Marcelo Camargo/ABr |
Dilma precisa avançar e criar nova agenda inspirada, inclusive, em certas reivindicações de um movimento social confuso e errático.
O veto ao aumento das passagens nos transportes urbanos, estopim do movimento que se alastrou de São Paulo para outros pontos do País, foi atendido. Esse sucesso inicial pode ter impacto na mobilização e deixá-lo, por outro lado, numa encruzilhada. Avançamos ou nos retiramos?
Mas quem pensará isso se não há líderes?
A presidenta Dilma, diante da força numérica da mobilização, também está diante de fatos novos e precisa, por isso, criar e conduzir outra agenda de governo. Para tanto pode avançar apoiada em sinalizações difusas de manifestantes confusos e erráticos. Foram eles, de qualquer forma, que botaram o bloco na rua e exibem cartazes como esse que resvala no mau gosto: “Enfia os 20 centavos no SUS”. Esse outro não é menos sugestivo: “Queremos educação padrão Fifa”.
Quem nega que Ensino e Saúde são pautas prioritárias no Brasil? Há preocupação intensa, bem visível, em ligar as análises das marchas realizadas nas principais capitais brasileiras com as vaias à presidenta Dilma Rousseff na abertura da Copa das Confederações, em Brasília. Nesse cenário, ganhou força a divulgação de pesquisas indicando queda expressiva na aprovação do governo.
Emergiu, paralelamente, um aumento da inflação que mexeu com velhos fantasmas da classe média.Os números governam a política. Esses, divulgados agora, ajudam, por exemplo, a manter viva a esperança de alterar o rumo da disputa presidencial de 2014, que aponta vantagem folgada para a reeleição de Dilma.
Protestos nas ruas, com violência ou sem violência, sempre são danosos aos governantes. Ônus do poder. A mídia conservadora sobrevoa o assunto, como urubu sobrevoa carniça, e se encarrega de estimular os jovens com a bandeira, em frangalhos, da marcha pacífica.
Manifestações populares são comuns à democracia. Machado de Assis, mesmo emparedado por uma elite autoritária e reacionária, percebeu e estimulou as liberdades oferecidas pelo, então, novo regime republicano, em crônica de 1892:
“A liberdade não é surda-muda nem paralítica. Ela vive, ela fala, ela bate as mãos, ela ri, ela assobia, ela clama, ela vive da vida”.
O pacato Machado não apoiaria violência. Meditaria, porém, sobre o bom comportamento, incentivado pela TV Globo, em manifestações legítimas nas ruas.
A República está coalhada de protestos: “Revolta da Vacina” (1904), “Revolta da Chibata” (1910), “Revolta das Barcas” (1959). Essa última, em Niterói (RJ), teve a força de levante popular motivado pelo custo da passagem e pelo péssimo serviço oferecido aos usuários. Tal como agora.
Nos anos 1960, jovens e velhos foram para as ruas com a bandeira das reformas políticas. Nos anos 1970, o fato estimulador era a ditadura. Em todos esses movimentos, porém, a política era o guia. Esse fator não aparece claramente agora.
Os manifestantes combatem politicamente com a suposição de que não fazem política. Logo, logo, no entanto, vão descobrir que, politicamente, estão a favor de alguém ou contra alguma coisa.
“por causa de um vintém – 20 centavos – no preço das passagens do transporte urbano, 5 mil pessoas se reuniram nas ruas para protestar.
ResponderExcluirhouve choques com a polícia, e o conflito generalizou-se.
a multidão quebrou cofres, arrancou trilhos, espancou cocheiros, esfaqueou mulas, levantou barricadas.
os distúrbios duraram três dias. daí em diante, tornaram-se frequentes as revoltas contra a má qualidade dos serviços públicos mais fundamentais, como o transporte, a iluminação, o abastecimento de água”. (José Murilo de Carvalho)
esse relato se refere ao ano de 1880, no brasil colonial, na cidade do rio de janeiro.
133 anos separam esta manifestação das que o MPL fez nas ruas de são paulo. a diferença é que o movimento de hoje foi liderado por jovens de classe média, e, em 1880, foi feita por trabalhadores, praças da polícia e pequenos comerciantes, em um das primeiras manifestações que colaboraram para a construção da cidadania no brasil.