Por Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa:
A semana chega ao fim sob o efeito das pesquisas de intenção de voto que fotografam o ponto de transição na disputa pela Presidência da República. Trata-se, como se dizia antigamente, de um instantâneo que congela o fluxo contínuo da História: no futuro bem próximo será possível esclarecer o peso de cada uma das múltiplas causas que irão definir o resultado das urnas. Por enquanto, o que se pode apreender do noticiário é que a velha política impôs suas regras até mesmo à candidata que se propunha a aposentá-la.
Nas edições de sexta-feira (5/9), os jornais oferecem um cardápio que vai de análises sobre detalhes das duas pesquisas mais recentes divulgadas pelo Ibope e o Datafolha a especulações sobre a capacidade da candidata Marina Silva, do PSB, de sustentar por mais quatro semanas o potencial de votos que amealhou desde o dia 15 de agosto.
Estamos a exatamente um mês do primeiro turno, e nessa reta final ela enfrenta o desafio de preservar os eleitores que conquistou, levando às urnas um verdadeiro saco de gatos, onde se misturam desde a militância ambientalista até saudosistas da ditadura.
Um ponto representativo dessa diversidade que compõe o eleitorado da ex-ministra do Meio Ambiente é resumido no manifesto divulgado pelo Clube Militar, reduto de generais e outros oficiais da reserva e origem de muitas crises institucionais no passado recente. O texto, intitulado “Pensamento do Clube Militar – Um fio de esperança”, aparece em resumo no Globo e pode ser lido na íntegra no site da instituição (ver aqui). Basicamente, afirma-se ali que a ex-ministra é “uma excelente candidata”, mas isso não significa que será, necessariamente, uma excelente presidente, segundo a expectativa dos militares aposentados.
O texto, assinado pelo general da reserva Clóvis Purper Bandeira, editor de opinião do Clube Militar, registra o fenômeno eleitoral e suas contradições, colocando em dúvida a capacidade da candidata de cumprir as promessas que vem fazendo. Para o porta-voz da entidade, Marina representa uma “esperança de mudança”. Ele observa, com cautela, que “as mudanças podem ser para melhor ou para pior, desde que interrompam a malfadada corruptocracia instalada no poder pelo lulopetismo” – afirma o manifesto, no tom que celebrizou certos colunistas da imprensa.
Risco calculado
O manifesto resume a circunstância em que se encontra a candidata do PSB em sua luta para arregimentar apoios à direita e à esquerda: “No governo, terá que descer das nuvens ‘sonháticas’ onde flutua e lutar na arena do dia a dia na Praça dos Três Poderes, enfrentando as feras insaciáveis que fazem as leis” – diz o texto. Talvez não haja, na mídia tradicional, uma síntese tão precisa do que Marina Silva representa na disputa eleitoral: “uma incógnita camaleônica”.
Quanto às preocupações específicas dos oficiais da reserva, a candidata do PSB já acenou com um gesto que agradou profundamente aos saudosistas da ditadura: em entrevista ao G1, portal da Globo, ela afirmou que não defende a revisão da Lei de Anistia e a responsabilização dos agentes civis e militares que cometeram assassinatos e torturas. O jornal carioca O Globo registra que, em 3 de novembro de 2008, na seção de Opinião da Folha de S. Paulo, ela havia escrito que “a tortura é crime hediondo, não é ato político nem contingência histórica. Não lhe cabe o manto da Lei de Anistia”.
Essa nova mudança vem se acrescentar ao seu movimento de aproximação com o agronegócio, ao recuo diante do desagrado de líderes religiosos à sua proposta de criminalização da homofobia, e ao projeto de política econômica que atende às demandas da mídia tradicional e aos setores mais conservadores da sociedade, até então abrigados na candidatura do PSDB.
Assim, de contradição em contradição, Marina Silva vai costurando uma rede de apoios oportunistas que renega, desmerece e avacalha o significado original daquela outra aliança, a Rede Sustentabilidade. Com essa tática, ela derrubou o candidato do PSDB e avançou nas fileiras do PT, seduzindo parte da nova classe de renda média. Mas é bem possível que, nessa busca desesperada por votos, Marina venha a perder a simpatia de antigos companheiros de militância que assinaram o manifesto de fundação da Rede (ver aqui).
A candidata do PSB não é hoje nem uma sombra do que foi a ativista Marina Silva.
As próximas pesquisas vão dizer se valeu a pena.
Nas edições de sexta-feira (5/9), os jornais oferecem um cardápio que vai de análises sobre detalhes das duas pesquisas mais recentes divulgadas pelo Ibope e o Datafolha a especulações sobre a capacidade da candidata Marina Silva, do PSB, de sustentar por mais quatro semanas o potencial de votos que amealhou desde o dia 15 de agosto.
Estamos a exatamente um mês do primeiro turno, e nessa reta final ela enfrenta o desafio de preservar os eleitores que conquistou, levando às urnas um verdadeiro saco de gatos, onde se misturam desde a militância ambientalista até saudosistas da ditadura.
Um ponto representativo dessa diversidade que compõe o eleitorado da ex-ministra do Meio Ambiente é resumido no manifesto divulgado pelo Clube Militar, reduto de generais e outros oficiais da reserva e origem de muitas crises institucionais no passado recente. O texto, intitulado “Pensamento do Clube Militar – Um fio de esperança”, aparece em resumo no Globo e pode ser lido na íntegra no site da instituição (ver aqui). Basicamente, afirma-se ali que a ex-ministra é “uma excelente candidata”, mas isso não significa que será, necessariamente, uma excelente presidente, segundo a expectativa dos militares aposentados.
O texto, assinado pelo general da reserva Clóvis Purper Bandeira, editor de opinião do Clube Militar, registra o fenômeno eleitoral e suas contradições, colocando em dúvida a capacidade da candidata de cumprir as promessas que vem fazendo. Para o porta-voz da entidade, Marina representa uma “esperança de mudança”. Ele observa, com cautela, que “as mudanças podem ser para melhor ou para pior, desde que interrompam a malfadada corruptocracia instalada no poder pelo lulopetismo” – afirma o manifesto, no tom que celebrizou certos colunistas da imprensa.
Risco calculado
O manifesto resume a circunstância em que se encontra a candidata do PSB em sua luta para arregimentar apoios à direita e à esquerda: “No governo, terá que descer das nuvens ‘sonháticas’ onde flutua e lutar na arena do dia a dia na Praça dos Três Poderes, enfrentando as feras insaciáveis que fazem as leis” – diz o texto. Talvez não haja, na mídia tradicional, uma síntese tão precisa do que Marina Silva representa na disputa eleitoral: “uma incógnita camaleônica”.
Quanto às preocupações específicas dos oficiais da reserva, a candidata do PSB já acenou com um gesto que agradou profundamente aos saudosistas da ditadura: em entrevista ao G1, portal da Globo, ela afirmou que não defende a revisão da Lei de Anistia e a responsabilização dos agentes civis e militares que cometeram assassinatos e torturas. O jornal carioca O Globo registra que, em 3 de novembro de 2008, na seção de Opinião da Folha de S. Paulo, ela havia escrito que “a tortura é crime hediondo, não é ato político nem contingência histórica. Não lhe cabe o manto da Lei de Anistia”.
Essa nova mudança vem se acrescentar ao seu movimento de aproximação com o agronegócio, ao recuo diante do desagrado de líderes religiosos à sua proposta de criminalização da homofobia, e ao projeto de política econômica que atende às demandas da mídia tradicional e aos setores mais conservadores da sociedade, até então abrigados na candidatura do PSDB.
Assim, de contradição em contradição, Marina Silva vai costurando uma rede de apoios oportunistas que renega, desmerece e avacalha o significado original daquela outra aliança, a Rede Sustentabilidade. Com essa tática, ela derrubou o candidato do PSDB e avançou nas fileiras do PT, seduzindo parte da nova classe de renda média. Mas é bem possível que, nessa busca desesperada por votos, Marina venha a perder a simpatia de antigos companheiros de militância que assinaram o manifesto de fundação da Rede (ver aqui).
A candidata do PSB não é hoje nem uma sombra do que foi a ativista Marina Silva.
As próximas pesquisas vão dizer se valeu a pena.
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