segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

Onde está o dinheiro da corrupção?

Por Eron Bezerra, no site Vermelho:

A lógica das sociedades capitalistas é a expropriação do alheio. A corrupção é apenas a parte não legalizada dessa prática macabra, razão pela qual as forças progressistas, de esquerda, jamais podem ser coniventes ou tolerantes com essa prática.

Toda sociedade tem seus valores, sua ética, que se constituem na sua cultura, no sentido definido por Tylor (Edward Burnett Tylor), como sendo “aquele todo complexo que inclui conhecimento, crença, arte, moral, lei, costume e quaisquer outras capacidades e hábitos adquiridos pelo homem na condição de membro da sociedade”. Cultura, portanto, tem valor histórico e de classe, ou seja, para cada período histórico e de acordo com a classe dominante esses valores culturais se alteram.

Assim, se na sociedade escravocrata era “legítimo” que um homem pudesse ser proprietário de outro homem e dele dispor integralmente, inclusive de sua vida, na sociedade capitalista é “legítimo” que os donos dos meios de produção paguem apenas uma ínfima parte pelo trabalho que os assalariados executam pra eles, o que assegura que eles continuarão cada vez mais ricos e os trabalhadores cada vez mais pobres. Essa é a ética da sociedade capitalista: a expropriação dura e crua.

A essência da sociedade capitalista é a exploração do homem pelo próprio homem, como bem sintetizou Karl Marx. A expropriação pura e simples do “alheio” é, portanto, a lógica dessa sociedade comandada pela burguesia, a classe dominante do capitalismo.

Como é fácil concluir a expropriação faz parte da cultura, da ética, das sociedades capitalistas, sendo a corrupção apenas a parte não “legalizada” dessa expropriação, na medida em que as outras formas de expropriação foram regulamentadas pelo estado – instrumento de dominação da classe dominante – e apresentadas como “exemplo” de capacidade empreendedora, competitividade e eficiência gerencial.

Mas, como nos ensina o materialismo histórico, "o novo nega o velho e o velho nega o novo", o que nos ajuda a compreender (o que explica) porque mesmo nas sociedades que deram os primeiros passos em direção ao socialismo (China, Cuba, Coreia, Vietnã) essa praga ainda continua existindo, apesar do rigor com que esses novos governos combatem a corrupção.

A corrupção está na essência da sociedade capitalista, é uma manifestação colateral da propriedade, a última das 7 grandes ideias (subsistência, governo, língua, família, religião, arquitetura e propriedade) desenvolvidas ao longo do processo evolutivo da humanidade, ainda no estágio da selvageria, e aprimoradas nos estágios posteriores da barbárie e civilização, até alcançar o seu ápice na sociedade capitalista. Tenderá a decrescer na sociedade socialista, na medida em que a realidade material objetiva se altere, até desaparecer no comunismo.

Assim, sendo a corrupção uma prática da cultura capitalista, não é compreensível que setores de esquerda tentem justificá-la, sob qualquer aspecto, e muito menos a pratiquem sob o simplório argumento de que isso é prática corriqueira no capitalismo.

De fato é e por isso mesmo tem que ser combatida por quem luta para construir outra sociedade, a sociedade socialista. Como é sabido, a consciência é produto da realidade material objetiva. Assim, a manutenção dessa lógica expropriativa contribui para manter inalterada a base material da sociedade e, consequentemente, das práticas que a maioria da sociedade burguesa “condena”, embora de maneira geral a pratique.

E a prova inconteste dessa afirmação é a própria operação “lava-jato” que revelou desvio de bilhões de reais através de contratos dos quais são beneficiário direto as principais construtoras do país e alguns operadores desse esquema agora convertidos em delatores. Do alto de sua “autoridade”, o delator mor Roberto Costa bradou: “essa prática (corrupção, aditivos arranjados, etc.) foi feita em todos os governos, do Collor, Sarney, Itamar, FHC, Lula e agora”.

Como o estado tem conteúdo de classe ele age seletivamente e julga e condena quem lhe interessa, mesmo que tenham praticado o mesmo crime. Por essa razão é que o chamado mensalão tucano – cujo operador era o mesmo Marcos Valério – e que foi chefiado por nada menos do que Eduardo Azeredo, então governador de Minas Gerais e Presidente Nacional do PSDB, sequer foi a julgamento, enquanto os denunciados no dito mensalão do PT já foram denunciados, julgados e condenados.

Também foi dito pelos delatores que os partidos beneficiados foram o PSDB, PSB, PP, PMDB e PT. Assim como todos os meios de comunicação noticiaram o índice de 3% como a maior parcela destinada aos partidos políticos beneficiados do montante eventualmente desviado através de contratos “arranjados”. E os outros 97%, onde estão? Ninguém teve curiosidade de fazer essa pergunta?

Os 97% restantes estão nas mãos dos operadores-delatores e das empreiteiras, como fica evidente pelo “quantum” que cada um deles se dispõe a devolver como parte do acordo das delações premiadas ou das negociações para redução de penas com o ministério público e o judiciário, ou seja, os partidos “beneficiados” abocanharam 3% e os atravessadores os outros 97%, numa inquestionável demonstração de que a corrupção é uma das chagas da sociedade capitalista.

Mas, por fim, acreditar que a direita faz cruzada contra a Petrobras por razões de zelo com a coisa pública seria de uma ingenuidade sem limites. A direita se anima pela luta de classes e vê nessa cruzada um instrumento (apenas isso) para minar o governo e tentar voltar ao comando do país, de onde foi apeada há 12 (16) anos. De quebra busca desmoralizar a Petrobras para tentar privatiza-la, seu objeto de desejo desde sempre.

Por outro lado, reduzir a nossa contra ofensiva apenas a essa constatação teórica não é suficiente para isolar a direita das amplas massas, onde de fato as coisas se resolvem. É preciso uma prática efetivamente de esquerda, que zele pela coisa pública, busque a eficiência administrativa e a melhoria permanente no padrão sócio cultural do povo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Comente: