pensando conservadoramente, o Brasil só alcançará uma taxa anual de investimentos superior a 25% do PIB se investir cerca de um trilhão de reais, ou 500 bilhões de dólares, na pior das hipóteses a rtir de 2013. Um montante que exige um apoio social e político mais consistente.
O governo Dilma, finalmente, deu um passo estratégico ao lançar um programa de investimentos para reimplantar a rede ferroviária, chegando a 10 mil km, ampliar a rede rodoviária em mais 7,5 mil km, e criar a EPL - Empresa de Planejamento e Logística. Esse programa, assim como os demais que serão anunciados, são sinais de que o governo se deu conta de que os atuais problemas conjunturais de nossa economia só podem ser resolvidos com mudanças estruturais, sob o comando do Estado.
A rigor, o governo está recuperando parte da experiência histórica brasileira, que teve em grupos de trabalho, grupos executivos e empresas estatais de planejamento e execução os principais instrumentos de implantação das políticas de desenvolvimento industrial, nas quais a infraestrutura foi parte essencial. Por outro lado, é preciso também considerar a experiência histórica e evitar alguns dos erros e barbaridades cometidos anteriormente, um dos quais foi acreditar que o empresariado brasileiro seria capaz de se mobilizar amplamente para realizar tal desenvolvimento.
Na época Vargas, o empresariado que existia teve que ser subsidiado o tempo todo, nem sempre obtendo o resultado esperado, principalmente quando o retorno do investimento era de longo prazo. O que obrigou o governo a constituir empresas estatais para assumir a construção e operação desses empreendimentos. Na época JK, ocorreu algo idêntico, mas numa conjuntura internacional em que já havia excedentes de capitais nos países avançados. Assim, para superar o pequeno empreendedorismo do empresariado brasileiro, JK realizou o desenvolvimento industrial principalmente tendo por base os capitais privados estrangeiros e, meio a contragosto, os capitais estatais nacionais.
Algo idêntico ocorreu no período da ditadura militar, quando esta teve que criar inúmeras estatais para dar conta dos investimentos em infraestrutura. Em todos esses períodos históricos, o grande empresariado privado brasileiro cresceu na marola dos capitais estatais e dos capitais estrangeiros, enquanto sufocava os pequenos e médios empresários, e passou, rapidamente, a imitar o sistema de monopólio das multinacionais estrangeiras. Esse mesmo grande empresariado se rebelou contra as estatais e contra o apoio dos governos ditatoriais a elas, a partir de 1974, mas não deu um pio sequer contra a destruição e o esgarçamento de grande parte do parque produtivo do Brasil, promovido pelos governos neoliberais dos anos 1990. Para ele, pouco importou a intensificação da oligopolização e da desnacionalização da economia brasileira.
Por outro lado, a maior parte dos grandes empresários brasileiros não tem vontade empresarial, nem financeira, para tocar as obras do PAC, nem para realizar os empreendimentos previstos nos programas estratégicos que a presidenta Dilma começou a anunciar, mesmo que o BNDES financie 80%. Essa parte do grande empresariado se acostumou a não se submeter aos riscos do capitalismo. Sua prática tem sido a de formação de cartéis, seja para fixar preços de monopólio, seja para pressionar o adiamento de licitações e obras, de modo que possam terminar as que estão construindo e tenham condições de obter as novas, impedindo que outras empresas, fora do cartel, participem do processo.
Não é por acaso que há atrasos e problemas em várias obras dos projetos do governo, desde as de baixa complexidade, como a da integração de bacias do São Francisco, até as de maior complexidade, como as das usinas dos rios Madeira e Xingu, das linhas de alta voltagem, e mesmo das ferrovias já em construção. Tais atrasos e problemas se devem, em grande medida, àquela falta de vontade de grandes empresas oligopolistas, falta de vontade que não é técnica, mas sim da natureza do sistema de monopólio.
Nessas condições, não basta ter programas e projetos, nem organizar as licitações com rapidez. É imprescindível que o governo também assuma a tarefa de reordenar as distorções do passado, como a submissão de nossa infraestrutura ao oligopólio automobilístico, que criou uma malha de transporte frankeinstein de altíssimo custo, com predominância das rodovias, desmontagem das ferrovias e portos, e destruição da marinha mercante brasileira. Além disso, é indispensável realizar uma verdadeira engenharia empresarial na formação de empresas de propósito específico, nas quais sejam integradas não só empresas estatais e grandes empresas brasileiras e estrangeiras, mas também médias e pequenas empresas nacionais. Em outras palavras, o governo precisa aproveitar sua capacidade de investimento e de planejamento e execução para reforçar a participação estatal e democratizar o capital, abrindo brechas no sistema oligopólico que domina a economia brasileira.
Além disso, as forças sociais e políticas democráticas e populares deveriam ser informadas sobre os diversos problemas técnicos que envolvem os programas e projetos anunciados e em processo de apresentação. Por exemplo, as novas ferrovias devem contemplar uma parcela de linhas eletrificadas e pisos de velocidade mais elevados do que os atuais. Se continuarmos com tetos de velocidade de 60 km/h, isso pouco vai agregar para baixar os custos logísticos e elevar a competitividade brasileira. O mesmo será verdade se a maior parte das linhas for de via única, ao invés de dupla via, e se não forem instalados centros modais de interligação com sistemas rodoviários, fluviais e aéreos.
Afora isso, a construção da infraestrutura é estratégica, mas não resolve por si só o problema da reindustrialização. Ela precisa ser complementada, no exemplo ferroviário, não só pela obrigação das siderúrgicas implantadas no Brasil fabricarem trilhos tecnicamente adequados às densidades de carga e às novas velocidades dos trens, mas também pela instalação de fábricas de locomotivas, carros de passageiros, vagões de cargas de diferentes modalidades, trucks, rodeiros e outros componentes, de modo a fortalecer estruturalmente a capacidade produtiva do país e, tão importante quanto, criar grande número de empregos permanentes.
Finalmente, mesmo reafirmando o caráter estratégico do passo dado pelo governo, não custa relembrar que os investimentos anunciados representam um pequeno percentual dos investimentos totais que o Brasil precisa para alavancar sua economia. Por isso, talvez seja de suma importância que as discussões em torno dos diversos programas pretendidos pelo governo devam se estender além do âmbito das equipes executivas, ministérios, governadores e grande empresariado, e incluam as diversas forças que apoiam o governo, em especial as forças democráticas populares. Mesmo porque, pensando conservadoramente, o Brasil só alcançará uma taxa anual de investimentos superior a 25% do PIB se investir cerca de um trilhão de reais, ou 500 bilhões de dólares, na pior das hipóteses a rtir de 2013. Um montante que exige um apoio social e político mais consistente.
Se as ferrovias são para transportar gente, tá certo, mas se esse plano é para transportar soja transgênica que, diga-se não serve para matar a fome de ninguém, então é um completo equivoco.
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