Por Ernesto Pereira, no site da Fundação Perseu Abramo:
Contrastando com a situação internacional em que as taxas básicas de juro na maioria dos países atingem seus mínimos históricos, o Banco Central, em decisão na última reunião do Copom, 21 de janeiro, promoveu um novo aumento da meta para a taxa Selic que garante ao Brasil a posição de único país capaz de disputar com a Rússia, que acabou de sofrer a maior crise cambial desde os anos 1990, o título de taxa real de juros mais alta do mundo, muito à frente dos demais países, inclusive de alguns com inflação superior à brasileira como Turquia e Indonésia.
O objetivo declarado do aumento das taxas é o de, ao conter a expansão da demanda, combater as pressões inflacionárias. Poderia causar algum estranhamento que o controle da demanda seja um objetivo central da política numa economia semiestagnada. Na realidade, isso revela os problemas da concepção do processo inflacionário brasileiro na qual se apoia a política de juros excepcionalmente elevados que, ao longo dos mais de vinte anos em que vem sendo aplicada no país, coleciona apenas resultados pífios, previsíveis para uma política que menospreza características relevantes da inflação no país.
Em primeiro lugar, o Brasil ainda conserva vários mecanismos formais e informais de indexação automática herdados do período de alta inflação que não são afetados por uma política monetária “dura”.
Em segundo, grande, senão a maior parte da inflação decorre não de pressões de demanda, mas de aumentos de custo. Esses aumentos, contra os quais as altas nos juros são simplesmente inócuas, resultam dos fortes e frequentes choques de oferta que têm impactado especialmente os preços da energia (cujos recentes reajustes são claros exemplos) e dos alimentos; da progressiva e altamente volátil desvalorização da moeda, revertendo apenas parcialmente anos de forte valorização; e das bem-vindas transformações estruturais no mercado de trabalho que têm levado ao aumento relativo dos salários mais baixos.
Em terceiro, mesmo para controlar pressões de demanda, variações na taxa de juros são, no Brasil, particularmente ineficientes. Isto porque, entre aqueles que possuem recursos excedentes, são na prática raras as situações em que decisões de gasto são adiadas em resposta ao aumento dos juros. Ao contrário, ao elevar a renda dos investidores em títulos públicos, o aumento da Selic expande (pouco) sua demanda. Por outro lado, entre aqueles que tomam crédito para consumir, os spreads singularmente elevados no país fazem com que os aumentos na Selic, diferentemente do que ocorre em outros países, provoquem variações relativamente pequenas nas taxas finais (mesmo que integralmente repassado, um aumento de 1 p.p. elevaria a taxa média de juros do cheque especial de 191% para 192%), impactando apenas marginalmente o consumo. Além disso, em razão da renda média baixa, em geral não é a taxa de juros que limita o consumo apoiado no endividamento, mas sim o valor da parcela a ser paga, quase insensível à Selic.
Finalmente, aumentos na taxa de juros, ao elevar imediatamente o custo financeiro das empresas, geram pressões para o aumento dos preços, e, ao afetar mais os investimentos que o consumo, limitam a expansão da capacidade produtiva contribuindo para a geração de pressões inflacionárias no futuro.
Ou seja, os aumentos da taxa básica de juros são inadequados para reduzir a indexação, inócuos para refrear a inflação de custos, ineficazes para controlar a demanda, e ainda provocam pressões de custos sobre as empresas pressionando os preços. Isso não significa, todavia, que esses aumentos sejam totalmente inúteis para controlar a inflação. De fato, ao produzir taxas excepcionalmente elevadas, seu efeito sobre a demanda, mesmo que pequeno, não é irrelevante, e acaba contribuindo marginalmente para limitar a propagação dos aumentos de preços que, diretamente, são incapazes de conter. Além disso, em especial se há abundância de liquidez externa, o aumento dos juros contribui para valorizar a taxa de câmbio e, assim, moderar o preço dos bens comercializáveis, mesmo que à custa do impacto negativo sobre a competitividade da indústria e suas perspectivas de crescimento e mesmo sobrevivência.
O aumento da taxa de juros não é, portanto, completamente inútil, embora seja extremamente ineficiente para controlar a inflação. Ainda, carrega um enorme impacto negativo sobre as finanças públicas. De fato, cada aumento de 0,5 p.p. na taxa básica eleva os encargos da dívida pública em cerca de R$ 10 bilhões ao ano. Com isso, as três altas do ciclo atual que, ao totalizar 1,25 p.p., expandiram esse custo em R$ 25 bilhões, mais que compensam o aumento da arrecadação no ano, que deve alcançar cerca de R$ 20 bilhões, previsto como fruto da implantação de todas as medidas tributárias anunciadas no mês. Na contramão do esforço fiscal, o aumento dos juros interpõe um sério obstáculo à redução da dívida do governo.
Se em vista de sua clara ineficiência e de seus evidentes impactos distributivos perversos, a conveniência do uso da taxa básica de juros como instrumento principal, quando não único, de combate à inflação no Brasil sempre foi questionável, ao sabotar hoje um dos objetivos centrais do ajuste fiscal erguido em prioridade, o endurecimento da política monetária em curso se torna ainda mais difícil de justificar.
Contrastando com a situação internacional em que as taxas básicas de juro na maioria dos países atingem seus mínimos históricos, o Banco Central, em decisão na última reunião do Copom, 21 de janeiro, promoveu um novo aumento da meta para a taxa Selic que garante ao Brasil a posição de único país capaz de disputar com a Rússia, que acabou de sofrer a maior crise cambial desde os anos 1990, o título de taxa real de juros mais alta do mundo, muito à frente dos demais países, inclusive de alguns com inflação superior à brasileira como Turquia e Indonésia.
O objetivo declarado do aumento das taxas é o de, ao conter a expansão da demanda, combater as pressões inflacionárias. Poderia causar algum estranhamento que o controle da demanda seja um objetivo central da política numa economia semiestagnada. Na realidade, isso revela os problemas da concepção do processo inflacionário brasileiro na qual se apoia a política de juros excepcionalmente elevados que, ao longo dos mais de vinte anos em que vem sendo aplicada no país, coleciona apenas resultados pífios, previsíveis para uma política que menospreza características relevantes da inflação no país.
Em primeiro lugar, o Brasil ainda conserva vários mecanismos formais e informais de indexação automática herdados do período de alta inflação que não são afetados por uma política monetária “dura”.
Em segundo, grande, senão a maior parte da inflação decorre não de pressões de demanda, mas de aumentos de custo. Esses aumentos, contra os quais as altas nos juros são simplesmente inócuas, resultam dos fortes e frequentes choques de oferta que têm impactado especialmente os preços da energia (cujos recentes reajustes são claros exemplos) e dos alimentos; da progressiva e altamente volátil desvalorização da moeda, revertendo apenas parcialmente anos de forte valorização; e das bem-vindas transformações estruturais no mercado de trabalho que têm levado ao aumento relativo dos salários mais baixos.
Em terceiro, mesmo para controlar pressões de demanda, variações na taxa de juros são, no Brasil, particularmente ineficientes. Isto porque, entre aqueles que possuem recursos excedentes, são na prática raras as situações em que decisões de gasto são adiadas em resposta ao aumento dos juros. Ao contrário, ao elevar a renda dos investidores em títulos públicos, o aumento da Selic expande (pouco) sua demanda. Por outro lado, entre aqueles que tomam crédito para consumir, os spreads singularmente elevados no país fazem com que os aumentos na Selic, diferentemente do que ocorre em outros países, provoquem variações relativamente pequenas nas taxas finais (mesmo que integralmente repassado, um aumento de 1 p.p. elevaria a taxa média de juros do cheque especial de 191% para 192%), impactando apenas marginalmente o consumo. Além disso, em razão da renda média baixa, em geral não é a taxa de juros que limita o consumo apoiado no endividamento, mas sim o valor da parcela a ser paga, quase insensível à Selic.
Finalmente, aumentos na taxa de juros, ao elevar imediatamente o custo financeiro das empresas, geram pressões para o aumento dos preços, e, ao afetar mais os investimentos que o consumo, limitam a expansão da capacidade produtiva contribuindo para a geração de pressões inflacionárias no futuro.
Ou seja, os aumentos da taxa básica de juros são inadequados para reduzir a indexação, inócuos para refrear a inflação de custos, ineficazes para controlar a demanda, e ainda provocam pressões de custos sobre as empresas pressionando os preços. Isso não significa, todavia, que esses aumentos sejam totalmente inúteis para controlar a inflação. De fato, ao produzir taxas excepcionalmente elevadas, seu efeito sobre a demanda, mesmo que pequeno, não é irrelevante, e acaba contribuindo marginalmente para limitar a propagação dos aumentos de preços que, diretamente, são incapazes de conter. Além disso, em especial se há abundância de liquidez externa, o aumento dos juros contribui para valorizar a taxa de câmbio e, assim, moderar o preço dos bens comercializáveis, mesmo que à custa do impacto negativo sobre a competitividade da indústria e suas perspectivas de crescimento e mesmo sobrevivência.
O aumento da taxa de juros não é, portanto, completamente inútil, embora seja extremamente ineficiente para controlar a inflação. Ainda, carrega um enorme impacto negativo sobre as finanças públicas. De fato, cada aumento de 0,5 p.p. na taxa básica eleva os encargos da dívida pública em cerca de R$ 10 bilhões ao ano. Com isso, as três altas do ciclo atual que, ao totalizar 1,25 p.p., expandiram esse custo em R$ 25 bilhões, mais que compensam o aumento da arrecadação no ano, que deve alcançar cerca de R$ 20 bilhões, previsto como fruto da implantação de todas as medidas tributárias anunciadas no mês. Na contramão do esforço fiscal, o aumento dos juros interpõe um sério obstáculo à redução da dívida do governo.
Se em vista de sua clara ineficiência e de seus evidentes impactos distributivos perversos, a conveniência do uso da taxa básica de juros como instrumento principal, quando não único, de combate à inflação no Brasil sempre foi questionável, ao sabotar hoje um dos objetivos centrais do ajuste fiscal erguido em prioridade, o endurecimento da política monetária em curso se torna ainda mais difícil de justificar.
Obrigada por nos propiciar instrumentos de análise. O aumento da taxa Selic - como principal instrumento de controle da inflação - é pífio. Agora, sei as razões. Em decorrência, compreendi a fala de Boechat na Band, dizendo que estão fazendo "uma reforminha aqui, outra ali. Não estão fazendo é porra nenhuma!". Fico feliz em ver Boechat, Merval, Míriam, Catanhêde, Marta Suplicy e outros parceiros esculhambarem o governo. Zé Simão xinga a presidenta de "Touro Sentado". Para mim, isso significa que, à despeito de tudo, a Presidenta tem força e mantém seu Programa de Governo atrelado ao compromisso de continuar com as Políticas Sociais prometidas. Enquanto o PIG esbravejar, a gente tem certeza que esses "penduricalhos neoliberais" - implementados pelo ministro do Planejamento - são mais para "acalmar" os opositores. Mas, é tempo perdido para os objetivos de um Brasil crescendo com inclusão social.
ResponderExcluirConversa fiada. O Brasil não possui demanda forte.
ResponderExcluirO problema da inflação nasce com a falta de oferta - e oferta é mantida com produção de produtos e serviços.
O BACEN tem que inventar outra estória e parar de remunerar os banqueiros.
Sei o que tá pegando também e a balança de pagamentos. Então se é isso não precisava aumentar a selic . Tem muitos produtos superfluos que são importados que poderia ter um taxação maior. Taxa mais as viagens no exterior. etcetra. etcetra.
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