Por Altamiro Borges
A elite paulista está desesperada com os chamados “rolezinhos” nos shoppings – ações articuladas por jovens da periferia, através das redes sociais, como forma de protesto e deboche. Neste final de semana, a PM do tucano Geraldo Alckmin voltou a esbanjar truculência e preconceito contra a moçada irreverente. A repórter Vanessa Barbara, da Folha, registrou uma destas cenas deprimentes, que confirmam a existência de um novo tipo de “apartheid” em São Paulo. Vale conferir a sua reportagem desta segunda-feira (13):
*****
Em Itaquera, PM dizia a quem passava: 'Vou arrebentar você'
No estacionamento do shopping Metrô Itaquera, 11 jovens de bermudas coloridas e tênis chamativos estavam sendo revistados. Tinham um olhar vazio e sem expressão; cederam as mochilas, os documentos e explicaram o que tinham ido fazer ali: dar um "rolezinho".
O tenente encarregado da operação não encontrou nada de ilícito nos pertences dos jovens, a maioria negros e menores de idade. Explicou que a polícia estava abordando pessoas que pudessem ter ido para o evento, pois tinha um mandado de proibição.
Anotaram nome e endereço de todos e avisaram que, se causassem tumulto, seriam multados em R$ 10 mil.
Os adolescentes não me olhavam nos olhos e pareciam resignados. "Não vou embora não, quero ir ao cinema", disse Rodney Batista, 20. No grupo de 11, só um tinha o olhar duro de quem estava engolindo a raiva.
Não vi ninguém com armas; ninguém roubando, depredando ou fazendo arrastão. Ainda assim, os lojistas entraram em pânico.
Segundo a opinião pública, são bandidos com histórico de crimes; no melhor dos casos, vagabundos que vão lá tumultuar, cometer delitos e assustar "gente de bem".
São tratados como tais pelas autoridades: passando pelo corredor, um policial repetia no ouvido de todos: "Vou arrebentar vocês, vou arrebentar" --e plaf, deu um chute em um menino.
Pedi: "Licença, gostaria de saber o nome do senhor, ouvi o que o senhor disse e vi o que fez", ao que ele tirou a etiqueta de identificação e escondeu no bolso. Insisti em saber o nome, tentei tirar uma foto, recorri ao tenente e falei com outros policiais - todos identificados.
Mas me acovardei e pensei que ele poderia ter ficado assustado por ter sido flagrado, que talvez tenha sido um momento do qual se arrependeu... Pensei também que arrogar qualquer tipo de coisa - "Sou da imprensa, olha só o meu crachá lustroso" - me rebaixaria ao nível dele, que usou do poder para fazer algo contra alguém mais fraco.
Vi gente filmando e sendo obrigada a apagar o arquivo, e a imprensa foi orientada a não registrar o que ocorria.
A gente fica só imaginando o que não devem fazer quando ninguém está realmente olhando.
*****
Esta ação da polícia não é isolada. Seis shoppings de São Paulo já conseguiram apoio da Justiça no bloqueio de suas portas automáticas para que policiais e seguranças privados identifiquem os frequentadores. Além de Itaquera, as liminares (decisões provisórias) beneficiaram: JK Iguatemi e Campo Limpo, na capital paulista; Parque D. Pedro e Iguatemi, em Campinas; e CenterVale, em São José dos Campos. Os alvos da discriminação são menores de idade desacompanhados e de baixa renda, conforme atestam várias reportagens. A absurda liminar da Justiça proíbe o ingresso destes jovens nos centros comerciai e ainda fixa uma multa de R$ 10 mil para os participantes destas ações.
O primeiro “rolezinho” ocorreu em dezembro no Shopping Itaquera, na periferia paulistana, e teve a participação de cerca de 6 mil jovens. A PM agiu com violência e seis adolescentes foram presos. A repressão gerou revolta e novos “rolezinhos” foram convocados pelas redes sociais. No shopping de Guarulhos, na região metropolitana, o protesto ocorreu em 15 de dezembro e resultou em 23 presos. No dia 22, véspera do Natal, jovens foram revistados no Shopping Interlagos, um dos mais luxuosos da capital. A polícia mobilizou inclusive o Grupo de Operações Especiais (GOE). Em 4 de janeiro, no Shopping Metrô Tucuruvi, na zona norte, houve outra ação com a presença de 400 jovens, mas sem incidentes.
Há sinais de que os “rolezinhos”, que tem características similares aos chamados flash mobs (concentrações espontâneas de pessoas convocadas pelas redes sociais em um determinado espaço para realizar uma mesma ação), podem se transformar numa nova forma de protesto dos jovens da periferia. Como já alertou a jornalista Eliane Brum, num excelente artigo na edição brasileira do jornal espanhol El País, o “rolezinho” expressa as brutais desigualdades da sociedade brasileira e “mostra a face deformada do seu racismo”. Os jovens são reprimidos sem qualquer motivo legal. “Se não há crime, por que a juventude pobre e negra das periferias da Grande São Paulo está sendo criminalizada?”, ela pergunta e responde:
“Por causa do passo para dentro. Os shoppings foram construídos para mantê-los do lado de fora e, de repente, eles ousaram superar a margem e entrar. E reivindicando algo transgressor para jovens negros e pobres, no imaginário nacional: divertir-se fora dos limites do gueto. E desejar objetos de consumo. Não geladeiras e TVs de tela plana, símbolos da chamada classe C ou ‘nova classe média’, parcela da população que ascendeu com a ampliação de renda no governo Lula, mas marcas de luxo, as grandes grifes internacionais, aqueles que se pretendem exclusivas para uma elite, em geral branca”.
“A resposta violenta da administração dos shoppings, das autoridades públicas, da clientela e de parte da mídia demonstra que esses atores decodificaram a entrada da juventude das periferias nos shoppings como uma violência. Mas a violência era justamente o fato de não estarem lá para roubar, o único lugar em que se acostumaram a enxergar jovens negros e pobres. Então, como encaixá-los, em que lugar colocá-los? Preferiram concluir que havia a intenção de furtar e destruir, o que era mais fácil de aceitar do que admitir que apenas queriam se divertir nos mesmos lugares da classe média, desejando os mesmo objetos de consumo que ela. Levaram uma parte dos rolezeiros para a delegacia. Ainda que tivessem de soltá-los logo depois, porque nada de fato havia para mantê-los ali, o ato já estigmatizou-os e assinalará suas vidas, como historicamente se fez com os negros e pobres no Brasil”.
A elite paulista está desesperada com os chamados “rolezinhos” nos shoppings – ações articuladas por jovens da periferia, através das redes sociais, como forma de protesto e deboche. Neste final de semana, a PM do tucano Geraldo Alckmin voltou a esbanjar truculência e preconceito contra a moçada irreverente. A repórter Vanessa Barbara, da Folha, registrou uma destas cenas deprimentes, que confirmam a existência de um novo tipo de “apartheid” em São Paulo. Vale conferir a sua reportagem desta segunda-feira (13):
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Em Itaquera, PM dizia a quem passava: 'Vou arrebentar você'
No estacionamento do shopping Metrô Itaquera, 11 jovens de bermudas coloridas e tênis chamativos estavam sendo revistados. Tinham um olhar vazio e sem expressão; cederam as mochilas, os documentos e explicaram o que tinham ido fazer ali: dar um "rolezinho".
O tenente encarregado da operação não encontrou nada de ilícito nos pertences dos jovens, a maioria negros e menores de idade. Explicou que a polícia estava abordando pessoas que pudessem ter ido para o evento, pois tinha um mandado de proibição.
Anotaram nome e endereço de todos e avisaram que, se causassem tumulto, seriam multados em R$ 10 mil.
Os adolescentes não me olhavam nos olhos e pareciam resignados. "Não vou embora não, quero ir ao cinema", disse Rodney Batista, 20. No grupo de 11, só um tinha o olhar duro de quem estava engolindo a raiva.
Não vi ninguém com armas; ninguém roubando, depredando ou fazendo arrastão. Ainda assim, os lojistas entraram em pânico.
Segundo a opinião pública, são bandidos com histórico de crimes; no melhor dos casos, vagabundos que vão lá tumultuar, cometer delitos e assustar "gente de bem".
São tratados como tais pelas autoridades: passando pelo corredor, um policial repetia no ouvido de todos: "Vou arrebentar vocês, vou arrebentar" --e plaf, deu um chute em um menino.
Pedi: "Licença, gostaria de saber o nome do senhor, ouvi o que o senhor disse e vi o que fez", ao que ele tirou a etiqueta de identificação e escondeu no bolso. Insisti em saber o nome, tentei tirar uma foto, recorri ao tenente e falei com outros policiais - todos identificados.
Mas me acovardei e pensei que ele poderia ter ficado assustado por ter sido flagrado, que talvez tenha sido um momento do qual se arrependeu... Pensei também que arrogar qualquer tipo de coisa - "Sou da imprensa, olha só o meu crachá lustroso" - me rebaixaria ao nível dele, que usou do poder para fazer algo contra alguém mais fraco.
Vi gente filmando e sendo obrigada a apagar o arquivo, e a imprensa foi orientada a não registrar o que ocorria.
A gente fica só imaginando o que não devem fazer quando ninguém está realmente olhando.
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Esta ação da polícia não é isolada. Seis shoppings de São Paulo já conseguiram apoio da Justiça no bloqueio de suas portas automáticas para que policiais e seguranças privados identifiquem os frequentadores. Além de Itaquera, as liminares (decisões provisórias) beneficiaram: JK Iguatemi e Campo Limpo, na capital paulista; Parque D. Pedro e Iguatemi, em Campinas; e CenterVale, em São José dos Campos. Os alvos da discriminação são menores de idade desacompanhados e de baixa renda, conforme atestam várias reportagens. A absurda liminar da Justiça proíbe o ingresso destes jovens nos centros comerciai e ainda fixa uma multa de R$ 10 mil para os participantes destas ações.
O primeiro “rolezinho” ocorreu em dezembro no Shopping Itaquera, na periferia paulistana, e teve a participação de cerca de 6 mil jovens. A PM agiu com violência e seis adolescentes foram presos. A repressão gerou revolta e novos “rolezinhos” foram convocados pelas redes sociais. No shopping de Guarulhos, na região metropolitana, o protesto ocorreu em 15 de dezembro e resultou em 23 presos. No dia 22, véspera do Natal, jovens foram revistados no Shopping Interlagos, um dos mais luxuosos da capital. A polícia mobilizou inclusive o Grupo de Operações Especiais (GOE). Em 4 de janeiro, no Shopping Metrô Tucuruvi, na zona norte, houve outra ação com a presença de 400 jovens, mas sem incidentes.
Há sinais de que os “rolezinhos”, que tem características similares aos chamados flash mobs (concentrações espontâneas de pessoas convocadas pelas redes sociais em um determinado espaço para realizar uma mesma ação), podem se transformar numa nova forma de protesto dos jovens da periferia. Como já alertou a jornalista Eliane Brum, num excelente artigo na edição brasileira do jornal espanhol El País, o “rolezinho” expressa as brutais desigualdades da sociedade brasileira e “mostra a face deformada do seu racismo”. Os jovens são reprimidos sem qualquer motivo legal. “Se não há crime, por que a juventude pobre e negra das periferias da Grande São Paulo está sendo criminalizada?”, ela pergunta e responde:
“Por causa do passo para dentro. Os shoppings foram construídos para mantê-los do lado de fora e, de repente, eles ousaram superar a margem e entrar. E reivindicando algo transgressor para jovens negros e pobres, no imaginário nacional: divertir-se fora dos limites do gueto. E desejar objetos de consumo. Não geladeiras e TVs de tela plana, símbolos da chamada classe C ou ‘nova classe média’, parcela da população que ascendeu com a ampliação de renda no governo Lula, mas marcas de luxo, as grandes grifes internacionais, aqueles que se pretendem exclusivas para uma elite, em geral branca”.
“A resposta violenta da administração dos shoppings, das autoridades públicas, da clientela e de parte da mídia demonstra que esses atores decodificaram a entrada da juventude das periferias nos shoppings como uma violência. Mas a violência era justamente o fato de não estarem lá para roubar, o único lugar em que se acostumaram a enxergar jovens negros e pobres. Então, como encaixá-los, em que lugar colocá-los? Preferiram concluir que havia a intenção de furtar e destruir, o que era mais fácil de aceitar do que admitir que apenas queriam se divertir nos mesmos lugares da classe média, desejando os mesmo objetos de consumo que ela. Levaram uma parte dos rolezeiros para a delegacia. Ainda que tivessem de soltá-los logo depois, porque nada de fato havia para mantê-los ali, o ato já estigmatizou-os e assinalará suas vidas, como historicamente se fez com os negros e pobres no Brasil”.
Nos shoppings do RJ e calculo que também em SP sempre houve diversidade racial e de classe - mesmo na Barra da Tijuca, p.ex.
ResponderExcluirCriar um movimento com nome para intimidar ou causar realmente algum tumulto ou dano é problemático, já que impõe algum tipo de reação. Na Europa se fez isso em supermercados e shoppings, do tipo 'leve e não pague' e por aí vai, mas era um lance político. Aqui também é. Ano de Copa e eleição se pode esperar tudo, pelo visto. Você legitima arrastão, se houver?
Então só a elite tem família ?? Esses jovens não tem família ?? Andam em bando por que ?? Bom saber, só vou aonde houver liminar !! Shopping não é parque estadual, estão lá para vender, quer fazer rolê, vá ao Ibirapuera.
ResponderExcluirA frase da charge está errada. De propósito e de má fé, evidente. O correto seria "Para fora todo mundo que tem cara de arruaceiro!" Ninguem implica com pobre frequentar shopping e sim com arruaceiro frequentando shopping.
ResponderExcluirMeu caro amigo, pra você que acha que não houve arrastão em Itaquera, segue as provas:
ResponderExcluirhttps://fbcdn-sphotos-a-a.akamaihd.net/hphotos-ak-frc3/1491607_10202212215120298_1887420605_n.jpg
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Antes de defender bandido, pesquisa um pouco mais! Abraços.
Elite contra? QUE ELITE, meu caro??? A elite que frequenta o Shopping ITAQUERA??? Elite de Itaquera? Ou você se refere à elite de GUARULHOS? Que idéia sem fundamento, nunca vi ninguém ser retirado de shopping nenhum por causa da cor da pele, nem da roupa, nada. Os shoppings excluem pelo poder de compra, não pela cor da pele, esse tempo já passou, saia do passado e venha para o presente.
ResponderExcluirBacana a matéria. Tem outra também bem interessante sobre os rolezinhos, todos deveriam ler: http://cutucandoaonca.blogspot.com.br/2014/01/rolezinho-ela-falava-alemao-e-ele-tinha.html
ResponderExcluirObservado desde fora do Brasil: O que acontece no Brasil e para brasileiros de concordar. Mas nisto agora mexem as ONGs "Contras" da Alemanha, Bretanha e EUA - para desestabilicar o Brasil na COPA -com o fim de quebrar a resistencia do governo contra a "expansao da OTAN" ao Atlantico Sul (e Sul-America e Africa) - o plano "Cut the Atlantic-divide" dos EUA. A OTAN quer um Brasil meigo com um governo entreguista. As ONGs da Alemanha no Brasil sao as mais agressivas - en quanto EUA e Bretanha estao ocupados com o Siria, Afghanistao e o Ira. Viu ??
ResponderExcluirMuito bom o post vou sempre visitar seu blog !!
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ResponderExcluirExcelente post !!