Criar factóides é uma arte, mas não exatamente nova. Ela pode ser útil a um artista, a um cartola de futebol, a um executivo de empresa, mas costuma ser muito utilizada na política. Principalmente por políticos que estão vivendo momentos complicados e precisam limpar sua barra. Mas para que a operação dê certo é sempre necessário contar com a benevolência e a cumplicidade dos veículos de comunicação.
Odorico Paraguassu foi o personagem rei do factóide na série Sucupira. Ele construi um cemitério numa cidade onde não morria ninguém e ficava o tempo todo arrumando maneiras de inaugurá-lo. Seus discursos eram recheados de adjetivos e o vocabulário era incompreensível para a patuléia.
Na real politik, muitos se especializaram nisso. Jânio, por exemplo, fazia uso do português castíssimo para impressionar. Fi-lo porque qui-lo, virou um memê da época pré-internet. O ex-presidente, um gourmet refinado, saia com um sanduíche de mortadela no bolso e quando os repórteres se aproximavam, sacava-o e esbanjava uma larga mordida. Antes de sair de casa, diziam assessores mais próximos, revolvia os cabelos deixando-os completamente engruvinhados e aplicava um pouco de talco no paletó que usava completamente torto para parecer que tinha caspa. Buscava parecer um homem sem luxos, simples e trabalhador. Não ligava que o achassem um pouco louco. Sabia que isso o tornava mais popular.
Quando prefeito de São Paulo de 85 a 88, Jânio saia multando carros, fazendo incertas em hospitais e escolas e colocava sapatos diferentes de propósito como se fosse por acidente. Aproveitava com essas notícias pré-fabricadas para retirar a reflexão crítica de sua gestão dos destaques. Ao invés de debater a qualidade de sua administração, os repórteres ficavam atrás de suas estrepolias.
César Maia seguiu os passos do paulista e chegou a ser apelidado de o prefeito maluquinho. Entre outras coisas, pedia picolé em açougue e caminhava com jaqueta em pleno verão carioca.
Mas às vezes o político não precisa inventar factóides para se livrar do noticiário negativo. A própria mídia lhe faz o serviço. Exemplo mais recente é o do mídia training para a sessão da CPI da Petrobras. Veja transformou o caso num escândalo, ele foi para manchete de todos os jornais, deu no JN e está sendo repercutido por inúmeras rádios e mídias regionais. E nada de aeroportos de Aécio. Isso virou bobagem. Interessa investigar as perguntas que estavam no site do Senado, mas que a Veja revelou como se fosse um furo de reportagem.
Não, os nossos veículos de comunicação não perderam o juízo. Eles simplesmente deixaram qualquer vergonha de lado e entraram desbragadamente no jogo político da eleição. E estão operando uma história que não fica de pé, buscando esconder um escândalo cuja investigação ainda precisa avançar muito. Já há indícios claro que os aeroportos de Minas, alguns fechados a cadeado e outros simplesmente inexistentes e cujo investimento do poder público bateu na casa dos milhões, podem fazer parte de uma operação de desvio de recursos públicos, mas também de criação de uma rede de operação para finalidades heterodoxas.
Mas isso não interessa agora. Importa saber é quem treinou os diretores da Petrobras para ir à CPI. Como se até o estafeta do Congresso não soubesse que nem um completo idiota vai a uma audiência de uma CPI sem passar antes por um treinamento.
Veja em si já é um factóide, mas os outros veículos que já perderam muito de sua credibilidade, mas que ainda tentam manter algum nível de respeito junto ao público, poderiam ao menos tentar não engolir detritos que ela lança à sociedade fazendo de conta que é jornalismo. Afinal, engolir e arrotar detritos de maré baixa, como diz um amigo blogueiro, não é exatamente algo saudável.
E o treinamento dos parlamentares do PSDB, para a mesma CPI, é o que?
ResponderExcluirCadê a indignação da mídia nativa?