quinta-feira, 6 de junho de 2013

O divã do FHC

Por Fernando Brito, no blog Tijolaço:

Todos sabem que o autoelogio dos pretensiosos é a resposta que, sozinhos, podem dar à falta de elogios alheios.

Fernando Henrique Cardoso não hesita em seguir este caminho, embora sua cultura livresca quase nos garanta que conheça o dito de D. Quixote a Sancho: “louvor em boca própria é vitupério”

O artigo que publica hoje no Estadão já entra, pelo título, no terreno do ridículo.

“Beijar a cruz”.

Ou seja, converter-se, como ele fez de corpo e mente – pois alma é algo do que os traidores de si mesmos têm de expurgar – ao neoliberalismo, à supremacia do mercado, à mão invisível de um deus financeiro e argentário que a tudo governa e conduz.

Que é fato que muita gente da esquerda – como ele o foi, ou dizia que era – abjurou de suas ideias e entregou-se, docemente, ao papel de servidor daquele credo. No PT, inclusive.

Mas a intenção de FHC é apenas dizer que ele era o príncipe e os que vieram depois dele são apenas arremedos mal-ajambrados do que ele foi. “É que Narciso acha feio o que não é espelho”:

“Sem coragem para fazer auto­crítica, o petismo foi pouco a pouco assumindo o programa do PSDB e agora os críticos do mais variado espectro cobram deste o suposto fato de não ter propostas para o Brasil… Entre­tanto, a versão modernizadora do PT é “envergonhada”. Fa­zem mal feito, como quem não está gostando, o que o PSDB fez e faria bem feito, se estives­se no comando.”

Vejam a pretensão: não apenas fez um período desastroso para o país, estagnou a economia, entregou patrimônio e saiu do Governo pedindo aos candidatos que, por patriotismo, ficassem quietos diante de uma “última ajoelhada” pedindo perdão ao FMI, como ainda se acha um modelo que os outros não têm como não seguir, embora o façam de forma muito menos “genial” que a ele próprio.

O que FHC não vê – porque não quer ver e ver a si mesmo em sua pequenez – é que o PSDB não está no comando pelo fato de que o povo tirou o PSDB de lá e por duas – duas, por enquanto – não permitiu que voltasse.

E fez isso não porque seja burro, ou que, como disse ele mesmo, precise que a tucanada seja mais carinhosa.

Fez porque abomina o projeto tucano de desmonte do país, de arrocho dos salários e expansão dos juros, de entrega das riquezas e da submissão do Brasil e de seu saque, em troca de miçangas e bugigangas da “modernidade”.

Porque nem nisso, no seu período, fez-se qualquer coisa para dar ao Brasil autonomia tecnológica.

Fernando Henrique pode até ter razão em dizer que “beija-se a cruz” – seria melhor dizer “beija-se o látego” – em muitas situações econômicas. Não apenas porque há leis e contratos deixados por ele que, mesmo ruinosos, são respeitados em nome de não haver quebra da institucionalidade como, sobretudo, porque o seu pensamento colonizado sobrevive, forte, na mídia e em boa parte da elite brasileira.

Que mesmo percebendo que vive melhor num país que cresce economicamente não consegue conviver com a ideia de que os pobres podem e devem ascender à cidadania.

Mas o cúmulo da cara-de-pau fernandiana vem no trecho em que ele fala do pré-sal. Diz que houve ”a súbita sacralização do pré-sal” e reclama do seu controle exclusivo pela Petrobras.

Ele, sob cuja batuta se revogou o monopólio do petróleo que seu pai e seu tio, militares nacionalistas, ajudaram a erguer, que colocou a Petrobras sob a vergonha de ver afundar uma plataforma, deve trincar os dentes de ódio ao ver que a empresa sobreviveu, mesmo depenada pelas ações que ele mercadejou em Nova York e se levanta como uma das maiores gigantes do mundo do petróleo.

Uma empresa que, 15 anos depois do gesto entreguista de FHC e de dez leilões de concessão de áreas petrolíferas, continua sendo responsável por 92% de todo o petróleo que se produz aqui. Que descobriu o pré-sal e é a única com capacidade tecnológica de coloca-lo imediatamente, que ressuscitou a industria naval brasileira, que está formando dezenas de milhares de trabalhadores qualificados para o setor de petróleo e gás, é dessa empresa que ele fala ser incapaz de cuidar do maior tesouro descoberto neste país, em toda a sua história?

Ah, mas o petróleo vai baixar de preço, as energias alternativas vão tomar conta do mundo, é preciso tirar tudo de lá, rápido, não importa como e por quem.

Fernando Henrique hoje, tem um único serviço a prestar ao Brasil. É estar ao lado daqueles que representam a tentativa de retorno destas ideias entreguistas, para que o povo brasileiro possa ver bem, sem ilusões, quem são e o que são.

De resto, ele só faz lembrar o cidadão que apareceu no consultório do “Analista de Bagé” , ótimo personagem de Luís Fernando Verissimo, dizendo que era assim e assado e aformando que tinha, por tantos defeitos, complexo de inferioridade. E levou um passa-fora do analista, que disse que ele era um poço de vaidade e megalômano. “Mas por que”, disse o homem, “se eu tenho tanto complexo de inferioridade?” E o analista: “olha, piá, tu é muito vaidoso. Eu conheço gente muito mais inferior que tu e que não fica se gabando disso”.

Um comentário:

  1. Essa conversinha de que a era do petróleo acabou é uma gigantesca bobagem ou, pior, esconde a vontade de entregar nossas riquezas. Do petróleo se produz fertilizantes agrícolas, plásticos, tecidos, lubrificantes para máquinas industriais, produtos químicos diversos. Além de ainda termos muitas décadas de uso do petróleo como combustível.

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