Por Paulo Nogueira, no blog Diário do Centro do Mundo:
Quanto há de independência real na imprensa que os suspeitos de sempre gostam de chamar, peitos estufados, de “independente”?
O episódio da estrepitosa demissão de um colunista do jornal britânico Daily Telegraph joga luzes sobre este assunto.
Peter Oborne disse que saía porque a cobertura do jornal do caso HSBC é uma “fraude contra os leitores”.
O que o jornal não quer arriscar, segundo ele, é a publicidade milionária que o banco lhe garante.
Na Era Digital, anúncios são cada vez mais escassos para a mídia impressa – e o preço a pagar por isso é o que se está vendo no Telegraph.
A independência da mídia “independente” termina na necessidade de agradar seus anunciantes.
Nos dias de ouro da mídia impressa, o quadro era outro, e era possível alguma altivez – pelo menos em sociedades com mídia mais avançada que a brasileira.
Pertence à antologia do jornalismo o embate travado, algumas décadas atrás, entre a General Motors, então a maior montadora do mundo, e a revista de negócios Fortune.
Desgostosa com uma reportagem da Fortune, a GM decidiu suspender por seis meses a publicidade na revista, da qual era o maior anunciante.
Ao saber disso, a Fortune imediatamente publicou sua resposta. Propaganda da GM não mais seria aceita na revista.
Foi um momento de glória, talvez o último, na divisão entre Igreja (conteúdo) e Estado (publicidade) que foi a essência durante muitos anos da imprensa americana.
No caso do Telegraph, pelo relato de Oborne, a Igreja foi estuprada pelo Estado.
Não será fácil administrar os danos à imagem num país como a Inglaterra, em que a opinião pública tem o poder de fechar um jornal transgressor, como foi o caso do tabloide News of the World.
No Brasil, jornalistas que estiveram ou estão em postos de comando nas grandes empresas jornalísticas conhecem muito a dura realidade da “independência” da imprensa.
Tente encontrar alguma reportagem crítica na Folha – ou no Globo, ou na Veja, ou no Estadão – sobre um grande anunciante.
Há, aqui, um complicador adicional.
Como as empresas frequentemente estiveram à beira de quebrar, por decisões de investimento catastróficas tomadas por famílias pouco capacitadas, os credores também sempre falaram alto.
Vivi uma situação dessas.
Em 1997, quando eu dirigia a Exame, fizemos uma reportagem de capa sobre o banco Safra.
Eu já tinha lido e aprovado o texto quando Roberto Civita pediu para vê-la, o que jamais acontecera.
Imprimimos o artigo e mandamos para ele. Jamais recebemos de volta. Tivemos que improvisar uma capa na última hora.
Um dos irmãos Safras ligou para Roberto Civita para conhecer detalhes da capa. E ela acabou reprovada fora da redação.
Como Safra conseguiu isso?
Porque era um dos maiores credores da Abril.
Acabou ali minha ilusão sobre a força da Igreja diante do Estado na Abril.
Interesses poderosos estão por trás das grandes decisões editoriais nas empresas jornalísticas - ou de anunciantes, ou de credores, ou simplesmente dos próprios donos.
Infelizmente, aqueles interesses quase nunca coincidem com os do leitor.
O episódio da estrepitosa demissão de um colunista do jornal britânico Daily Telegraph joga luzes sobre este assunto.
Peter Oborne disse que saía porque a cobertura do jornal do caso HSBC é uma “fraude contra os leitores”.
O que o jornal não quer arriscar, segundo ele, é a publicidade milionária que o banco lhe garante.
Na Era Digital, anúncios são cada vez mais escassos para a mídia impressa – e o preço a pagar por isso é o que se está vendo no Telegraph.
A independência da mídia “independente” termina na necessidade de agradar seus anunciantes.
Nos dias de ouro da mídia impressa, o quadro era outro, e era possível alguma altivez – pelo menos em sociedades com mídia mais avançada que a brasileira.
Pertence à antologia do jornalismo o embate travado, algumas décadas atrás, entre a General Motors, então a maior montadora do mundo, e a revista de negócios Fortune.
Desgostosa com uma reportagem da Fortune, a GM decidiu suspender por seis meses a publicidade na revista, da qual era o maior anunciante.
Ao saber disso, a Fortune imediatamente publicou sua resposta. Propaganda da GM não mais seria aceita na revista.
Foi um momento de glória, talvez o último, na divisão entre Igreja (conteúdo) e Estado (publicidade) que foi a essência durante muitos anos da imprensa americana.
No caso do Telegraph, pelo relato de Oborne, a Igreja foi estuprada pelo Estado.
Não será fácil administrar os danos à imagem num país como a Inglaterra, em que a opinião pública tem o poder de fechar um jornal transgressor, como foi o caso do tabloide News of the World.
No Brasil, jornalistas que estiveram ou estão em postos de comando nas grandes empresas jornalísticas conhecem muito a dura realidade da “independência” da imprensa.
Tente encontrar alguma reportagem crítica na Folha – ou no Globo, ou na Veja, ou no Estadão – sobre um grande anunciante.
Há, aqui, um complicador adicional.
Como as empresas frequentemente estiveram à beira de quebrar, por decisões de investimento catastróficas tomadas por famílias pouco capacitadas, os credores também sempre falaram alto.
Vivi uma situação dessas.
Em 1997, quando eu dirigia a Exame, fizemos uma reportagem de capa sobre o banco Safra.
Eu já tinha lido e aprovado o texto quando Roberto Civita pediu para vê-la, o que jamais acontecera.
Imprimimos o artigo e mandamos para ele. Jamais recebemos de volta. Tivemos que improvisar uma capa na última hora.
Um dos irmãos Safras ligou para Roberto Civita para conhecer detalhes da capa. E ela acabou reprovada fora da redação.
Como Safra conseguiu isso?
Porque era um dos maiores credores da Abril.
Acabou ali minha ilusão sobre a força da Igreja diante do Estado na Abril.
Interesses poderosos estão por trás das grandes decisões editoriais nas empresas jornalísticas - ou de anunciantes, ou de credores, ou simplesmente dos próprios donos.
Infelizmente, aqueles interesses quase nunca coincidem com os do leitor.
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