Por Salim Lamrani, no site Opera Mundi:
Mais de meio século depois da ruptura das relações diplomática entre Cuba e Estados Unidos em 3 de janeiro de 1961, os dois governos anunciaram o início de um processo de normalização dos contatos bilaterais. Havana e Washington responderam de forma favorável a uma petição do papa Francisco que os tinha chamado a deixar de lado as diferenças de outros tempos e restabelecer os laços entre o povo estadunidense e o cubano. O Vaticano e o Canadá facilitaram os contatos entre as duas partes oferecendo às delegações a discrição necessária ao longo de um processo de diálogo que durou cerca de 18 meses.
Intercâmbio de presos
Depois de vários meses de negociações secretas, Cuba e Estados Unidos conseguiram um acordo histórico de intercâmbio de presos que abre o caminho à plena normalização das relações entre ambas as nações. Havana decidiu libertar Alan Gross, agende estadunidense preso desde 2009 e condenado a 15 anos de prisão por ter dado ajuda material a diferentes setores da oposição cubana no contexto de um programa do Departamento de Estado destinado a conseguir uma “mudança de regime” na ilha. Da mesma maneira, Cuba libertou outro agente estadunidense chamado Rolando Sarraff Trujillo, que estava preso há 20 anos, assim como outros cinquenta detidos[1].
De sua parte, Washington libertou três agentes cubanos, Antonio Guerrero, Ramón Labañino e Gerardo Hernández, que cumpriam desde 1998 penas até de prisão perpétua por terem se infiltrado nas organizações do exílio cubano envolvidas nos atentados terroristas contra Cuba. Os detalhes desse intercâmbio terminaram depois de uma comunicação telefônica histórica de 45 minutos - o primeiro contato oficial direto entre o presidente cubano e o estadunidense desde 1959 - no dia 16 de dezembro de 2014. Mediante esses respectivos gestos, Raúl Castro e Barack Obama retiraram o principal obstáculo ao estabelecimento de relações cordiais entre ambos os países.[2]
O fim de uma política obsoleta e contraproducente
No dia 17 de dezembro de 2014, em um discurso na televisão, Obama informou a opinião pública estadunidense e mundial sua decisão de restabelecer relações diplomáticas com Havana. “Hoje, os Estados Unidos mudam sua relação com o povo de Cuba e se trata da mudança mais significativa da nossa política em mais de 50 anos”.[3]
O presidente estadunidense fez uma constatação lúcida a respeito da política exterior de Washington. Ao insistir em aplicar medidas - que remontam à Guerra Fria - anacrônicas e cruéis, pois afetam os setores mais frágeis da população cubana, e contraproducentes - já que o objetivo de derrubar o governo cubano não se cumpriu -, Washington suscitou a condenação unânime da comunidade internacional. “Vamos pôr fim a um enfoque obsoleto que fracassou durante décadas em promover nossos interesses. Vamos começar a normalizar as relações entre nossos dois países”, disse Barack Obama.
A hostilidade em relação a Cuba isolou completamente os Estados Unidos no cenário internacional. Durante a reunião anual da Assembleia Geral das Nações Unidas em outubro de 2014, pelo vigésimo terceiro ano consecutivo, 188 países votaram contra as sanções impostas à população cubana. Da mesma maneira, os Estados Unidos são o único país do continente americano que não tem relações diplomáticas e comerciais normais com Cuba. A América Latina, muito sensível às questões cubanas, também expressou sua vontade de integrar a ilha à próxima Cúpula das Américas, que acontecerá em abril de 2015 no Panamá, ameaçando o encontro com um boicote no caso de uma nova exclusão de Havana.
Obama lembrou essa realidade. “Nenhuma nação nos seguiu na imposição dessas sanções [e] nem o povo estadunidense nem o povo cubano tiram proveito de uma política rígida que está enraizada em fatos que aconteceram quando a maioria de nós nem tínhamos nascido ainda [...]. Decidi, então, colocar os interesses de nossos dois povos no centro de nossa política [...]. Afinal, esses últimos cinquenta anos demonstraram que o isolamento não funcionou. É tempo de adotar um novo enfoque”.
Segundo a Casa Branca, “a política estadunidense em relação a Cuba isolou os Estados Unidos de seus sócios regionais e internacionais, limitou a capacidade de influência no continente americano e impediu o uso de toda uma série de instrumentos disponíveis para os Estados Unidos, com a finalidade de promover uma mudança positiva em Cuba”.[4] John Kerry, secretário de Estado, compartilhou desse ponto de vista lembrando que “não apenas essa política fracassou [...], mas também isolou os Estados Unidos em vez de isolar Cuba.”[5]
Restabelecimento do diálogo e flexibilização das sanções econômicas
Washington decidiu, então, restabelecer as relações diplomáticas que rompeu de forma unilateral em 1961. Roberta Jacobson, subsecretária de Estado para os Assuntos Hemisféricos, viajará para Cuba em janeiro de 2015 para formalizar a abertura de uma embaixada na capital cubana. Ambas as nações expressaram sua vontade de colaborar em temas como saúde, imigração, luta contra o terrorismo e o narcotráfico, assim como a elaboração de uma resposta comum às catástrofes naturais[6], “Estou impaciente por ser o primeiro Secretário de Estado em 60 anos a realizar uma visita a Cuba”, enfatizou John Kerry em um comunicado.[7]
Washington também decidiu revisar sua lista dos países que considera patrocinadores do terrorismo internacional, da qual Cuba faz parte desde 1982. Obama responde, assim, a um pedido da comunidade internacional e de vários congressistas estadunidenses que qualificam essa inclusão de arbitrária, enquanto o mundo inteiro louva a mediação de Havana no processo de paz da Colômbia.
A Casa Branca também decidiu flexibilizar as restrições às viagens dos cidadãos estadunidenses. Se as estâncias turísticas ordinárias ainda se mantêm proibidas, as viagens culturais, religiosas, acadêmicas, científicas, esportivas, sanitárias, humanitárias e profissionais serão favorecidas e os visitantes estadunidenses poderão usar seus cartões de crédito em Cuba em breve.
Por outro lado, as transferências de dinheiro dos cidadãos estadunidenses para Cuba passarão de 500 dólares por trimestre para 2.000 dólares. Da mesma forma, os cidadãos estadunidenses poderão importar bens de Cuba no valor de 400 dólares. Em um nível comercial, a gama de produtos exportáveis — limitados até hoje às matérias-primas alimentícias — se ampliará para outros setores como materiais de construção, equipamentos agrícolas e telecomunicações. Washington acata, assim, a uma petição do mundo dos negócios estadunidense que deseja investir no mercado natural que se encontra a apenas 150 quilômetros.
As transações financeiras em dólares foram facilitadas e as instituições estadunidenses poderão estabelecer relações com Cuba. As entidades estadunidenses instaladas no exterior poderão estabelecer laços comerciais com a ilha e realizar transações em dólares. Da mesma forma, será anulado o artigo da lei Helms-Burton, de 1996, que sanciona com uma proibição de seis meses de entrada nas águas territoriais estadunidenses todos os barcos estrangeiros que viajem para Cuba, se o comércio realizado com a ilha é de ordem humanitária.
O presidente Obama também convocou os legisladores estadunidenses a adotarem as medidas necessárias para suspender as sanções econômicas. De fato, desde 1996, somente o Congresso está habilitado a pôr um fim definitivo ao estado de sítio imposto a Cuba.
Reação de Havana e da comunidade internacional
O presidente cubano Raúl Castro se alegrou com o restabelecimento das relações bilaterais com os Estados Unidos, lembrando que Cuba sempre tinha afirmado sua vontade de resolver pacificamente as diferenças. “Desde a minha eleição como presidente dos Conselhos de Estado e de Ministros, reiterei em múltiplas ocasiões nossa disposição de manter com o governo dos Estados Unidos um diálogo respeitoso, baseado na igualdade soberana, para tratar dos mais diversos temas de forma recíproca, sem prejuízo da independência nacional e da autodeterminação do nosso povo”, declarou. Aproveitou a ocasião para saudar a decisão do presidente Obama que “merece o respeito e o reconhecimento”. Não obstante, recordou que deveriam ser canceladas as sanções econômicas que provocam “enormes danos humanos”. “Devemos aprender a arte de conviver, de forma civilizada, com nossas diferenças”, concluiu.[8]
A comunidade internacional aplaudiu a aproximação histórica entre Cuba e Estados Unidos, que põe fim a mais de meio século de relações conflitivas. O Vaticano expressou sua grande satisfação. Ban Ki-Moon, secretário-geral das Nações Unidas, felicitou os dois mandatários e declarou sua disposição “a ajudar a esses dois países a desenvolver suas relações como bons vizinhos”.[9]
A América Latina aplaudiu de forma unânime esse momento histórico. O Mercosul, por meio da presidenta do Brasil, Dilma Rousseff, felicitou Washington e Havana pela notícia “fantástica”.[10] José Mujica, presidente do Uruguai, expressou sua emoção: “É algo que na escala latino-americana é parecido, mas do outro lado, ao Muro de Berlim: caiu o bloqueio. Os bloqueios comerciais só serviram na história da humanidade para fazer os povos passarem mal, mas nunca resolveram nada”.[11] Cristina Fernández de Kirchner, presidenta da Argentina, prestou uma homenagem ao “povo cubano e a seu governo por iniciar um processo de normalização das relações com os Estados Unidos em absoluta dignidade e em pé de igualdade”. Nicolás Maduro, presidente venezuelano, enfatizou a “valentia” de Barack Obama.[12]
O Organização dos Estados Americanos também expressou sua satisfação a Washington e Havana por “terem dado esses históricos passos, tão necessários como corajosos, para restabelecer relações diplomáticas quebradas em 1961”. José Miguel Insulza, seu secretário-geral, declarou que “as medidas anunciadas hoje abrem uma via de normalização que já não tem volta”. Pediu que o congresso estadunidense adote as medidas legislativas necessárias para suspender definitivamente as sanções econômicas.[13]
Ao responder ao chamado da comunidade internacional e da opinião pública de seu próprio país, Barack Obama tomou a decisão mais emblemática de seus dois mandatos presidenciais e colocou fim a uma anomalia antiga restabelecendo as relações com Cuba. A história lembrará do presidente Obama, não apenas por ser o primeiro homem negro que chegou ao cargo supremo, mas, sobretudo, como o que aceitou o ramo de oliveira oferecido por Cuba e que abriu o caminho para a instauração de relações bilaterais construtivas. É tempo agora de os Estados Unidos colocarem um final definitivo a um estado de sítio econômico imposto desde 1960, permitir que os turistas estadunidenses descubram a ilha e aceitar a realidade de uma Cuba diferente — com suas virtudes e defeitos — mas independente e livre para eleger seu próprio modelo de sociedade.
Notas
[1] El Nuevo Herald, “Espía liberado por Cuba a cambio de tres agentes condenados trabajó para la CIA”, 18 de dezembro de 2014.
[2]The White House, «Barack Obama’s Speech: Charting a New Course of Era», 17 de dezembro de 2014. http://www.whitehouse.gov/issues/foreign-policy/cuba (site consultado em 17 de dezembro de 2014)
[3]The White House, «Barack Obama’s Speech: Charting a New Course of Era», 17 de dezembro de 2014. http://www.whitehouse.gov/issues/foreign-policy/cuba (site consultado em 17 de dezembro de 2014)
[4]Ibid.
[5] John Kerry, “Statement by Secretary Kerry: Announcement of Cuba Policy Changes”, U.S. Department of State, 17 de dezembro de 2014. http://iipdigital.usembassy.gov/st/english/texttrans/2014/12/20141217312131.html#axzz3MC4Z8Upx (site consultado em 17 de dezembro de 2014)
[6]The White House, «Fact Sheet: Charting a New Course on Cuba”, 17 de dezembro de 2014. http://www.whitehouse.gov/the-press-office/2014/12/17/fact-sheet-charting-new-course-cuba (site consultado em 17 dezembro de 2014)
[7] John Kerry, “Statement by Secretary Kerry: Announcement of Cuba Policy Changes”, op. cit.
[8] Raúl Castro, « Alocución del Presidente cubano : Los Cinco ya están en Cuba », Cubadebate, 17 de dezembro de 2014
[9] Le Monde, « Une ‘rectification historique’ qui ne contente pas tout le monde », 17 de dezembro de 2014.
[10] Opera Mundi, « Dilma diz achar ‘fantástica’ reaproximaçao de Cuba e EUA e lembra de porto de Mariel”, Opera Mundi, 17 de dezembro de 2014.
[11] Cubadebate,
[12] Telam, 17 de dezembro de 2014.
[13] Organización de Estados Americanos, « Secretario General de la OEA celebra ‘anuncio histórico’ de reanudación de relaciones diplomáticas entre Estados Unidos y Cuba”, 17 de dezembro de 2014. http://www.oas.org/es/centro_noticias/comunicado_prensa.asp?sCodigo=C-557/14 (site consultado em 17 de dezembro de 2014).
Intercâmbio de presos
Depois de vários meses de negociações secretas, Cuba e Estados Unidos conseguiram um acordo histórico de intercâmbio de presos que abre o caminho à plena normalização das relações entre ambas as nações. Havana decidiu libertar Alan Gross, agende estadunidense preso desde 2009 e condenado a 15 anos de prisão por ter dado ajuda material a diferentes setores da oposição cubana no contexto de um programa do Departamento de Estado destinado a conseguir uma “mudança de regime” na ilha. Da mesma maneira, Cuba libertou outro agente estadunidense chamado Rolando Sarraff Trujillo, que estava preso há 20 anos, assim como outros cinquenta detidos[1].
De sua parte, Washington libertou três agentes cubanos, Antonio Guerrero, Ramón Labañino e Gerardo Hernández, que cumpriam desde 1998 penas até de prisão perpétua por terem se infiltrado nas organizações do exílio cubano envolvidas nos atentados terroristas contra Cuba. Os detalhes desse intercâmbio terminaram depois de uma comunicação telefônica histórica de 45 minutos - o primeiro contato oficial direto entre o presidente cubano e o estadunidense desde 1959 - no dia 16 de dezembro de 2014. Mediante esses respectivos gestos, Raúl Castro e Barack Obama retiraram o principal obstáculo ao estabelecimento de relações cordiais entre ambos os países.[2]
O fim de uma política obsoleta e contraproducente
No dia 17 de dezembro de 2014, em um discurso na televisão, Obama informou a opinião pública estadunidense e mundial sua decisão de restabelecer relações diplomáticas com Havana. “Hoje, os Estados Unidos mudam sua relação com o povo de Cuba e se trata da mudança mais significativa da nossa política em mais de 50 anos”.[3]
O presidente estadunidense fez uma constatação lúcida a respeito da política exterior de Washington. Ao insistir em aplicar medidas - que remontam à Guerra Fria - anacrônicas e cruéis, pois afetam os setores mais frágeis da população cubana, e contraproducentes - já que o objetivo de derrubar o governo cubano não se cumpriu -, Washington suscitou a condenação unânime da comunidade internacional. “Vamos pôr fim a um enfoque obsoleto que fracassou durante décadas em promover nossos interesses. Vamos começar a normalizar as relações entre nossos dois países”, disse Barack Obama.
A hostilidade em relação a Cuba isolou completamente os Estados Unidos no cenário internacional. Durante a reunião anual da Assembleia Geral das Nações Unidas em outubro de 2014, pelo vigésimo terceiro ano consecutivo, 188 países votaram contra as sanções impostas à população cubana. Da mesma maneira, os Estados Unidos são o único país do continente americano que não tem relações diplomáticas e comerciais normais com Cuba. A América Latina, muito sensível às questões cubanas, também expressou sua vontade de integrar a ilha à próxima Cúpula das Américas, que acontecerá em abril de 2015 no Panamá, ameaçando o encontro com um boicote no caso de uma nova exclusão de Havana.
Obama lembrou essa realidade. “Nenhuma nação nos seguiu na imposição dessas sanções [e] nem o povo estadunidense nem o povo cubano tiram proveito de uma política rígida que está enraizada em fatos que aconteceram quando a maioria de nós nem tínhamos nascido ainda [...]. Decidi, então, colocar os interesses de nossos dois povos no centro de nossa política [...]. Afinal, esses últimos cinquenta anos demonstraram que o isolamento não funcionou. É tempo de adotar um novo enfoque”.
Segundo a Casa Branca, “a política estadunidense em relação a Cuba isolou os Estados Unidos de seus sócios regionais e internacionais, limitou a capacidade de influência no continente americano e impediu o uso de toda uma série de instrumentos disponíveis para os Estados Unidos, com a finalidade de promover uma mudança positiva em Cuba”.[4] John Kerry, secretário de Estado, compartilhou desse ponto de vista lembrando que “não apenas essa política fracassou [...], mas também isolou os Estados Unidos em vez de isolar Cuba.”[5]
Restabelecimento do diálogo e flexibilização das sanções econômicas
Washington decidiu, então, restabelecer as relações diplomáticas que rompeu de forma unilateral em 1961. Roberta Jacobson, subsecretária de Estado para os Assuntos Hemisféricos, viajará para Cuba em janeiro de 2015 para formalizar a abertura de uma embaixada na capital cubana. Ambas as nações expressaram sua vontade de colaborar em temas como saúde, imigração, luta contra o terrorismo e o narcotráfico, assim como a elaboração de uma resposta comum às catástrofes naturais[6], “Estou impaciente por ser o primeiro Secretário de Estado em 60 anos a realizar uma visita a Cuba”, enfatizou John Kerry em um comunicado.[7]
Washington também decidiu revisar sua lista dos países que considera patrocinadores do terrorismo internacional, da qual Cuba faz parte desde 1982. Obama responde, assim, a um pedido da comunidade internacional e de vários congressistas estadunidenses que qualificam essa inclusão de arbitrária, enquanto o mundo inteiro louva a mediação de Havana no processo de paz da Colômbia.
A Casa Branca também decidiu flexibilizar as restrições às viagens dos cidadãos estadunidenses. Se as estâncias turísticas ordinárias ainda se mantêm proibidas, as viagens culturais, religiosas, acadêmicas, científicas, esportivas, sanitárias, humanitárias e profissionais serão favorecidas e os visitantes estadunidenses poderão usar seus cartões de crédito em Cuba em breve.
Por outro lado, as transferências de dinheiro dos cidadãos estadunidenses para Cuba passarão de 500 dólares por trimestre para 2.000 dólares. Da mesma forma, os cidadãos estadunidenses poderão importar bens de Cuba no valor de 400 dólares. Em um nível comercial, a gama de produtos exportáveis — limitados até hoje às matérias-primas alimentícias — se ampliará para outros setores como materiais de construção, equipamentos agrícolas e telecomunicações. Washington acata, assim, a uma petição do mundo dos negócios estadunidense que deseja investir no mercado natural que se encontra a apenas 150 quilômetros.
As transações financeiras em dólares foram facilitadas e as instituições estadunidenses poderão estabelecer relações com Cuba. As entidades estadunidenses instaladas no exterior poderão estabelecer laços comerciais com a ilha e realizar transações em dólares. Da mesma forma, será anulado o artigo da lei Helms-Burton, de 1996, que sanciona com uma proibição de seis meses de entrada nas águas territoriais estadunidenses todos os barcos estrangeiros que viajem para Cuba, se o comércio realizado com a ilha é de ordem humanitária.
O presidente Obama também convocou os legisladores estadunidenses a adotarem as medidas necessárias para suspender as sanções econômicas. De fato, desde 1996, somente o Congresso está habilitado a pôr um fim definitivo ao estado de sítio imposto a Cuba.
Reação de Havana e da comunidade internacional
O presidente cubano Raúl Castro se alegrou com o restabelecimento das relações bilaterais com os Estados Unidos, lembrando que Cuba sempre tinha afirmado sua vontade de resolver pacificamente as diferenças. “Desde a minha eleição como presidente dos Conselhos de Estado e de Ministros, reiterei em múltiplas ocasiões nossa disposição de manter com o governo dos Estados Unidos um diálogo respeitoso, baseado na igualdade soberana, para tratar dos mais diversos temas de forma recíproca, sem prejuízo da independência nacional e da autodeterminação do nosso povo”, declarou. Aproveitou a ocasião para saudar a decisão do presidente Obama que “merece o respeito e o reconhecimento”. Não obstante, recordou que deveriam ser canceladas as sanções econômicas que provocam “enormes danos humanos”. “Devemos aprender a arte de conviver, de forma civilizada, com nossas diferenças”, concluiu.[8]
A comunidade internacional aplaudiu a aproximação histórica entre Cuba e Estados Unidos, que põe fim a mais de meio século de relações conflitivas. O Vaticano expressou sua grande satisfação. Ban Ki-Moon, secretário-geral das Nações Unidas, felicitou os dois mandatários e declarou sua disposição “a ajudar a esses dois países a desenvolver suas relações como bons vizinhos”.[9]
A América Latina aplaudiu de forma unânime esse momento histórico. O Mercosul, por meio da presidenta do Brasil, Dilma Rousseff, felicitou Washington e Havana pela notícia “fantástica”.[10] José Mujica, presidente do Uruguai, expressou sua emoção: “É algo que na escala latino-americana é parecido, mas do outro lado, ao Muro de Berlim: caiu o bloqueio. Os bloqueios comerciais só serviram na história da humanidade para fazer os povos passarem mal, mas nunca resolveram nada”.[11] Cristina Fernández de Kirchner, presidenta da Argentina, prestou uma homenagem ao “povo cubano e a seu governo por iniciar um processo de normalização das relações com os Estados Unidos em absoluta dignidade e em pé de igualdade”. Nicolás Maduro, presidente venezuelano, enfatizou a “valentia” de Barack Obama.[12]
O Organização dos Estados Americanos também expressou sua satisfação a Washington e Havana por “terem dado esses históricos passos, tão necessários como corajosos, para restabelecer relações diplomáticas quebradas em 1961”. José Miguel Insulza, seu secretário-geral, declarou que “as medidas anunciadas hoje abrem uma via de normalização que já não tem volta”. Pediu que o congresso estadunidense adote as medidas legislativas necessárias para suspender definitivamente as sanções econômicas.[13]
Ao responder ao chamado da comunidade internacional e da opinião pública de seu próprio país, Barack Obama tomou a decisão mais emblemática de seus dois mandatos presidenciais e colocou fim a uma anomalia antiga restabelecendo as relações com Cuba. A história lembrará do presidente Obama, não apenas por ser o primeiro homem negro que chegou ao cargo supremo, mas, sobretudo, como o que aceitou o ramo de oliveira oferecido por Cuba e que abriu o caminho para a instauração de relações bilaterais construtivas. É tempo agora de os Estados Unidos colocarem um final definitivo a um estado de sítio econômico imposto desde 1960, permitir que os turistas estadunidenses descubram a ilha e aceitar a realidade de uma Cuba diferente — com suas virtudes e defeitos — mas independente e livre para eleger seu próprio modelo de sociedade.
Notas
[1] El Nuevo Herald, “Espía liberado por Cuba a cambio de tres agentes condenados trabajó para la CIA”, 18 de dezembro de 2014.
[2]The White House, «Barack Obama’s Speech: Charting a New Course of Era», 17 de dezembro de 2014. http://www.whitehouse.gov/issues/foreign-policy/cuba (site consultado em 17 de dezembro de 2014)
[3]The White House, «Barack Obama’s Speech: Charting a New Course of Era», 17 de dezembro de 2014. http://www.whitehouse.gov/issues/foreign-policy/cuba (site consultado em 17 de dezembro de 2014)
[4]Ibid.
[5] John Kerry, “Statement by Secretary Kerry: Announcement of Cuba Policy Changes”, U.S. Department of State, 17 de dezembro de 2014. http://iipdigital.usembassy.gov/st/english/texttrans/2014/12/20141217312131.html#axzz3MC4Z8Upx (site consultado em 17 de dezembro de 2014)
[6]The White House, «Fact Sheet: Charting a New Course on Cuba”, 17 de dezembro de 2014. http://www.whitehouse.gov/the-press-office/2014/12/17/fact-sheet-charting-new-course-cuba (site consultado em 17 dezembro de 2014)
[7] John Kerry, “Statement by Secretary Kerry: Announcement of Cuba Policy Changes”, op. cit.
[8] Raúl Castro, « Alocución del Presidente cubano : Los Cinco ya están en Cuba », Cubadebate, 17 de dezembro de 2014
[9] Le Monde, « Une ‘rectification historique’ qui ne contente pas tout le monde », 17 de dezembro de 2014.
[10] Opera Mundi, « Dilma diz achar ‘fantástica’ reaproximaçao de Cuba e EUA e lembra de porto de Mariel”, Opera Mundi, 17 de dezembro de 2014.
[11] Cubadebate,
[12] Telam, 17 de dezembro de 2014.
[13] Organización de Estados Americanos, « Secretario General de la OEA celebra ‘anuncio histórico’ de reanudación de relaciones diplomáticas entre Estados Unidos y Cuba”, 17 de dezembro de 2014. http://www.oas.org/es/centro_noticias/comunicado_prensa.asp?sCodigo=C-557/14 (site consultado em 17 de dezembro de 2014).
Sou totalmente contra o fim do embargo. Se os malditos imperialistas só sabem explorar, pra que retomar, meu Deus? Só vão contaminar a pureza do BELÍSSIMO socialismo cubano. Vida longa ao Comandante!! Só assim, muito brevemente, teremos o prazer de ver hordas de ianques fugindo em toscas jangadas para o paraiso de Havana.
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