Por Camila Pavanelli de Lorenzi, no site Outras Palavras:
O boletim de hoje (9) está organizado em três seções: passado, presente e futuro. A gravidade da crise exige que olhemos para tudo ao mesmo tempo: o passado, para tentarmos aprender com os erros e evitar sua repetição; o presente, para tentarmos entender o que está acontecendo agora; e o futuro, para tentarmos voltar a ter água um dia. Toscamente falando, é isso. Vamos lá:
Passado:
– ONGs como a ISA e o Idec afirmam que o governo estadual e a Sabesp erraram na administração do Sistema Cantareira, mantendo inalterada a captação de água durante a seca que se abateu sobre a região na estação chuvosa, de outubro a fevereiro (http://bit.ly/1teNyfG). Além disso, as ONGs acusam o poder público de se omitir e esconder informações.
– O que seria essa omissão de informações? É preciso contar a história desde o princípio: com base na Lei de Acesso à Informação, o Idec solicitou à Sabesp em setembro a divulgação do mapa de diminuição de pressão noturna na distribuição de água. A empresa simplesmente não enviou o material requisitado. O Idec, então, acionou o MP e o Procon em 20/10 para que a Lei de Acesso à Informação fosse cumprida: o acesso ao mapa poderia mostrar aos consumidores os locais onde a diminuição de pressão poderia ocasionar problemas no abastecimento (http://bit.ly/1wkzdgs).
– Esta não foi a primeira intervenção do Idec na crise hídrica. O Instituto informa que, em 21/04, o governo do estado planejava multar os consumidores que aumentassem o consumo de água. Acontece que o Código de Defesa do Consumidor estipula que o fornecedor de produtos e serviços só pode elevar o preço com justa causa – e a medida governamental não dizia que “justa causa” era essa, já que o governo recusava-se a decretar racionamento. Quando o Idec anunciou que a medida era ilegal, o governo estadual desistiu da proposta. Preferiu não ter de decretar racionamento no estado (http://bit.ly/1wkzdgs).
Presente:
– Mas a ação movida pelo Idec com base na Lei de Acesso à Informação deu resultado: a Sabesp foi obrigada judicialmente a divulgar o mapa da redução de pressão (http://bit.ly/ZWgsoZ). Para o Idec, esta é a primeira vez em que a empresa reconhece publicamente que algumas regiões da cidade de São Paulo têm enfrentado problemas no abastecimento.
– Discordo desta afirmação do Idec. Afinal, a Sabesp divulgou o mapa porque foi obrigada judicialmente – e afirma que ele não serve como indicativo de onde pode vir a faltar água (http://bit.ly/ZwgsoZ). Oficialmente, eu diria que o posicionamento da Sabesp não mudou: segundo a empresa, há problemas de abastecimento sim, mas eles são “pontuais” e não sistemáticos (http://bit.ly/136AQ8W).
– Com relação à situação atual do Sistema Cantareira, um especialista em recursos hídricos afirmou que a transferência entre os reservatórios do Sistema (coisa que vem sendo feita atualmente) torna mais difícil o tratamento da água e exige que mais produtos químicos sejam usados (http://glo.bo/1wLexBY).
– Em Itu, as pessoas fazem fila à noite para pegar água da bica (http://glo.bo/1xCmTZn). Coloquei esta notícia na seção “presente” por motivos óbvios: é isso que está acontecendo em Itu agora. Mas isso pode ser também o futuro da cidade de São Paulo: se em Itu, que tem aproximadamente 160 mil habitantes, os caminhões-pipa não estão dando conta de abastecer a cidade, o que será da Grande São Paulo e suas 8 milhões e 800 mil pessoas? Talvez a “piada” do diretor da Sabesp – as “férias coletivas” para a grande São Paulo caso não chova (http://bit.ly/1wl1O8O) – seja mais séria do que gostaríamos.
– Enquanto isso, a Sabesp continua investindo em campanhas de combate ao desperdício voltadas ao consumidor residencial (http://on.fb.me/1tCjhr0). Naturalmente, é preciso que todos economizem, mas eu gostaria de saber que medidas a Sabesp está tomando em relação aos grandes consumidores. Não encontrei dados referentes especificamente a São Paulo, mas descobri que, segundo a ANA, a agricultura é responsável por 70% do consumo de água no país e a indústria por 7% (http://bit.ly/1sC2ejK) – e, como lembra Rasputin Thuin (http://bit.ly/1Dt6it1), até março deste ano a Sabesp dava descontos para grandes consumidores (http://bit.ly/1ryxEHv).
– Em suma: sim, vamos convencer o Seu José a lavar a calçada com balde em vez de esguicho. Mas podemos pensar também no que iremos cobrar das indústrias e do agronegócio? Não é só que é hipócrita cobrar economia do consumidor residencial enquanto até março se incentivava o desperdício por parte dos grandes consumidores. É também terrivelmente ineficaz – inclusive para os grandes consumidores, que, como vimos (http://bit.ly/1tXGK8f), também já enfrentam a falta d’água.
Futuro:
– Amanhã às 9h, será transmitido pela internet um evento da Aliança pela Água – uma coalizão de ONGs que propõe medidas de curto, médio e longo prazo para enfrentar a crise (http://bit.ly/1tCjomh).
– É bom mesmo pensarmos em medidas para todos os prazos, pois a seca em São Paulo deve continuar em 2015. Devido às mudanças climáticas, tem sido difícil compreender o comportamento do El Niño; mas, se o fenômeno ocorrer no fim deste ano – há 70% de chances de que isso ocorra –, e se tiver o mesmo efeito que teve em 1997 e 1998, haverá “uma imensa seca no mundo”, nas palavras de um pesquisador da Organização Mundial de Metereologia (http://bit.ly/1wEhGjr).
E esse foi o boletim de hoje. Pode entrar em pânico, que amanhã tem mais.
O boletim de hoje (9) está organizado em três seções: passado, presente e futuro. A gravidade da crise exige que olhemos para tudo ao mesmo tempo: o passado, para tentarmos aprender com os erros e evitar sua repetição; o presente, para tentarmos entender o que está acontecendo agora; e o futuro, para tentarmos voltar a ter água um dia. Toscamente falando, é isso. Vamos lá:
Passado:
– ONGs como a ISA e o Idec afirmam que o governo estadual e a Sabesp erraram na administração do Sistema Cantareira, mantendo inalterada a captação de água durante a seca que se abateu sobre a região na estação chuvosa, de outubro a fevereiro (http://bit.ly/1teNyfG). Além disso, as ONGs acusam o poder público de se omitir e esconder informações.
– O que seria essa omissão de informações? É preciso contar a história desde o princípio: com base na Lei de Acesso à Informação, o Idec solicitou à Sabesp em setembro a divulgação do mapa de diminuição de pressão noturna na distribuição de água. A empresa simplesmente não enviou o material requisitado. O Idec, então, acionou o MP e o Procon em 20/10 para que a Lei de Acesso à Informação fosse cumprida: o acesso ao mapa poderia mostrar aos consumidores os locais onde a diminuição de pressão poderia ocasionar problemas no abastecimento (http://bit.ly/1wkzdgs).
– Esta não foi a primeira intervenção do Idec na crise hídrica. O Instituto informa que, em 21/04, o governo do estado planejava multar os consumidores que aumentassem o consumo de água. Acontece que o Código de Defesa do Consumidor estipula que o fornecedor de produtos e serviços só pode elevar o preço com justa causa – e a medida governamental não dizia que “justa causa” era essa, já que o governo recusava-se a decretar racionamento. Quando o Idec anunciou que a medida era ilegal, o governo estadual desistiu da proposta. Preferiu não ter de decretar racionamento no estado (http://bit.ly/1wkzdgs).
Presente:
– Mas a ação movida pelo Idec com base na Lei de Acesso à Informação deu resultado: a Sabesp foi obrigada judicialmente a divulgar o mapa da redução de pressão (http://bit.ly/ZWgsoZ). Para o Idec, esta é a primeira vez em que a empresa reconhece publicamente que algumas regiões da cidade de São Paulo têm enfrentado problemas no abastecimento.
– Discordo desta afirmação do Idec. Afinal, a Sabesp divulgou o mapa porque foi obrigada judicialmente – e afirma que ele não serve como indicativo de onde pode vir a faltar água (http://bit.ly/ZwgsoZ). Oficialmente, eu diria que o posicionamento da Sabesp não mudou: segundo a empresa, há problemas de abastecimento sim, mas eles são “pontuais” e não sistemáticos (http://bit.ly/136AQ8W).
– Com relação à situação atual do Sistema Cantareira, um especialista em recursos hídricos afirmou que a transferência entre os reservatórios do Sistema (coisa que vem sendo feita atualmente) torna mais difícil o tratamento da água e exige que mais produtos químicos sejam usados (http://glo.bo/1wLexBY).
– Em Itu, as pessoas fazem fila à noite para pegar água da bica (http://glo.bo/1xCmTZn). Coloquei esta notícia na seção “presente” por motivos óbvios: é isso que está acontecendo em Itu agora. Mas isso pode ser também o futuro da cidade de São Paulo: se em Itu, que tem aproximadamente 160 mil habitantes, os caminhões-pipa não estão dando conta de abastecer a cidade, o que será da Grande São Paulo e suas 8 milhões e 800 mil pessoas? Talvez a “piada” do diretor da Sabesp – as “férias coletivas” para a grande São Paulo caso não chova (http://bit.ly/1wl1O8O) – seja mais séria do que gostaríamos.
– Enquanto isso, a Sabesp continua investindo em campanhas de combate ao desperdício voltadas ao consumidor residencial (http://on.fb.me/1tCjhr0). Naturalmente, é preciso que todos economizem, mas eu gostaria de saber que medidas a Sabesp está tomando em relação aos grandes consumidores. Não encontrei dados referentes especificamente a São Paulo, mas descobri que, segundo a ANA, a agricultura é responsável por 70% do consumo de água no país e a indústria por 7% (http://bit.ly/1sC2ejK) – e, como lembra Rasputin Thuin (http://bit.ly/1Dt6it1), até março deste ano a Sabesp dava descontos para grandes consumidores (http://bit.ly/1ryxEHv).
– Em suma: sim, vamos convencer o Seu José a lavar a calçada com balde em vez de esguicho. Mas podemos pensar também no que iremos cobrar das indústrias e do agronegócio? Não é só que é hipócrita cobrar economia do consumidor residencial enquanto até março se incentivava o desperdício por parte dos grandes consumidores. É também terrivelmente ineficaz – inclusive para os grandes consumidores, que, como vimos (http://bit.ly/1tXGK8f), também já enfrentam a falta d’água.
Futuro:
– Amanhã às 9h, será transmitido pela internet um evento da Aliança pela Água – uma coalizão de ONGs que propõe medidas de curto, médio e longo prazo para enfrentar a crise (http://bit.ly/1tCjomh).
– É bom mesmo pensarmos em medidas para todos os prazos, pois a seca em São Paulo deve continuar em 2015. Devido às mudanças climáticas, tem sido difícil compreender o comportamento do El Niño; mas, se o fenômeno ocorrer no fim deste ano – há 70% de chances de que isso ocorra –, e se tiver o mesmo efeito que teve em 1997 e 1998, haverá “uma imensa seca no mundo”, nas palavras de um pesquisador da Organização Mundial de Metereologia (http://bit.ly/1wEhGjr).
E esse foi o boletim de hoje. Pode entrar em pânico, que amanhã tem mais.
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