terça-feira, 6 de maio de 2014

O discurso de Dilma e o "Volta Lula"

Por Miguel do Rosário, no blog O Cafezinho:

Conversando ontem com a turma do Barão de Itararé sobre a situação política, eu comentava o discurso de Dilma no Encontro Nacional do PT.

A presidenta ficou quase uma hora fazendo um discurso de cerimonial: “Eu queria agradecer fulano, sicrano… Queria também agradecer beltrano”. Agradeceu umas 350 pessoas! Não consegui continuar assistindo. Para piorar, ela inicia o discurso agradecendo Lula de uma maneira exagerada, com um tom ufanista que não combina com Lula, uma pessoa de modos afáveis e modestos. Dilma tem de tratar Lula como amigo, de igual para igual, nunca de baixo para cima. Não tinha de chamar Lula nem de “senhor”, e sim de “você”.

Eu gostaria de saber quem é o gênio que planeja um discurso desse para a presidente às vésperas de uma eleição presidencial! Me parece óbvio que Dilma tem de cortar imediatamente qualquer convencionalismo, que pega muito mal em 2014, e ainda mais para alguém que já sofre o desgaste natural de estar no governo e ser obrigado a seguir alguns protocolos. Na minha humilde opinião, Dilma tem de começar seus discursos indo direto ao assunto, talvez fazendo uma abertura poética, emocionante. 

Ficou muito chocante assistir ao discurso de Lula, divertido, espontâneo e genial como sempre, e depois ouvir Dilma iniciar o seu dizendo “eu queria agradecer” por horas a fio! Dilma não precisa ser o Lula, mas poderia, no mínimo, contratar alguém mais criativo para escrever seus discursos. Não dá para entender. O PT nunca teve tanta estrutura, e não consegue construir uma base de comunicação mais eficiente para Dilma Rousseff? Assim não há quem segure o “volta Lula”. E assim não há quem vença as eleições…

Assista ao discurso de Dilma no Encontro Nacional do PT. Se conseguir enfrentar os primeiros desesperadores 15 minutos, o que eu não consegui, talvez você escute alguma coisa bonita. Aliás, se tem alguma coisa bonita, deveria ser então recortada e espalhada nas redes.

Dilma fez um excelente discurso na TV, mas não adianta se ficar só nisso. Tem de seguir o conselho de Lula durante o Encontro Nacional do PT, e fazer discursos assim diariamente. Usa a EBC, as redes sociais, o blog. Se Dilma não usar a comunicação para falar bem de seu governo, quem o fará? A grande mídia já iniciou uma campanha violentíssima contra o governo e o PT. É pau pau pau, todo dia, toda hora. A tática pode ser resumida no novo chapéu noticioso das manchetes do jornal O Globo: “Escândalo em série”.

A presidente parece ter comprado a versão midiática sobre o que um presidente pode ou não fazer. Não é a mídia que define o que um presidente pode ou não fazer. E não se pode chancelar a criminalização da política. A presidente precisa falar todo dia com a população. Os ministros precisam falar todo o dia com a população. E falar diretamente, sem intermédio da mídia. Usem os sites dos ministérios! Usem as redes sociais! Dar entrevista ao Globo, como fez Guido Mantega, dizendo que vai “aumentar tributos”, é tiro no pé! Nesse caso, é melhor mesmo ficar quieto.

É preciso estabelecer, junto à sociedade (não junto à mídia) e junto às instituições responsáveis, quantas vezes por mês um presidente pode falar em cadeia nacional. Uma? Duas? Vamos estabelecer isso, e daí o presidente fala uma ou duas vezes por mês. E pode usar a EBC, ou não? Pode trocar o “Café com a presidenta” por um discurso semanal forte em vídeo? A presidente pode usar o blog?

É isso ou deixar que a mídia domine a narrativa de tudo o que está acontecendo no Brasil, e assim como nos fizeram, em 64, acreditar que golpe era democracia e democracia era golpe, hoje nos fazem acreditar hoje que tudo está ruim quando as coisas estão boas. A narrativa da mídia é poderosa, engambela as melhores cabeças; aliás, ela engambela sobretudo as melhores cabeças por razões psico-culturais: é na grande mídia que as “melhores cabeças” tem esperança de verem publicadas resenhas de suas obras.

O governo tem de oferecer, por isso mesmo, instrumentos para atrair a intelectualidade: prêmios literários, políticas inovadoras para cinema, desburocratização do sistema de fomento a produção cinematográfica.

Enfim, Dilma tem o grande trunfo que a oposição não tem: uma caneta. É com essa caneta que Dilma pode ganhar as eleições, abrindo seu governo a propostas criativas, sobretudo no campo da comunicação e da cultura, mas consciente de que esse campo hoje é fundamental para dar suporte às transformações estruturais em curso no país.

A presidenta deveria dar alguma palavrinha sobre comunicação social e política. A América Latina inteira está fazendo leis de mídia, e Dilma não dá nem uma palavrinha sobre o assunto? Isso acaba prejudicando politicamente os movimentos que lutam pela democratização da mídia, porque nos sentimos abandonados. Eu sei que o PT não tem força para, sozinho, fazer uma mudança. Mas não custa nada a presidente fazer uma observação, nem que seja irônica, sobre a mídia brasileira. É este o sentido do título: Volta Lula, não no sentido do presidente Lula ser o candidato, mas de termos uma liderança política que enfrente o debate político, não uma vez na vida outra na morte, mas diariamente. E se ela não quiser, então delegue, de fato, poder a alguém para fazê-lo. O poder não tolera o vácuo, se há silêncio no governo, a mídia o preenche alegremente, e nos aniquila.

Esta semana ficamos sabendo que uma mulher foi linchada em Guarujá por causa de um “boato” nas redes sociais. Pois é, se um boato lançado por um site meia bomba de Guarujá tem esse poder, imaginem o poder da mídia corporativa, trabalhando unida com um só objetivo: destruir a imagem de um partido político e desmantelar a sua base aliada.

É óbvio que é preciso pôr um freio democrático a esse poder arbitrário, que traz desequilíbrio à delicada balança dos poderes.

Dilma não pode deixar de usar a maior arma de um político numa democracia: a palavra. Quando não puder falar diretamente, use a ironia, o humor, a metáfora. E quando puder falar diretamente, seja agressiva, dura e elegante, como só ela sabe fazer.

A maioria dos leitores do blog são eleitores da Dilma e ficam chateados quando eu faço críticas à presidenta. Eu também sou eleitor. Nós somos o núcleo duro de esquerda, em torno de 30% do eleitorado. Votamos na esquerda independente do carnaval da mídia. Entretanto, se não houver uma política de comunicação mais agressiva, Dilma pode até ganhar as eleições, mas perdendo politicamente e enfrentando grandes dificuldades para governar num próximo mandato.

*****

Alguns informes:

- A semana está um pouco enrolada para o blogueiro porque estou à frente da organização do nosso II Encontro de Blogueiros do Rio de Janeiro, que começa na próxima sexta-feira. Quem quiser participar, inscreva-se logo, porque as vagas são realmente limitadas.

- Além disso, hoje, terça-feira, a gente comemora 1 ano do núcleo fluminense do Barão de Itararé e estamos organizando um churrasco de comemoração, só que num lugar pequeno e por isso mesmo, infelizmente, fechado apenas para poucos convidados.

- Outro informe importante é a estreia do programa de Paulo Moreira Leite na TV Brasil, hoje às 22 horas. Vale a pena conferir, gravar no youtube e divulgar o máximo possível, porque o nosso campo tem pouquíssimos espaços para se manifestar, mesmo nas tvs públicas.

3 comentários:

  1. É tanta informação que até palpite para o Aécio Neves já dei, aqui no Blog do Altamiro Borges e creio que ele não o publicará. Como tantos outros que já postei por lá! As vezes sou mal e até mau compreendido nas minhas intenções.
    Neste quero apenas fazer uma pergunta sobre o churrasco de um ano do Barão de Itararé no RJ. Por que não escolheram um lugar maior? E quem foram os convidados privilegiados e os desprivilegiados, e por que?
    Liberdade, igualdade e fraternidade?

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  2. Volta Lula!?
    Repetindo com algumas alterações este comentário já postado em artigos e matérias sobre o mote.
    Existe algo interessante que influencia a opinião da maioria, dos eleitores como convêm ao caso. Apesar de iniciá-lo com gostos musicais.
    Dias atrás falei de meu gosto sobre os sucessos musicais dos anos 50, 60 e 70 das grandes bandas, grupos a até cantores/compositores nacionais e internacionais comparando-os com hoje sob a pergunta, por que não surgem ou fazem mais músicas como daquela época? E ouvi a seguinte definição: Música também é questão de sentimento e sofre influência do contexto político-social que vivemos. Hoje o sentimento é outro, até para compositores daqueles tempos que ainda estão em gozo de plena saúde e na meia-idade.
    Há analogia no sentimento do eleitor com dos cantores/compositores referidos acima.
    Na política a costura de alianças torna uma eleição meio-ganha. No Brasil quem tem o apoio do PMDB entra para este rol de candidatos privilegiados, porque o PMDB ainda é o primeiro ou no pior dos casos o segundo partido de maior quantidade de vereadores, deputados estaduais e federais do país tornando-o o mais forte cabo-eleitoral depois do PT. Não descartando a importância do PCdoB e demais partidos políticos por menores que sejam como também de políticos da envergadura eleitoral de Fernando Collor de Mello e Paulo Salim Maluf, entre outros. Receita de Lula, que deu certo.
    Mas a segunda metade-ganha de uma eleição depende do sentimento que o candidato desperta no eleitor.
    Temos aí despontando em percentuais críticos para todos tanto nas pesquisas eleitorais sérias ou até em tendenciosas: Três candidatos; Dilma Roussef, Aécio Neves e Eduardo Campos com Marina Silva de vice.
    Existe nos dilmistas uma torcida para que o passado Lula/Lula se repita como Dilma/Dilma e depois outro Lula/Lula. Boicotando assim a volta de Lula para a disputa deste pleito e colocando todo um projeto da esquerda brasileira a beira de um colapso ou caos por questão de sentimentos próprios. Se esquecendo que o sentimento a ser levado em consideração é o do eleitor.
    Por mais que ele diga que apoia Dilma, a volta de Lula é imprescindível para esta disputa eleitoral e não quer dizer que esta ganha, não! Mas que as chances aumentam consideravelmente é fato indiscutível.
    Que os dilmistas se conformem, se há alguma chance de dobradinhas é de Lula, outra vez, Lula/Lula Dilma Lula/Lula e quiçá Dilma em um caso inédito de transferência de votos como foi da primeira vez, em uma segunda.
    ZéM.

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  3. O que não dá para entender são as sugestões para o investimento nas artes como cinema, obras de pintores, autores e etc, para atenderem os anseios dos intelectuais. Após quase quatro anos de governo da presidente Dilma.
    Sugestão esta para o discurso, leia bem: PARA O DISCURSO. Isso quer dizer o que? Que Dilma Roussef deu uma banana para os intelectuais brasileiros?
    É preciso acordar para uma realidade política que se apresenta desfavorável para o projeto da esquerda brasileira.
    Não adianta esbravejarem em uníssonos a favor de Dilma com inclusive sugestões entre tapas e beijos à ela, sem aceitarmos e refletirmos antes, sugestões de outros para nós mesmos. Para as nossas administrações de micro ou pequenas entidades de classes levando a elas a realidade, o que está em jogo e quais são as verdadeiras chances de ganhar e principalmente, de perder. Para sabermos quem realmente devemos apoiar nesta candidatura.
    Eu tenho convicção plena de que o candidato certo para este pleito é Lula.
    Não podemos por em risco um projeto que custou séculos e milhares de vidas para ser concretizado.
    Precisamos de uma Estrela que Brilha. Lula Lá!

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