Por Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa:
A imprensa parece ter encerrado no domingo (11/5) seu interesse no caso do linchamento da dona de casa Fabiane Maria de Jesus, ocorrido no dia 3, no bairro de Morrinhos, em Guarujá, litoral paulista. Seguindo a tendência da última década, as edições domingueiras de jornais, com menos capilaridade para ampliar a cobertura dos fatos, concorrem diretamente com as revistas, investindo em textos analíticos dos assuntos que dominaram a semana.
A violência, representada pelo crime cometido por moradores de Morrinhos, é tratada pelos diários em aspectos mais amplos do que são capazes de fazer as próprias revistas semanais de informação, embora o leitor ainda esteja longe de ver o tema abordado sob o olhar da complexidade.
A linguagem linear do jornalismo tradicional e o modo como a imprensa se apropriou das tecnologias digitais de edição e publicação limitam o potencial de contar a história, mesmo com a disponibilidade de sistemas de publicação multiplataformas. Por outro lado, temos que conviver com o crescimento avassalador do protagonismo nas redes digitais, com indivíduos sem qualificação específica fazendo o papel do jornalista, o que pode resultar num quadro desastroso.
O Globo reproduz, na edição de domingo, um estudo da ONG Safernet (ver site aqui) mostrando como aumentou o total de denúncias de incitações ao crime através do Facebook, a rede social mais utilizada. Nos últimos três anos, a partir de 2011, houve uma multiplicação de 265% nos casos denunciados de páginas com conteúdo violento, representado por manifestações de intolerância racial, religiosa, xenofobia e homofobia, de pregação nazista e incitação ao crime contra a vida.
Embora não esteja descrito na reportagem, o observador constata, em meio à maioria de anônimos, manifestações de protagonistas mais recorrentes, que acabam formando grupos de admiradores, e até mesmo personalidades conhecidas da vida social e da mídia, como um famoso publicitário que de vez em quando defende o assassinato de autoridades federais.
A responsabilidade da mídia
Os diários paulistas de circulação nacional foram ao local do linchamento fazer um retrato da comunidade onde foi cometido o ato de barbárie.
A Folha de S. Paulo achou interessante registrar que a família da vítima também temia o mito da bruxa que estaria raptando crianças para usar em rituais de magia negra e conta que Fabiane Maria de Jesus não acreditava na história que acabaria provocando sua morte. A Folha também rastreia as páginas dedicadas a pregar a violência, chamando seus autores de “Datenas do Facebook” – referência ao jornalista José Luís Datena, apresentador da Rede Bandeirantes de Televisão.
No Estado de S. Paulo há uma reportagem sobre o clima de arrependimento e culpa que domina a comunidade de Morrinhos, após a revelação de que a mulher linchada era apenas uma dona de casa com problemas de depressão que havia deixado de tomar seus medicamentos. Mas o jornal não fica apenas na cobertura factual, no caderno “Metrópole”. O caderno de cultura “Aliás” apresenta na capa reflexões do sociólogo brasileiro José de Souza Martins e do filósofo esloveno Slavoj Žižek, autor de um livro intituladoViolência. O sociólogo revela que, nos últimos 60 anos, cerca de 1 milhão de brasileiros participaram de linchamentos e tentativas coletivas de execução de suspeitos, que tiveram como vítimas um grande número de inocentes como Fabiane Maria de Jesus.
O que mais impressiona, além da banalidade do ato criminoso, é a revelação de que essa prática saltou de quatro ocorrências por semana para uma por dia, depois das manifestações de junho de 2013, segundo José de Souza Martins. Essa é uma questão central, que merece ser mantida sob o foco da imprensa, dada a possibilidade de um recrudescimento das manifestações durante a Copa do Mundo.
Temos, então, no conjunto de leituras do fim de semana, o detalhamento do crime e dos sentimentos que provoca quando a horda volta à sua rotina de massa humana, a persistência da estigmatização do outro, do diferente, como uma cicatriz de obscurantismo em meio à modernidade, e o ponto em torno do qual a imprensa segue gaguejando: a responsabilidade dos meios de comunicação.
Por mais que se dê voltas ao assunto, convém discutir, algum dia, o papel da televisão e do rádio – e agora, também da internet – no estímulo à violência.
A violência, representada pelo crime cometido por moradores de Morrinhos, é tratada pelos diários em aspectos mais amplos do que são capazes de fazer as próprias revistas semanais de informação, embora o leitor ainda esteja longe de ver o tema abordado sob o olhar da complexidade.
A linguagem linear do jornalismo tradicional e o modo como a imprensa se apropriou das tecnologias digitais de edição e publicação limitam o potencial de contar a história, mesmo com a disponibilidade de sistemas de publicação multiplataformas. Por outro lado, temos que conviver com o crescimento avassalador do protagonismo nas redes digitais, com indivíduos sem qualificação específica fazendo o papel do jornalista, o que pode resultar num quadro desastroso.
O Globo reproduz, na edição de domingo, um estudo da ONG Safernet (ver site aqui) mostrando como aumentou o total de denúncias de incitações ao crime através do Facebook, a rede social mais utilizada. Nos últimos três anos, a partir de 2011, houve uma multiplicação de 265% nos casos denunciados de páginas com conteúdo violento, representado por manifestações de intolerância racial, religiosa, xenofobia e homofobia, de pregação nazista e incitação ao crime contra a vida.
Embora não esteja descrito na reportagem, o observador constata, em meio à maioria de anônimos, manifestações de protagonistas mais recorrentes, que acabam formando grupos de admiradores, e até mesmo personalidades conhecidas da vida social e da mídia, como um famoso publicitário que de vez em quando defende o assassinato de autoridades federais.
A responsabilidade da mídia
Os diários paulistas de circulação nacional foram ao local do linchamento fazer um retrato da comunidade onde foi cometido o ato de barbárie.
A Folha de S. Paulo achou interessante registrar que a família da vítima também temia o mito da bruxa que estaria raptando crianças para usar em rituais de magia negra e conta que Fabiane Maria de Jesus não acreditava na história que acabaria provocando sua morte. A Folha também rastreia as páginas dedicadas a pregar a violência, chamando seus autores de “Datenas do Facebook” – referência ao jornalista José Luís Datena, apresentador da Rede Bandeirantes de Televisão.
No Estado de S. Paulo há uma reportagem sobre o clima de arrependimento e culpa que domina a comunidade de Morrinhos, após a revelação de que a mulher linchada era apenas uma dona de casa com problemas de depressão que havia deixado de tomar seus medicamentos. Mas o jornal não fica apenas na cobertura factual, no caderno “Metrópole”. O caderno de cultura “Aliás” apresenta na capa reflexões do sociólogo brasileiro José de Souza Martins e do filósofo esloveno Slavoj Žižek, autor de um livro intituladoViolência. O sociólogo revela que, nos últimos 60 anos, cerca de 1 milhão de brasileiros participaram de linchamentos e tentativas coletivas de execução de suspeitos, que tiveram como vítimas um grande número de inocentes como Fabiane Maria de Jesus.
O que mais impressiona, além da banalidade do ato criminoso, é a revelação de que essa prática saltou de quatro ocorrências por semana para uma por dia, depois das manifestações de junho de 2013, segundo José de Souza Martins. Essa é uma questão central, que merece ser mantida sob o foco da imprensa, dada a possibilidade de um recrudescimento das manifestações durante a Copa do Mundo.
Temos, então, no conjunto de leituras do fim de semana, o detalhamento do crime e dos sentimentos que provoca quando a horda volta à sua rotina de massa humana, a persistência da estigmatização do outro, do diferente, como uma cicatriz de obscurantismo em meio à modernidade, e o ponto em torno do qual a imprensa segue gaguejando: a responsabilidade dos meios de comunicação.
Por mais que se dê voltas ao assunto, convém discutir, algum dia, o papel da televisão e do rádio – e agora, também da internet – no estímulo à violência.
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