Por Laurindo Lalo Leal Filho, na Revista do Brasil:
Em aula recente, na Escola de Governo de São Paulo, ilustrei o tema da padronização das informações oferecidas pela mídia com manchetes idênticas estampadas pelos três jornalões brasileiros (Globo, Estadão e Folha). O tema era a fala do ex-presidente Lula no Encontro Nacional de Blogueiros. De um discurso de mais de uma hora, com análises da conjuntura, aqueles e outros veículos, como Correio Braziliense, O Dia, Exame e o portal G1, resolveram destacar, de forma truncada, uma referência do ex-presidente à forma do torcedor chegar aos estádios de futebol.
Lembrei que o blogueiro Eduardo Guimarães se fez passar por um cidadão desinformado para constatar, com alguns repórteres, qual seria a linha adotada em conjunto para a cobertura do encontro. O dialogo foi rápido: “Lula é sempre notícia, né?”, comentou Eduardo com um repórter. A resposta: “Notícia cabeluda. Dá um trabalho danado”. “Por quê?”, quis saber o blogueiro. “A gente tem de achar a ‘pauta certa’”, informou o jornalista.
Presentes à aula, jornalistas não se contiveram e fizeram questão de deixar claro que não havia nenhuma novidade nisso. Combinar linhas de cobertura, com o cuidado para que os destaques sejam semelhantes, é mais comum do que se imagina. Trata-se da luta em defesa da sobrevivência profissional. Os alunos explicaram: ao dar ênfases iguais a um determinado aspecto do assunto que está sendo coberto, os jornalistas evitam possíveis cobranças ou mesmo punições das chefias. Livram-se de comparações, atendem ao esperado pelos patrões e seguram o emprego.
Lembrei também do coronelismo midiático, um dos mais perversos desdobramentos do coronelismo brasileiro, gestado com a criação da Guarda Nacional, no século 19, ainda na Regência, e presente até hoje em nossa sociedade. Victor Nunes Leal, no livro Coronelismo, Enxada e Voto, mostra como os coronéis do império souberam acompanhar a urbanização do pais, mantendo seus latifúndios agrários, mas enviando filhos e genros para se tornarem “doutores” nas cidades, estendendo nelas o poder conquistado na fazenda.
Não é por acaso que até hoje os herdeiros gostam de ser chamados de doutores, sem nunca terem defendido uma tese de doutorado. Parte deles controla os latifúndios midiáticos, fonte moderna de poder.
O que distingue um e outro latifúndio não está no seu controle, mas na mão de obra utilizada e no produto obtido. A mercadoria produzida no campo esgota-se no seu consumo e a margem de independência do trabalhador na sua realização beira o zero. No latifúndio midiático, o produto permanece vivo no consumidor mesmo depois do seu consumo. Por vezes pelo resto da vida, pois tratam-se de bens simbólicos inculcados em corações e mentes.
Essa característica do produto jornalístico sempre deu ao trabalhador da área uma margem de ação própria, inexistente para o trabalhador rural. Na década de 1980, dizia-se que eram brechas a serem ocupadas pelo jornalista comprometido com a verdade. Só que a concentração dos meios de comunicação, o controle ideológico das redações e o estabelecimento das pautas comuns estreitou ao máximo aquelas “brechas” equiparando, muitas vezes, as margens de liberdade do jornalista às do trabalhador rural.
Ampliou-se também o número e o poder dos capatazes no latifúndio moderno, profissionais bem pagos para não apenas controlar os trabalhadores, mas para dar voz às ideias e posições políticas dos seus patrões. Apesar desse quadro cada vez mas rígido, não notei nos alunos da Escola de Governo sinais de resignação. Ao contrário, mostraram-se conscientes da situação e defenderam a possibilidade de atuar nos resquícios das brechas ainda existentes.
Só o fato de procurarem um curso como aquele para a discussão de temas desprezados pela mídia mostra que, apesar de todo o cerco em torno da prática jornalística, a resistência existe e pode, no futuro, resultar na volta de modelos de informação menos comprometidos com os interesses dos latifundiários, antigos e modernos.
Em aula recente, na Escola de Governo de São Paulo, ilustrei o tema da padronização das informações oferecidas pela mídia com manchetes idênticas estampadas pelos três jornalões brasileiros (Globo, Estadão e Folha). O tema era a fala do ex-presidente Lula no Encontro Nacional de Blogueiros. De um discurso de mais de uma hora, com análises da conjuntura, aqueles e outros veículos, como Correio Braziliense, O Dia, Exame e o portal G1, resolveram destacar, de forma truncada, uma referência do ex-presidente à forma do torcedor chegar aos estádios de futebol.
Lembrei que o blogueiro Eduardo Guimarães se fez passar por um cidadão desinformado para constatar, com alguns repórteres, qual seria a linha adotada em conjunto para a cobertura do encontro. O dialogo foi rápido: “Lula é sempre notícia, né?”, comentou Eduardo com um repórter. A resposta: “Notícia cabeluda. Dá um trabalho danado”. “Por quê?”, quis saber o blogueiro. “A gente tem de achar a ‘pauta certa’”, informou o jornalista.
Presentes à aula, jornalistas não se contiveram e fizeram questão de deixar claro que não havia nenhuma novidade nisso. Combinar linhas de cobertura, com o cuidado para que os destaques sejam semelhantes, é mais comum do que se imagina. Trata-se da luta em defesa da sobrevivência profissional. Os alunos explicaram: ao dar ênfases iguais a um determinado aspecto do assunto que está sendo coberto, os jornalistas evitam possíveis cobranças ou mesmo punições das chefias. Livram-se de comparações, atendem ao esperado pelos patrões e seguram o emprego.
Lembrei também do coronelismo midiático, um dos mais perversos desdobramentos do coronelismo brasileiro, gestado com a criação da Guarda Nacional, no século 19, ainda na Regência, e presente até hoje em nossa sociedade. Victor Nunes Leal, no livro Coronelismo, Enxada e Voto, mostra como os coronéis do império souberam acompanhar a urbanização do pais, mantendo seus latifúndios agrários, mas enviando filhos e genros para se tornarem “doutores” nas cidades, estendendo nelas o poder conquistado na fazenda.
Não é por acaso que até hoje os herdeiros gostam de ser chamados de doutores, sem nunca terem defendido uma tese de doutorado. Parte deles controla os latifúndios midiáticos, fonte moderna de poder.
O que distingue um e outro latifúndio não está no seu controle, mas na mão de obra utilizada e no produto obtido. A mercadoria produzida no campo esgota-se no seu consumo e a margem de independência do trabalhador na sua realização beira o zero. No latifúndio midiático, o produto permanece vivo no consumidor mesmo depois do seu consumo. Por vezes pelo resto da vida, pois tratam-se de bens simbólicos inculcados em corações e mentes.
Essa característica do produto jornalístico sempre deu ao trabalhador da área uma margem de ação própria, inexistente para o trabalhador rural. Na década de 1980, dizia-se que eram brechas a serem ocupadas pelo jornalista comprometido com a verdade. Só que a concentração dos meios de comunicação, o controle ideológico das redações e o estabelecimento das pautas comuns estreitou ao máximo aquelas “brechas” equiparando, muitas vezes, as margens de liberdade do jornalista às do trabalhador rural.
Ampliou-se também o número e o poder dos capatazes no latifúndio moderno, profissionais bem pagos para não apenas controlar os trabalhadores, mas para dar voz às ideias e posições políticas dos seus patrões. Apesar desse quadro cada vez mas rígido, não notei nos alunos da Escola de Governo sinais de resignação. Ao contrário, mostraram-se conscientes da situação e defenderam a possibilidade de atuar nos resquícios das brechas ainda existentes.
Só o fato de procurarem um curso como aquele para a discussão de temas desprezados pela mídia mostra que, apesar de todo o cerco em torno da prática jornalística, a resistência existe e pode, no futuro, resultar na volta de modelos de informação menos comprometidos com os interesses dos latifundiários, antigos e modernos.
Esta é a forma de se formar "jornailstas", dependentes de seus patrões, e não de informações!
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