Por Enio Squeff, no sítio Carta Maior:
O mundo pintado pela informática nos anos que seguiram à implantação dos computadores individuais era róseo: a internet nascia como uma aurora benfazeja e radiante que fazia de cada homem o depositário livre do saber do mundo. O próprio trabalho subtraia-se à maldição do pecado original. Todos teríamos mais tempo em casa: o computador era a ferramenta da libertação dos homens e mulheres que podiam, no convívio com os filhos, cumprir a jornada de trabalho, significativamente diminuída. A consideração de que a exploração do homem pelo homem continuava merecia o riso irônico dos otimistas – e dos mentirosos – de sempre. Não se cogitava que os Estados Unidos, "berço da democracia" pudesse, justamente, pela internet, transformar-se no Big Brother previsto por George Orwell, em seu célebre "1984".
Na verdade, a essas alturas, não parece ser só dos Estados Unidos a primazia do uso da informática para espionar, ou pior, para escamotear. No mundo da informação, o paradoxo de sonegá-la não só aos leitores, mas a todo o mundo, parece ser a contrapartida inimaginada pelos panegiristas tanto das democracias do tipo ocidental, quanto dos defensores do admirável mundo novo da tecnologia como paradigma do bem estar para os homens. T.W. Adorno, nos longínquos anos 50, já alertava que a tecnologia como corolário das sociedades perfeitas, era uma ilusão trágica. Tinha para si o uso que o nazifascismo fizera da então nascente tecnologia da informação. A detenção dos meios de comunicação não eliminava o uso das suas prerrogativas, de instrumento de domínio do sistema. A apropriação privada dos meios de informação não era diferente da apropriação privada dos meios de produção. Eram, pelo contrário, uma coisa só.
Fica a conclusão para a nossa realidade. O oligopólio da mídia brasileira talvez seja o exemplo mais flagrante do quanto podem os jornais e revistas que mentem e omitem. E o quanto lhes valem apostar em suas meias verdade ou mentiras inteiras para seu próprio futuro no sistema capitalista do Brasil.
Das meias verdades sabemos bem. Não é mentira que os estádios construídos, adrede, mostram-se, afinal, bem melhores do que tudo o que grande imprensa vaticinava em contrário, ao insistir em que o Brasil não teria a capacidade de construí-los a tempo. Como os fizemos, com algum financiamento do BNDES, ficou-se a ver as multidões da classe média nas ruas a clamar que poderíamos ter feitos mais hospitais em vez de estádios. É uma verdade inteira de que a saúde no Brasil é catastrófica em alguns lugares, não tão desastrosas em outros e que o SUS é o melhor que o Brasil pode fazer para a saúde do seu povo. E que muitos países, mesmo desenvolvidos, não fazem. Aguardam-se, mesmo assim, os protestos contra a Copa do Mundo de 2014. E o silêncio, além do desestímulo, mais rápido e eficiente possíveis a quaisquer comemorações se, por acaso, os jogadores brasileiros lograrem vencer o torneio. Foi assim com a Copa das Confederações. O Brasil venceu mas, em compensação, "não construiu hospitais", logo a TV e os jornais não tinham nada o que comemorar, já que depois da construção dos estádios a única esperança era a derrota do Brasil na final. E não aconteceu.
Parece ser na área da informação, entretanto, que as omissões e as mentiras deslavadas apontam para a existência de um Big Brother na direção contrária a da verdade. Ela existe, não para todos os gostos. Não, em todo o caso, por exemplo, para os que gostariam – e deveriam saber – como e em que condições um funcionário público, tido como exemplar, como o ministro Joaquim Barbosa, comprou um imóvel em Miami. Sobre o qual ele se recusa a falar, o que, claro, não provoca a estranheza de ninguém na grande imprensa.
É que lista de mentiras e omissões, a rigor, não tem fim. A grande imprensa sabe da existência de um processo de mais de seiscentos milhões contra Globo, por sonegação de impostos. Ela sabe, não os seus leitores. Há um processo correndo contra o governo paulista nas cortes internacionais: um alto executivo da Siemens admitiu claramente que pagava propinas para alguns administradores do metrô paulistano. Feita a denúncia pela revista "Isto é", os jornalões e as revistonas (de novo, com a exceção da "Carta Capital, entre outras menores) tentaram claramente ignorar o assunto, pois fazem toda a questão de proteger o tucanato no governo Só não o fizeram porque o assunto está correndo em tribunais do exterior – do contrário nunca o mencionariam.
Em relação ao rumoroso caso do mensalão, sabe-se que há uma urgência dos jornais e a mídia em geral em ver os réus condenados, devidamente trancafiados atrás das grades. Quanto ao fato de ter ficado demonstrado que não houve o desvio de um único centavo dos mais de setenta milhões pagos à agência de Marcos Valério, como provaram a Visanet e o Banco de Brasil, por intermédio de suas respectivas auditorias, (o que desmonta o processo inteiro levado a cabo pelo doutor Joaquim Barbosa), este é um assunto guardado a sete chaves. Que só os que têm acesso a alguns cronistas, sites e blogs sabem por inteiro. Há, no entanto, pelo contrário, o engodo da mansão do filho do Lula – que os jornais jamais denunciaram ser, na verdade, o prédio da Escola de Agricultura da Universidade de São Paulo (Esalq); há a montagem grosseira de uma foto de Lula com a sua esposa e sua suposta namorada, que igualmente todo o sistema de informação ficou sabendo, mas jamais informou; há a mentira das relações da presidenta Dilma com assaltos a bancos, no tempo da Ditadura, uma falsidade grotesca estampada por um dos grandes jornais brasileiros, de que ele, aliás, ele jamais se retratou. Há as denúncias contra a filha de José Serra, enfeixada num dos grandes best-sellers que jamais foi apresentado que tal pela grande imprensa; há, em suma, uma censura global, no Brasil, que está longe de ser da alçada do Big Brother da vez, que é o sr. Barack Obama e que, surpreendentemente, é praticado pela mesma mídia que a todo o momento fala em liberdade de imprensa. As mentiras, as omissões e as meias verdades são tantas que se pode projetar facilmente um livro a respeito: ele talvez se transforme num best-seller que certamente, por razões óbvias, os leitores da "Veja", do "Estadão," da "Folha" e os ouvintes da CBN e os telespectadores da Globo, dentre outras, jamais tomarão conhecimento.
Quem trabalhou nos grandes jornais e revistas nos anos setenta e oitenta há de se lembrar, com saudade, dos editorais furibundos do "Estadão" contra a "Folha", desta contra a "Globo", e de todos contra a "Veja", além da própria, contra todos. Não se tratava apenas do sagrado mandamento da concorrência. Havia o consenso de que a liberdade de imprensa dependia do contraditório. E o prestígio se fazia por quem "furasse" o outro. Na época, imaginava-se que o Big Brother seria aquele previsto e pintado por Orwell, num mundo em que os resistentes seriam a imprensa e os jornalistas. Não passava pela cabeça de ninguém que o "Grande Irmão" acabasse sendo, afinal, a própria grande imprensa.
O mundo pintado pela informática nos anos que seguiram à implantação dos computadores individuais era róseo: a internet nascia como uma aurora benfazeja e radiante que fazia de cada homem o depositário livre do saber do mundo. O próprio trabalho subtraia-se à maldição do pecado original. Todos teríamos mais tempo em casa: o computador era a ferramenta da libertação dos homens e mulheres que podiam, no convívio com os filhos, cumprir a jornada de trabalho, significativamente diminuída. A consideração de que a exploração do homem pelo homem continuava merecia o riso irônico dos otimistas – e dos mentirosos – de sempre. Não se cogitava que os Estados Unidos, "berço da democracia" pudesse, justamente, pela internet, transformar-se no Big Brother previsto por George Orwell, em seu célebre "1984".
Na verdade, a essas alturas, não parece ser só dos Estados Unidos a primazia do uso da informática para espionar, ou pior, para escamotear. No mundo da informação, o paradoxo de sonegá-la não só aos leitores, mas a todo o mundo, parece ser a contrapartida inimaginada pelos panegiristas tanto das democracias do tipo ocidental, quanto dos defensores do admirável mundo novo da tecnologia como paradigma do bem estar para os homens. T.W. Adorno, nos longínquos anos 50, já alertava que a tecnologia como corolário das sociedades perfeitas, era uma ilusão trágica. Tinha para si o uso que o nazifascismo fizera da então nascente tecnologia da informação. A detenção dos meios de comunicação não eliminava o uso das suas prerrogativas, de instrumento de domínio do sistema. A apropriação privada dos meios de informação não era diferente da apropriação privada dos meios de produção. Eram, pelo contrário, uma coisa só.
Fica a conclusão para a nossa realidade. O oligopólio da mídia brasileira talvez seja o exemplo mais flagrante do quanto podem os jornais e revistas que mentem e omitem. E o quanto lhes valem apostar em suas meias verdade ou mentiras inteiras para seu próprio futuro no sistema capitalista do Brasil.
Das meias verdades sabemos bem. Não é mentira que os estádios construídos, adrede, mostram-se, afinal, bem melhores do que tudo o que grande imprensa vaticinava em contrário, ao insistir em que o Brasil não teria a capacidade de construí-los a tempo. Como os fizemos, com algum financiamento do BNDES, ficou-se a ver as multidões da classe média nas ruas a clamar que poderíamos ter feitos mais hospitais em vez de estádios. É uma verdade inteira de que a saúde no Brasil é catastrófica em alguns lugares, não tão desastrosas em outros e que o SUS é o melhor que o Brasil pode fazer para a saúde do seu povo. E que muitos países, mesmo desenvolvidos, não fazem. Aguardam-se, mesmo assim, os protestos contra a Copa do Mundo de 2014. E o silêncio, além do desestímulo, mais rápido e eficiente possíveis a quaisquer comemorações se, por acaso, os jogadores brasileiros lograrem vencer o torneio. Foi assim com a Copa das Confederações. O Brasil venceu mas, em compensação, "não construiu hospitais", logo a TV e os jornais não tinham nada o que comemorar, já que depois da construção dos estádios a única esperança era a derrota do Brasil na final. E não aconteceu.
Parece ser na área da informação, entretanto, que as omissões e as mentiras deslavadas apontam para a existência de um Big Brother na direção contrária a da verdade. Ela existe, não para todos os gostos. Não, em todo o caso, por exemplo, para os que gostariam – e deveriam saber – como e em que condições um funcionário público, tido como exemplar, como o ministro Joaquim Barbosa, comprou um imóvel em Miami. Sobre o qual ele se recusa a falar, o que, claro, não provoca a estranheza de ninguém na grande imprensa.
É que lista de mentiras e omissões, a rigor, não tem fim. A grande imprensa sabe da existência de um processo de mais de seiscentos milhões contra Globo, por sonegação de impostos. Ela sabe, não os seus leitores. Há um processo correndo contra o governo paulista nas cortes internacionais: um alto executivo da Siemens admitiu claramente que pagava propinas para alguns administradores do metrô paulistano. Feita a denúncia pela revista "Isto é", os jornalões e as revistonas (de novo, com a exceção da "Carta Capital, entre outras menores) tentaram claramente ignorar o assunto, pois fazem toda a questão de proteger o tucanato no governo Só não o fizeram porque o assunto está correndo em tribunais do exterior – do contrário nunca o mencionariam.
Em relação ao rumoroso caso do mensalão, sabe-se que há uma urgência dos jornais e a mídia em geral em ver os réus condenados, devidamente trancafiados atrás das grades. Quanto ao fato de ter ficado demonstrado que não houve o desvio de um único centavo dos mais de setenta milhões pagos à agência de Marcos Valério, como provaram a Visanet e o Banco de Brasil, por intermédio de suas respectivas auditorias, (o que desmonta o processo inteiro levado a cabo pelo doutor Joaquim Barbosa), este é um assunto guardado a sete chaves. Que só os que têm acesso a alguns cronistas, sites e blogs sabem por inteiro. Há, no entanto, pelo contrário, o engodo da mansão do filho do Lula – que os jornais jamais denunciaram ser, na verdade, o prédio da Escola de Agricultura da Universidade de São Paulo (Esalq); há a montagem grosseira de uma foto de Lula com a sua esposa e sua suposta namorada, que igualmente todo o sistema de informação ficou sabendo, mas jamais informou; há a mentira das relações da presidenta Dilma com assaltos a bancos, no tempo da Ditadura, uma falsidade grotesca estampada por um dos grandes jornais brasileiros, de que ele, aliás, ele jamais se retratou. Há as denúncias contra a filha de José Serra, enfeixada num dos grandes best-sellers que jamais foi apresentado que tal pela grande imprensa; há, em suma, uma censura global, no Brasil, que está longe de ser da alçada do Big Brother da vez, que é o sr. Barack Obama e que, surpreendentemente, é praticado pela mesma mídia que a todo o momento fala em liberdade de imprensa. As mentiras, as omissões e as meias verdades são tantas que se pode projetar facilmente um livro a respeito: ele talvez se transforme num best-seller que certamente, por razões óbvias, os leitores da "Veja", do "Estadão," da "Folha" e os ouvintes da CBN e os telespectadores da Globo, dentre outras, jamais tomarão conhecimento.
Quem trabalhou nos grandes jornais e revistas nos anos setenta e oitenta há de se lembrar, com saudade, dos editorais furibundos do "Estadão" contra a "Folha", desta contra a "Globo", e de todos contra a "Veja", além da própria, contra todos. Não se tratava apenas do sagrado mandamento da concorrência. Havia o consenso de que a liberdade de imprensa dependia do contraditório. E o prestígio se fazia por quem "furasse" o outro. Na época, imaginava-se que o Big Brother seria aquele previsto e pintado por Orwell, num mundo em que os resistentes seriam a imprensa e os jornalistas. Não passava pela cabeça de ninguém que o "Grande Irmão" acabasse sendo, afinal, a própria grande imprensa.
O livro de George Orwell é 1984. Só para corrigir. Não precisa publicar.
ResponderExcluirAbraços