quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Alguns números não mentem

Por Paulo Moreira Leite, em seu blog:

É bom não desprezar a importância das estratégicas de marketing numa campanha eleitoral dirigida a uma massa de mais de 100 milhões de eleitores. Convém colocar os pés na realidade, porém.

Há duas semanas que os índices de intenção de voto de Dilma Rousseff estão em alta. Sobem em todos os institutos, em todos os itens, em todas comparações. Conforme os dados mais recentes, Dilma lidera a campanha no primeiro turno e alcançou um empate técnico com Marina Silva em pesquisas para o segundo turno. Se você olhar a curva, pode até enxergar mais crescimento de Dilma pela frente. Se olhar para trás, irá lembrar que há exatamente um mês Dilma era candidata - matematicamente - a vencer a eleição no primeiro turno. O que mudou mesmo?

O que mudou foi a morte de Eduardo Campos, até então um concorrente secundário. Marina chegou com 21 pontos, o mesmo número que possuía em 2010, deslocou Aécio Neves e tornou-se a primeira desafiante real. Os números de ontem mostram que os benefícios emocionais das primeiras semanas começam a esgotar-se. O eleitor olha para a concorrente com atenção e quer saber o que ela representa como candidata. 

Marina foi adotada pela herdeira de um dos grandes bancos privados do país e assumiu uma proposta que o cidadão comum pode não entender - independência do Banco Central - mas compreende o que significa: deixa o controle da política econômica nas mãos do mercado, sem respeitar autoridades eleitas pelo povo. Sua assessoria econômica produz cenas frequentes de opera-bufa. 

Em sucessivas demonstrações de fraqueza, a candidata corrige o programa de governo depois de quatro tuítes, o que é deprimente. Depois anuncia que irá formar um comitê para recrutar “homens de bem” para formar sua equipe, o que é ridículo. Seu programa de governo não trazia uma linha sobre o pré-sal, o que surpreendeu até os adversários, pois demonstra uma dificuldade imensa para pensar seriamente o futuro do país.
Para infelicidade de quem anunciou a morte do PT em tantas oportunidades, a campanha de 2014 mostra o oposto e se move em torno do universo político nascido em torno de Luiz Inácio Lula da Silva. A soma das intenções de voto de petistas e ex-petistas — Dilma, Marina, Luciana Genro e Eduardo Jorge — se aproxima de 75% do total do eleitorado, o que é até comum em ditaduras, mas configura um recorde sob regimes democráticos. 

Estamos falando de um movimento político das maiorias, que nasceu ligado a luta em defesa dos direitos dos trabalhadores, a denúncia da má distribuição de renda, ao alargamento da democracia, questões que permanecem atuais até hoje porque refletem uma realidade de classe. A força de Dilma reside no fato de que, neste terreno, onde caminha a maioria dos brasileiros, seu governo tem o que mostrar — o que explica a dificuldade dos adversários para enfrentar um debate racional.

Não se trata de achar que o governo é bom ou ótimo, ruim ou péssimo. Mas de perguntar se o país não irá ficar pior se Dilma não for reeleita. Essa é a pergunta da campanha. A reação de aliados reticentes e distanciados, que nas últimas semanas se reagruparam em apoio ao governo, demonstra aonde está a força de gravidade e explica a retomada de Dilma nas pesquisas.

Incapaz de questionar o governo onde importa para as pessoas que vivem do próprio trabalho, a oposição dá um valor exagerado, com traços de comportamento obsessivo-compulsivo, a operações especulativas da Bolsa de Valores, que por si só não sinalizam grande coisa na economia.
A dificuldade de Aécio Neves reside aí. Ele está excluído da campanha porque foi excluído da vida real da maioria dos brasileiros. O PSDB pode reivindicar os méritos de ter derrubado a inflação em 1994, mas não participou das transformações de fundo que vieram depois, e que criaram um país onde a periferia social não se encontra no poder, mas faz-se ouvir como nunca antes em 500 anos de história. E isso é realmente novo, por mais que muita gente já esteja habituado.

Depois de tentar, inutilmente, denunciar as mudanças promovidas por Lula como manobras eleitoreiras, o PSDB acabou falando sozinho - num prenúncio da posição de Aécio no último debate.

Aécio não tem o lastro popular de Marina - comprometido agora com o apoio até de parentes do assassino de Chico Mendes - e também não tem discurso. Fez campanha como garoto mimado, lembrando sempre quem foi seu avô mas sem ter o que dizer para netos menos afortunados. Continua com muitos amigos na mídia, capazes de escrever que caiu em terceiro lugar em Minas Gerais por um “descuido” na própria estratégia de campanha. Mas sua última esperança é um lance de sorte, um evento extrapolítico.

Neste ambiente inteiramente desfavorável, os adversários do governo imaginam que será possível confundir o eleitorado, na reta final, com a produção de um escândalo político midiático em torno da delação premiada de Paulo Roberto da Costa. Não se trata de um debate ético, nem de uma discussão produtiva - quando seria mais conveniente discutir reforma política e financiamento de campanhas - mas de uma iniciativa seletiva, a mesma que produziu a AP 470 e escondeu o mensalão PSDB-MG e o propinoduto tucano do metrô paulista. Incapaz de vencer um partido nas urnas, seus adversários contam com ajuda externa para a carta da criminalização.

Ainda assim, os números traduzem uma situação clara: no debate político de 2014, a oposição está sendo vencida pela quarta vez consecutiva.

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