Por Luciano Martins Costa, no Observatório de Imprensa:
A Folha de S. Paulo, cujos títulos costumam ser mais afirmativos e enfáticos que os de seus concorrentes entre os jornais de circulação nacional, sai com um texto cauteloso na primeira página, em sua edição de quarta-feira (30/10). “Facção criminosa é suspeita de atuar em protesto em SP”, diz a manchete do jornal paulista.
No caderno “Cotidiano”, o título principal informa com prudência inusitada: “Polícia investiga se facção criminosa agiu em protestos”. No subtítulo e no destaque logo abaixo do título, o leitor vai sendo informado de que não se trata apenas de uma suspeita, mas de um conjunto de informações que, contextualizadas, induzem a uma opinião mais consistente: a de que o crime organizado se infiltrou nas manifestações que se repetem na zona norte de São Paulo desde que um policial militar matou a tiro um estudante de 17 anos de idade.
O que a Folha está tentando evitar, aparentemente, é a constatação de que o governo paulista não tem condições de enfrentar uma eventual onda de ataques do crime organizado.
O Estado de S. Paulo foi mais incisivo, ao publicar uma lista de eventos que demonstrariam a participação de integrantes da organização conhecida como Primeiro Comando da Capital (PCC) nas manifestações mais recentes.
O Globo entrevistou moradores e comerciantes da região de Vila Maria e Jaçanã, que foram aconselhados a não sair de casa e manter fechados seus estabelecimentos. Segundo o jornal carioca, o “toque de recolher” foi determinado por suspeitos de integrar a quadrilha e reforçado por policiais. De acordo com o Globo, na noite de terça-feira (29) não havia transporte coletivo, e no Jaçanã não era possível tomar nem o “trem das onze”, referência ao samba famoso do compositor Adoniran Barbosa.
Trocadilhos à parte, uma especialidade do jornal carioca, a reportagem mostra um cenário de desolação, com trabalhadores se resignando a voltar a pé para suas casas após a dura jornada, e tendo que andar em grupos para evitar a abordagem de assaltantes. Até mesmo as raras viaturas policiais encontradas pelo repórter trafegavam com faróis apagados. No entanto, com todas as evidências, nenhum jornal afirma o óbvio: que o PCC está de volta às ruas.
Nervos à flor da pele
É sabido que a organização criminosa tem grande influência na zona norte de São Paulo, conforme observa o Estado. Também se deve considerar a controvérsia provocada pela revelação de conversações telefônicas nas quais integrantes da quadrilha ameaçavam promover nova onda de ataques, caso se confirmasse a transferência de seus líderes para o regime disciplinar mais rigoroso nas penitenciárias onde cumprem suas sentenças. Não é banal o fato de que pelo menos vinte dos detidos nos protestos de segunda-feira (28) têm registros de roubo, furto ou tráfico de drogas.
Longe do noticiário sobre os protestos, o Estado de S. Paulo informa, em nota ao pé de uma coluna, que um dos chefes da organização, Paulo César Souza Nascimento, que cumpre pena em Presidente Venceslau (SP), foi transferido para o isolamento, onde permanecerá por seis meses. Na mesma nota informa-se que outros 33 sentenciados, identificados como líderes do PCC, também poderão ser colocados sob regime mais rigoroso de reclusão.
Os jornais afirmam que parte da zona norte de São Paulo está sob toque de recolher, ou seja, há uma conflagração à vista, mas evitam relacionar esse fato à provável participação de criminosos nos protestos que têm paralisado a região. Paralelamente, a imprensa informa que o Ministério da Justiça tenta obter do Supremo Tribunal Federal e da Procuradoria-Geral da República respaldo para a adoção de medidas de controle das manifestações, com intenção de interromper a prática das depredações, sempre creditadas aos ativistas que se identificam como os Black Blocs.
O contexto, extremamente complexo, tem provocado controvérsias nas redes sociais. A defesa da liberdade de expressão, que fundamenta as opiniões em favor das manifestações iniciadas no mês de junho, é confrontada com o intenso protagonismo dos Black Blocs, que se apossaram de todos os protestos sem, no entanto, apresentar uma demanda específica.
A imprensa divulga consultas de opinião pública que revelam uma ampla desaprovação à tática do vandalismo, mas não pode condenar explicitamente as manifestações.
Os assassinatos de suspeitos e meros transeuntes, como o caso que detonou protestos na zona norte da capital paulista, mostram que a Polícia Militar não apenas age arbitrariamente, como muitos de seus integrantes estão esgotados e sem condições de tomar decisões sob pressão.
A cautela dos jornais tenta esconder os sintomas de que o governo do estado não consegue controlar sua polícia – a alternativa seria admitir que a violência da Polícia Militar é uma política do Estado.
A Folha de S. Paulo, cujos títulos costumam ser mais afirmativos e enfáticos que os de seus concorrentes entre os jornais de circulação nacional, sai com um texto cauteloso na primeira página, em sua edição de quarta-feira (30/10). “Facção criminosa é suspeita de atuar em protesto em SP”, diz a manchete do jornal paulista.
No caderno “Cotidiano”, o título principal informa com prudência inusitada: “Polícia investiga se facção criminosa agiu em protestos”. No subtítulo e no destaque logo abaixo do título, o leitor vai sendo informado de que não se trata apenas de uma suspeita, mas de um conjunto de informações que, contextualizadas, induzem a uma opinião mais consistente: a de que o crime organizado se infiltrou nas manifestações que se repetem na zona norte de São Paulo desde que um policial militar matou a tiro um estudante de 17 anos de idade.
O que a Folha está tentando evitar, aparentemente, é a constatação de que o governo paulista não tem condições de enfrentar uma eventual onda de ataques do crime organizado.
O Estado de S. Paulo foi mais incisivo, ao publicar uma lista de eventos que demonstrariam a participação de integrantes da organização conhecida como Primeiro Comando da Capital (PCC) nas manifestações mais recentes.
O Globo entrevistou moradores e comerciantes da região de Vila Maria e Jaçanã, que foram aconselhados a não sair de casa e manter fechados seus estabelecimentos. Segundo o jornal carioca, o “toque de recolher” foi determinado por suspeitos de integrar a quadrilha e reforçado por policiais. De acordo com o Globo, na noite de terça-feira (29) não havia transporte coletivo, e no Jaçanã não era possível tomar nem o “trem das onze”, referência ao samba famoso do compositor Adoniran Barbosa.
Trocadilhos à parte, uma especialidade do jornal carioca, a reportagem mostra um cenário de desolação, com trabalhadores se resignando a voltar a pé para suas casas após a dura jornada, e tendo que andar em grupos para evitar a abordagem de assaltantes. Até mesmo as raras viaturas policiais encontradas pelo repórter trafegavam com faróis apagados. No entanto, com todas as evidências, nenhum jornal afirma o óbvio: que o PCC está de volta às ruas.
Nervos à flor da pele
É sabido que a organização criminosa tem grande influência na zona norte de São Paulo, conforme observa o Estado. Também se deve considerar a controvérsia provocada pela revelação de conversações telefônicas nas quais integrantes da quadrilha ameaçavam promover nova onda de ataques, caso se confirmasse a transferência de seus líderes para o regime disciplinar mais rigoroso nas penitenciárias onde cumprem suas sentenças. Não é banal o fato de que pelo menos vinte dos detidos nos protestos de segunda-feira (28) têm registros de roubo, furto ou tráfico de drogas.
Longe do noticiário sobre os protestos, o Estado de S. Paulo informa, em nota ao pé de uma coluna, que um dos chefes da organização, Paulo César Souza Nascimento, que cumpre pena em Presidente Venceslau (SP), foi transferido para o isolamento, onde permanecerá por seis meses. Na mesma nota informa-se que outros 33 sentenciados, identificados como líderes do PCC, também poderão ser colocados sob regime mais rigoroso de reclusão.
Os jornais afirmam que parte da zona norte de São Paulo está sob toque de recolher, ou seja, há uma conflagração à vista, mas evitam relacionar esse fato à provável participação de criminosos nos protestos que têm paralisado a região. Paralelamente, a imprensa informa que o Ministério da Justiça tenta obter do Supremo Tribunal Federal e da Procuradoria-Geral da República respaldo para a adoção de medidas de controle das manifestações, com intenção de interromper a prática das depredações, sempre creditadas aos ativistas que se identificam como os Black Blocs.
O contexto, extremamente complexo, tem provocado controvérsias nas redes sociais. A defesa da liberdade de expressão, que fundamenta as opiniões em favor das manifestações iniciadas no mês de junho, é confrontada com o intenso protagonismo dos Black Blocs, que se apossaram de todos os protestos sem, no entanto, apresentar uma demanda específica.
A imprensa divulga consultas de opinião pública que revelam uma ampla desaprovação à tática do vandalismo, mas não pode condenar explicitamente as manifestações.
Os assassinatos de suspeitos e meros transeuntes, como o caso que detonou protestos na zona norte da capital paulista, mostram que a Polícia Militar não apenas age arbitrariamente, como muitos de seus integrantes estão esgotados e sem condições de tomar decisões sob pressão.
A cautela dos jornais tenta esconder os sintomas de que o governo do estado não consegue controlar sua polícia – a alternativa seria admitir que a violência da Polícia Militar é uma política do Estado.
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